Amara encontrou no fundo do armário um pijama infantil em forma de Pikachu, algo que ela havia comprado durante um antigo trabalho de meio período. Pensou que serviria bem para Théo. Quanto a Pitter, a solução foi mais simples: o irmão mais novo dela, Pietro, tinha deixado algumas peças de roupa durante uma visita.
Enquanto procurava por roupas, Amara se lembrou brevemente de seus pais adotivos e do irmão mais novo, Lorenzo Anbrósio. Desde que havia se reconciliado com seus pais biológicos, o contato com a família adotiva havia diminuído. Era uma memória dolorosa, mas rapidamente ela a deixou de lado.
Com as roupas encontradas, Amara voltou ao quarto e pegou um conjunto novo de lençóis e fronhas. O sofá da sala não era grande o suficiente para Pitter se deitar confortavelmente, então ela improvisou, usando um banquinho para estender o espaço.
Théo, por sua vez, era independente para a idade. Depois de se lavar e vestir o pijama de Pikachu, foi direto para a cama. Ele parecia um coelhinho fofo e tranquilo, já acomodado como se estivesse em casa.
Depois de tomar banho, Amara optou por um pijama conservador e prendeu o cabelo em um coque despretensioso. Ao sair do quarto, certificou-se de que sua aparência era decente.
— Isso... Sr. Pitter, vou me deitar. Se precisar de algo, pode me chamar.
— Claro. — Pitter respondeu, seus olhos seguindo-a por um breve momento, enquanto uma sombra de emoção passava pelo seu rosto.
A simplicidade de Amara, vestida em seu pijama e com o rosto fresco após o banho, parecia acender algo dentro de Pitter. Ele desviou o olhar, tentando afastar pensamentos inoportunos.
Amara entrou no quarto e foi recebida pela visão de Théo já acomodado. Não conseguiu conter um sorriso diante da cena adorável. Apagou a luz do teto, deixando apenas o abajur ligado, e deitou-se ao lado dele.
Théo, no entanto, não parecia disposto a dormir. Seus olhinhos brilhavam no escuro, deixando claro que ele esperava algo.
— Não sei contar histórias... Que tal uma música? — propôs Amara, tentando encontrar uma solução.
Era o que ele queria, Théo ficou animado.
Amara começou a cantar uma melodia suave:
"Nos dias quentes e frios do outono, Ficar perto de você, Observando o tempo passar silenciosamente..."
De repente, ela parou. O próximo verso era absolutamente impróprio para uma criança. Sentindo-se um pouco constrangida, ela tossiu levemente.
— Esqueci o resto da letra! Vou cantar outra, ok? — improvisou.
Théo, sempre obediente, concordou.
Dessa vez, ela escolheu uma canção infantil:
"João e Maria subiram a colina Para buscar um balde de água. Maria caiu e quebrou sua coroa, E João veio caindo atrás..."
Amara cantou a música três vezes, até que os suaves roncos de Théo a fizeram sorrir.
— Não é fácil criar filhos... — murmurou para si mesma, admirando Pitter em silêncio.
Ela se perguntou sobre o passado de Pitter. Quem era a mãe de Théo? Por que ela teria deixado uma criança tão adorável e o pai sozinho? Seria uma questão de status? Ou algo mais complicado?
Essas perguntas dançavam na mente de Amara enquanto ela se entregava ao sono, perdida em devaneios.
No meio da noite, porém, ela foi acordada de repente por um som abafado vindo da sala de estar. Algo havia acontecido...
Amara saiu cuidadosamente da cama, para não acordar Théo, que dormia profundamente. O som abafado vindo da sala de estar chamou sua atenção.
Ao abrir a porta do quarto, viu Pitter inclinado sobre o balcão da cozinha, despejando um pouco de água em um copo. Sua expressão estava pálida, e uma de suas mãos repousava sobre o estômago.
Ela se aproximou rapidamente, a preocupação evidente no tom de sua voz.
— Senhor Pitter, você está bem?— Nada demais — respondeu ele, evitando maiores explicações.
Amara estreitou os olhos, observando-o atentamente.
— Seu estômago está doendo, não está?Pitter não respondeu, mas o silêncio foi suficiente para confirmar suas suspeitas.
Amara lembrou-se de algo que Melissa havia comentado uma vez: Pitter não tolerava bem alimentos picantes. "Mas por que ele insistiu em comer, então?", pensou. Sem perder tempo, ela foi buscar um remédio.
— Espere aqui, vou pegar algo para aliviar a dor. — Voltou momentos depois com dois comprimidos na mão. — Tome estes, vão ajudar.
Pitter pegou os comprimidos, seus dedos frios roçando levemente a palma de Amara. O toque inesperado a fez sentir um calor subir até as bochechas.
No silêncio da madrugada, com o vento zunindo lá fora, aquele pequeno contato parecia criar uma tensão palpável no ar. Amara tentou desviar os pensamentos, concentrando-se em algo trivial. "Pi, 3,14159..." repetiu mentalmente, tentando recuperar a compostura.
— Está se sentindo melhor? Quer que eu o leve ao hospital? — perguntou ela, tentando parecer calma. — Desculpe, eu não sabia que você não podia comer comidas apimentadas…
— Não é sua culpa — disse ele, com uma voz serena. — É só um problema antigo.
Por um instante, o silêncio entre eles foi preenchido apenas pelo som do vento. Então, Pitter falou novamente, dessa vez com um olhar mais suave.
— O motivo de invadirmos sua hospitalidade esta noite foi Théo. Ele queria vê-la.Amara piscou, surpresa.
— Théo queria me ver?— Ele ficou muito assustado no armazém e, desde então, depende muito de você. Afinal, foi você quem o salvou.
Ao ouvir isso, Amara notou algo curioso: sempre que o assunto era Théo, a aura fria e intimidante de Pitter parecia se dissipar. Ele ficava mais humano, quase vulnerável.
— Entendo… — Amara assentiu lentamente.
Aquela noite tinha um clima que deixava as pessoas mais propensas a baixar suas defesas. Talvez fosse isso que a levou a fazer a pergunta que a incomodava há tempos:
— Posso perguntar algo? Théo não fala?Pitter hesitou antes de responder.
— Não é que ele não saiba falar… Ele simplesmente não quer.Amara franziu a testa, refletindo.
— Então, é algo emocional?— Sim. Théo é uma criança reservada. Ele tende a se isolar.
Amara assentiu, entendendo a situação, mas evitando tocar em questões mais profundas sobre a família. Sabia que era melhor não se intrometer em segredos tão pessoais.
— Senhorita Amara — Pitter a chamou de repente, com um olhar intenso. Seus olhos brilhavam, profundos como a noite lá fora, mas carregavam algo que parecia… distante.
— Sim? — respondeu ela, um pouco desconfortável sob aquele olhar.
— Já nos conhecemos antes?
Amara piscou, confusa. Se fosse outra pessoa, ela poderia pensar que era uma tentativa clichê de iniciar uma conversa, mas o tom sério de Pitter a desconcertou.
— Acho que não. Se tivesse encontrado o senhor antes, tenho certeza de que me lembraria. Por quê?— Nada. — Pitter desviou o olhar para a janela. A luz fraca da lua iluminava seu rosto, que agora parecia mais solitário.
O silêncio entre eles ficou pesado. Amara sentiu que era hora de encerrar a conversa.
— Senhor Pitter, se não precisar de mais nada, acho que vou voltar para o meu quarto...Pitter levantou a mão, interrompendo-a.
— Sem pressa. Sente-se."Sem pressa?! Estou com muita pressa!" pensou Amara, mas obedeceu, relutante.
Amara sentou-se obedientemente na cadeira, como uma aluna envergonhada do ensino fundamental. Seu rosto transparecia um misto de desespero e resignação.Pitter a observava, apoiando a cabeça com uma das mãos. Na penumbra da noite, ele parecia ainda mais enigmático e perigoso do que seu habitual comportamento austero durante o dia.— Você está com medo de mim? — perguntou ele, sem rodeios.Amara balançou a cabeça vigorosamente, depois assentiu de forma cuidadosa.— Provavelmente ninguém na cidade deixaria de ter medo de você, certo?Pitter sorriu de leve, mas seus dedos continuaram brincando com a xícara entre suas mãos. Com a mesma serenidade de antes, ele disparou outra pergunta:— Então você tem medo de mim porque os outros têm? Nesse caso, por que não se casa comigo, já que tantas outras mulheres querem?A pergunta fez Amara quase escorregar da cadeira. Ela achava que já havia escapado daquele tipo de conversa anteriormente, mas claramente tinha subestimado a determinação dele.— C
Pillar estava furiosa no escritório:— Amara conseguiu o papel de protagonista feminina coadjuvante!— Protagonista feminina coadjuvante? — Melissa franziu a testa. — Ela não estava apenas interpretando um papel irrelevante em algum filme desconhecido? Como é que teve tempo para fazer o teste para a protagonista feminina coadjuvante?— Também achei estranho. Descobri algumas coisas sobre a audição de ontem — respondeu Pillar, pensativa. — Os jurados estavam prestes a sair quando viram Amara por acaso. Decidiram ali mesmo que ela era perfeita para o papel. Parece que sua intuição estava certa: essa garota é perigosa. As audições já tinham terminado, e ainda assim ela conseguiu influenciar os jurados. Quem sabe o que ela fez para convencê-los?Pillar hesitou antes de continuar. Sabia que a aparência de Amara era uma arma poderosa. Não seria surpresa se algum dos jurados tivesse se encantado com ela.Inicialmente, Pillar planejava moldar Amara cuidadosamente quando a contratou. Mas, entã
Amara hesitou enquanto encarava o número salvo em seu telefone. Por mais que tivesse tentado evitar o momento, finalmente decidiu discar.Desde o incidente de cinco anos atrás, a ideia de interagir com crianças fazia com que memórias dolorosas emergissem. Era impossível esquecer o que havia perdido... a criança que carregava suas maiores esperanças e que agora representava seu passado mais sombrio.Porém, havia algo diferente em Théo. Ele não trazia consigo o desconforto ou as lembranças ruins. Ao contrário, a presença dele parecia aquecer sua alma. Era como se houvesse algo inexplicavelmente reconfortante nele.— Alô? — A voz do outro lado era um silêncio tímido.Amara sorriu, compreendendo imediatamente. — Théo? É você, não é? Desculpe a demora para ligar. A tia acabou de terminar o trabalho e lembrou de você!Sem resposta, ela continuou, conversando com suavidade:— Você já comeu? Espero que esteja se alimentando bem. Está muito magrinho, sabia? Crianças precisam comer para crescer
Théo amava o silêncio. Normalmente, depois de jantar, ele se retirava para seu quarto, isolando-se do restante da casa. Todos os funcionários precisavam finalizar suas tarefas e ir para seus próprios aposentos em silêncio absoluto. Qualquer som que perturbasse o ambiente o deixava irritado, ou pior, fora de controle.Certa vez, Madame Kléo enviou alguns lanches ao quarto dele, preocupada com a possibilidade de que não estivesse comendo o suficiente. Mas Théo, em resposta, simplesmente se trancou no sótão. Era um espaço onde ninguém ousava incomodá-lo.Apesar de todo o amor e preocupação de Pitter e Pietro, ninguém na casa se atrevia a forçar interações desnecessárias com Théo. Contudo, naquela noite, o inesperado aconteceu. O garoto, que sempre evitava companhia, tomou a iniciativa de sair do quarto. Mais surpreendente ainda: correu diretamente até Pitter, agarrando-se à perna do pai com determinação.Pietro não pôde conter o riso."Théo, o que está fazendo? Tentando me comprar com su
Amara estava vestida com calças de couro preto que destacavam suas curvas, uma escolha prática para pilotar sua moto. Quando chegou ao destino, arrancou o capacete e as luvas, revelando cabelos longos que caíam como uma cascata sobre os ombros. Sua aparência desenfreada e imponente parecia saída de um quadro.Pietro quase soltou um assobio ao vê-la entrar, mas conteve-se para evitar problemas.No entanto, a tensão reinava na sala. Pitter estava parado, firme e inabalável, enquanto segurava Théo, que lutava como uma fera enfurecida, seus pequenos braços agitavam-se desesperadamente, tentando escapar do aperto firme.“Pitter, você não pode fazer isso com ele!” Amara entrou rapidamente na sala e, em um movimento ágil, tirou o pequeno Théo dos braços do pai. O garotinho ficou atordoado por um segundo, mas assim que reconheceu Amara, seus olhos se encheram de lágrimas. Ele abraçou-a com força, como se ela fosse seu porto seguro, escondendo o rosto em seu ombro.Amara sentiu o coração apert
"Sim."Amara coçou a cabeça, sentindo-se estranha. “Isso... não é um pouco inapropriado? Posso vir a qualquer hora se Théo quiser me ver!”Pitter massageou a testa com cansaço. “Há muitos fatores desconhecidos, especialmente à noite. Seria perigoso se tivéssemos uma situação de emergência e você viesse aqui em alta velocidade na sua moto novamente. Com minha identidade, não é conveniente trazer Théo para visitar você com frequência. Sei que esse pedido pode parecer um incômodo, mas, como pai de Théo, estou sinceramente pedindo. Espero que possa considerar.”Amara sentiu uma dor de cabeça chegando.Ela teria recusado imediatamente se Pitter estivesse usando sua autoridade para forçá-la. Mas ele estava sendo honesto, quase implorando, e era difícil dizer não diante daquele rosto tão extraordinariamente bonito.Pietro, que assistia de canto, olhava para seu irmão com admiração.Incrível! Não esperava que Pitter usasse uma técnica tão refinada. Ele transformou uma desvantagem em uma oport
No canto da sala de estar, o velho mordomo observava atentamente a interação entre Amara e Théo. Ele notou que, durante toda a manhã, Amara não fez qualquer esforço para se aproximar deliberadamente de Théo. Em vez disso, manteve-se concentrada em seus roteiros, enquanto o garoto seguia sua rotina habitual, lendo livros ou desenhando.Apesar da aparente normalidade, o mordomo percebeu um detalhe: ocasionalmente, Théo lançava olhares discretos na direção de Amara. Havia uma expressão de serenidade e animação em seu rosto, algo raro de se ver.Embora essas interações trouxessem certa tranquilidade, o mordomo não conseguia afastar suas preocupações. Desde que soubera da confiança que Pitter depositava em Amara e da aparente aprovação de Pietro, o irmão de Pitter, ele mantinha sua guarda alta. Lembrava-se bem de como, há dois anos, um incidente terrível quase levou o pequeno Théo ao extremo. Desde então, tornou-se extremamente cauteloso com qualquer pessoa que tentasse se aproximar do men
Amara engasgou, incapaz de encontrar palavras.– Pitter! Seus funcionários sabem que você está usando a marca pessoal da sua empresa para ajudar artistas da concorrência?Era evidente que não. Lecks, o famoso maquiador, claramente não fazia ideia de quem ela era, dado o quão desconhecida Amara era no mundo artístico.Amara queria ajoelhar-se diante de Pitter. A Stellar Entertainment era, afinal, uma das subsidiárias da Riddel Corporation! Mesmo que Pietro estivesse atualmente gerenciando a Stellar e outras produtoras, o verdadeiro chefe nos bastidores era Pitter Riddel.A corporação havia se envolvido na indústria do entretenimento há cinco anos, adquirindo a Stellar Entertainment e transformando-a em um império capaz de rivalizar com as grandes concorrentes, incluindo a qual Amara pertencia, que até então era líder no setor. A competição entre as duas empresas era feroz. Seus funcionários, de artistas a maquiadores, raramente se misturavam. Em qualquer set que houvesse representantes