Saudade! Uma palavra que simplesmente não tem explicação. É impossível falar sobre o que a saudade representa para cada pessoa.No caso de Mel, a ausência que sentia era de alguém que estava ali, o tempo todo e que ela adorava com todas as suas forças.— MuitaMel respondeu falando sobre a intensidade dos próprios sentimentos, mas se precisasse explicar temia que ferisse o marido.E com certeza a nostalgia que sentia não significava falta de amor. Talvez até excesso porque era completamente apaixonada por todas as versões do marido.— Eu só vou fechar o galpão e vamos para casa. Me espera?— Para sempreRodolpho acabou rindo, o amigo ficaria furioso com qualquer pessoa que ousasse interromper momentos como aquele, mas com Mel, Endi parecia feliz com a chegada dela.Também sentiu saudades, a esposa do subchefe não se parecia em nada com Mel, ela jamais iria até um lugar como aquele. Aurora não sabia sequer dirigir e mesmo com muito esforço do marido, a menina simplesmente não se intere
Máscaras, nunca conhecemos realmente as pessoas que estão ao nosso lado, sabemos que se aproximar de um leão é perigoso, que devemos evitar ratos e que manter a distância de serpentes é a melhor escolha para nos mantermos seguros.Ainda assim, ninguém nos ensina que o ser humano é o topo da cadeia alimentar por um único motivo.Ele é capaz de fingir!O homem não venceria um leão pela força, nem afastaria ratos com palavras, muito menos eliminaria todas as serpentes do mundo sem colocar a si mesmo em risco.Ele faz o oposto do que seria natural, se esconde antes de atirar, envenena os animais pequenos com armadilhas aparentemente deliciosas e mesmo com os répteis o homem usa enxofre, arapucas e até a violência, jamais a inteligência.O que chamam de ser racional, nada mais é do que a capacidade de vencer pela mentira.Mas infelizmente, não somos ensinados a ter cuidado com o ser humano, o pior e mais dissimulado dos animais.Endi sabia disso, muitas vezes precisou lidar com a mentira e
Mel deixou a garota em casa, tentou explicar que não eram assim, que a justiça é algo muito maior do que apenas seguir as regras de um livro e que Endi fazia tudo o que estava ao seu alcance para que ninguém se sentisse da forma como Amara estava se sentindo. — Você falou dos homens do conselho, mas se esquece que até o meu pai pagou pelos erros que cometeu, já foi condenado a câmara, mesmo quando era o chefe. Meu sogro nunca foi privilegiado por ser quem é e mesmo o meu irmão ficou meses esperando pela morte quando se levantou contra uma de nós. Eu nunca pedi por nenhum deles, porque sei que Endi olha todos os fatos antes de decidir, por que eu pediria pelo seu irmão? — Porque vocês não o conhecem, Tank é rude às vezes, mas é a melhor pessoa que eu conheço. Se o seu marido é mesmo a pessoa que diz, então me deixa falar com ele, dizer o que ele não sabe e se ainda assim ele decidir condenar o meu irmão, eu vou embora sem falar mais nada. Quando Mel ouviu sobre as coisas que Amara vi
Amara se levantou depressa, correu para o irmão tão desajeitada que nem se deu conta de que ele estava segurando um lanche, tudo foi para o chão, mas ele a abraçou.Um dos poucos abraços que Tank deu na irmã, preferia manter distância, nunca quis que ela visse o toque de um homem como normal e achava que isso precisava começar em casa, mas naquele dia, o olhar da menina o fez esquecer das próprias crenças e da dor que sentia.Os ombros e as virilhas estavam cortados pelo contato com o ferro quente, mas abraçar Amara era um privilégio que achou que nunca mais teria.— Desculpa te assustar assim, Foquinha. Vou dar um jeito de tirar a gente daqui, prometo.— Por quê?— Porque não é seguro, Amara.A menina pensou que gostava de Mel e que apesar de detestar o jeito autoritário de Endi, ele tinha sido bom com eles.— Quando?— Não sei, preciso pensar. Sair da organização não é uma opção, eles vão nos caçar feito bichos. Vou pensar em uma saída segura, Foquinha. Só fica longe dessa gente.Am
Amara ficou confusa, a aflição do irmão parecia sem sentido algum, eles nunca foram próximos da madrasta, aliás ao contrário, se lembrava com clareza de todas as coisas que Tank dizia sobre ela.— É uma puta de rua, Amara. Ela se vendeu por casa e comida, nem olhe para ela.Ela obedeceu, sempre obedecia, o irmão era a única família que tinha e Tank já tinha feito sacrifícios demais por ela, qualquer coisa que ele pedisse em troca ainda seria pouco.Isso até aquele dia, não sabia por quem o irmão estava preocupado, se pela madrasta que nem conversavam, ou pelo pai que sempre tinha sido como um inimigo com quem dividiam a casa.Não importava com qual dos dois, ainda parecia loucura.Quando o irmão correu para fora ela tentou segui-lo, mas Tank sumiu antes que ela conseguisse chegar no final do jardim que o pequeno sobrado possuía.Voltou para dentro se sentindo estranha.O irmão seria capaz de mentir para ela?A garota ficou parada por um tempo até começar a juntar os materiais da escol
Endi não tentou explicar que não era como as pessoas que feriram a garota, pareceu quase cruel tentar se defender diante de alguém que carregava tanta dor sem derrubar uma única lágrima.Mel estava chorando muito antes de Dállia terminar, mas a esposa de Russo continuava narrando a própria vida como quem detalha fatos em uma delegacia.— Onde? De que bairro você veio, menina?— Sunnyside, Houston— Vamos cuidar de você. Pode ir com a Mel se sentir mais segura, ninguém mais vai te fazer mal, Dállia.A garota não respondeu, mas pensou que não tinha mais nada que pudesse perder, já tinham tirado absolutamente tudo dela. Lembrou de Tank e um arrepio gelado pareceu sair do seu coração e se espalhar pelo corpo.Puxou o ar tentando controlar o que sentiu, mas lembrou do jeito que ele a abraçava, como beijou a sua mão o dia em que ela se cortou preparando o almoço.Desde que foi levada a casa de Endi, aquela foi a primeira lágrima que derramou e não era pela dor do passado, era pela dor de te
Tentou bater outra vez na porta do capo, mas outro doberman cravou os dentes em seu tornozelo e puxou.Tank caiu e mal teve tempo de erguer os braços antes de ser atingido no peito. O ar pareceu ser arrancado dos pulmões o peso do animal, as patas pressionando suas costelas. Tudo parecia um pesadelo sem fim.Já nem sentia a perna que o outro cão sacudia de um lado para o outro, mas reagiu no instinto. Segurou o focinho da cadela, os dentes cravados nas suas mãos, o sangue pingando quente em seu rosto, os olhos ardendo pelo suor.Uma luta cega enquanto usava toda a força que ainda tinha para manter a mandíbula do bicho aberta.Os músculos do braço queimavam, assim como os ferimentos, ardendo como fogo.Endi desceu as escadas, viu a poça de sangue invadir sua sala por baixo da porta, sorriu, porque quem quer que fosse, tinha aprendido com quem estava lidando.Abriu a porta apenas para se divertir, mas quando viu o soldado, algo o fascinou.Não era uma luta pela sobrevivência, havia uma
Endi, assim como o pai, gostava de histórias de amor, talvez não com a mesma fé de Sombra, mas as reais, aquelas que enraízam na carne e fazem um homem perder a razão, essas ele apreciava.Deixou Tank cercado pelos dobermans, os animais não atacariam, mas achou que seria divertido se o soldado acordasse e desse de cara com feras ao invés da mulher que ele desmaiou chamando.Caminhou assobiando uma canção que adorava, My Way do Frank Sinatra. Pegou um kit de primeiros socorros e avisou ao filho.— Quer me ajudar a dar alguns pontos?— Quero!Edgar nem mesmo entendeu que os pontos seriam em uma pessoa, mas gostava de fazer tudo junto com o pai e o seguiu satisfeito, ganhou uma lambida no rosto de um dos dobermans, com as crianças aquelas feras pareciam realmente animais de estimação.Endi ensinou o filho como limpar as feridas, mas Edgar não teve força para fazer as suturas, ainda assim ajudou com tudo o que conseguiu.— Vamos matar ele, pai?— Acho que não, parece que ele ainda tem uma