A Proposta

Faço carinho nos cabelos dela, enquanto observo seu rosto pálido, suas olheiras profundas e então meus olhos descem para seu corpo, que dia após dia perde ainda mais suas curvas. Dou um beijo em sua testa e nos despedimos. 

Ao fechar a porta atrás de mim, lágrimas rolam em meu rosto, um misto de felicidade, alívio e uma ponta de preocupação. Embora saiba que o que fiz foi arriscado, errado e tenha piorado o meu desespero, não sinto nenhum resquício de arrependimento. Minha mãe agora tem uma enorme chance de sobreviver à sua doença.

Com uma parte dos meus problemas resolvida, cumpro minha primeira obrigação na empresa e invento uma desculpa para sair. Fico encarando meu carro por alguns minutos antes de dirigir até uma agência de carros, mais uma vez determinada a tentar vendê-lo para recuperar o relógio. No entanto, o valor absurdo oferecido novamente, inferior à primeira proposta, me faz desistir da ideia.

No caminho de volta à empresa, Noah me liga, mais uma vez pressionando para que eu o encontre.

— Srta. Hampton. — Noah me cumprimenta quando me sento à mesa, e dou um sorriso sem graça — Onde está o meu relógio?

— Sr. Ewing, eu preciso de mais um tempo, por favor. Estou tentando recuperar o dinheiro que recebi por ele para poder devolvê-lo.

— Não, eu já te dei tempo demais, acredite.

— Eu não consigo $100 mil assim, do nada. Realmente agi por impulso e não consigo resolver isso tão facilmente. — Respondo num tom baixo, desviando o olhar e encarando os meus dedos — Por favor, me dê um prazo. Em dois dias, eu consigo.

— Dois dias? Não sou do tipo com tanta paciência quanto estou tendo. Mas me esqueci que você é burra, então vou te explicar o óbvio: em dois dias a loja poderá vender o meu relógio. Se não consegue o dinheiro por conta própria, peça para o seu pai. Tenho certeza que 100 mil não é nada para ele.

— Não, isso não! — Exclamo, num tom assustado, e ele abre um sorriso sarcástico.

— Seu papai não tem noção do que a princesinha dele fez, não é? Imagino como ele ficará ao saber o que você se tornou, Ava. Portanto, não teste a minha paciência, ou não somente ele como todo mundo saberá sobre o seu passatempo de sair por aí à procura de homens indefesos para roubá-los!

— Você está longe de ser indefeso, Noah.

— Sr. Ewing, Ava. Embora já tenha te levado para a cama, você não tem intimidade para me chamar pelo nome. — Noah diz rispidamente, me obrigando a revirar os olhos disfarçadamente. — Ava, eu não sou indefeso, mas e os outros? 

— Para você é Srta. Hampton!

— Ava. — ele continua, em tom sarcástico, ignorando o meu comentário. — Estou de ótimo humor hoje, então te farei uma proposta.

— Qual?

 — Quero que seja minha esposa.

— O quê? — indago, confusa, após quase cair da cadeira pelo susto da proposta. — Não me diga que se apaixonou por mim por conta de uma noite que nem sequer me lembro direito.

— Não seja presunçosa, Ava, sequer me lembro como foi aquela noite. Tudo não passará de um relacionamento de fachada, um casamento contratual com cláusulas muito bem estabelecidas, para que você nem pense em me dar outro golpe.

— Isso é um absurdo! Eu não aceitarei isso.

— Como te disse, estou de bom humor. — Noah responde após olhar uma mensagem no celular e então se levanta. — Portanto, você terá até amanhã pela manhã para me devolver o relógio, ou aceitar a minha proposta. Do contrário, terei o imenso prazer de formalizar a queixa contra você e divulgar isso à imprensa. Com licença, Ava.

Noah me encara enquanto abre a carteira e j**a algumas notas em cima da mesa antes de sair. Permaneço sentada por alguns minutos, tentando digerir a proposta que ele me fez, e me vejo cada vez mais sendo posta contra a parede.

Mais uma vez, situações desesperadas pedem medidas desesperadas, e quando me dei conta, mesmo contra a minha vontade, estava indo até a casa do meu pai.

— Minha menina! — Dorothy, governanta da família há anos, me abraça e me beija carinhosamente — Há quanto tempo, meu amor! Como você está?

— Sinceramente, tia Dory? Não sei definir como estou. Fisicamente estou bem, mas estou psicologicamente destruída. O meu pai está? Hoje ele não trabalhou, então não tive outra opção senão vir aqui.

— Está no escritório, Ava, com a… — Dorothy revira os olhos. — Com a Srta. exigente Smith.

— Que Deus me ajude, tia Dory!

Rimos juntas e ela me acompanhou até o escritório do meu pai, anunciando a minha chegada e saindo a seguir. O meu pai me encara assustado com a minha visita, pois não venho aqui desde que ele se separou da minha mãe, enquanto a nova namorada dele revira os olhos disfarçadamente.

— Ava? — Ele estende a mão para que eu me sente e sorri. — Que surpresa te ver aqui, filha!

— O senhor não foi para a empresa hoje, então tive que vir até aqui, papai.

— Não irá cumprimentar a Amy?

— Preciso conversar com o senhor. — Ignoro a pergunta dele. Em provocação, Amy se senta no colo dele. — Em particular, papai.

— Eu e o seu pai não temos nada a esconder, Ava, não vejo necessidade da minha saída.

— Concordo, meu docinho de coco. — Meu pai acaricia a coxa dela e olha para mim — Pode falar, Ava.

— Papai, por favor…

— Se preferir, pode deixar para falar quando eu voltar para a empresa, na próxima semana.

— Fale, minha filhinha!

— Amy, não força! Você tem quase a minha idade! — Reviro os olhos e respiro fundo antes de falar — Preciso de $100 mil, papai.

— De novo essa história, Ava? Já te disse que não vou mais ajudar no tratamento da sua mãe. Já fiz demais por ela e perdi muito tempo também.

— Também a abandonou quando ela mais precisou do senhor e do seu apoio, não é?

— Ava, seu pai precisa aproveitar a vida, não é, meu amorzinho? — Amy beija o meu pai e abre um sorriso irônico para mim.

— Exatamente, docinho. Ava, é somente isso? Estávamos organizando a nossa próxima viagem, Amy quer ir para o Caribe e eu prometi levá-la, mas você está nos atrapalhando!

— Não é para o tratamento da minha mãe, pai. — Suspiro e passo as mãos no rosto antes de voltar a encará-lo. — Já consegui o dinheiro da cirurgia dela ontem. Mas acabei arrumando um enorme problema por conta disso.

— O que você fez, Ava? — Ele me encara sério e tira Amy do colo para se levantar. — Espero que você não tenha feito nada para sujar o nosso sobrenome, Ava!

 — Peguei algo de alguém, pai. Agora essa pessoa está se aproveitando disso para…

— Ava — Meu pai passa as mãos no rosto e me encara sério — Pegar? Você quer dizer roubar, não é? Não acredito que você…

— Ava, querida. Eu não acredito que você esteja tão chateada com o seu pai ao ponto de roubar e manchar a imagem dele por aí! — Amy se aproxima de mim e acaricia o meu braço. — Você precisa entender que os casamentos chegam ao fim. Você não pode se vingar do seu pai por ter…

— Ter o quê, Amy? — corto suas palavras e me levanto bruscamente, encarando-a nos olhos com uma mistura de indignação e incredulidade. — Ter sido um covarde ao abandonar a esposa doente e um casamento de 25 anos? Ou por ter se envolvido com qualquer uma? Porque é isso que você é! Uma mulherzinha qualquer, uma puta oportunista que...

— Não repita isso! — Meu pai exige com um grito, seguido de um tapa brusco em meu rosto. Sinto a ardência na minha pele e desisto de segurar as lágrimas de decepção, ao testemunhar ele abraçando Amy, que finge um choro ofendido. — Peça desculpas para a Amy, Ava!

— O quê?! Nunca!

— Tudo bem, minha vida… Ela está chateada porque você me ama e preferiu ficar comigo.

— Eu exijo que ela faça isso!

— Não, eu não vou pedir desculpas por falar a verdade — Enxugo as minhas lágrimas e balanço a cabeça negativamente — A que ponto o senhor chegou, papai, eu realmente não o reconheço mais.

— Lamento que pense assim. — meu pai afirma, ainda abraçado com ela. Ela abre um sorriso disfarçado ao me encarar. — Assim que o divórcio sair eu vou me casar com ela. Portanto, espero que você se conforme com isso e aprenda a respeitá-la. Volto a repetir, enquanto você não souber respeitar a Amy, você terá apenas o seu salário e a sua faculdade, e se dê por satisfeita.

— Isso tudo foi realmente um erro, eu não deveria ter vindo até aqui.

— Concordo! Ultimamente a única coisa que você faz é me desafiar, Ava. — Meu pai segura a Amy pela mão e se senta, colocando-a em seu colo novamente — Quanto ao seu problema, assuma as responsabilidades e resolva sozinha. Se venda se for preciso! Eu não quero saber como irá resolver isso. Mas esteja ciente, Ava, se você ousar manchar o nosso sobrenome, juro por Deus que me esqueço que sou o seu pai e eu acabo com você! Agora saia! Temos uma viagem para terminar de organizar e eu já perdi tempo demais com você.

  

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