Liam
Estou me sentindo como um leão enjaulado, andando de um lado a outro do meu escritório sem conseguir parar. E mais uma vez veio a necessidade de extravasar a raiva de alguma maneira, optei pela mais acessível no momento. Peguei uma garrafa do conhaque favorito do meu pai e joguei contra a parede.
— Droga, droga e droga! — Lancei um copo também contra a parede — Mil vezes droga!
O choque passou e em seu lugar só existe raiva. Muita raiva do meu pai, da minha mãe e, principalmente, do imbecil do meu tio. Tenho certeza de que foi ele que convenceu o meu pai a estabelecer aquelas condições para que eu possa assumir de uma vez por todas a minha fortuna. E continuo sem conseguir acreditar que o meu pai fez isso comigo! O que Frederico está fazendo comigo é chantagem, e das mais ordinárias.
Continuei andando pela sala, agora tomando cuidado para não pisar nos cacos de vidros, até que me senti um pouco mais controlado e liguei para a minha secretária.
— Providencie alguém da limpeza aqui na minha sala — Ordenei sem nem mesmo cumprimentar a mulher do outro lado da linha — Rápido!
Não estava com paciência para gente lenta. Por mais que a minha secretária costuma atender a todos os meus pedidos com grande eficiência, ela não prezava pela agilidade e isso me dava nos nervos.
Sentei em minha cadeira por trás da mesa imponente de diretor geral e desbloqueei o computador. Precisava me preparar para uma reunião com a equipe de gestão de crise. O meu pai não poderia ter escolhido um momento pior para soltar aquela bomba sobre o meu colo.
Alguém bateu à porta nesse instante e imaginei que fosse da limpeza.
— Entra logo! — gritei impaciente.
Não estava errado e logo percebi a entrada de uma garota usando um macacão branco horrível e uma touca na cabeça. Apesar de nunca prestar atenção nas pessoas que cuidam das tarefas básicas da minha empresa, notei que já faz alguns meses que sempre vem a mesma garota cuidar da limpeza da minha sala.
Ela apenas acenou antes de começar o seu trabalho e eu não me dignei a responder ao seu cumprimento. Estava ocupado demais com problemas bem mais importantes que uma funcionária do setor de limpeza.
Continuei analisando alguns relatórios importantes e buscando informações complementares na internet, assim como solicitei por e-mail um laudo do setor jurídico da empresa, tudo isso simultaneamente.
— Já pensou em buscar ajuda? — Uma voz doce e suave falou muito baixo.
Pensei ter ouvido coisas e olhei para a única pessoa na sala além de mim. Não é possível que aquela garota teve a audácia de sugerir que eu preciso de ajuda.
— O que disse? — perguntei, arqueando a sobrancelha.
Encarei a garota, mais uma vez a minha vista gritando socorro diante daquela roupa horrorosa. Ela me olhou parecendo desconfortável, diria até que arrependida por ter falado o que quer que seja, agora de pé juntando os cacos de vidros na pá. Espero que ela não tenha a coragem de repetir.
— O senhor já pensou em procurar ajuda?
Os meus ouvidos não me enganaram e a voz suave e delicada era mesmo daquela garota sem graça. Mas analisando melhor o seu rosto, notei que seus traços não são nada desagradáveis. Não que isso mude alguma coisa. Ela tinha acabado de jogar fora o emprego dela na Loser Inc.
Inclinei o meu corpo de maneira a me apoiar melhor no encosto alto da cadeira de executivo e com toda a tranquilidade que possuo, levei a minha mão ao queixo.
— Você está demitida.
A garota olhou para mim, surpresa estampada em seu rosto. Seus olhos expressavam uma mistura de tristeza e determinação, mas ela não recuou.
— Desculpe, senhor, mas eu só queria ajudar, oferecer uma palavra amiga. Todos passamos por momentos difíceis, e às vezes é preciso reconhecer quando precisamos de ajuda.
Senti um desconforto momentâneo diante da sinceridade em suas palavras. Aquela doçura e empatia que ela demonstrava eram estranhas para mim, acostumado a lidar com pessoas mais duras e assertivas. Por um momento, o pensamento de reavaliar minha decisão passou pela minha mente. Mas a arrogância rapidamente voltou à tona.
— Eu não preciso de palavras amigas de uma faxineira. Cuide dos seus afazeres e não se intrometa em assuntos que não lhe dizem respeito.
Ela abaixou a cabeça, resignada, mas antes de sair, disse:
— Espero que um dia encontre a paz que está buscando.
A porta se fechou atrás dela, e a sala ficou imersa em um silêncio pesado. Eu me esforcei para retomar meu foco nos relatórios, mas as palavras da garota ecoavam em minha mente. O que ela quis dizer com aquilo?
À medida que o dia passava, eu me pegava pensando na funcionária da limpeza. Ao chegar na casa dos meus pais à noite, encontrei meu pai e o meu tio reunidos na sala de estar da mansão e toda a minha tensão e raiva voltaram com força total.
— Espero que tenha pensado na minha sugestão, Liam — Frederico Ricci foi logo dizendo.
— É dessa forma que o senhor classifica o que está me obrigando a fazer? — Perguntei sem titubear — Uma ”sugestão”?
— Só estou tentando colocar um pouco de juízo na sua cabeça, meu filho — Apesar das palavras, seu tom não tinha gentileza alguma — Não vou colocar a minha empresa nas mãos de um playboy irresponsável.
— Frederico! — Mamãe disse horrorizada, ao entrar na sala neste momento — Não pode falar dessa forma com o nosso filho.
— Eu já estou acostumado, mamãe — Falei com cinismo — Afinal, foi esse tratamento que recebi durante toda a minha vida, não é mesmo?
Eu amo a minha mãe e ela é o único motivo pelo qual eu ainda continuo visitando aquela casa. Não importa que o grande idiota seja também o meu pai. Eu não confio nele.
— E você, como sempre, está agindo com o costumeiro cinismo — Frederico apontou, levando o seu charuto à boca e tragando-o mais uma vez — Espero que uma esposa consiga amenizar esse temperamento rebelde.
— Por estranho que possa parecer, eu concordo com o Liam — O meu tio Julian também se inseriu na conversa — Não pode colocar uma condição como essa para que ele possa assumir a empresa.
— Ah, por favor, Julian! Não me faça rir — Eu soltei uma risada sarcástica — Você está torcendo para que o meu pai faça exatamente isso. Afinal, se eu não me casar dentro de um mês, a presidência da empresa irá para o Caíque, o seu filho amado.
— Por favor, queridos — Mamãe interferiu na situação mais uma vez — Não vamos entrar em outra discussão sem sentido. Não chegaremos a lugar algum com todas essas acusações.
Julian teve a decência de se manter em silêncio, mas não tenho certeza se foi devido ao que eu falei ou as palavras de mamãe. Julian é irmão do meu pai, mas ele também sabe que mesmo sendo um completo idiota, papai jamais perdoaria alguém que venha a bater de frente com a sua esposa. Isso não deixa de ser uma contradição, quando ele mesmo é um cretino com ela.
Enquanto a tensão continua a pairar no ar, eu olhei ao redor daquela luxuosa sala de estar, sentindo-me sufocado pela pressão e pelas expectativas que minha família depositava sobre mim. Eu não queria ser controlado ou manipulado pelo meu pai.
Aos olhos deles, eu era apenas um playboy mimado e irresponsável, incapaz de assumir a responsabilidade pelos negócios da família.
— Liam, eu entendo que você tenha suas próprias opiniões, mas é hora de amadurecer — meu pai retrucou, sua voz repleta de autoridade — Se você quer ser levado a sério, precisa demonstrar comprometimento e responsabilidade. O casamento é um passo importante nessa direção.
Eu cerrei os punhos, sentindo minha paciência se esgotar. A ideia de um casamento arranjado apenas para garantir meu suposto amadurecimento era insultante.
— Eu não vou aceitar isso, pai — declarei, com firmeza em minha voz — Eu não vou me submeter a um casamento apenas para agradá-lo. Eu tenho minhas próprias metas e minha própria vida para viver.
Minha mãe me olhava com tristeza, parecendo dividida entre seu amor por mim e a lealdade ao meu pai. Ela tentou intervir novamente, mas eu a cortei antes que pudesse falar.
— Melhor eu ir embora — Falei com determinação.
Eu deixei a sala de estar. Preciso de um momento de paz para organizar meus pensamentos e tomar uma decisão. Enquanto caminhava pelos corredores da mansão, minhas emoções se misturavam. Raiva, frustração, mas também uma chama de determinação. Eu não vou perder a empresa que é minha por direito e entregá-la de mãos beijadas ao meu primo Caíque, após anos me dedicando totalmente a Laser Inc.
LiamAcordei disposto a encontrar uma esposa. Se a condição para que eu assuma a Laser Inc. e a minha fortuna é essa, é exatamente isso o que farei. Porém, após uma noite mal dormida, em que perdi horas rolando na cama pensando sobre esse assunto, decidi que meu pai terá uma grande surpresa quando descobrir o que eu pretendo fazer.Ele estabeleceu que eu deveria me casar, porém, ele não especificou com quem. Eu pretendo encontrar uma esposa completamente oposta ao que ele acredita ser a pessoa que eu vou escolher para me casar. Decidido a seguir meu próprio caminho e fazer uma escolha que desafiasse as expectativas de meu pai, eu me pus a buscar uma esposa que fosse completamente diferente do que ele imaginava. Alguém que não se encaixava no estereótipo de uma mulher fútil da alta sociedade paulistana.Mas onde eu poderia encontrar alguém assim? Eu não tenho a menor ideia. Talvez eu deva sair, conhecer lugares diferentes dos quais eu costumo frequentar. Estava pensando sobre isso qua
CecíliaOlhei em torno do cômodo minúsculo, a tristeza me invadindo mais uma vez. As paredes estavam úmidas e como estava chovendo muito naquela noite, temi pela minha segurança, pois parece que o teto pode cair a qualquer momento. Voltei a orar por uma ajuda divina.Não havia muito a fazer além disso, afinal. Não estava conseguindo me concentrar na leitura de nenhum dos livros que eu trouxe na mudança, o que é absolutamente normal, considerando-se a minha situação atual.Fui demitida do meu emprego e quando cheguei em casa e contei para a minha família, o meu padrasto me mandou embora de casa no mesmo instante. Lembrei das palavras de Jean e o meu peito doeu uma vez mais.— Se não pode contribuir com as despesas de casa, também não vai ficar debaixo do meu teto — Ele disse com extrema frieza — Não posso sustentar mais uma boca. Já me basta ter que sustentar a sua mãe e os seus irmãos.Eu poderia ter dito que os meus irmãos são filhos dele e que a minha mãe é a sua esposa, mas na situ
LiamEu não consigo entender o que está acontecendo com Marta ultimamente. Ela parece estar cada dia mais estranha e até mesmo com raiva de mim. Eu sei que não sou um chefe fácil de lidar, mas isso não justifica essa mudança de comportamento, afinal, ela já trabalha comigo há mais de cinco anos. Pensava sobre isso quando Caíque entrou na minha sala sem ser anunciado e logo Marta estava atrás dele, preocupada com a minha reação, como já aconteceu outras vezes.— O que está fazendo aqui, Caíque? — Perguntei furioso, ficando de pé por trás da minha mesa — Essa sala é minha e você não pode entrar aqui sem a minha autorização.Caíque não demonstrou preocupação alguma com as minhas palavras, sentando-se na cadeira em frente a mesa e cruzando as pernas sobre o tornozelo com tranquilidade. Ele demonstrou estar bastante à vontade.— Por pouco tempo, meu caro.Eu encarei o meu primo sem conseguir entender o que ele estava tentando insinuar com aquela frase, e quando o questionei, ele respondeu
CecíliaConsegui um trabalho como garçonete em uma boate na zona sul da cidade. Estou odiando, mas foi a única coisa que apareceu. Consegui através da indicação de uma das garotas que também moram na pensão. Na verdade, não é bem uma boate, percebi no meu primeiro dia de trabalho. Não sei como denominar o local, mas eles o chamam de Clube Sussex. A maioria do público é constituído de homens e em alguns locais mais reservados do clube acontecem shows de pole dance e outras coisas que eu realmente não tive o menor interesse em saber. Por sorte eu fui designada a ficar nos arredores do bar comum, a parte em que não acontece nada em especial. Apenas música e bebidas. — Essa noite está uma loucura! — Manuela comentou, quando chegamos juntas ao bar para pegar os pedidos dos clientes — Não consegui ir ao banheiro desde que chegamos aqui.— Sim, está bastante movimentado hoje — Concordei.Rapidamente o barman atendeu aos pedidos e nos afastamos.O clube estava realmente lotado, principalmen
LiamNo momento em que meus olhos encontraram os dela, reconheci a garota imediatamente. Era Cecília, a ex-funcionária de limpeza que eu havia demitido impulsivamente em um acesso de raiva. Um sentimento desconfortável tomou conta de mim. Evitei seu olhar, lembrando-me de que ela era apenas uma empregada.Pensar que Marta estava preocupada com a garota e na verdade ela já está trabalhando em um clube noturno, provavelmente ganhando mais do que quando estava na minha empresa, me trouxe um sorriso cínico no rosto.Estendi a mão para ajudá-la a se levantar, fazendo o máximo que podia por ela naquele momento. Porém, tão logo ela conseguiu ficar de pé, afastei minha mão rapidamente, sentindo-me incomodado.— Obrigada, senhor — disse ela com uma voz falsamente doce.— Não precisa me agradecer. Apenas vá embora daqui. Você já causou problemas demais para uma noite só — Cortei-a bruscamente.Cecília pareceu surpresa com a minha reação hostil. Seus olhos, que outrora demonstravam tristeza, ago
CecíliaEra final da tarde e eu estava caminhando para o ponto de ônibus com Manuela quando um homem estranho me abordou no meio da rua, segurando meu braço com força e me encarando com um olhar cheio de ira. — Você sabe onde está o Bobby? — Ele perguntou, seu olhar segurando o meu de maneira perigosa.Senti todo o meu corpo trêmulo, o pavor me deixando completamente sem palavras. Eu não consegui emitir nem mesmo um único som.— Responde, garota! — O homem mau encarado gritou dessa vez, chegando a cuspir em meu rosto.— Eu… eu não… — Gaguejei, simplesmente aterrorizada.— Não brinca comigo, garota! — Voltou e me pressionar.— Ela não sabe nada sobre o Bobby, Marcão — Manuela veio em minha defesa, sua voz trêmula, mas ao menos ela estava falando — Ela não tem contato algum com o Bobby!— Não se mete, Manu — O homem gritou para a minha colega — Eu tô falando com ela. O Bobby disse que ela é a gatinha dele..Bem, agora eu estou simplesmente em desespero com essa informação. — Eu não te
LiamFicava cada vez mais aborrecido com a teimosa recusa de Cecília em falar comigo. Ela estava se comportando como uma grande tola, desperdiçando meu precioso tempo. Entretanto, não tinha muita escolha a não ser aguardar. Eu tinha pedido a Marta para me levar na casa da família de Cecília, para buscar informações sobre onde poderia encontrá-la, mas a pessoa que nos atendeu foi o padrasto dela e depois de destratar a minha secretária e eu, acabamos indo embora sem ao menos uma pista sobre o lugar para onde Cecília. Meu pai estipulou um prazo rígido para que eu encontrasse uma noiva, e o tempo estava se esgotando rapidamente. Não havia um plano B. Eu sabia um pouco de sua história e seu passado, tanto porque ela já havia trabalhado em minha empresa quanto porque minha secretária a conhecia. Cecília era a única garota que eu conhecia e que estava em uma situação difícil o suficiente para considerar a proposta que eu estava prestes a fazer. Quando pedi meu terceiro drinque, aproveite
CecíliaNão tenho a menor idéia de por quanto tempo eu permaneci em silêncio, enquanto encarava Liam Ricci com uma mistura de choque e descrença.— Você… o quê!? — Minha pergunta saiu alto demais.— Eu entendo que isso é inesperado, Cecília — ele começou, sua voz cheia da mais completa arrogância. — Mas eu preciso me casar o quanto antes. E cheguei a conclusão de que você é a pessoa ideal para os meus planos.Eu o observei atentamente, tentando entender a lógica por trás desse pedido insano. Liam Ricci, o notório mulherengo, estava me pedindo em casamento? A ideia de que aquele homem egocêntri