Cecília
Consegui um trabalho como garçonete em uma boate na zona sul da cidade. Estou odiando, mas foi a única coisa que apareceu. Consegui através da indicação de uma das garotas que também moram na pensão. Na verdade, não é bem uma boate, percebi no meu primeiro dia de trabalho. Não sei como denominar o local, mas eles o chamam de Clube Sussex.
A maioria do público é constituído de homens e em alguns locais mais reservados do clube acontecem shows de pole dance e outras coisas que eu realmente não tive o menor interesse em saber. Por sorte eu fui designada a ficar nos arredores do bar comum, a parte em que não acontece nada em especial. Apenas música e bebidas.
— Essa noite está uma loucura! — Manuela comentou, quando chegamos juntas ao bar para pegar os pedidos dos clientes — Não consegui ir ao banheiro desde que chegamos aqui.
— Sim, está bastante movimentado hoje — Concordei.
Rapidamente o barman atendeu aos pedidos e nos afastamos.
O clube estava realmente lotado, principalmente de homens, mas eu não me dei ao trabalho de prestar atenção em nenhum deles. Afinal, eram todos iguais: homens abastados e arrogantes, que nem mesmo agradecem quando as garçonetes os atendiam. Eles me lembravam do Liam, o que me fez suspirar de frustração.
Já tinha percebido que aquele trabalho não era apenas cansativo, mas também extremamente desagradável. À medida que bebiam, os homens se tornavam ainda mais inconvenientes ao longo da noite. Cheguei até mesmo a receber cantadas de algumas mulheres e de casais. No entanto, todas as vezes que pensei em reagir de alguma forma, lembrei-me de que aquela era minha única fonte de renda naquele momento e engoli qualquer provocação.
Eram mais de duas da manhã quando fui atender uma das mesas no salão principal e percebi que um dos clientes era ninguém menos que Liam Ricci, meu ex-chefe idiota. Era muita coisa para suportar em uma única noite. Nesse momento, odiei-o três vezes mais, culpando-o por eu estar naquela situação.
A culpa é minha, então eu posso colocar em quem eu quiser, pensei com amargura.
— Manuela, Manuela — Chamei apressada, desistindo de ir atender a mesa onde Liam está — Você pode atender aquela mesa? Por favor!
Não que ele fosse lembrar de mim, mas eu realmente não tenho estômago para ficar frente a frente com o meu ex-chefe.
— Desculpe, Cecília, mas o setor daquela mesa é de responsabilidade sua. Eu não posso assumir a sua parte do trabalho. — Manuela respondeu, com uma expressão de compreensão misturada com pena.
Eu sabia que Manuela estava certa, afinal, cada uma de nós tinha as nossas mesas designadas, e trocar de lugar poderia causar confusão e atrapalhar o serviço. Suspirei resignada, sabendo que teria que encarar Liam de qualquer maneira.
— Tudo bem, eu entendo. Vou lá então. — Respondi, tentando controlar o nervosismo que começava a se espalhar pelo meu corpo.
Respirei fundo e me dirigi até a mesa onde Liam estava acompanhado por um grupo de amigos. Eles estavam rindo alto e fazendo brindes, claramente aproveitando a noite. Quando me aproximei, percebi que Liam não havia me reconhecido. Afinal, eu não passava de uma ex-funcionária qualquer.
— Boa noite, senhores. O que posso trazer para vocês? — Perguntei com um sorriso falso no rosto, tentando esconder a mistura de sentimentos que me consumia.
Os amigos de Liam pediram suas bebidas e fizeram alguns pedidos de aperitivos, enquanto ele parecia distraído em meio às conversas animadas. Eu estava prestes a me retirar e ir buscar os pedidos quando, sem querer, um dos amigos de Liam esbarrou em mim, fazendo com que eu derramasse uma bebida em Liam.
— Droga! Olha o que você fez! — Ele exclamou, levantando-se bruscamente e limpando o líquido que escorria pela sua camisa.
Eu me senti envergonhada e culpada, mas antes que eu pudesse pedir desculpas, Liam me lançou um olhar furioso e começou a reclamar de forma grosseira.
— Você é completamente incompetente, não é? Não consegue servir uma simples bebida sem fazer um estrago! — Ele vociferou, atraindo a atenção de outros clientes ao redor.
— Calma, Liam — Um dos homens que estava na mesa falou para ele — Ela não teve intenção.
Meu rosto queimava de vergonha, mas eu sabia que precisava manter a compostura. Engoli o orgulho ferido e respondi com a voz firme.
— Lamento muito pelo ocorrido, senhor. Vou providenciar uma toalha para que possa se limpar.
Eu me afastei o mais rápido possível, sentindo alguns olhares sobre mim e fui até o balcão.
Enquanto pegava uma toalha para Liam, eu tentava controlar a frustração e a raiva que surgiam dentro de mim. Eu era uma pessoa digna de respeito, mesmo que meu trabalho fosse humilde. Mas aquele homem parecia não enxergar isso. Voltei rapidamente para a mesa, determinada a resolver a situação e seguir em frente.
— Aqui está a toalha, senhor. Lamento novamente pelo incidente.
Liam pegou a toalha e limpou a camisa com impaciência.
— Apenas vá embora e traga nossos pedidos. E tome mais cuidado dessa vez.
Fiz menção de ir novamente ao bar buscar os pedidos, porém, um dos homens que estavam na mesa e que parecia estar bastante embriagado, me abraçou de surpresa, me deixando perplexa com a sua atitude inesperada.
— Ei, garota bonita, não se preocupe com ele. Ele só está de mau humor porque teve que dividir a atenção.
Tentei me soltar do abraço inconveniente, mas ele estava me segurando com bastante força.
— Por favor, senhor, me solte. Estou apenas fazendo o meu trabalho.
— Ah, não seja assim tão séria. Eu só quero me divertir um pouco — O homem insistiu, falando bem próximo ao meu ouvido e me deixando ainda mais enojada com a situação.
— Me solta! — Falei alto o suficiente para ser ouvida por várias pessoas.
— Pare com isso, cara! Deixe a garota em paz! — Um dos homens disse, eu não saberia dizer qual deles.
— Ah, qual é, não seja tão chata! Eu sei que você quer se divertir também.
Liam se aproximou de nós e tentou afastar o amigo, mas acredito que o estado de embriaguez e a falta de equilíbrio do homem fizeram com que ele se desequilibrasse, mas quem acabou caindo fui eu. O impacto foi doloroso.
— Olha só o que você fez, Caíque! — Liam reclamou alto, me encarando com irritação.
Eu senti uma dor aguda e me vi tonta por alguns instantes. Enquanto tentava recuperar o equilíbrio, Liam se aproximou de mim, parecendo preocupado, e estendeu a mão para me ajudar a levantar.
Nesse momento que nossos olhares se encontraram.
LiamNo momento em que meus olhos encontraram os dela, reconheci a garota imediatamente. Era Cecília, a ex-funcionária de limpeza que eu havia demitido impulsivamente em um acesso de raiva. Um sentimento desconfortável tomou conta de mim. Evitei seu olhar, lembrando-me de que ela era apenas uma empregada.Pensar que Marta estava preocupada com a garota e na verdade ela já está trabalhando em um clube noturno, provavelmente ganhando mais do que quando estava na minha empresa, me trouxe um sorriso cínico no rosto.Estendi a mão para ajudá-la a se levantar, fazendo o máximo que podia por ela naquele momento. Porém, tão logo ela conseguiu ficar de pé, afastei minha mão rapidamente, sentindo-me incomodado.— Obrigada, senhor — disse ela com uma voz falsamente doce.— Não precisa me agradecer. Apenas vá embora daqui. Você já causou problemas demais para uma noite só — Cortei-a bruscamente.Cecília pareceu surpresa com a minha reação hostil. Seus olhos, que outrora demonstravam tristeza, ago
CecíliaEra final da tarde e eu estava caminhando para o ponto de ônibus com Manuela quando um homem estranho me abordou no meio da rua, segurando meu braço com força e me encarando com um olhar cheio de ira. — Você sabe onde está o Bobby? — Ele perguntou, seu olhar segurando o meu de maneira perigosa.Senti todo o meu corpo trêmulo, o pavor me deixando completamente sem palavras. Eu não consegui emitir nem mesmo um único som.— Responde, garota! — O homem mau encarado gritou dessa vez, chegando a cuspir em meu rosto.— Eu… eu não… — Gaguejei, simplesmente aterrorizada.— Não brinca comigo, garota! — Voltou e me pressionar.— Ela não sabe nada sobre o Bobby, Marcão — Manuela veio em minha defesa, sua voz trêmula, mas ao menos ela estava falando — Ela não tem contato algum com o Bobby!— Não se mete, Manu — O homem gritou para a minha colega — Eu tô falando com ela. O Bobby disse que ela é a gatinha dele..Bem, agora eu estou simplesmente em desespero com essa informação. — Eu não te
LiamFicava cada vez mais aborrecido com a teimosa recusa de Cecília em falar comigo. Ela estava se comportando como uma grande tola, desperdiçando meu precioso tempo. Entretanto, não tinha muita escolha a não ser aguardar. Eu tinha pedido a Marta para me levar na casa da família de Cecília, para buscar informações sobre onde poderia encontrá-la, mas a pessoa que nos atendeu foi o padrasto dela e depois de destratar a minha secretária e eu, acabamos indo embora sem ao menos uma pista sobre o lugar para onde Cecília. Meu pai estipulou um prazo rígido para que eu encontrasse uma noiva, e o tempo estava se esgotando rapidamente. Não havia um plano B. Eu sabia um pouco de sua história e seu passado, tanto porque ela já havia trabalhado em minha empresa quanto porque minha secretária a conhecia. Cecília era a única garota que eu conhecia e que estava em uma situação difícil o suficiente para considerar a proposta que eu estava prestes a fazer. Quando pedi meu terceiro drinque, aproveite
CecíliaNão tenho a menor idéia de por quanto tempo eu permaneci em silêncio, enquanto encarava Liam Ricci com uma mistura de choque e descrença.— Você… o quê!? — Minha pergunta saiu alto demais.— Eu entendo que isso é inesperado, Cecília — ele começou, sua voz cheia da mais completa arrogância. — Mas eu preciso me casar o quanto antes. E cheguei a conclusão de que você é a pessoa ideal para os meus planos.Eu o observei atentamente, tentando entender a lógica por trás desse pedido insano. Liam Ricci, o notório mulherengo, estava me pedindo em casamento? A ideia de que aquele homem egocêntri
LiamSegurar a mão de Cecília era algo que eu não havia planejado. Não naquele momento. O aperto de mãos ao selar nosso acordo era uma formalidade, mas acabei prolongando aquele contato mais do que o necessário. E, de repente, aquilo se tornou incômodo.Quando percebi que segurava sua mão por tempo demais, a soltei quase que imediatamente, como se o simples toque entre nós tivesse o poder de queimar. Ela também pareceu desconfortável com a situação, e isso me incomodou além do normal.Por outro lado, eu estava satisfeito por Cecília ter aceitado minha proposta maluca de um casamento por conveniência. Era um alívio saber que a solução para meus problemas estava bem diante de mim, mesmo que
CecíliaA sensação de acordar naquela manhã em um quarto incrivelmente bonito e uma cama absurdamente macia me deixou desorientada. Nunca na minha vida eu tinha dormido em uma cama tão confortável. Lentamente, as lembranças da noite anterior começaram a retornar, como flashes de uma história maluca que eu havia vivido. A proposta surpreendente de casamento de Liam, ainda ecoava na minha mente. E as notícias alarmantes sobre a pensão e Marcão, que me levaram a aceitar a ideia de ir para o apartamento de Liam, também ressurgiram.Tudo isso me deixou um pouco chocada, e levei alguns minutos para processar tudo o que estava acontecendo. Era como se minha vida tivesse sido virada de cabeça para baixo em uma única noite, e eu estava apenas começando a compreender a extensão das mudanças que estavam por vir.Decidi levantar-me, mas ao fazê-lo, percebi que só estava usando um roupão atoalhado que encontrei nos armários do luxuoso banheiro da suíte em que foi instalada na noite anterior. A ún
LiamFui ao quarto de hóspedes do meu apartamento com um misto de aborrecimento e determinação. Não era uma visita que eu estava ansioso para fazer, mas sabia que era necessária. Precisava deixar tudo claro com aquela garota. Não queria ter problemas futuros ou enfrentar expectativas as quais eu jamais poderia realizar.— Eu vou providenciar os papéis do nosso casamento no civil o mais breve possível — expliquei com enfado, enfatizando o caráter estritamente formal da situação. — Casaremos, e você irá morar aqui no apartamento. É apenas isso.— Você falou algo sobre criar uma imagem de casal para convencer as pessoas… — Sim, temos que fazer com que pareça real aos olhos de todos, especialmente da minha família. Precisamos sair juntos, comparecer a eventos sociais e agir como um casal normal. Mas lembre-se, Cecília, tudo isso é apenas fachada. Não quero qualquer engano ou mal-entendido a respeito disso. — Deixei claro com firmeza.— Você já disse isso. Não precisa repetir o tempo todo
LiamEstava em meu escritório quando recebi a visita do meu pai, que parecia estar soltando fumaça pelas narinas, de tão irritado ele parecia naquele momento. Como eu já havia deduzido antes, o dia não parecia promissor.— Liam, que história absurda é essa que acabo de saber?Eu encarei o meu genitor sem ter a mínima ideia sobre o que ele estava falando e fiz um gesto para indicar que ele deveria sentar-se. Claramente não tinha como conversar com ele nas atuais condições.— Sente-se, por favor — Pedi — E me explique sobre qual assunto o senhor está falando.— Não me venha com enrolação, garoto! — Ele me repreendeu como se eu tivesse quinze anos, e não os trinta que acabo de completar — Eu não vou aceitar que se case com uma garota de tão baixo nível como está pretendendo!Certamente Caíque já havia informado ao meu pai sobre a presença de Cecília em meu apartamento, algo que eu não desejava que acontecesse ainda. O meu pai continuou de pé, seu rosto vermelho e me senti até mesmo um po