— Assim não é muito educado, não acha? — Hesitei, achando que seria falta de respeito.— Não se preocupe, aqui em casa os homens são todos viciados em trabalho. Nunca têm hora certa para voltar. Se eu fosse esperar por eles para cada refeição, já teria morrido de fome há tempos. — Respondeu a Sra. Auth, com bom humor, tentando me tranquilizar.Acabei rindo da leveza dela e segui para a sala de jantar. Os pratos, como esperado, eram obra do Lotus. Uma única mordida foi suficiente para eu reconhecer o toque do chef.— Se gostou, coma bastante. Dá para ver que anda trabalhando demais, você está até mais magra. — Comentou a Sra. Auth com um sorriso gentil.— Não é isso, senhora. Na verdade, eu sempre fui de comer bem. — Respondi, sentindo-me um pouco sem jeito.— Que ótimo. Quem tem apetite tem sorte. — Disse ela, com uma risada calorosa.Enquanto comíamos, conversamos sobre assuntos triviais. A atmosfera era agradável, mas, mesmo assim, eu não conseguia evitar ficar atenta aos sons ao red
— Não tem problema. A Sra. Auth comentou que você anda muito ocupado com o trabalho, que às vezes chega a virar noites. — Falei com um sorriso, tentando parecer tranquila, mas minha voz saiu levemente trêmula enquanto tentava confortá-lo.— Sim, ultimamente estou com uma tarefa especial, mas já está quase terminando.— Que bom. Mas, por favor, não se esqueça de cuidar da saúde, mesmo na correria.— Obrigado pela preocupação.Embora aquela estrada fosse uma via particular e os dois carros parados no meio não atrapalhassem ninguém, o cenário era estranho. Pleno meio-dia, no meio da serra, cercados por matas e silêncio, nós dois continuávamos ali, parados no meio da estrada. A situação começava a ficar um tanto desconfortável.Após um breve momento de silêncio, levantei a mão num gesto leve e falei:— Bom… você deve estar com fome depois de tanto trabalho. É melhor voltar logo para casa e comer alguma coisa. Eu também preciso voltar para o escritório.— Tudo bem. Obrigado pelo esforço.—
Eu sabia que, assim que Carlos saísse da detenção, ele viria atrás de mim para acertar as contas, talvez até com vingança em dobro. Já estava preparada para enfrentá-lo.— Você é reincidente em traição. Como pode dizer que eu te incriminei? Além disso, quem te denunciou foi sua mulher e seu filho. O que eu tenho a ver com isso?— Se você não tivesse contado para a Isabela, ela nunca teria descoberto! — Gritou Carlos.— Sr. Carlos, agora o senhor está sendo injusto. Afinal, ela é minha madrasta. Se dedicou tanto para me criar e educar. Ser grata é uma virtude, não é? O senhor deveria me elogiar por isso. — Respondi, com uma ironia ácida, sentindo uma satisfação inesperada ao provocá-lo.Carlos ficou ainda mais furioso:— Sua língua é afiada como uma navalha! Você é uma víbora, cheia de veneno! Se eu soubesse que seria assim, teria estrangulado você no dia em que sua mãe te deu à luz!Que tipo de pai diz algo assim? Aquelas poucas noites na detenção foram uma punição leve demais para ele
Eu simplesmente não conseguia entender, mas, aos poucos, comecei a perceber que a aproximação da família Auth parecia ter sido meticulosamente planejada.Desde a aparição de Jean no meu casamento, passando pelo convite da Sra. Auth para eu ir até a casa dela tirar medidas, até o momento em que Jean gastou trezentos milhões para comprar o Bracelete de Jade por mim. Nada disso parecia ser apenas fruto da bondade e generosidade deles. Tudo parecia calculado.Mas por quê? Por que fariam tudo isso por mim? Eu, uma herdeira rejeitada, sem relevância, abandonada pelo marido logo após o casamento. Mesmo que eu tivesse certa beleza e talento como estilista, isso não seria motivo suficiente para atrair a atenção e o esforço de uma família tão poderosa como a deles, muito menos para justificar essa importância absurda que pareciam dar a mim.Minha mente ficou presa em um turbilhão de dúvidas. Quanto mais eu pensava, mais tinha a sensação de que algo estava fora do lugar.Enquanto isso, Carlos seg
“Será possível que alguém da família Auth também tinha sangue raro, como o meu, e esteja tentando me manter por perto como um “banco de sangue” permanente?” Desde pequena, por causa do ambiente hostil em que cresci, aprendi a enxergar a verdadeira face das pessoas e a desconfiar das intenções alheias.Se até mesmo os meus próprios parentes foram tão cruéis e calculistas, por que alguém que não tem nenhum laço de sangue comigo seria tão bom e generoso? E eu, ingênua, achava que era apenas sorte, que tinha encontrado um “anjo protetor”.Lembrei-me do almoço de alguns dias atrás, no Condomínio Florensa, quando a Sra. Auth soltou aqueles comentários enigmáticos e cheios de segundas intenções. Isso só reforçou minha convicção de que a aproximação da família Auth não era nada inocente.Além disso, não foi o próprio Davi que, certa vez, disse que a família Auth era “um mar profundo” e que eu não tinha chance contra Jean? Será que ele sabia de algo que eu ainda não entendia completamente?Quan
Mas Jean recusou:— Não precisa ter pressa. Se você não pode amanhã, marcamos em outro momento.— Mas acho que não vou ter tempo nos próximos dias... Se minha irmã falecer, vou ter que lidar com muitas coisas por um bom tempo. Para não atrasar o seu lado, é melhor que minha assistente vá até você para resolver isso.Falei com toda a educação e sinceridade possíveis, acreditando que isso não o incomodaria. Mas Jean não era ingênuo. Ele percebeu algo estranho nas entrelinhas e foi direto ao ponto:— Kiara, por que você está tão formal e distante de repente? Agora usa formalidades, evita me encontrar... Aconteceu algo? Eu ou minha família fizemos algo que te desagradou?Suas palavras diretas me deixaram sem reação. Minha língua parecia travada, incapaz de formar uma resposta convincente.Jean, no entanto, manteve a calma, falando com paciência:— Se fizemos algo errado, você pode me dizer. Não tem problema.— Não, não... De jeito nenhum. Pelo contrário, vocês foram bons demais comigo, e é
Embora isso estivesse dentro das minhas expectativas e fosse exatamente o resultado que eu queria, ainda assim meu coração apertava. A imagem de Jean flutuava na minha mente. Apesar de termos nos conhecido há pouco tempo, cada expressão, cada sorriso e cada movimento elegante dele permaneciam claros como o dia na minha memória.Passei um bom tempo imersa nessa melancolia, mas, ao perceber que já era tarde, sacudi a tristeza e comecei a me preparar. Era hora de ir ao hospital. O confronto com a família Mendes prometia ser mais uma batalha dura, e eu não tinha nem forças nem tempo para me perder em devaneios românticos. Restava deixar que o tempo apagasse essas lembranças aos poucos.Quando cheguei ao hospital, vi que Carlos e Isabela já tinham sido liberados. Não era difícil imaginar que isso era obra de Davi.A situação de Clara, como haviam dito, era realmente crítica. Ela estava na UTI, cercada por uma infinidade de aparelhos. Tubos a envolviam por todos os lados, e ela usava uma más
Davi provavelmente já sabia há muito tempo quem Clara realmente era. Mas, como já havia feito sua escolha errada, preferia insistir nela a admitir o erro e perder a compostura. Agora, com Clara admitindo tudo abertamente, sem sequer se dar ao trabalho de fingir, era como se ela o humilhasse na frente de todos. Como ele poderia não se sentir constrangido? Como poderia manter a aparência?Clara, à beira da morte e ciente de que seus dias estavam contados, parecia ter perdido qualquer vergonha. Ela estendeu a mão magra e, com uma voz arrogante, ordenou:— Passe o bracelete. Você já assinou os papéis para recuperar as ações. Vai querer voltar atrás agora?Eu segurei o bracelete com firmeza, sem dizer nada, apenas olhando para ela com um olhar frio e impassível.Vendo que eu não respondia, Clara virou a cabeça para Davi e, com a voz fraca e cheia de afetação, pediu:— Davi… pega o bracelete para mim. Me ajuda a colocar.Ela ergueu com dificuldade a mão que não estava conectada ao soro, este