Na quarta-feira desisti de três aulas para ensinar sobre coesão textual para Jack no refeitório, após ele insistir muito e me trancar no meu próprio dormitório. A sorte que tive foi que, se ajudasse no reforço dele e de outros alunos em Literatura, minhas faltas seriam descontadas. E qual o melhor jeito disso acontecer não sendo ajudando o garoto que é motivo das minhas faltas? Acabei aceitando já que não tinha muito o que perder. No entanto, Jack, pelo contrário, tinha bem mais o que perder.A redação que Jack está se preparando é sobre o livro The Handmaid's Tale, que será na quinta-feira, e ele quase não sabe escrever algo decente. Quer dizer… Jack não sabe escrever quase nada decente. Provavelmente deveria ter faltado quase todas as aulas do primário. Ele consegue escrever mais erros ortográficos em um texto com a mesma frequência que fala porcarias. — Bem… a coesão, para ser mais fácil de você entender, são frases e palavras que ligam o texto para torná-lo coerente. Quase semelha
O calor começa a se espalhar por todo o meu corpo junto com arrepios.Com certeza poderia beber qualquer coisa da geladeira da cantina. Passo a mão na testa e sinto gostas de suor espalhar-se pelas costas da mão. Eu realmente estou suando igual um porco. Nenhuma novidade.— Oh, desculpa a demora — ouço a senhorinha dizer e me dirijo para ela.— Tudo bem — tento ser educado, mas ainda com os olhos nas mesas e querendo entender o que merda Alice Kayller está dizendo para Jack e ele está rindo. Que merda essa garota faz alí na verdade?— Está aqui sua bebida, irá querer só uma mesmo? Parece que vocês têm mais companhia agora.— Sim… só... uma e… — volto a olhar para eles e depois para a senhorinha —, obrigado — respondo ansioso e pego a garrafa do balcão.— De
A quadra não tem cobertura, até porque não tem sol para isso. Heather está congelando e se esfregando em mim como se fosse uma cachorra sardenta. Romy tinha nos obrigado a correr dez vezes em volta da quadra e fazer no mínimo cinco flexões. Hoje ela está empolgada, mesmo com o inverno chegando. Na verdade, o inverno nunca foi um real problema para Romy nos escravizar.— Eltery está olhando de novo para a gente — Heather comenta se jogando no banco da arquibancada. — Eu realmente não sei o que esse imigrante tá olhando.— Heather! Isso é xenofobia.— Hoje em dia tudo é xenofobia. Se ficassem no país deles não ficariam ofendidos — ela cruza os braços e começa a encarar Eltery, que percebe e volta a correr. — Agora parou de olhar — diz e puxa a garrafa de água da lateral da bolsa.—
Murmúrios começam do lado de fora da enfermaria. Heather fica em alerta, até mesmo levanta o rosto e se ajeita na cadeira. Eu também tento fazer o mesmo, mas quando mexo uma perna, sinto uma aflitante cãibra subir desde de a ponto dos meus dedos até o joelho. Puxo a perna um pouco para o lado e fico mexendo os dedos do pé dentro do tênis, sentindo a dor amenizar aos poucos. É um ótimo momento para ter cãibra. É um ótimo momento para muitas coisas.A porta ao lado de Heather, é empurrada com tanta força que até mesmo a enfermeira se assusta. Romy, Eltery, Dra. Else e mais um garoto entram na sala desesperados. Eltery está pressionando o nariz e um pouco tonto, sangue escorre pela a mão que está pressionando, e gotas vermelhas atingem o chão da enfermaria. A primeira pess
Não estou mais esperando a porta da sala de exames ser aberta, agora estou esperando e torcendo, para que uma certa porta nunca se abra. E se abrir, que a pessoa além dela tenha tido um infarto.Minha mãe sempre dizia que desejar o mal para pessoas que vão te foder era melhor do que desejar o bem. Jesus discordaria disso com certeza e, ainda, citaria aquela frase sadomasoquista: se esbofetearem seu rosto, ofereça o outro lado. Quem iria oferecer o outro lado da face para ser esbofeteado? Sadomasoquistas? Sim.“Quando um cristão oferecer um lado da face para você esbofetear, esbofetei é com bastante força,” ela dizia com um cigarro entre os dedos e olhando para a rua da nossa casa em Prince Albert.Os cabelos dela eram cacheados e caíam pela jaqueta de couro preto. Ela não usava mais aliança e nem vestidos, a maquiagem se tornou escura. Antes, sempre parecer
Depois de deixarmos a diretoria, descemos a quantidade desesperadora de degraus. A diretoria fica no oitavo andar, para chegarmos a ela, usamos o elevador de deficientes. Mas para irmos embora, vamos de escadas.Às vezes o internato parece ter mais escadas e salas do que alunos. E é só nas aulas ou intervalos que encontro uma boa concentração de pessoas, no entanto, a maioria do tempo só cruzo com uma ou duas pessoas no corredor.Todo o mês chegam ao menos cinco ou dez alunos e, mesmo assim, ainda há dormitórios vazios que não recebem alguém já há tempos. Eu e Hector costumávamos transar em um desses dormitórios vagos, quando não podíamos fazer isso no meu dormitório.Quando escolhemos o cômodo ideal para ficarmos, bem longe de câmeras ou fofoqueiros, encontramos ele tão sujo que as teias de aranha se dissolv
No caminho para o banheiro, acabo esbarrando em duas pessoas ao mesmo tempo. Peço desculpas a uma delas, mas a outra não tenho paciência de pedir e só continuo o caminho. Ao entrar no corredor do banheiro, percebo Hector encostado em uma parede. Ele abre um sorriso acenando para uma porta e depois some por onde estava indicando.O que ele está pretendendo?Acelero os passos até atingir o local que ele entrou. O cheiro de mijo com sujeira faz eu mexer o nariz. Entro e bato à porta, deslizando o dedo pela maçaneta.— O que você quer? — me adianto logo. Hector está apoiado em uma das pias ajeitando os cabelos no espelho. Os músculos de suas costas estão marcados na camiseta branca listrada. Ele usa uma calça caqui apertada que combina com o tom dos sapatos. Essa é a roupa que com certeza mais me deixa excitado por ele. Para de pensar com o pau, Angus.
Após deixar Hector, caminho de volta para dentro do teatro. Agora o lugar está bem mais cheio que antes. Feller já deve ter chegado. Observando pela porta do teatro, vou fazendo uma busca por alguma coisa loira demais. Meus olhos vão passando até chegarem no monitor descendo as escadas.— Ei! Por que demorou tanto? — ele salta dois degraus e consegue facilitar para chegar a mim.— Eu acabei tendo um imprevisto no caminho — minto.— Tudo bem, venha logo que a apresentação já vai começar.— Mas eu ainda não me despedi dos meus amigos.— Você faz isso no caminho, agora venha logo — não questiono-o e começo a acompanhá-lo.O espaço na escada é minúsculo, só podendo passar uma pessoa de cada vez. Seguro o corrimão e ultrapasso as fileiras de assentos, tentando ava