Enquanto Leyla vai se preparar, eu fico a esperando em uma praça que ficava na região de classe alta do reino. Acabo por ficar ali algumas horas, até que eu a vejo se aproximando novamente. Dessa vez ela não está mais com seu vestido chique; ela usa algo mais casual e despojado e carrega uma mochila nas costas
— Podemos ir? — questionei. Eu já estava impaciente de tanto esperar.
— Necessito resolver algo antes — ela me responde — Vamos, por aqui.
Eu a sigo até a saída da praça, entrando num território de mansões que ficava próximo ao palácio da família real. De repente, a garota simplesmente entra em uma casa nobre, indo a uns dos saguões da mansão onde ela se aproxima de uma garota que está sentada em uma poltrona lendo um livro, completamente encapuzada, o que me impediu de ver o seu rosto. Quem é ela? E por que dela estar desse jeito?
— Não me digas que tu vais viajar com esse ruivinho de novo? — a menina resmunga.
— É visível que já sabes o que está havendo. Dessarte, deves saber o que dizer aos meus pais, certo?
— Que tu foste selecionada de última hora para uma missão em nome da Congregação de Jade? — a garota com capuz questiona, e Leyla assente com a cabeça.
Dizer aos pais da Leyla que ela está numa missão? Isso não seria uma mentira? Por acaso a Leyla sempre dá essa desculpa quando exploramos juntos?
Queria interrogar minha amiga sobre isso, mas sou interrompido no momento em que ela começou a me puxar para fora do local.
— Espera um minuto — puxo meu braço de volta assim que estávamos fora da mansão.
— Sim? — ela me olha confusa.
— Primeiro, quem era ela? Segundo, você mente para seus pais? Terceiro, que desculpa é essa de Congregação de Jade?!
— O nome da garota é Suyane, da família Yonara. Não me questiones o porquê do capuz, já te adianto arrazoando que não sei. Mas ela é a nova membro da Congregação de Jade, uma organização rica de Allanor que trabalha a favor da família real, da qual também fui obrigada a participar. E sim, dou essa balela fajuta para meus pais, pois, caso falasse a verdade, me impediriam.
— Isso é tão errado... — resmungo.
— Não é como se tu foste santo.
Acabei por preferir não ficar discutindo sobre aquilo, e nem iria cancelar os planos, então ela que lide com as consequências depois.
Assim, seguimos para fora do reino.
***
Mais dias longos e cansativos de viagem ocorreram, tanto que foi um alívio assim que chegamos às costas da terra de Shiymorán. E desta vez não me faço de pão duro e pago um carroceiro para que ele nos levasse até a capital.
Durante todo o trajeto até a capital, Leyla parecia impressionada com as simples plantas e árvores que nos cercavam. Na verdade, ela já estava impressionada desde o minuto que pisamos no país. Com o ar extremamente puro, as casas fundidas às árvores, as vestes com um estilo oriental, a comida diferente... Ela observava tudo.
Bem que eu falei que seria diferente de tudo que ela já havia visto.
No segundo em que chegamos à capital, pago ao carroceiro o que devo e então seguimos caminho. Eu pretendia voltar à casa do yarén, Jack. Afinal, ele é o único que eu conheço aqui.
— Ah, este lugar é tão encantador — suspira Leyla, que parece tranquila e relaxada.
— Realmente – concordo. — Vamos, acho que sei onde podemos ficar.
Se eu me lembro bem, a casa do Jack ficava em uma parte da floresta ao sudeste, mas não é tão longe de uma aldeia. Espero que estejamos indo pelo caminho certo.
Por sorte estávamos no caminho certo, e não demoramos para chegar ao lar do garoto.
— Que lugar és este? — minha amiga pergunta ao chegarmos.
— De um conhecido — eu tento entrar na casa; não obstante, a porta estava trancada. E realmente não parecia ter nenhum movimento lá dentro, então ele deve ter saído.
Bom, já que Jack não está em sua casa, temos duas opções. A primeira seria esperá-lo chegar, e a segunda é dar uma explorada a mais nessa floresta. Todavia, nenhum de nós parece estar interessado na primeira opção...
Bom, nós decidimos o que iremos fazer em seguida: apenas continuaremos andando pelo bosque que transpirava pura magia, a ponto de simples pedras começavam a levitar do nada.
Nós continuamos o caminho, até que avisto entre as árvores o que parece ser o topo de um palácio.
Hmm... talvez devêssemos tentar a sorte.
De alguma forma, consigo convencer Leyla a vir comigo em direção ao palácio, e, assim sendo, subimos um leve morro que tínhamos que atravessar para chegar ao local. E no momento em que o atravessamos, nos deparamos com o Jack, que estava em frente ao palácio conversando com uma bela mulher negra, alta, de cabelos ondulados curtos e escuros, e que usa um quimono da cor verde esmeralda com alguns desenhos de flores.
Nós nos aproximamos dos dois, que percebem nossa presença logo mais.
— Você voltou? — falou o ahito, parecendo surpreso ao me ver novamente.
— É claro, tenho muita coisa para ver nesse lugar — respondo.
— Ah, entendi... — Impressão minha ou senti leve desinteresse em sua voz? — Se é assim, então, esta é Kyoumi — Jack olha para a mulher a seu lado. — Ela é uma feiticeira poderosa e a monarca do país. Kyoumi, este é o Caleb, o humano estrangeiro de quem comentei.
— Então é você... — Ela me olha e fala de uma maneira séria. — O invasor do templo. Jack me contou o acontecimento. — Droga! Acho que estou muito ferrado. — No entanto, ele também disse que você devolveu os pertences e se arrependeu.
— S-Sim, peço perdão. — Baixo minha cabeça — Prometo que isso não irá se repetir.
— Realmente espero isso. Poderia puni-lo, mas... Como Jack parece acreditar em você, de alguma forma... — Ela olha redireciona seu olhar para o garoto por alguns segundos. — Irei te dar uma chance. E direi que é um prazer poder conhecê-lo, explorador. — Seu tom de voz mudou para um calmo e sereno.
— Bom... O prazer é todo meu, majestade. E essa é… — eu pretendia apresentar Leyla, mas a jovem me interrompe:
— Chamo-me Leyla Paxley, e sinto-me ditosa em poder conhecer-vos — ela realmente parece animada.
— Eu a trouxe comigo dessa vez — comentei — Espero que não se importe.
— Fico feliz em saber que fez novos amigos, Jack — a mulher olha para o garoto, parecendo alegre — Pode ir agora.
O jovem híbrido dá um pequeno sorriso a moça, que também devolve um antes de se despedir e entrar em seu templo.
— Bom, podemos ir agora — ele diz ao sair andando.
***
(Continuar...)
/Leyla'sPOV/ Fazíamos o caminho de volta para a residência do garoto ahito, Jack. Devo confessar que me sinto, e estou, afadigada. Quero dizer, já estava um pouco cansada antes, desde que chegamos aqui emShiymorán. Afinal, foi uma viagem deveras fadigosa. Mas eu estivera tão animada de estar em um ambiente diferente, que não me importei. Não que não esteja feliz agora, porém o cansaço está vencendo-me. — Está muito longe? — inquiro. — Não — Jack me responde — Por quê? — Por nada — dou um longo suspiro. Permanecemos andando pelo que acredito que foram três minutos, e era como se minhas pernas fossem quebrar a qualquer instante. Definitivamente, não estou tão acostumada a andar longas distâncias. Com isso, finalmente me pronunciei: — Ah, necessito descansar, nem que seja um pouco — resmunguei — Deveria ter vindo com sapatos mais confortáveis, — aproximo-me de uma
/Leyla’s POV/ Não pude ter o deleite de ficar em Shiymorán por muito mais tempo. Já havia ficado no país por três dias, que, em minha opinião, passaram muito rápido. Tinha que voltar a Allanor, ou meus pais, ou qualquer pessoa, poderia suspeitar de algo. Portanto, cá estava eu de volta a este reino, que me parece mais uma prisão. De qualquer forma, não me apetece deslembrar-me de Shiymorán. Muito pelo contrário, até combinei com o Caleb de que irei retornar logo mais. — Leyla — uma voz amigável e familiar soou atrás de mim. — Por onde estiveste? Virei-me para trás pra ver quem me chamava. Foi quando me deparei com uma garota jovem e alta, que possuía cabelos longos e negros e olhos azuis. Suas vestes eram chiques e elegantes, típico das pessoas ricas de Allanor. Seu nome era Eri, da família Scarpellini. Assim como eu, Eri também pertencia a uma família rica e muito influente neste reino, além do fato de também possuir magia. — Estive a tua pro
Após a resposta seca da garota de capuz, um pequeno silêncio ficou entre nós por alguns segundos, deixando o clima meio desconfortável até que o ruivo o encerrou com um resmungo: — Puff, tudo bem. Vou dar um jeito — ele deu as costas. — Vamos logo. Por alguns minutos não perdemos a embarcação, e o explorador arranjou um modo de a garota Yonara viajar conosco. Afe, francamente, espero que ela não interrompa nossos planos. *** Depois de uma longa e até mesmo cansativa viagem, chegamos às encostas oeste do continente. Era mais ou menos meio-dia e estávamos com muita fome, portanto nos alimentamos em uma das barracas de comida que havia por ali no litoral. Apesar de boa parte dos nomes dos pratos estarem escritos com o dialeto de Shiymorán, também havia muitos com nosso idioma, e foram esses que escolhemos. <
Ela nos lança um olhar sério e um tanto intimidador, até que paira seus olhos em Caleb, fazendo uma leve expressão zangada. — Foi você! — a valquíria diz, ainda o encarando. — Esse garoto mortal invadiu meu palácio, e ainda tentou roubar minha espada — a valquíria expressa grande ira em sua voz. — Esse mortal merece uma punição. Que será… a morte! Rapidamente, a valquíria retira sua espada da bainha empunhando-a e fazendo um movimento rápido e poderoso, enquanto avança para cima do jovem explorador na menção de executar um golpe mortal! — Sarah, espere! — antes que fosse tarde demais, Jack se posiciona a frente do ruivo, ficando entre eles. Por sorte, a guerreira interrompe sua ação a tempo, antes de atingir o yarén, deixando a espada a pequenos centímetros de seu pescoço. — Saia da minha frente, garoto! — ordena a valquíria, porém Jack não move um músculo. — Por que está defendendo esse mero humano? <
/Jack's POV/ Já havia completado um dia desde que Ducan retornou a Shiymorán junto com alguns amigos. Eu não me importei quanto a isso, não sei se ligo mais, mas o problema é que desta vez eles trouxeram uma mestiça com eles, e isso sim me incomodou! Passaram dos limites! Quer dizer… aquela garota tem sangue demoníaco, como alguém conseguiria ficar tranquilo perto dela? O pior é que ela não fazia menção de ir embora tão cedo. Por sorte, a rainha Kyoumi e a primeira no comando do exército de Shiymorán, Sawa, deram a ideia de mostrar os pontos turísticos da capital, além dos costumes básicos dos humanos do país para que erros como “invadir um monastério sagrado” não se repitam. Obviamente Kyoumi e Sawa são pessoas muito ocupadas, então essa função foi passada para alguns de seus empregados. De qualquer forma, pelo menos ficarei um dia inteiro sem sentir aquela aura sombria da Yonara me atormentando. Não que eu tenha algo c
— Talvez isso deva até explicar o porquê de morares sozinho e longe dos teus pais e da própria tribo. Eu até poderia supor… — Ela faz uma expressão pensativa, voltando a falar com um tom sarcástico e debochado logo em seguida: — Julgando pelo tamanho da casa em que vive, deves ser de uma família rica de yarén, e certamente deves ter roubado uma porcentagem deste dinheiro para moldar a casa. Contudo, apenas fugiu para capital, longe da própria família e tribo! De onde ela tirou essas conclusões idiotas? I-Isso não faz menor sentido! E por que ela está falando isso, e desse jeito? Quero dizer, eu realmente posso não ter tentado ser amigável com ela quanto para os outros, mas por quê? Grr! — Eu sugiro a você que não fale de coisas das quais não tem conhecimento — respondo de forma seca. — Quer saber por que eu moro sozinho e não com meus pais? É porque eu não os tenho! E também não possui uma tribo — Olho para o rosto da garota, observando uma expressão de choque e, por incrível que pa
Porém ele não me dá uma resposta e apenas desvia seu olhar novamente.— Talvez eu possa ajudar, não? — Insisto. — Quem são aqueles? Sei que quer me dizer algo. — Está enganado. — Vamos, Jack, não somos amigos? Olha, eu… — Acabo interrompendo minha própria fala ao perceber que ele rosnava. — Grr. — O jovem olha para mim novamente, exibindo aquele mesmo olhar. — Pare de tentar me retratar com suas suposições bobas! Chega desse seu pano de chão idiota, pare de querer se passar por um herói. Desculpe se passei a impressão errada, mas não somos amigos! — Uau, eu achei que ficaria bem com isso, mas doeu mais do que pensei. — Eu apenas tive pena de você e te ajudei, fui amigável com vocês, mas apenas isso. Mas o que recebo em troca? Você só me causou problemas e reclamações até agora! — Ok, acho que ele tem direito de estar assim, posso estar magoado, mas ao menos ele está falando, né? — Eu não consigo lidar com mais mortais intrometidos como você, o que vocês tanto querem? Para alguém que
/Suyane's POV/ Ducan havia ido atrás de Jack fazia algum tempo, mas, até agora, nada de os dois retornarem, então eu saí. Pensei em retomar minha busca pelo yarén, mas, como eu não tinha ideia de para onde eu estava indo, apenas acabei por desistir. Claro que ainda quero me reconciliar com Jack, mas aguardarei até o momento em que ele for encontrado. Assim, decidi focar em outra coisa que também estava intrigando-me. Aquela valquíria, Sarah, me deixara curiosa… No dia em que cheguei aqui, ela me falou que eu não deveria atrapalhá-la, mas o que isso significaria? A que ela estava referindo-se? Eu tenho muitas perguntas a fazer. Por conta dos comentários de Ducan, já tinha uma certa noção de onde era localizado seu palácio, então não tive problema em encontrá-lo. Por seguinte, me aproximo, empurrando aquela grande e pesada porta e entrando em sua morada, dando-me de cara um amplo e espaçoso saguão. Não demoro muito para escutar a voz daquela valquíria: