A transfusão excessiva de sangue me deixou em um estado de sono profundo, do qual demorei muito para acordar. Durante esse tempo, eu sonhava constantemente. Nos sonhos, ouvia vozes ao meu redor, repetindo coisas como: — Carolina, você precisa ter cuidado. Não pode se machucar ou sangrar. Se isso acontecer, ninguém poderá te salvar. — Carolina, como você pôde doar tanto sangue? Quer morrer? — Sua tola, idiota. Quem pediu para você fazer isso? — Carolina, me salva. Estou com frio... As vozes vinham de pessoas diferentes. Reconhecia a de meus pais, a de George, e, principalmente, a de Sebastião. Eu queria responder, mas parecia que minha boca estava selada, incapaz de emitir qualquer som. De repente, a visão no meu sonho se fixou em Sebastião. Ele estava coberto de ferimentos, e o sangue escorria de seu corpo como se fosse água saindo de uma torneira aberta. Fiquei apavorada. Ele também tinha o sangue dourado. Ele não podia sangrar assim! — Sebastião, Sebastião! — Gritei,
Miguel disse que eu estava em coma há três dias e que ele também estava ali há três dias. Então, George certamente também veio. Afinal, ele disse ao telefone que viria imediatamente. — Toma um pouco de água. — Miguel colocou um copo perto da minha boca. Olhei para ele e perguntei: — E o George? Miguel ficou visivelmente desconfortável por um momento antes de responder: — Bebe a água primeiro. Aquelas palavras fizeram algo no meu peito apertar. Minha garganta, já seca e dolorida, parecia arder ainda mais. — Ele não veio, né? — Veio. — Miguel respondeu, sentando-se na beira da minha cama. — Ele veio. — Então, onde ele está agora? — Perguntei, confusa. Se George realmente havia vindo, por que ele não estava aqui comigo? Eu estive inconsciente por três dias. Ele não deveria estar ao meu lado? Será que ele realmente decidiu seguir o que eu disse antes, de que, se ele me machucasse, deveria se afastar de mim? — Ele foi embora. Provavelmente saiu para resolver a questão da
— Carolina! — Sebastião estendeu a mão e segurou meu braço. Olhei para o curativo em sua cabeça antes de encarar Miguel, que havia entrado com ele. — George pode estar em apuros. — Falei, com a voz carregada de preocupação. Miguel franziu o cenho, claramente surpreso e incrédulo: — Como assim? O que aconteceu? Como você sabe que ele está com problemas? Eu não sabia. Era apenas um pressentimento. — Liguei para ele mais cedo. Ele disse que estava ocupado e que me ligaria depois. Mas até agora não retornou. — Expliquei, tentando justificar minha suspeita. — E você não tentou ligar para ele de novo? — Sebastião perguntou, com um tom que misturava preocupação e leve reprovação. George tinha dito que me retornaria, então eu apenas esperei. Não quis insistir, nem liguei de novo. — Eu ligo para ele. — Disse Sebastião, pegando o celular e discando o número de George. A ligação demorou a ser atendida. Quando finalmente foi, ouvi a voz de George do outro lado, clara e inconfun
Fiquei paralisada olhando para aquela única palavra na tela, incapaz de reagir. Involuntariamente, meus olhos voltaram às mensagens que eu tinha enviado para ele. — Porra, o que ele está querendo fazer? — Sebastião resmungou e imediatamente tentou ligar para George novamente. Mas, dessa vez, o telefone já estava desligado. Meus olhos começaram a ficar turvos enquanto olhava para a tela do celular. Virei-me rapidamente e dei alguns passos até a janela, encarando o céu que já começava a escurecer. Ouvi passos atrás de mim e, antes que alguém dissesse algo, falei: — Saiam. Deixem-me sozinha por um tempo. Sebastião e Miguel perceberam o quanto eu estava machucada e respeitaram meu pedido. Eles saíram sem insistir, fechando a porta atrás de si. Foi naquele instante que as lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto, como se tivessem esperado o momento em que eu estivesse sozinha para finalmente cair. Eu não sabia se estava chorando porque George aceitou tão facilmente o térmi
Que notícia? Fiquei paralisada por um instante. Desde que acordei, ninguém havia mencionado nada disso. Abri a porta de repente. Sebastião e Miguel, que estavam do lado de fora, se viraram para me encarar ao mesmo tempo. — Que notícia? — Perguntei diretamente, sem rodeios. Os dois trocaram um olhar, claramente tentando decidir se deveriam ou não me contar. Antes que um deles pudesse abrir a boca, cortei o silêncio: — Eu ouvi tudo. Miguel suspirou, com o olhar mais sério, e começou a mexer no celular. Sebastião tentou impedi-lo, mas eu o intimidei com um único olhar, deixando claro que não aceitaria ser deixada de fora disso. — É melhor que ela saiba. Assim, pode esclarecer as coisas com George. — Disse Miguel enquanto abria algo no celular e, em seguida, estendeu o aparelho para mim. Era uma captura de tela de uma página de notícias. O título dizia: [Namorados de sangue dourado: jovem doa 800 ml de sangue raro para salvar o amado. Agora, o sangue dela corre nas veias
— Então, você pode voltar, mas não vai conseguir ir sozinho assim. — Disse Sebastião, fazendo uma pausa antes de olhar para Miguel. — Irmão, volte com a Carol.Miguel acenou com a cabeça. — Claro.Queria recusar, mas sabia que não adiantaria. Com a situação em que me encontrava, eles certamente não me deixariam ir sozinha.— E você? — Perguntei, olhando para o curativo na cabeça de Sebastião.— Eu vou esperar o Pedro. Quando ele sair, volto com ele. — Respondeu Sebastião, o que parecia ser o certo a fazer.Pedro sofria bullying em um país estrangeiro. Se saísse e não tivesse ninguém por perto, ele certamente se sentiria mal. Mas, pensando bem, com Sebastião assim, talvez Pedro ficasse ainda mais incomodado.— Se o Pedro te ver assim, ele vai se sentir culpado. — Eu avisei Sebastião.— Não se preocupe, vou inventar outro motivo. Não vou mencionar o acidente. — Insistiu Sebastião.Vendo sua determinação, sabia que não adiantava insistir mais. Apenas perguntei:— O Pedro ainda vai consegu
Eu fiquei olhando para Miguel, e a reação dele me deu a resposta de que eu precisava.— Carol. — Miguel me chamou suavemente. — Não pense demais.Pensar demais?Na verdade, eu não estava pensando muito.Mas, agora que ele falou isso, não pude evitar começar a pensar mais.— Os tios e tias também sabem, não é? — Eu perguntei, embora fosse uma pergunta, também era uma afirmação.Eles me criaram durante tantos anos, como poderiam não saber o meu tipo sanguíneo?— Carol, quando meus pais te trouxeram para a família Martins para te criar, era natural que eles tivessem que cuidar de você. Não tem nada de errado em saber disso. — Miguel explicou com muito esforço.Sim, eles me conhecem, sabem que eu sou de sangue dourado, assim como o Sebastião, e isso não tem nada de errado.Mas eles nunca haviam mencionado isso, e isso parecia errado.— Carol, por que você não fala nada? Não pense demais, meus pais te tratam como filha, eles não teriam outros sentimentos. — Miguel continuava tentando explic
Este quarto eu só olhei duas vezes desde que acordei: uma vez procurando pelo George, e agora procurando por algo.Miguel se aproximou de mim e se agachou levemente.— Carol, como você está se sentindo? Está sentindo algum desconforto? — Ele perguntou.Eu estava prestes a negar com a cabeça quando ouvi uma batida na porta, seguida pela entrada do médico e de Sebastião.— Peça para o médico fazer um exame, vai que você sinta algo estranho, seria difícil tratar no avião. — Explicou Sebastião, olhando para Miguel enquanto falava.Eu percebi claramente que ele franziu a testa por um momento.Quando o médico entrou, Miguel se levantou e deu espaço para ele, se afastando naturalmente para o lado.O médico fez os exames, ouviu meu coração, mediu minha pressão arterial e fez uma série de verificações, antes de dizer:— Sua recuperação está boa, tudo está normal.— Obrigada, doutor. — Sebastião expressou sua gratidão.Miguel então falou:— Eu vou acompanhar o doutor e também vou aproveitar para