CAPITULO 3

Já tinha chegado em casa alguns minutos atrás. Antes de entrar, parei para comprar fraldas, lenços umedecidos para bebês e uma barra de chocolate porque, bem, uma garota precisa se dar alguns pequenos prazeres. Mas é claro, nem tudo podia ser tão fácil. Assim que entrei na loja, me deparei com alguns dos meus antigos colegas do ensino médio. Só de vê-los foi suficiente para que aquele nó familiar de raiva se formasse no meu peito. Quantas vezes eles me fizeram sentir como se eu fosse menos que eles? As provocações sempre estavam lá, esperando para me lembrar do que eu já sabia: que nunca fui parte do grupo deles, que nunca me viram como mais do que um alvo fácil. Mas o que eu ia dizer a eles agora? Nada. Não valia a pena gastar palavras com aquelas cabeças ocas.

Tudo parecia estar indo bem até que cheguei ao caixa. Lá estavam elas: Molly e Vanessa, duas meninas da minha antiga turma. Não sei o que essas pessoas têm, mas parece que estão sempre procurando formas de me fazer sentir desconfortável.

—Ah, Vanessa, olha quem temos aqui —disse Molly com aquela voz fingida e cheia de sarcasmo, juntando as mãos em atitude de oração enquanto levantava o capuz da sua jaqueta, como se estivesse imitando uma virgem—. Nada mais, nada menos que *Santa Ângela*.

—Molly, mais respeito —respondeu Vanessa, igualmente irônica, fazendo uma reverência exagerada—. Lembre-se que ela é nossa *virgencinha*. Respeite.

Senti minha mandíbula se tensionar. Eu não queria dar a elas a satisfação de me verem afetada, mas era impossível ignorá-las quando elas se empenhavam tanto em me provocar. O que custava deixar-me em paz? Ser mãe não é um crime, mas para elas parecia ser o pior pecado.

—Será que vocês duas não têm nada melhor para fazer? —eu disse, incapaz de me conter por mais tempo—. Par de idiotas.

Molly sorriu de lado, claramente aproveitando minha reação.

—Hmm, talvez, mas é muito mais divertido te incomodar, né, Vanessa?

Vanessa assentiu com aquela falsa inocência que só conseguia me enfurecer ainda mais.

—Óbvio. Como desperdiçar essa oportunidade?

Paguei o mais rápido que pude e saí da loja quase correndo. Não me envergonho de ser mãe, de jeito nenhum. Desde que Emily chegou à minha vida, sinto que tudo ganhou sentido. Ela é minha razão para seguir em frente, minha pequena luz nos dias cinzentos. Mas isso não significa que as provocações não doam ou que o rejeição não tenha deixado marcas. Quando souberam sobre minha gravidez, toda a escola se tornou um inferno. Mamãe Beca e minha mãe Isabel foram demitidas por me defenderem. Ambas eram professoras naquela instituição, e mesmo assim decidiram ficar do meu lado, embora isso significasse perder tudo. Às vezes me pergunto se realmente acreditaram em mim ou se apenas fingiram para me fazer sentir melhor, mas no fim, o importante é que tenho seu apoio.

Com papai Alonso é diferente. Ele é meu avô, e desde sempre fui sua neta favorita. Apesar de tudo, ele nunca deixou de estar ao meu lado. É incrível como alguém pode te amar tanto sem pedir nada em troca. Ele sempre fazia de tudo para me ajudar: com minhas tarefas, me levando para aulas de balé, e até sendo meu cúmplice quando eu queria comer doces proibidos. Minha mãe Isabel e mamãe Beca sempre diziam que ele era um "alcoviteiro", mas eu sabia que ele só queria me ver feliz.

Embora nossas vidas nem sempre tenham sido fáceis. Minha mãe teve que lidar com seu próprio passado. Ela me teve pouco depois de se formar no ensino médio, e meu pai… Bom, ele é um completo desconhecido para mim. Sei que ele é britânico e vem de boa posição, mas além disso, nunca me importei em saber mais sobre ele. A única coisa que sei é que papai Alonso, que era muito tradicional, não aceitou nada bem quando soube que sua filha mais nova, solteira, estava grávida. Foi demais para ele, e ele acabou se mudando para evitar fofocas. Mas apesar disso, minha mãe encontrou força. Ela estudou, se tornou professora de idiomas e seguiu em frente. E mamãe Beca sempre esteve lá, nos apoiando.

Agora, com minha própria situação, tudo mudou. Por minha culpa, minha mãe e mamãe Beca perderam seus empregos, e papai Alonso sofreu um acidente vascular cerebral justo quando mais precisávamos de sua ajuda. Então eu abandonei a escola e comecei a trabalhar, mesmo estando grávida. Mamãe conseguiu um emprego como professora de balé, e papai voltou ao trabalho como contador público, embora já estivesse próximo da aposentadoria. Mamãe Beca decidiu me ajudar integralmente durante minha gravidez, trabalhando no estúdio fotográfico de Vico, minha prima materna. Mas seu estilo de vida viajante e ritmo acelerado não eram compatíveis comigo, especialmente naquele estado. Mesmo assim, ela me deixou algo inestimável: seu amor pela fotografia. Victoria sempre foi meu exemplo a seguir, desde que éramos crianças.

Cheguei em casa me sentindo exausta, mas tentei disfarçar. Ao entrar, mamãe Beca me recebeu com seu calor habitual.

—Angie, querida, está com fome? Fiz lasanha.

A verdade é que eu não tinha apetite. Estava cansada, frustrada pelo que tinha acontecido na loja, mas sabia que precisava comer. Emily dependia de mim.

—Sim, mamãe Beca. Vou tomar um banho antes de jantar. Aliás, como minha coelhinha se comportou hoje? —perguntei enquanto pegava Emily no colo e fazia cócegas nela. Sua risada, tão pura e sincera, sempre conseguia me acalmar. Não importava quantas vezes eu tivesse falhado ou quanto me machucaram naquele dia; ver aqueles grandes e brilhantes olhos azuis era suficiente para me reiniciar e me lembrar que tudo valia a pena.

—Muito bem —respondeu mamãe Beca, sorrindo enquanto cutucava o nariz de Emily, fazendo-a rir ainda mais—. Ela é uma menina muito bem-comportada.

Coloquei Emily no berço e fui para o banheiro. Precisava de um banho relaxante, algo que limpasse não só meu corpo, mas também todos aqueles pensamentos negativos. Enquanto a água quente caía sobre mim, ouvi a voz de mamãe Beca através da porta.

—E então, como foi o seu dia de trabalho, querida?

—Ah, bem… Normal, sem novidades —menti, deixando que o vapor da água levasse minhas preocupações, pelo menos por um momento.

Emily. Só pensar nela me dava forças para continuar.

•••

Eu estava subindo as escadas com Emily nos braços quando senti os passos de Victoria atrás de mim. Não precisei me virar para saber que era ela; sempre havia algo em sua presença que me fazia sentir mais leve, como se seus passos trouxessem consigo um ar diferente, um que acalmava meus pensamentos mais pesados.

Ao entrar no meu quarto, acomodei Emily no berço e fiquei olhando para ela por um momento. Sua respiração tranquila, aquele pequeno som que ela fazia ao exalar, tudo nela era tão perfeito que eu não conseguia evitar me perguntar como alguém tão puro existia em um mundo tão complicado. Mas ali estava ela, minha pequena razão para seguir em frente, dormindo profundamente enquanto seu peito subia e descia no ritmo de sua inocência.

Senti a mão de Victoria pousar no meu ombro. Ela não disse nada, mas não era necessário. Eu sabia que ela entendia o que tinha acontecido no café. Loretta deve ter falado com ela, como sempre fazia quando queria ter certeza de que eu estava bem. Victoria tinha essa habilidade especial de ler nas entrelinhas, de perceber o que me preocupava antes mesmo que eu mesma soubesse.

Me aproximei da janela e olhei para fora. O céu estava tingido de tons alaranjados e rosados, o sol se despedindo lentamente enquanto a noite começava a envolver o bairro. Pensei em Mía e em como ela sempre parecia encontrar maneiras de me tirar do sério. Eu não queria dar mais voltas ao assunto, mas era difícil ignorar como essas pequenas interações conseguiam se instalar na minha mente e não me deixar em paz.

Victoria se moveu atrás de mim e começou a arrumar o carrinho que tinha trazido para Emily. Vi-a fazer isso com tanto cuidado, como se cada detalhe fosse importante. Aquele carrinho era muito mais do que eu poderia ter imaginado comprar para minha filha. Era lindo, delicado, mas resistente. Perguntei-me como Victoria sempre sabia exatamente o que precisávamos, como aparecia nos momentos certos com as coisas perfeitas.

Uma parte de mim se sentiu culpada por ter esquecido o mês-versário de Emily. Não era a primeira vez que algo assim acontecia, mas cada vez doía mais. Entre o trabalho, as responsabilidades e os dias que simplesmente se confundiam uns com os outros, eu tinha deixado algo tão importante escapar. Victoria tinha razão: eu me perdia tanto cuidando de Emily que às vezes esquecia de cuidar de mim mesma ou de lembrar dos pequenos detalhes que também importavam.

Quando descemos as escadas, o aroma do jantar já preenchia toda a casa. Mamãe Beca e Isabel estavam na cozinha terminando de arrumar a mesa. Suas risadas suaves flutuavam no ar, misturando-se ao som dos talheres e dos pratos. Por um momento, tudo pareceu estar no lugar certo. O calor da minha família, a presença reconfortante de Victoria, a lembrança de Emily dormindo lá em cima… até a tensão do dia começava a se dissipar.

Sentei-me à mesa e observei todos enquanto serviam a comida. Victoria comia com entusiasmo, como sempre, enquanto contava alguma anedota engraçada que fez mamãe Beca rir. Isabel assentia com um sorriso tranquilo, embora seus olhos ainda mostrassem aquela preocupação silenciosa que nunca desaparecia por completo. E eu… eu só me permiti estar ali, naquele momento, sentindo que, pela primeira vez em dias, podia respirar sem peso no peito.

Enquanto jantávamos, pensei em Helios e no que Artemis nos tinha contado sobre ele. Sempre admirei Helios por sua dedicação à música, mas também entendia seu desejo de mudar de rumo. Havia algo admirável na forma como ele seguia em frente depois de tudo o que tinha perdido. Embora ele nunca mencionasse abertamente, eu sabia que Lara e o bebê que nunca chegou ao mundo ainda eram uma ferida aberta em seu coração.

Olhei para minha mãe e para mamãe Beca compartilhando um sorriso, e depois para Victoria, que agora brincava com uma mecha de cabelo enquanto falava animadamente. Lembrei-me das palavras de Victoria sobre não me perder em Emily e deixar de lado meus próprios sonhos. Talvez ela tivesse razão. Talvez um dia eu encontrasse uma maneira de retomar esses pedaços de mim que tinha deixado para trás, aqueles que ainda guardavam esperanças e anseios.

Por agora, no entanto, estava bem com este momento. Com este jantar, esta casa cheia de risos e amor, e aquela pequena menina lá em cima que fazia tudo valer a pena.

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