Gabrielle Depois daquele jantar desastroso, saí para tentar esquecer — sem sucesso — o absurdo de que eu havia concordado com Leslie. Antes que percebesse, já estava estacionado na frente do bar onde Lucas me levou. Alice me viu sair do esportivo branco ― o mesmo que Lucas costumava usar para ir até a empresa ― se apressou para vir ao meu encontro. Apesar de ser uma noite quente, sua escolha de roupa era vulgar, até mesmo para meus padrões. O vestido era de lamê turquesa, era tão apertado que parecia que uma brisa mais forte rasgaria as costuras. Não tinha decote profundo, mas as costas estavam completamente nuas. Ela era bonita, mas de uma beleza padronizada: rosto redondo e inexpressivo, lábios carnudos, nariz arrebitado e cabelos pretos no corte chanel. Sua magreza excessiva a faz parecer com as garotas de revista, todas iguais, sem uma única peculiaridade que a destacasse. Talvez fosse esse o motivo da escolha da roupa. Ela sabia que não era chamativa por
Gabrielle Quando desci para o café, notei algo estranho: a casa estava silenciosa, vazia. Não havia sinal de Leslie, Dave ou mesmo de Jullian. Olhei ao redor, e nem as empregadas ou seguranças estavam na porta. Onde os diabos foram para todos? Pela primeira vez em muito tempo, parecia que ninguém estragaria meu humor logo pela manhã. Não permitiria que tirassem de mim aquela fagulha de prazer e satisfação pela caçada da noite anterior. Assim como não permitiria que ninguém, absolutamente ninguém, tirasse de mim aquilo que me pertencia. Ele próprio havia se rendido e se entregou a mim, como eu poderia então dividir qualquer minúscula parte de sua atenção com outra pessoa? Permitir que outra mulher pudesse sequer pensar que teria qualquer possibilidade de se aproximar dele, estava fora de cogitação. Todo pensamento ruim que começou a brotar, se dissipou enquanto percorria o caminho até a cozinha. Ao entrar, um aroma adocicado invadiu minhas narinas, e lá estava ele, de co
Gabrielle Apesar de ele não ter comentado, eu sabia que Lucas não havia acreditado na desculpa de Leslie. Ele me conhecia bem demais para se deixar enganar por algo tão simples, mas era educado demais para dizer isso em voz alta. Após longos minutos de silêncio, ele finalmente falou: — A lista é tão grande assim? Revirei os olhos, tentando encerrar o assunto de uma vez. — Tenho certeza de que Jullian já te entregou um dossiê completo, com todas as pessoas com quem mantive contato. Lucas sorriu de canto. — Para Jullian, você é como uma filha. Não o culpe por se preocupar com você. — O que ele faz é além de preocupação. — Ri diante do absurdo. — Ele se livrou de todos. Nem deu chance de que se aproximassem. Ele se colocou atrás de mim, colando seu corpo ao meu, tendo minhas costas apoiadas em seu abdômen, ele se abaixou até estar em minha altura, sussurrando em meu ouvido: — Eu também me livraria de qualquer um que tentasse se aproximar
Lucas Park Desde o dia em que retornei para o lado de Gabrielle, tenho me empenhado ao máximo para ser quem ela precisava que eu fosse, mesmo que, para isso, precisasse abrir mão de velhos hábitos — aqueles que adquiri depois de acordar do coma — ou deixar de lado as partes menos agradáveis da minha personalidade. E, embora não fosse nada fácil manter esses novos comportamentos, eu me forçava um pouco mais a cada dia. Porque eu tinha um propósito claro. No início, eu só queria seu perdão. Torcia para que ela me aceitasse de volta na sua vida. Mas, com o tempo, comecei a ser mais ganancioso. Por que deveria me contentar apenas com seu perdão, se poderia ter tudo o que ela era? Por que deveria me satisfazer apenas em estar ao seu lado, se podia tê-la dentro de mim, como uma extensão de quem eu era? Não bastava ter sua mente e seu corpo. Eu nunca estaria satisfeito. Queria o seu ser inteiro. A sua alma, assim como ela já possuía a minha. Eu me perguntava se isso era amor.
Lucas Park Parte das exigências do velho John seria, inevitavelmente, um casamento e apropriação empresarial. Quem quisesse se candidatar ao posto de marido de sua adorada filha precisava preencher uma lista extensa de pré-requisitos. Ter uma empresa que correspondesse a pelo menos 10% do capital do conglomerado Gold era apenas o primeiro deles. Esse foi o verdadeiro motivo pelo qual meu pai trabalhou tanto durante esses anos. Ele sabia que, mesmo com o contrato firmado, eu não seria um candidato aceitável se não tivéssemos o capital necessário para apresentar como “dote”. O olhar de Jullian tinha algo de cúmplice, mas também uma pitada de pena. Como se soubesse que, no fundo, estávamos todos presos à mesma armadilha, e não havia saída elegante para nenhum de nós. No final, talvez não importasse o motivo que levava todos a ansiarem por nossa união. Amor, ambição ou mera sobrevivência — pouco importava qual deles me guiava. Tudo o que importava era o resultado. E eu estava di
Lucas Park — Meu pai surtaria — murmurei, mais para mim mesmo. — Acho que não estamos em posição de esperar a aprovação de ninguém — ele retrucou, com uma expressão afiada, atenta a qualquer traço de hesitação em mim. — Ignorar umas quatro cláusulas do testamento não seria tão difícil. — Mesmo assim... Ela pode se recusar a assinar a certidão de casamento. Ela pode... — Nenhuma mulher recusaria se casar com o pai de seu filho. — Ele deu de ombros e começou a caminhar em direção à saída. — Tic-tac, senhor Park. Então era isso? Ele apenas jogou a bomba com o pavio aceso em minhas mãos e saiu? Jullian tinha uma forma estranha de lidar com situações aparentemente sem solução. Talvez tenha sido esse o talento que o velho John tenha visto nele. Talvez seja por esse motivo que, mesmo após a morte de seu marido, Leslie continuava mantendo Jullian por perto, a frente das decisões difíceis. Eu nunca o havia visto falhar em suas jogadas. Mas dessa vez, não parecia
Gabrielle Com todos os empregados de folga naquele dia, eu mesma teria que dirigir até a universidade. Embora pudesse pedir a Lucas que assumisse o volante, seria rude da minha parte. Ele sequer sabia como chegar até lá. Além disso, eu não poderia me distrair. Acelerar até o limite, como fazia de madrugada quando a casa toda dormia, não era uma opção. Precisava manter a calma, mesmo que cada segundo segurando aquele volante parecesse insuportavelmente desconfortável. A verdade é que eu temia perder a concentração com ele ao meu lado. Já seria difícil manter os olhos na estrada, mas bastava ele abrir a boca e minha mente se perderia. E, como sempre, minhas pernas fraquejariam com a intensidade da presença dele — porque quando estávamos a sós, Lucas tinha o poder de me desarmar por completo. Ele me esperava no estacionamento, encostado casualmente no mesmo carro que eu havia usado na noite anterior. A serenidade em seu rosto me dava uma sensação ilusória de paz. Eu sabia
Gabrielle Tentei, de toda forma, me concentrar nas palavras dele e manter o foco na conversa. Mas cada vez que ele sorria daquele jeito, como se estivesse testando minha paciência, meu coração vacilava. Talvez ele estivesse, de fato, me provocando, tentando me fazer desistir desse assunto e evitar respostas desconfortáveis. Mas havia tantas perguntas girando em minha mente que desistir não era uma opção. E ele estava certo sobre algo. Mesmo depois de dez anos, apesar de toda a transformação física, eu soube imediatamente quem ele era quando foi revelado para mim naquela primeira vez. Não foi preciso raciocinar ou juntar peças. Eu senti. Era como se meu corpo o registrasse antes mesmo que minha mente pudesse aceitar o reencontro. Eu não poderia imaginar o inferno que ele havia atravessado. E, sinceramente, não queria pensar nisso. Tinha algo cruel em reviver dores antigas, como se trouxesse à tona fantasmas que ele havia tentado enterrar. Ainda assim, não era tão simples