Acordei assustada, como se um vento gélido tivesse passado direto por dentro de mim. Meus olhos se abriram num sobressalto, e levei alguns segundos para entender onde estava. As cortinas pesadas ainda bloqueavam a luz da madrugada, mergulhando o quarto em penumbra. Meus sentidos estavam confusos, o coração acelerado batendo contra as costelas. E então me lembrei. O quarto. As portas trancadas. Damon. Sentei-me devagar, sentindo os lençóis grossos e macios contra minha pele. A lareira crepitava baixo, emitindo apenas calor o suficiente para espantar o frio da madrugada, mas não o suficiente para aquecer meu peito. Foi aí que senti. A presença. Densa. Silenciosa. Havia alguém ali. Virei o rosto lentamente. E então o vi. No canto mais escuro do quarto, onde a luz da lareira não alcançava, ele estava de pé, como uma estátua feita de trevas. Os olhos vermelhos como brasa ardiam no escuro. Damon. — O que está fazendo aí? — minha voz saiu baixa, trêmula, entre a indignação e o med
O quarto estava mergulhado em penumbra quando abri os olhos. O silêncio era denso, cortado apenas pela brisa suave que entrava pelas frestas da janela. Minha atenção foi capturada por algo sobre a cadeira próxima à cama: um vestido. Um vestido justo, de um vermelho tão profundo que mais parecia vinho recém-derramado. Ao lado, cuidadosamente dobrada, uma pequena carta repousava.Meus dedos hesitaram antes de tocá-la. O papel era firme, com a caligrafia perfeita que eu já reconhecia como dele."Vista. Espero você lá embaixo. – Damon."Um arrepio percorreu minha espinha. Não havia mais nenhuma instrução, só aquela ordem suave, insinuante. Ele queria me ver com aquilo... queria me provocar? Ou... me testar?Minha primeira reação foi deixar o vestido ali mesmo e continuar com o que estava vestindo. Mas algo dentro de mim – talvez o resquício do orgulho ferido, ou a curiosidade perigosa que Damon despertava – me fez mudar de ideia. Ele queria um jogo? Eu jogaria também. Mesmo com o medo ain
O silêncio que ficou após a saída de Ravik parecia ainda mais pesado que sua presença. Damon estava de pé, de costas para mim, os punhos cerrados ao lado do corpo, como se lutasse contra algo dentro de si. Eu deveria estar com medo. E estava. Mas também havia algo mais... algo quente, rastejando por debaixo da pele, como se meu corpo estivesse sintonizado com o dele, apesar da minha mente gritar por distância.— Ele queria me matar, não é? — minha voz saiu baixa, quase um sussurro.Damon se virou lentamente, os olhos vermelhos como brasas em brasa. Seus passos ecoaram pelo salão de pedra até que ele parou diante de mim, sem tocar, mas perto o suficiente para que eu sentisse o calor que emanava dele.— Provavelmente — respondeu, sem rodeios. — Ravik não perdoa falhas. Nem surpresas.— E eu sou o quê? Uma falha ou uma surpresa?Os olhos dele caíram nos meus lábios, depois subiram devagar até meus olhos. Ele sorriu de canto. Um sorriso perigoso.— Você é uma tentação. E isso... é bem pio
Damon se foi com a mesma intensidade . — como um raio que rasga o céu e deixa o ar carregado. O salão parecia mais frio sem ele, mais vazio… mais perigoso. Mas era o vazio dentro de mim que me deixava inquieta. Aquele homem me deixava em ruínas, confusa entre ódio e desejo, entre medo e curiosidade. E agora… me deixara sozinha de novo.Não. Eu não aceitaria isso.Caminhei pelo salão com passos firmes, o som dos meus saltos ecoando nas pedras antigas. A seda vermelha do vestido ainda colava ao meu corpo como uma segunda pele — como se ele me tivesse marcado com seus olhos e agora eu carregasse a lembrança em cada curva. E mesmo assim, a raiva pulsava.Ele me sequestrou. Me trancou. Me usou em jogos que eu não compreendia. E agora, desaparecia sem dar respostas?Atravessando os arcos de pedra, fui em direção à varanda ao lado do salão principal. O dia estava claro, mas o céu carregado anunciava uma tempestade iminente. Era como se o clima respondesse ao que eu sentia — e talvez fosse ex
Narrado por Elara Há mil anos, dizem que o sol deixou de nascer sobre os Montes de Eldraven. Mas eu nunca vi o sol, então pra mim… ele é só mais uma lenda. Como tantas outras que nos contam pra manter a gente obediente. Aqui em Caerlyn, vivemos sob o véu da escuridão eterna, cercados por muralhas altas e preces sussurradas. Prata nas portas, símbolos sagrados nas janelas, e medo... muito medo. As pessoas acham que isso nos protege. Eu sei que só nos isola. As Terras Escarlates se estendem logo além da floresta. Ninguém fala nelas em voz alta, mas todos já ouviram os nomes que o vento carrega: Vareth, o castelo negro, e Damon Valtor — o vampiro ancestral, o príncipe do sangue, o monstro escondido em silêncio há séculos. Mas eu não tenho medo de nomes. Meu nome é Elara, e desde pequena eu soube que não pertencia a esse lugar. Fui criada por uma curandeira velha que me ensinou mais com livros do que com bênçãos. Sempre achei que os muros não estavam ali pra manter os monstros for
Na manhã seguinte, fui até os arquivos da vila. Um casarão antigo, com cheiro de mofo, pergaminhos empilhados até o teto e janelas seladas com velhas orações. Loran estava como sempre — debruçado sobre um livro empoeirado, com o cenho franzido e os dedos manchados de tinta. — Preciso de ajuda — disse, sem rodeios. Ele levantou os olhos devagar. Sempre me olha como se estivesse lendo algo invisível em mim. — Você esteve fora da vila de novo, não é? — murmurou, voltando os olhos pro livro. — Você sabia? — perguntei. — Eu imaginei. Você carrega o cheiro da floresta quando entra. E... está tremendo. Me sentei ao lado dele, baixando o tom da voz. — Encontrei pegadas perto do lago. Grandes. Recentes. E... um símbolo desenhado na lama. Uma rosa negra. Loran parou. Fechou o livro com cuidado e olhou pra mim como se tivesse acabado de ouvir o fim de uma profecia. — Você viu mesmo isso? — Ele nunca fala com ênfase. Mas agora... havia urgência. Assenti. Ele puxou um pergami
Ele falou meu nome como se fosse uma oração esquecida. Ou uma maldição. — Quem é você? — minha voz ecoou no sonho, mas parecia pequena diante dele. Ele sorriu, lento. Perigoso. — Você me chamou. — Eu não fiz isso. — Mas está em você. O sangue. O laço. O poder. Você sente, não sente? Dei um passo para trás, o ar ao redor dele parecia vibrar — como eletricidade ou calor antes de uma tempestade. — Fique longe de mim! — Não posso. — Ele caminhou em minha direção, cada passo ecoando como um trovão silencioso. — Porque somos ligados. Porque você é a chave que pode libertar… ou destruir tudo. Meus pés estavam cravados no chão. Eu queria fugir, gritar, acordar — mas não conseguia. — Por que eu? — perguntei, a voz trêmula. — Porque seu destino foi escrito antes mesmo do seu nascimento. Ele ergueu a mão e tocou meu rosto. Gélido, mas inexplicavelmente... familiar. — E porque, Elara… você é minha. Acordei ofegante, com o grito preso na garganta. A pedra no colar bri
Acordei com a sensação de estar sendo observada.As pálpebras pesavam como se tivessem sido costuradas, e um gosto metálico tomava minha boca. Quando finalmente consegui abrir os olhos, percebi que não estava mais na floresta. Estava deitada sobre uma cama enorme, coberta por lençóis de linho escuro, em um quarto que definitivamente não pertencia à minha realidade.As paredes eram de pedra polida, cobertas por tapeçarias antigas. Havia uma lareira acesa, crepitando suavemente, lançando sombras dançantes por todo o cômodo. Um candelabro de ferro pendia do teto abobadado, tremeluzindo com chamas vivas. Era um quarto luxuoso, silencioso e... fechado.Levantei de súbito. A cabeça latejou com o movimento brusco, mas ignorei. Caminhei até a porta com passos hesitantes e tentei girar a maçaneta. Trancada. Testei mais duas vezes, com mais força, até bater o punho nela com frustração.— Alguém? — gritei. — Está me ouvindo?Nenhuma resposta. Só o eco da minha própria voz voltando como zombaria.