Não existe analgésico suficiente para apagar a dor que memórias brutais são capazes de causar. Iris, 15 anos, não consegue sair de casa e luta há dois anos contra seus traumas. Skye, 16 anos, já passou por tantos lares adotivos e sofreu violências diversas que conter as lágrimas é um processo quase impossível. Esses dois adolescentes se cruzam diversas vezes por obra do acaso, se conhecem, se apaixonam e descobrem que amar também não é um processo fácil, mas viver pode ser menos angustiante quando há alguém do seu lado. “Quebradiço” é uma história sobre a superação da dor no dia-a-dia daqueles em que os sentimentos são mais intensos e o mundo mais pesado em suas costas.
Ler maisIRIS As grossas gotas de chuva estouravam em cima do para-brisa do carro. Mamãe freou bruscamente e o cinto de segurança me deu um gancho. Sorte que eu estou de jaqueta de couro preta e o cinto prendeu na gola antes de me enforcar. É um domingo frio e chuvoso, daqueles que faz com que ninguém queira sair de casa... Mamãe não queria sair e eu tive que insistir para ela me trazer. — IRIS Iris: “Sammy, você acha que a gente combina?” Enviei um SMS para a Sammy no meio da minha aula, segurando o celular em baixo da mesa. A mensagem continha um coração de símbolos ascii, dentro dele escrevi o meu nome e o de Skye. Fiz a mesma coisa o dia inteiro em todo os fóruns que eu frequento, inclusive o de One Direction… não que eu goste08: Coragem
IRIS É a primeira vez que vejo mamãe sorrir para me levar em algum lugar ou me deixar faltar na aula. Normalmente quando saímos de casa é uma guerra, eu enrolo, faço de tudo para atrasar e o impossível para não precisar mais sair… não hoje. Hoje estou tão ansiosa que até estava pronta primeiro que ela. Escolhi uma camiseta que é toda cor-de-rosa com o Ursinho Pooh na frente, a estampa cobre toda a camiseta e está escrito “Doce como mel” em inglês. Fiz mamãe lavar minha calça jeans preta ontem a noite para poder usá-la (não vou de calça branca porque o Skye me disse ser muito desastrado e não quer
IRIS A maçaneta era quadrada de metal prateado e fosco. No meio da porta marrom lia-se “Masculino”, mas eu não prestei atenção antes de abrir. Meus olhos estavam ardendo e as lágrimas já queriam rolar. Eu só precisava me esconder em um local seguro para ligar para minha mãe implorando que ela viesse me buscar. Não tinha intenção de entrar no banheiro masculino do Centro Pearse, mas entrei. Eu estava segurando um lenço de papel e ele estava todo borrado com minha sombra azul-marinho, lápis e rímel preto. A visão da maquiagem derretendo de forma desastrosa foi constatada quando eu me olhei no espelho, tinha até manchado a minha camiseta branca
IRIS Alguma vez você já teve muita vontade de estar em um local, mas não conseguiu ir? Não quando seus pais não deixam, ou porque você tem um compromisso marcado anteriormente e que não pode ser desmarcado, mas simplesmente não conseguir ir. Toda a animação que eu estava sentindo após o meu dia feliz no Centro Pearse, desapareceu de tarde. Fiquei extremamente exausta. Não fui na festa de aniversário da Sammy e desde então, ela não responde minhas mensagens. — IRISQue vergonha.Meu primeiro dia no Centro Pearse e eu já tive uma crise de pânico. Minhas unhas estão cravadas na pele do pulso de Skye, por cima da manga do moletom que ele usa, mas ainda assim é um ato desesperado. Posso sentir as lágrimas escorrerem dos meus olhos pelo meu rosto e minha visão borra. Só vejo manchas.— Ei, qual o04: Afinidade
IRISA fachada do Centro Pearse é muito convidativa. Há um caminho de pedras por um jardim bem aparado que leva direto a uma porta dupla de vidro que reflete a luz da manhã agradável de domingo. A arquitetura é quadrada e clean, as paredes pintadas de branco parecem bem limpas e cuidadas, os vidros das janelas e portas não parecem empoeirados e posso ver que lá dentro é bem iluminado. Há uma suntuosa placa de cimento e metal com os dizeres: “Centro Clínico Pearse de Reabilitação Mental” . Eu já estive aqui milhões de vezes, quando venho para a consulta com minha psiquiatra, mas hoje parece que é a primeira vez.
IRISMamãe tamborila os dedos no volante impaciente comigo. Ela é uma mulher bonita, mas que engordou muito depois que engravidou de mim e de minha irmã mais velha Keira. Foi por esse motivo que meu pai divorciou-se dela e se casou com uma outra mulher vinte anos mais nova e quarenta quilos mais magra. Tenho pena de minha mãe, a vida não tem sido boa com ela.— Se você entrar, podemos provar calças, quem sabe encontramos algo na promoção que sirva em você.
IRISDra. Brandburry está batendo a caneta em sua mesa de madeira maciça. Isso me deixa nervosa. Tap. Tap. Tap. Meus olhos estão fixos em seus dedos pequenos e gorduchos. Ela tem unhas pequenas e gorduchas também. Sem esmalte. Dra. Brandburry tem olhos pequenos, escuros e perspicazes. Ela é uma intelectual. Do tipo que não usa maquiagem, que está sempre séria e que só precisa olhar para você por um minuto para analisar sua vida inteira. Ela me dá medo. Eu tenho medo de muitas coisas. É por isso que estou aqui no consultório psiquátrico. Para vencer meus medos.