Cecília
Enquanto Fernando falava com minha amiga ao telefone no outro cômodo, peguei Aurora no colo para brincar um pouquinho com ela. Tal foi minha surpresa, quando me virei e me deparei com Nando me observando silenciosamente recostado na porta que dividia a cozinha do corredor da escada. Um pouco sem graça, tentei entregar a bebezinha a ele e percebi seus olhos marejados. Me preocupei achando que era algo com Bia, então perguntei.
— Aconteceu alguma coisa com Bianca? — Pigarreei e olhei para baixo. — Você me parece um pouco... triste.
— Ah não, não. Está tudo certo com ela. — Ele levou uma das mãos aos olhos, me dando a certeza de que ele havia chorado em algum momento. — Eu ofereci que ela viesse me auxiliar na clínica enquanto não acha outro emprego melhor. — Ele disse vindo em minha direção pra pegar a filha. — Vamos deixar a tia Cecí a vontade agora não é meu amor? O último quarto no final do corredor, tem
Fernando Eu não sabia o que era certo naquele momento e eu não queria errar com aquela mulher. Deixei Cecília no quarto de hóspedes com pesar, pois o que eu mais queria era tê-la em meus braços ali mesmo, naquele corredor. Caminhei lentamente até a porta do meu quarto, prorrogando a cada passo aquela distancia nada bem vinda. Por fim, sem ter mais pra onde ir, cheguei à porta do meu quarto, e antes de entrar, dei uma última olhada em direção ao quarto daquela que eu mais desejava nos últimos tempos. A peguei me observando do corredor e quando ela se deu conta disso, entrou apressada de volta para o seu quarto. Aquilo tinha sido o meu passe livre para o meu maior desejo. Pro inferno os bons modos. Retomei todo o trajeto que acabara de fazer a passos largos, e de volta ao quarto de Cecí, bati à sua porta. Ela abriu vagarosamente quase sem acreditar no que encontraria do outro lado e sem muitas delongas, e
CecíliaCansada de tentar explicar, resolvi fazer o que Fernando me pedira. Deixamos Leda com Aurora em casa e voltamos para o departamento de polícia local para prestar queixa contra Leonardo.Como já era esperado, demoraram horas a fio para nos atender, quando souberam de quem se tratava. Nos passaram de um setor a outro como bolinha de ping pong no intuito de nos cansar. E cansou.Na terceira hora já corrida no banco de espera para entrar na sala do diretor, Fernando se alterou e eu tive que o lembrar de onde estávamos, mas até que não foi de todo ruim, pois apenas meia hora depois o chefe da polícia nos recebeu. Prestei a minha queixa sob o olhar despreocupada do homem a minha frente.Era um fato que ele não estava sequer se dando ao trabalho de fingir receber a ocorrência. Fernando educadamente se despediu dele com um aperto d
Fernando O beijo que passei o dia inteiro querendo repetir estava acontecendo novamente, mas como se algo estivesse errado, Cecí se afastou após algum tempo. — Fiz alguma coisa errada? — A questionei incrédulo ainda com a respiração um pouco ofegante. Ela me olhava com um misto de sentimentos em seus grandes olhos verdes que eu tanto amava. Ela engoliu em seco e saiu, indo em direção a cozinha sem me responder. A segui e insisti na pergunta um pouco mais apreensivo do que gostaria. — O que houve Ceci? — Ela novamente me encarou e disse que estava apenas cansada. Eu não engoli aquela mentira, mas se ela não queria, eu não tinha qualquer direito de insistir, então apenas acatei, balançando a cabeça numa afirmativa e me dirigi para a geladeira para iniciar o preparo do nosso jantar. Em pouco mais de meia hora, a mesa estava posta e fui chamar Cecília no andar de cima. Ela havi
Cecília A noite foi lenta e perturbadora. Eu sabia que Nando entenderia o meu afastamento repentino, como algo ruim. E em partes, até era. Pra mim, estava sendo um martírio aliás. Mas eu não podia simplesmente ama-lo com todo o meu coração, e esconder um segredo tão grandioso como aquele, dele. Eu me sentiria uma mentirosa traíra. Por isso, achei que ir com mais calma, seria o ideal, já que desde que Leda me contara que certos segredos também cercavam Nando, eu sentia que precisava me preservar igualmente até que ele também se sentisse à vontade para me contar tais segredos, sejam eles, quais forem. Aproveitei a falta de sono por conta de sua ausência e iniciei mais uma vez a busca por telefones e sites de orfanatos que possivelmente eu talvez tenha deixado de ligar ou tenha deixado passar despercebido. Achei no máximo três que não lembrava de ter falado e anotei em um bloco de notas do meu próprio aparelho.
Fernando Cheguei na clínica mais feliz que o normal. Claro, depois do beijo de despedida que dei na minha Cecí, nada e nem ninguém poderiam estragar o meu dia. Foi o que eu pensei e até que durou por longas horas. Porém, toda alegria durava pouco em um mundo tão ruim não é mesmo? Alguns minutos depois de mim, Bia chegou e ficamos conversando até os primeiros clientes chegarem. Atendi o primeiro, o segundo e o terceiro e liberei minha nova assistente para almoçar. Estava indo cuidar dos filhotinhos que nessa semana mesmo já poderiam entrar para adoção, quando o sininho da porta me notificou a entrada de outro cliente. Bom, eu achei que era outro cliente, mas era àquele ao qual todo o meu maior desejo obscuro se concentrava. Fechei o punho ao me virar e dar de cara com Leonardo. Era mesmo muita cara de pau ele aparecer na minha frente depois de ter feito o que fez com a minha Cecília. Seus ferimentos da ú
Cecília Eu amava Fernando. Sim, eu já amava aquele homem. Mas eu não podia simplesmente jogar aquela bomba do nada no seu colo. Saberia que mesmo ele demonstrando me amar, não iria receber bem. Primeiro por eu ter mentido no nosso primeiro encontro, segundo que país adotivos normalmente não querem saber dos biológicos por medo de serem trocados. Por isso, eu e Leda conversamos e chegamos à conclusão de que a hora certa chegaria. Claro que eu sonhava em ter minha filha comigo por cada milésimo de segundo da minha vida dali pra frente, mas para tudo dar certo, precisaria aguentar tê-la somente por parte do dia enquanto eu era sua babá. Naquela manhã, eu não desgrudei dela, a observei em todos os seus movimentos como se eu nunca a tivesse visto. Percebi suas manias, suas preferências e gostos, senti o seu cheirinho e a olhei no fundo dos olhos por mais de uma vez, para que ela soubesse de ve
FernandoCheguei em casa nervoso. Durante o curto trajeto, pude analisar alguns acontecimentos e o meu medo de Leonardo estar falando a verdade, intensificou. Nada fazia sentido por enquanto, mas o medo de perder minha filha me cegava.Abri a porta de supetão e Leda veio ao meu encontro. Vi Cecí com Aurora no colo e meu corpo gelou só de lembrar das palavras de Leonardo. Fui até ela e pedi que me entregasse a menina, ela se negou em um primeiro momento e eu não gostei daquilo. A questionei e tudo em seguida agora parecia um grande borrão na minha mente.Minha cabeça latejava de tanta dor, Leda me seguia, falando sem parar alguma coisa que eu não conseguia entender. Um zumbido e um apito invadiam meus ouvidos. Já estava no quarto de Aurora colocando-a no berço, quando eu voltei a realidade com a minha bebezinha chorando e eu caindo sentado na mesma poltrona que um
Cecília Alguns dias se passaram desde aquele trágico dia em que meus piores pesadelos se tornaram realidade e em nenhum sequer, eu parei de chorar. Ter minha filha sendo tirada dos meus braços novamente, era o pior castigo que eu poderia sofrer. Obviamente, deixei de ir trabalhar na casa dele. O jeito como me tratou, como insinuou que eu roubaria sua filha... Minha filha, era doloroso demais! Estava magoada e não conseguia perdoar ele por enquanto. O amava ainda, não tinha dúvidas, mas precisava pensar. Se ele tinha sido capaz de duvidar de mim, acreditando em Leonardo, eu não saberia dizer se conhecia mesmo o Fernando. Leda havia tentado me ligar por várias vezes, mensagens de Fernando chegaram por dias, mas não abri nenhuma. Bia as vezes vinha com alguma novidade da clínica, mas eu desviava o assunto. Quanto menos eu soubesse, menos eu iria sofrer. Acreditei nisso pelo menos nas duas primeiras