Capítulo 4

Catarina

Entro em casa já esperando a agressão. Heitor se aproxima e, em um gesto automático, encolho os ombros. Mas ele não me b**e. Apenas segue para o banheiro, toma banho e se deita, parecendo me ignorar.

         Eu me arrumo para dormir, mas o sono está cada vez mais distante. Estou agitada e simplesmente não consigo tirar a imagem de Theo da minha cabeça. O porte, o corpo e, sobretudo, aqueles olhos. Imagino como deve ser tocar aquela pele bronzeada, encostar os lábios naquela boca proeminente, sentir o cheiro que o seu suor exala. Quanto mais imagens se formam na minha cabeça, menos eu consigo relaxar. Sinto como se estivesse correndo uma maratona: a boca seca e o coração disparado.

“Ele é só um menino”, me censuro em pensamento. Mas nem essa constatação é capaz de afastar a reviravolta que Theo causa na minha imaginação. É... hoje vai ser difícil dormir. E, para ser realmente sincera, eu não sei se quero. Afinal, sonhar acordada é tudo o que posso fazer. E, definitivamente, ninguém pode m****r nos meus devaneios. Eles são a única coisa que efetivamente me pertencem.

***

         Duas semanas se passam, e sigo a minha rotina sem graça. Mas, naquela manhã, Heitor me dá uma notícia que reacende aquele fogo dentro de mim.

         – No sábado, os cariocas vão fazer um open house para inaugurar a casa nova. Vai ser um brunch. Preciso que compre um presente bem bonito para eles. O ideal é ir àquela loja de Vassouras, que sempre tem coisas refinadas. Vou deixar dinheiro suficiente para você escolher algo à altura deles; temos que dar uma boa impressão.

         – Tudo bem. Hoje à tarde, irei a Vassouras escolher um presente. A que horas é o brunch no sábado?

         – Cristiane marcou para as 11h. Então, vamos chegar às 11h30. Esteja pronta.

         – Vou estar.

Saio da sala com pontadas de ansiedade no estômago, já pensando no que vou vestir. Preciso achar uma roupa que, apesar de recatada, me deixe bonita. Arrumo a casa e entro no banho, fazendo uma varredura mental de todos os meus vestidos. Se eu não precisasse tanto economizar, até compraria um modelo novo.

***

         À tarde, dirijo para Vassouras, com o pensamento distante. Chegando à loja, admiro as novidades e bato o olho no presente ideal: um conjunto de porcelana francesa, no formato de folhagens, para servir aperitivos. Chique, de bom gosto, sem ser ostensivo. E ainda sobrará um bom troco para as minhas reservas financeiras.

         Saio da loja pensando em fazer um lanche na cidade e, enquanto caminho até a confeitaria, dou de cara com Theo. Fico imediatamente nervosa, mas me esforço para parecer casual. Ele está ainda mais lindo, com uma camisa social listrada, dobrada na altura do cotovelo, e uma calca cáqui, que cai perfeitamente no seu corpo torneado.

         – Boa tarde, Theo. Tudo bem? O que faz aqui em Vassouras?

         – Eu vim fazer uma entrevista de emprego em uma empresa de telecomunicações. Acabei de me formar em Engenharia de Telecom.

         – Ah. Que legal! Já fez a entrevista? Como se saiu?

         – A conversa foi ótima. Eu dei muita sorte porque eles estavam procurando alguém justamente com o meu perfil. Fui contratado. Já soube na hora; nem teve aquele suspense chato de ficar esperando feedback.

         – Que ótimo! Meus parabéns! É o seu primeiro emprego?

         – É sim. Fiz alguns estágios durante a faculdade, mas trabalho, de verdade, com carteira assinada, vai ser o primeiro. E a senhora, trabalha?

         – Pode me chamar de você. E não, não trabalho. Eu sou formada em Administração de Empresas, mas nunca exerci a profissão.

Um silêncio paira no ar após a minha resposta. Fico esperando ele perguntar a razão de eu não ter um emprego, mas, para a minha sorte, ele não o faz. Apenas fica me olhando por alguns segundos, sem nada dizer.

         – Bom, estou indo fazer um lanche na confeitaria. Foi ótimo te ver.

         – Para falar a verdade, estou com fome. Acabei nem almoçando hoje. Posso lanchar com você?

         – Claa-aaro. Por que não? Vamos, é aqui pertinho!

         Seguimos, lado a lado, mudos. Embora minha cabeça esteja a mil por hora, me concentro em parecer indiferente. É só um lanche com um menino. Nada além disso.

***

        

Comemos e, para a minha surpresa, a conversa flui. É muito fácil falar com Theo. Mesmo afetada pela sua presença, me sinto à vontade perto dele. Tudo é natural, fluido, intuitivo. Eu me pego rindo em diferentes ocasiões, como não fazia havia muito tempo. Como é bom ouvir o som da minha própria gargalhada: uma risada verdadeira, espontânea, bem diferente de todos aqueles sorrisos forçados que dou na presença de Heitor. Quando terminamos, ele insiste em pagar a conta, gentil. E chega a hora da despedida, o que já me dá um aperto no peito.

         – Bom, preciso voltar para casa. Foi ótimo o papo. Quer dizer, você está de carro?

         – Foi maravilhoso. E não. Eu vim de ônibus porque vendi o meu carro do Rio e o novo, que escolhi, ainda não ficou pronto.

         – Posso te dar uma carona de volta, se quiser.

         – Se não for incomodar, quero sim. Seria ótimo. Além de não ter que pegar ônibus, ainda podemos conversar um pouco mais.

         Quase me arrependo da minha oferta imediatamente após fazê-la. Mas não posso deixar que a atração que sinto por Theo influa nos meus modos. Seria extremamente rude não oferecer uma carona, tendo em vista que vamos para o mesmo lugar.

         Entramos no carro, e a conversa volta de maneira natural. Theo me conta sobre o automóvel que vai comprar e comenta as expectativas com o novo emprego. Enquanto tento não me distrair com a rouquidão da sua voz, começo a ouvir um barulho forte, que parece vir do motor. Ele também percebe e fala para eu parar no acostamento, mas nem dá tempo de atender ao seu pedido. O meu carro simplesmente pifa, bem no meio da estrada. Saltamos e, juntos, empurramos o veículo até um local seguro para, em seguida, ligarmos para um guincho.

         Começa a anoitecer enquanto esperamos o socorro e sinto que, a cada minuto que passa, Theo está mais próximo de mim. O seu olhar também se torna mais penetrante com o passar do tempo, como se quisesse decorar cada pedaço do meu rosto. Fico nervosa, preocupada, mas, lá no fundo, me sinto feliz com a sua atenção. Depois de ficarmos alguns minutos em silêncio, ele me diz:

         – Não quero, em hipótese alguma, ser desrespeitoso nem abusado. Mas a senhora, quer dizer, você ... é linda. Desde aquele dia na casa do prefeito, não paro de pensar em você e nas maneiras que me faz sentir. Eu nunca tive esse tipo de reação por nenhuma outra mulher. É algo forte, que domina os meus pensamentos, revira as minhas emoções. Fico tonto perto de você.

         Meu coração dispara de modo frenético, e tenho a sensação de que vou desfalecer. Olho para o chão, sem saber como reagir. O certo seria ficar ofendida e dar um fora no rapaz, mas a verdade é que me sinto exatamente como ele descreveu.

         – Eu, eu... não sei o que dizer, Theo.

         – Só me diga uma coisa: você se sente como eu? Porque, quando a gente se olha, vejo uma conexão. E não acho que estou sozinho nisso.

         – O que adianta eu me sentir como você? Continuo sendo casada com Heitor e...

         Eu não consigo terminar a frase. Theo acaba com a pouca distância que há entre nós e cola a sua boca na minha. O seu hálito quente me invade, as nossas línguas se entrelaçam e, em segundos, minhas mãos se agarram nos seus cabelos. Sinto a sua mão na minha nuca, no meu corpo, em mim inteira. Nossas bocas estão famintas, e simplesmente esqueço que o mundo ao meu redor existe. Tudo o que quero é beijar Theo, me perder no seu gosto e derreter no toque urgente das suas mãos.

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