Giulia

Michael não atende. O que me faz pensar que talvez seja melhor mesmo, afinal o que eu diria a ele? De novo, a sensação de que ele vai rir, e não vai dar importância. Me levanto, determinada a não pensar mais no assunto quando e vejo que ele está ligando de volta, e atendo depois de alguns longos segundos incerta de que deveria.

– Giulia – ouço a voz de Michael – o que houve?

– Ah, sim, hum... não houve nada – perfeito, como se eu fosse ligar para Michael em algum momento por nada.

– Desculpe-me não atende-la, estava em reunião – tenho uma impressão nítida de ter ouvido alguém grunhir de dor, e o som foi abafado logo em seguida – o que queria?

– Não sei como dizer isso, sério, vai parecer ridículo – respiro fundo e me sento na cama – não tem um jeito disso não soar estranho, então, Michael, precisamos nos beijar.

Silêncio do outro lado, e quase posso vê-lo abafando um riso descontraído enquanto tenta manter a compostura antes de me responder qualquer coisa.

– Isso é uma sugestão, uma ordem, uma intimação... não sei se ouvi direito – ele faz uma pequena pausa – disse que quer me beijar, Giulia?

– Não! – fico vermelho, de vergonha e por ele achar que liguei porque quero beijá-lo.

– Se puder me explicar, fico grato.

– Eu nunca beijei – falo, tentando ser o mais clara possível para que ele entenda o que realmente se passa comigo.

– Hum, certo... onde quer chegar, afinal? – ele está ficando impaciente.

– Eu não gosto da ideia que meu primeiro beijo vai ser visto por quase uma centena de convidados amanhã – suspiro, já espero que ele não entenda – sei que foi estranho dizer que precisamos nos beijar, mas gostaria que levasse em consideração que é constrangedor para mim.

Michael fica em silêncio do outro lado da linha, e logo o ouço respire profundamente:

– Stai tranquilla, Giulia, não vamos tornar isso mais difícil do que parece – seu tom de voz é tranquilo, o que me faz pensar que talvez ele possa me poupar dos olhares curiosos e maldosos.

– Eu não queria incomodá-lo no meio da tarde, me desculpe – digo, me senti aliviada porque ele parece ter entendido como esse assunto está me deixando preocupada.

– Você tem meu número para isso.

Nos despedimos e penso que Linda estava certa quando me disse para falar com Michael, então, volto para a companhia delas, onde a conversa está animada e logo elas me incluem enquanto falam sobre alguns detalhes do vestido de noiva. A conversa girando em torno dos preparativos e Diana fala que não sonha com vestido de noiva, enquanto Alessa, não só sonha como é capaz ela mesma de desenhar o seu, já que estuda moda.

– Imagino que Charlotte ficaria chocada ao saber disso, Diana – Linda fala, bebendo o café que havia sido servido.

– Ela ficaria chocada por muito menos – Diana dá os ombros – vou ser sincera, dependendo do noivo, eu daria um jeito de fugir!

– Não diga uma coisa dessas – Alessa parece discordar de Diana no que diz respeito ao assunto – seria um choque para nosso pai.

– Estou desconfiada de que ele está me arrumando um marido.

– Joe não permitirá que você se case com alguém que não lhe agrade, Di – Alessa é de fato a mais madura das duas, e eu concordo, a menos que meu tio deva algum favor a alguém, é claro.

– Você fala igual à nossa mãe – Diana olhou de canto para a irmã – e sabe que não é verdade, portanto, ouçam o que digo, se meu pai escolher um velho nojento eu fujo!

– Quer falar baixo? – Alessa indicou discretamente para os seguranças que as acompanhavam, a alguns metros de onde estava, e em seguida olhou por cima do meu ombro, em direção a porta – Michael voltou...

– O tipo de noivo do qual eu não fugiria! – Diana fala depois de um suspiro dramático.

Paraliso por um instante, o que ele faz aqui afinal? Minha intenção é olhar discretamente por cima do ombro, mas quando me viro, vejo a mão de Michael apoiar-se no encosto da minha cadeira, o relógio caro, manga da camisa dobrada, e ergo o queixo encontrando-o sério me encarando.

– Senhoritas – ele fala, um sorriso discreto aparece em seus lábios – sinto por incomodá-las, mas preciso roubar Giulia de sua companhia por um instante – Michael me estende a mão, para que eu seguisse com ele – eu a devolvo em seguida.

– Fique à vontade, irmão – Linda despreocupada – quer que lhe prepare uma bebida?

– Não devo me demorar – ele continua segurando minha mão, e depois a solta para me guiar em direção a porta.

Entramos na biblioteca, lugar com o qual estou bastante familiarizada, pois passo parte do dia aqui, e ele fecha a porta atrás de nós. Em seguida ele aponta para uma das estantes e se aproxima, esperando que eu me junte a ele, acionando um mecanismo na parte interna, abrindo uma passagem para um tipo de cômodo secreto. Quando entramos, percebo que está mais para um bar secreto e posso imaginá-lo ali em reunião com seus capitães, e soldados de mais confiança. Além do bar, e suas cadeiras altas, bebidas e copos de uísque, há uma mesa onde cartas e fichas estão organizadas, cadeiras confortáveis, as paredes provavelmente a prova de som, iluminação indireta e piso de madeira, clássico.

– Espero que não se importe – ele fala enquanto observa o local – mas, não desejo ser interrompido.

– Aconteceu algo? – para mim já é bem estranho que ele tenha voltado, depois de passarmos horas juntos, e que agora estávamos fora das vistas de todos.

– Sim – Michael passou a mão direita pelos cabelos pretos – nossa conversa à pouco.

– Oh... eu não deveria te perturbar com isso – me sinto envergonhada, não esperava que ele fosse voltar a esse assunto.

– Na verdade, foi descuidado de minha parte, não pensar que pode ser bem estranho ter uma verdadeira plateia já que você nunca beijou.

– Estou um pouco aflita sim – percebo que ele está chegando perto.

– Então – ele me segura pelo braço quando percebe que vou me afastar – acho melhor resolver isso logo.

– Como? – Michael está a centímetros de mim, esperando que eu pare de tentar me soltar, tranquilo.

– Quer parar com isso? Foi você que disse que deveríamos nos beijar.

– Você quer dizer, agora? – pergunto, tentando ganhar tempo, jamais poderia imaginar que ele viria para isso.

– Assim que você estiver certa que pode controlar-se – Michael me envolve com seu braço esquerdo, ainda me segurando com a outra mão, então ele me solta devagar. Seus lábios se aproximam dos meus, e minha boca é tomada pelo gosto de uísque e charuto.

Ele me aperta junto ao seu corpo, e seu calor parece me invadir, assim como sua língua deslizando entre meus lábios, cruzando com a minha, explorando minha boca, despertando violentamente o desejo do qual venho tentando ignorar desde o vi pela primeira vez. Nada que eu tinha imaginado se comparava com a sensação de mover minhas mãos pelo peito de Michael, seus músculos tornando-se tensos ao meu toque, enquanto ele aprofundava o beijo, como se fôssemos nos consumir no desejo que sentimos ambos nesse instante.

Michael envolve meu pescoço com delicadeza, sinto que ele quer me dominar, é como se estivesse sem ar e logo em seguida ele me fez respirar novamente. Tento me afastar, em vão, e o beijo se torna mais suave. Michael morde meu lábio inferior de leve, e tenho certeza de que se ele me soltar nesse exato momento, mal conseguirei me manter em pé. Ele não solta. Posso notar seus músculos oscilando sutilmente, ele me mantém perto para que eu possa me afastar certo que estou pisando no chão!

Ele olha aquele mesmo jeito, quando me viu pela primeira vez, porém agora não há somente a raiva que ele vem nutrindo por mim durante aqueles anos todos. Ele vai ao bar e serve a si mesmo uma generosa dose de uísque, apressado, como se pudesse desligar dos seus lábios o beijo que acabou de me dar. Vou até a porta, e tento abri-la, está trancada.

– Só abre com a senha ou minha digital – ele diz, bebendo outro gole em seguida – em certas ocasiões, os dois.

– Quero sair daqui – falo, sem me voltar para ele – por favor, abra.

– Com prazer, já fiz o que tinha que fazer – o painel se acende por alguns segundos sob a digital de Michael e posso ouvir um baque suave, destrancando a porta.

– Espero que tenha apreciado, Sr. Villani – falo enquanto me dirijo a porta – pois isso não irá se repetir! – minha voz soa mais alto do que eu queria.

Michael me alcança antes que minha mão toque a maçaneta, se posicionando a minha frente, cara de poucos amigos, e os mesmos olhos gélidos de sempre, ele fala baixo:

– Não cabe a senhorita essa decisão – ele fala de uma maneira clara, e tão fria que não parece que ser o homem que me beijou instantes atrás – será minha, Giulia, toda vez que eu desejar, e posso garantir que sou bem persuasivo.

– Você voltou para isso? – eu não me reconheço, acho que nunca senti tanta repulsa por alguém como agora – porque você voltou, afinal?

– Voltei porque parecia urgente para você, cazzo! – é a primeira vez que ouço Michael falar alto – Voltei porque queria acabar com isso de uma vez, a porra do beijo!

– Que aparentemente você odiou!

– Não é só você que está sob pressão, caralho! – nesse tempo de convivência com Michael Villani, nunca havia presenciado ele tão alterado – tenho que fazer esse casamento dar certo, Giulia, há muita coisa em jogo!

– Acho que vai se casar com o Cavalieri errada – é tarde quando percebo o que disse, Michael me segura pelos braços – deveria se casar com Diana!

– O que você está falando? Eu nunca pensei em me casar com a Diana!

– Porque comigo, Michael? A maior parte do tempo você me ignora completamente, você odeia minha mãe, está tão infeliz com a ideia que só me levou a conhecer Sylvia um dia antes do noivado! – eu tento me soltar, mas mal consigo me mover, enquanto ele parece ignorar o que digo.

 – Este sou eu, Giulia – ele fala com atendido – não espere que eu vá cortejá-la, e dificilmente sentirei algo por você além de atração. Eu a procurarei como esposa, e faremos nossos papéis diante de Cavalieris e Villanis. Sobre minha proteção, estará segura, terá uma vida confortável, e tudo o que o dinheiro puder comprar. Você está certa, eu odeio Donatella, e isso nunca vai mudar. E sabe o que me atormenta?

– Não – acho que nesse exato momento, estou me dando conta de que nunca escaparei aquela promessa, meus olhos se enchem de lágrimas.

– Que você faça exatamente o que Donatella fez – ele me soltou devagar – Nikolai Dotroiev está lá fora, e tudo o que eu mais quero, meu último pensamento todas as noites, desde que a trouxe para casa, é que gostaria de apenas uma chance de acertar uma bala no coração daquele figlio di puttana !

– E isso lhe traria paz?

– Eu não sei o que é paz – ele fala, e é como se uma sombra pairasse sobre seu olhar, em seguida ele abre a porta, e sai calmamente, com sua ausência de paz, e acabando com a minha também.

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