Aki encarou Chiara por alguns segundos, sua expressão séria, enquanto cruzava os braços. O ambiente no vestiário estava carregado de suspense.
— Sabe qual o meu problema com você? — começou Aki, o tom de voz controlado, mas carregado de desprezo. — Eu não gosto desse tipo de jogador que chega em um time sem ter lutado por nada. Que não sabe o que é sacrificar o corpo, o tempo, e tudo mais, só para ter a chance de jogar.
Chiara sentiu o estômago apertar, mas manteve-se firme, com os ombros retos, tentando parecer imperturbável.
— Do que você tá falando? — ela retrucou, tentando manter a voz firme. — Eu treino como qualquer um aqui.
Aki soltou uma risada curta, mas sem humor.
— É fácil falar agora. — Ele deu um passo à frente, mantendo o olhar fixo nela. — Mas você sabe o que o Luca passou? O cara jogava em um time de quinta categoria antes de finalmente conseguir uma chance aqui. Três anos sendo ignorado por clubes de elite até alguém enxergar o talento dele.
Ele apontou para outro jogador que estava de saída do vestiário.
— E o Marco? Ele teve que pagar do próprio bolso para fazer um teste em um time pequeno em outro país. Foi lá sem garantias, sem apoio, sem saber onde ia dormir, só por uma oportunidade. E conseguiu. — Aki respirou fundo. — E aí tem você. Um garoto privilegiado, com um pai cheio de dinheiro, que “coincidentemente” conseguiu uma vaga logo depois de um enorme patrocínio cair na conta do time.
Chiara sentiu o sangue ferver. Ele não tinha ideia do esforço real que Dario havia feito para chegar ali.
— Você não faz ideia do que tá falando. — A voz de Chiara saiu mais baixa, mas firme. — Eu fui sondado antes de qualquer patrocínio. Entrei aqui porque tenho talento. O dinheiro do meu pai não tem nada a ver com isso.
Aki balançou a cabeça lentamente, sem mudar sua expressão séria.
— É isso que você diz. Mas olha, para mim, tanto faz. — Ele deu de ombros. — Eu só quero saber de uma coisa: você é um jogador de verdade? Porque isso é o que vai fazer a diferença no final. O time precisa de alguém que aguente a pressão, não de um filhinho de papai.
As palavras dele estavam sufocando-a, e Chiara sentiu-se impotente. Tudo o que ela queria era defender o irmão, mas, ao mesmo tempo, sabia que Aki não aceitaria explicações fáceis. Ele via o patrocínio dos Bianchi como um sinal claro de privilégio, e não parecia estar disposto a mudar de ideia.
— Eu vou te provar que mereço estar aqui tanto quanto qualquer um. — As palavras saíram de sua boca com uma convicção que surpreendeu até ela mesma. — Você vai ver que eu tenho o que é preciso para estar nesse time.
Aki deu um leve sorriso de canto de boca, algo entre desdém e desafio.
— Espero que sim. — Ele começou a levantar a camisa suada do treino. — Não quero um companheiro de time que só está aqui devido ao sobrenome.
Chiara tentou manter o foco, mas quando Aki tirou a camisa, revelando o abdômen bem definido e marcado de cicatrizes leves, ela se pegou distraída por um segundo. A visão a tirou momentaneamente do controle, e o raciocínio travou. Sem pensar duas vezes, ela girou nos calcanhares e saiu do vestiário apressadamente, tentando afastar da mente a imagem que havia acabado de ver.
Chiara saiu do vestiário como um furacão, o rosto ainda quente de raiva e, para sua frustração, um pouco de timidez também. Tudo o que queria era sair dali o mais rápido possível.
Enquanto caminhava apressada em direção ao carro de Dario, os pensamentos se acumulavam.
Idiota... arrogante... quem ele pensa que é? Esse Aki acha que sabe tudo, só porque j**a bem... As palavras de Aki ecoavam na cabeça dela, e a raiva crescia cada vez mais. Ele pode ser um imbecil completo, mas...
Sem perceber, ela deixou escapar em voz alta.
— Mas ele é um gostoso com G maiúsculo. — murmurou, os pensamentos escapando sem controle.
— Opa, peraí! — Uma voz surgiu de repente ao lado dela.
Chiara parou imediatamente, congelada. Quando virou, viu Luca parado a poucos metros de distância, segurando o riso, claramente se divertindo com o que acabara de ouvir.
— Eu não ouvi isso, ouvi? — perguntou Luca, ainda rindo, os olhos brilhando de malícia.
Chiara arregalou os olhos, o pânico tomando conta. Droga, por que eu falei isso em voz alta? Ela abriu a boca para dizer algo, mas Luca foi mais rápido.
— Relaxa, Dario, eu não vou contar para ninguém que você acha o Aki um “gostoso com G maiúsculo”. — Ele fez aspas com os dedos, com um sorriso travesso. — Seu segredo está seguro comigo.
Chiara sentiu o rosto esquentar ainda mais, mas não era de vergonha ou talvez fosse um pouco. Ela tentou pensar em algo para dizer, alguma explicação que salvasse a situação, mas Luca já estava saindo, ainda rindo.
— Ei, sem julgamentos, ok? Não tenho preconceito, pode ficar tranquilo. — Luca virou-se uma última vez, piscando para ela.
Chiara ficou parada por um momento, totalmente atônita. Agora, além de lidar com Aki, teria que administrar Luca pensando que Dario era gay.
Ela balançou a cabeça e soltou um suspiro, entrando no carro com uma sensação de exaustão. Não sabia se ria ou chorava da confusão que sua vida havia se tornado.
Chiara dirigia concentrada na direção, as mãos estavam firmes no volante enquanto sua mente girava com tudo o que havia acontecido. Era muita coisa para assimilar em um único dia: o treino puxado, o confronto com Aki, o mal-entendido com Luca. Ela suspirou profundamente, sentindo falta dos dias tranquilos em que sua maior preocupação era ser uma bibliotecária comum, longe de todo esse caos.
Sem pensar muito, pegou o celular e ligou para Martina. Precisava desabafar antes que explodisse.
— Marti, você não vai acreditar no dia horrível que eu tive — disse Chiara assim que Martina atendeu.
Do outro lado, Martina riu.
— Oi para você também, sua louca. O que foi agora?
Chiara suspirou dramaticamente, apertando o volante.
— Eu odeio a minha vida! — exclamou. — Eu não sei por que eu me coloco nessas situações.
— Tá, respira e me conta o que aconteceu. — Martina tentou segurar a risada, mas Chiara já sabia que ela estava se divertindo.
— Primeiro, eu quase tive uma briga com o Aki no vestiário — começou Chiara, o tom de voz já exasperado. — Ele basicamente disse que eu, na verdade, o Dario só está no time devido ao patrocínio do meu pai e que eu não sou boa o suficiente, no caso ele. Mio Dio, eu já estou toda confusa.
— Ai, esse Aki pelo visto vai te dar trabalho. — Martina interrompeu. — Sempre com essa cara de superior, mas com aquele corpinho, né? Continua.
— Sim! Exatamente. Aí, eu surtei e disse que ia provar que mereço estar no time e tudo mais. E ele deu um sorrisinho arrogante, sabe? E aí... — Chiara parou por um segundo, se lembrando do momento em que ele tirou a camisa. — Aí o cara começa a tirar a camisa, Marti! Tirou a camisa e aí, mio Dio, ele é muito gostoso.
Martina gargalhou do outro lado da linha.
— Não acredito que você disse isso, Chiara!
— Eu disse isso em voz alta, Marti! — Chiara exclamou, agora rindo junto. — Pior, o Luca Ricci tava passando e ouviu. Ele agora acha que o Dario é gay. Ele me disse: “Não tenho preconceito, pode ficar tranquilo.” — Ela fez uma imitação fajuta do sotaque interiorano de Luca.
Martina gargalhava tanto que mal conseguia falar.
— Meu Deus, eu não aguento! Você atrai essas confusões, amiga! — disse ela, ainda rindo. — Mas, honestamente? Isso é hilário. Deixa o Luca pensar o que quiser!
Chiara riu, mas logo voltou ao seu tom dramático.
— Sério, como eu deixo essas coisas acontecerem?
— Ai, Chiara, para com isso! — disse Martina, agora mais séria, mas ainda com um sorriso na voz. — Você tá fazendo um trabalho incrível, mesmo que tenha uns tropeços. E, ó, às vezes a vida dá umas voltas engraçadas.
— Engraçadas? Isso aqui é uma novela ridícula das 18h, Marti! — Chiara resmungou, mas não conseguia evitar o riso.
— E quem não gosta de um pouco de drama? — Martina provocou. — Mas olha, você tá certa em querer provar que pode fazer isso. Vai lá, mostra para ele quem você é! E se, no meio do caminho, você quiser fazer umas besteiras. — ela riu. — Eu apoio também.
— Claro que você apoia! — Chiara riu, sentindo-se um pouco mais leve. — Eu sabia que você ia me incentivar a fazer coisas erradas.
— Às vezes, a gente precisa, né? — Martina respondeu com um tom brincalhão.
Chiara balançou a cabeça, sorrindo, enquanto estacionava em frente ao seu prédio.
— Vou tentar não me meter em mais confusão, mas com o Aki por perto não prometo nada.
— Boa sorte com isso, porque ele é um pedaço de mau caminho. — Martina riu de novo. — Mas, se precisar de conselhos duvidosos, você sabe quem chamar.
— Sempre. — Chiara desligou o telefone com um sorriso no rosto.
Chiara estacionou o carro e subiu as escadas rapidamente. Quando entrou no apartamento, foi recebida pelo aroma delicioso de algo sendo preparado por sua cunhada.
— Oi, Elena — disse Chiara, forçando um sorriso cansado. — O que tá cozinhando de bom?
Elena virou-se com um sorriso caloroso no rosto.
— Oi, Chiara! Nada de mais, só um macarrão ao pesto para jantarmos. Como foi o treino?
— Bem, foi puxado — respondeu Chiara, jogando a bolsa no sofá. — Mas a equipe está se ajustando. Ainda temos alguns dias até a primeira partida, então ainda dá para melhorar bastante.
— Que bom — disse Elena, voltando a mexer na panela. — Vou terminar aqui, depois te chamo para jantar.
Chiara assentiu e foi direto ao quarto de Dario que estava deitado descansando. Ela bateu levemente na porta e entrou com um sorriso.
— Como você tá? — perguntou ela, sentando-se ao lado da cama.
Dario sorriu levemente, ajeitando-se nos travesseiros.
— Melhorando. Como foi o treino?
Chiara respirou fundo, já decidida a omitir as partes mais complicadas do dia. Ele não precisava saber da tensão com Aki ou das insinuações de Luca. Dario precisava de paz para se recuperar, não de mais estresse.
— Foi puxado, como sempre — começou ela, tentando soar natural. — O técnico fez algumas considerações sobre o bloqueio e a recepção. A gente ainda tem uns ajustes para fazer, mas nada que a gente não consiga resolver até o início do campeonato.
Dario assentiu, atento a cada palavra.
— E você, como se saiu?
— Bem, dentro do possível. — Chiara sorriu. — Estou conseguindo acompanhar o ritmo, e o técnico não fez nenhuma crítica muito séria.
— Que bom. — Dario suspirou, relaxando um pouco mais. — Obrigado por tudo, Chiara. Eu sei que não deve ser fácil.
Chiara sorriu, tocando o braço dele com carinho.
— Só se preocupa em melhorar logo. O resto eu resolvo.
Dario sorriu em resposta e Chiara deu um leve suspiro. Tudo que ela queria no momento é que seu irmão se recuperasse sem preocupações, mesmo que isso significasse carregar o peso de algumas coisas sozinha.
A manhã do primeiro jogo oficial da Superlega chegou mais rápido do que Chiara imaginava. Os últimos dias haviam passado sem grandes problemas, e o Lombardy Lions parecia cada vez mais entrosado. Chiara ajustava as meias enquanto observava seus companheiros de equipe se aquecendo. O ginásio estava repleto de energia, os gritos dos torcedores ecoavam nas arquibancadas, e o clima de competição já dominava o ambiente. A adrenalina corria solta e seu coração batia muito rápido, mas havia uma sensação de estar em casa, ela estava confiante.— Vamos começar com tudo! — gritou o técnico, aproximando-se do time. — Vocês sabem o que fazer. Foco no bloqueio e não se deixem intimidar pela pressão. É só mais um jogo, um passo de cada vez.O apito inicial soou, e o jogo começou.O Lombardy Lions entrou com força total, determinado a impor seu ritmo logo de cara. A bola subiu para o saque inicial, e o adversário tentou intimidar com ataques rápidos e precisos. Chiara, estava atenta em cada movimen
O som dos tênis deslizando na quadra ecoava pelo ginásio. Chiara olhava para os próprios pés, ainda sem acreditar que estava realmente fazendo aquilo. Enquanto caminhava para iniciar seus treinos com sua melhor amiga, Martina, sua mente voou diretamente para aquele fatídico dia.Dario, sorrindo no centro da quadra, pronto para mais um treino com a sua namorada. Chiara sentada na arquibancada, como fazia de costume, acompanhando os movimentos rápidos do irmão. Martina ao seu lado mexendo no celular como sempre, planejando seu próximo rolê.Ninguém mais estava no ginásio. Era uma noite tranquila, e Dario aproveitava seu tempo de descanso antes do início da temporada. Para ele, não havia forma melhor de relaxar do que jogar uma partida com sua namorada, Elena.Tudo parecia normal até que...O impacto. O som seco de Dario caindo no chão. O grito de dor que quebrou o silêncio do ginásio.Por um segundo, Chiara congelou. Era como se o mundo tivesse parado. Seu irmão, o jogador mais ágil que
Montelago - ItáliaSetembro de 2024O sol da manhã invadia o pequeno apartamento em Montelago, mas o brilho que ele irradiava não parecia alcançar Chiara. Ela estava de pé em frente ao espelho, estudando o próprio reflexo. O corte de cabelo curto ainda era um choque, mesmo depois de alguns dias, ela ainda não tinha se acostumado com o seu novo visual.— Bom dia, Dario — murmurou para si mesma, tentando imitar o tom descontraído e confiante do irmão. A voz soava estranha, como se fosse alguém que ela não conhecia.Ela ajeitou o cabelo curto, suspirando. O visual estava perfeito. Daria para enganar qualquer um pelo menos, era isso que ela esperava.— Não fique se estressando tanto — disse Martina, entrando na sala com uma xícara de café na mão e um sorriso no rosto. — Você está parecendo ele. Agora só falta acreditar nisso.— Fácil para você falar — Chiara respondeu, passando as mãos nervosamente pelos cabelos. — Você não vai estar lá fingindo ser outra pessoa.Martina riu.— Verdade, m
O silêncio tomou conta do apartamento após a pergunta de Roberto. Chiara sentia o olhar pesado do pai sobre ela, e seu coração batia acelerado. O corpo parecia paralisado, mas sua mente trabalhava rápido, buscando uma forma de explicar tudo.Roberto deu um passo à frente, com o rosto marcado pela raiva contida. Ele passou a mão pelos cabelos grisalhos e voltou a fitar Chiara, o tom de sua voz saiu cortante.— Então, me expliquem. Que merda vocês fizeram? — repetiu, mas dessa vez a pergunta parecia mais dirigida a ela.Chiara engoliu em seco, sem saber por onde começar. O olhar de seu pai fazia com que se sentisse pequena, como se cada palavra pudesse ser um erro fatal.— Pai, calma. — Dario interveio, tentando suavizar a tensão. — Aconteceu um acidente, você sabe como essas coisas são. Eu não posso jogar por um tempo.— Um acidente? — Roberto interrompeu, o tom mais alto e incrédulo. — Isso não justifica essa loucura. — Ele virou-se para Chiara, os olhos fixos nela como lâminas. — E vo
Chiara estava sentada no sofá apenas pensando no que havia acontecido. Dario já havia ido descansar, deixando-a sozinha para esperar Martina. O toque da campainha a trouxe de volta à realidade.Ela se levantou rapidamente e abriu a porta. Lá estava Martina, com a expressão preocupada.— E aí, o que rolou? — perguntou Martina, sem rodeios, entrando no apartamento como um furacão.Chiara soltou um suspiro pesado, fechando a porta atrás de si.— Vamos para o quarto, não quero acordar o Dario — sugeriu ela, apontando para o corredor.As duas caminharam até o quarto, e assim que se sentaram na cama, Chiara começou a contar tudo. Cada palavra dita por Roberto, cada olhar cheio de julgamento. Ela tentou manter o tom neutro, mas a dor era visível. Martina ouviu em silêncio, mas suas expressões falavam por si.Quando Chiara terminou, Martina explodiu.— Eu juro, Chiara, esse homem é um desgraçado! — começou ela, jogando as mãos no ar. — Que tipo de pai faz isso? Como ele pode tratar você assim
A luz suave da manhã já iluminava as montanhas ao redor de Montelago quando Chiara estacionou o carro de Dario em frente ao ginásio. Esse era um pequeno passo para se sentir mais confiante, além de evitar os táxis e as caronas diárias de Martina.Ela estacionou o carro com cuidado e pegou a bolsa no banco do passageiro. O movimento no estacionamento já estava começando, com alguns jogadores chegando, mas foi a Mercedes Benz C300 azul que chamou sua atenção. A porta do carro se abriu com uma suavidade quase ensaiada, e quem saiu de lá foi Aki, com aquele andar confiante, como se o mundo estivesse exatamente onde ele queria que estivesse.Chiara respirou fundo. Aki era um enigma para ela, ele era sempre distante, sempre observador, mas nunca de fato amigável. Talvez fosse a hora de tentar quebrar o gelo, ou pelo menos ser educada.— Bom dia, Aki — disse ela, tentando soar casual, mas sentindo o coração bater um pouco mais forte.Para sua surpresa, Aki a olhou por um instante, assentiu e