MORERÉ, ILHA DE BOIPEBA, BAHIA
Enfim chegou o dia, o dia de fazer a travessia, de ir ao encontro do novo, ao desconhecido. Confesso que estou ansiosa e, ao mesmo tempo, com medo das dificuldades que irei encontrar, pois, o que conheço do mundo são informações que obtive de revistas e jornais esquecidos por turistas ou através da única estação de rádio que chega o sinal na vila, onde seu assunto principal é política. Geralmente uma vez por semana vou à Velha Boipeba, onde assisto televisão nas pousadas e restaurantes que também possuem wi-fi, recebem sinal de uma única operadora que funciona na região. Nunca acessei a internet, na verdade, nem sei como fazê-lo.
O que será de uma menina como eu criada em um vilarejo que nem sinal de celular tem, na cidade grande? Aparelho esse que só tive em minhas mãos quando ganhei da minha tia quando fiz quinze anos. Uma menina que só entende de peixes, do mar, limpar casa e cozinhar. Uma menina que deu seu primeiro beijo, se é que posso chamar assim, aos catorze anos atrás da igrejinha e depois disso se arrependeu, pensou estar grávida. Que passou vários meses orando pedindo perdão a Deus por pecar, com medo de ser expulsa de casa por estar ‘gerando um filho’. Se não fosse uma revista esquecida por um casal de turistas no barco do meu pai, onde explicava sobre a sexualidade da mulher, e sobre gestação, estaria pedindo perdão até hoje.
Uma menina que foi criada para ser esposa de alguém, de cuidar do marido como minha mãe cuida do meu pai. Que foi ensinada pelo pai que o homem tem que zelar pelo bem-estar da família e satisfazer sua mulher, essa parte quando perguntava ele sempre dizia que quando eu fosse adulta entenderia, conclusão, até hoje não sei. Que o homem é chefe da família, é sua responsabilidade proteger, cuidar e principalmente amar sua esposa e filhos mais do que a si próprio, que eles sempre vêm em primeiro lugar.
Moreré é o meu lugar, é o meu paraíso.
Nossa vila tem menos de trezentos moradores. Aqui não precisamos de relógio, o nosso ritmo é determinado pela maré. Os turistas que chegam com sua pressa citadina, logo são envolvidos com a calmaria e a beleza da ilha. No amanhecer a maré baixa e que antes era oculto encoberto pelas águas, ficam diante dos nossos olhos e sob nossos pés. Metros e metros de areia, onde caminhamos até a água chegar nos joelhos.
Piscinas naturais são formadas, as pessoas que visitam a ilha, se divertem jogando bola, frescobol ou fazendo brincadeiras. Algumas apenas desfrutam do sol acariciando sua pele ou na sobra de uma amendoeira. Ao cair do sol, tudo desaparece sob as águas, trazendo sobre nós o céu mais lindo que já vi na vida, chega ser engraçado dizer isso, nunca estive fora da ilha, mesmo assim duvido que exista mais lindo. Incontáveis estrelas esbanjam sua beleza e excelência no meio da escuridão. Nunca me cansarei da beleza desse lugar, ele nunca é o mesmo, a cada subida da maré ele se transforma tornando se possível ainda mais belo.
Irei sentir saudades do meu tranquilo e lindo paraíso, de andar descalça, de ser beijada pelo sol todas as manhãs. Do som do barco do meu pai, do cheiro e sabor da comida da minha mãe. Minha mudança é inevitável, decidiram sobre meu futuro desde que me entendo por gente, quando eu fosse para o ensino médio iria residir na casa da irmã da minha mãe, tia Sônia, em Salvador, até terminar os estudos, encontrar um bom rapaz e me casar. Portanto.
Seja o que Deus quiser.
ANABruno e eu estamos juntos desde os meus dezessete anos, o conheci no meu primeiro ano na escola, ele estava no terceiro ano, portanto, seu último. Nunca fui uma pessoa tímida, sou comunicativa, porém, muito cautelosa ao me aproximar das pessoas.No meu primeiro dia de aula os alunos do terceiro ano ficaram incumbidos de nos apresentar a escola, um desses era o Bruno. Quando entramos no laboratório, inocentemente perguntei se eles usavam ratos para fazerem experiência, os alunos mangaram de mim, me deixando constrangida. Bruno e seu lindo par de olhos verdes, veio em minha defesa, dizendo que foi a primeira coisa que passou por sua cabeça quando entrou na escola. Assim que disse essas palavras, piscou para mim. Na hora percebi que ele estava me ajudando, um rapaz bonito, bem informado e inteligente como ele jamais diria uma asneira como a que eu disse. Um laboratório do ensino médio usar ratos, o que eu
ANA⸻ BRUNO, CORRE AQUI. Grito do nosso quarto.⸻ O que foi amor? Ele surge desesperado na porta do quarto. Tão logo o vejo abro minhas pernas, estou usando apenas sua camisa de algodão branca. Ele olha para minha chibiu com as mãos no peito.⸻ Porra! Você me assustou.⸻ Quer dizer que isso, aponto para minha chibiu linda, cheirosa e depilada, te assusta agora? Isso para mim, é novidade.⸻ O que deu em você mulher, está ficando abilolada?⸻ Acabei de ver na internet as mulheres sem calcinha abrindo as pernas para seus boys, nenhum deles se assustou, a maioria caiu de boca. Você é um estraga prazer, literalmente. Digo me levantando.⸻ Vem cá amor, me assustei com você gritando, pensei que tinha acontecido alguma coisa.⸻ Esqueci Bruno. Vou beber água e dormir. Essa noite não encosta em mim, seu pênis pode ficar assustadinho, faç
ANAConfirmo o número do prédio e entro, na recepção minha entrada é liberada com facilidade. Quando o elevador chega ao décimo andar me apresso em sair, para minha surpresa me deparo com várias pessoas falando ao mesmo tempo, umas em suas mesas com mais de uma pessoa a sua volta e outras circulando pelo amplo espaço. As mesas não são organizadas em baias, nem em salas. Elas ficam dispostas no centro, uma ao lado da outra, formando dois corredores, permitindo a circulação em volta delas. Uma mulher que aparenta ter uns trinta e cinco anos, com um vestido de linho cinza-claro, justo, vem em minha direção.⸻ Ana, sou Suzana, ele estica sua mão em comprimento, em seguida entrego os ternos. Me acompanhe por favor, sorrio e sigo seus passos. Por todo caminho vejo imagens de muitas propagandas que já vi nas redes sociais e na tv. Fico maravilhada. No final do amp
ANAEm casa me desfaço da minha roupa e jogo-me na cama, permaneço com minha lingerie. Penso no casal e como me senti os observando. Minha memória me leva aos meus pais, ao Bruno e ao homem de pele escura que vi a um mês quando fui trocar o terno. Desde aquele dia a cena de nosso ‘encontro’ na porta do elevador se repete em câmera lenta em meus pensamentos.Minha mão desliza por dentro da minha calcinha, meus dedos envolvem meu nervo, movimentando levemente. As imagens se misturam, meu corpo se arrepia. Me vejo no lugar da mulher no bar, o homem não é mais o dela, é o Bruno, em poucos segundos, não é mais o Bruno, é ele, o homem que vi por um pouco mais de um minuto. Sua pele negra se destaca nas luzes brilhantes da pista de dança. Suas mãos alcançam minha bunda. Sua boca encosta na minha, eu a abro para recebê-lo. Sua língua dita os movimen
HECTOR⸻ Te dou o até o final do mês para que você resolva isso, nem um dia a mais. Irritado desligo o telefone e o bato no gancho. Faz dois meses que solicitei ao corretor um lugar descente para empresa, é impossível que em um centro comercial enorme como esse não tenha dois andares disponíveis para mim. Desde que o andar onde funcionava a agência pegou fogo, ele conseguiu esse espaço que é um caos, me iludiu ao dizer que era ‘provisório’.⸻ Suzana, providência por favor outra imobiliária, vê se eles conseguem para ontem um lugar descente para nós. Nesse espaço improvisado estão misturados todos os setores. Apesar de o trabalho estar fluindo, não é o ideal. Preciso que os setores sejam divididos, um para o departamento do atendimento, outro para o planejamento, para criação, tráfego, redação pu
HECTOREla me olha com desejo, muitas mulheres desejam um homem negro como eu, muitas querem comprovar o que dizem sobre nós em relação ao sexo e a respeito do nosso pênis. Isso também acontece com as mulheres negras e a fama de serem quentes na cama. Porém, as mulheres da alta sociedade nos usam para realizar seus desejos, uma pequena minoria nos quer como seus parceiros no dia a dia. A maioria não quer apresentar um homem de pele escura como seu companheiro, namorado, esposo. Não digo isso em relação a mim, e sim em relação a homens que tem um relacionamento, baunilha, apesar de já ter recebido algumas propostas como essa.⸻ Qual seu nome? Pergunto.⸻ Ana ClaraPorra, o que está acontecendo? Ana? A menção desse nome me deixa animado, porém, a Ana dos meus pensamentos, é linda, desde o nosso ‘encontro no’ elevador, a
ANAMeu final de semana foi praticamente dentro do quarto, não tive ânimo para fazer nada. Pela manhã acordava bem cedo, tomava café com minha mãe, às sete, meu pai já estava no mar. Depois caminhava pela praia. O mar e o vento gelado eram as testemunhas da tristeza em meu peito. Pensar no Bruno, em nosso relacionamento e em tudo que aconteceu, por mais que eu não quisesse, eram as únicas coisas que eu fazia. Ainda não consigo entender como que de repente tudo mudou. O que sei de relacionamento, vida a dois e de sexo, aprendi com ele. Antes do Bruno não havia namorado ninguém, minha única experiência foi um beijo inocente de uma adolescente.Com ele me tornei mulher, éramos perfeitos um para o outro, a não ser por um detalhe. Em mim há uma necessidade de ser domada, não que eu seja um animal feroz, longe disso. Preciso ser conduzida, não
ANASubo as escadas do prédio com o coração palpitando, a última vez que estive aqui foi sábado de manhã. Ando pelo corredor do terceiro andar ansiosa, sei que Bruno ainda não está em casa, costumamos chegar às seis, já que chegávamos juntos.Abro a porta e entro. Coloco minha bolsa sobre o sofá e me sento. Olho em volta pensativa, ainda não sei o que vou fazer, meus sentimentos em relação a essa situação, não está definida. O mais estranho é que nunca me imaginei sem o Bruno, mas estou cogitando essa possibilidade. Sempre falei brincando com as meninas sobre outros homens, em nosso grupo no WhatsApp dizemos muitas bobagens, mas tudo não passou de diversão, nunca cogitei me deitar com outro homem que não fosse o Bruno, se eu tinha alguma fantasia, era com ele que queria realizar.Como um passe de m&aac