⸻ Te dou o até o final do mês para que você resolva isso, nem um dia a mais. Irritado desligo o telefone e o bato no gancho. Faz dois meses que solicitei ao corretor um lugar descente para empresa, é impossível que em um centro comercial enorme como esse não tenha dois andares disponíveis para mim. Desde que o andar onde funcionava a agência pegou fogo, ele conseguiu esse espaço que é um caos, me iludiu ao dizer que era ‘provisório’.
⸻ Suzana, providência por favor outra imobiliária, vê se eles conseguem para ontem um lugar descente para nós. Nesse espaço improvisado estão misturados todos os setores. Apesar de o trabalho estar fluindo, não é o ideal. Preciso que os setores sejam divididos, um para o departamento do atendimento, outro para o planejamento, para criação, tráfego, redação publicitária, redação jornalística, marketing de conteúdo, social media e análise de dados.
Como dono da agência me envolvo em todas as frentes, mas o departamento do atendimento é o que atuo diretamente, pois, o considero o mais importante por ser o primeiro contato com o cliente, é onde Sérgio e eu produzimos os briefings das demandas que são repassados aos setores internos da empresa. Fazemos o que for possível para manter o cliente feliz e satisfeito com as entregas e assim conseguir novas contratações.
⸻ Vou precisar do terno para hoje à noite, digo a minha secretária, pego meu celular, chave e carteira. Vou almoçar. Passo pela bagunça organizada que se tornou minha empresa e entro no elevador. No restaurante a garçonete me atende toda sorridente, ela é bem bonita, mas não serve para um homem como eu. Em menos de dois minutos após a minha chegada, Ivan se senta na minha frente.
⸻ Desculpe o atraso.
⸻ Acabei de chegar, digo.
⸻ Animado para a festa do Fortunato?
⸻ Sinceramente não, só vou por causa da minha condição de dono do clube, por ele ser meu amigo e por ter sido uns dos escolhidos para fazer uma demonstração, apesar de ele saber que não gosto de manifestações públicas.
⸻ Bons motivos, você não acha? Fico sério. ⸻ O que está acontecendo contigo Hector? Você ia ao clube duas vezes por semana, passou a ir uma, e agora mal aparece. Nem lembro qual foi a última vez que te vi lá. Tem alguma coisa a ver com a Nanda?
⸻ Não. A Nanda foi uma boa submissa, apesar de ela ser switch, mas é passado. O clube que não me atraí mais como antes.
⸻ Não vai me dizer que se tornou baunilha? Isso não tem nada a ver com você.
⸻ Longe de mim. Bato três vezes sobre a mesa de madeira, ele rir. ⸻ Mesmo gostando de fazê-lo de vez enquanto, não posso mudar o que sou. Cheguei aos trinta, amigo, não quero mais dominar aleatoriamente, sem uma conexão permanente, necessito de uma escrava que me conheça de verdade, não superficialmente, e eu a ela.
⸻ Entendo, às vezes penso nisso, mas para muitos em nosso meio, pode parecer um pensamento, baunilha.
⸻ Verdade. Você e a Carla, como estão?
⸻ Ela me disse que sentia falta de ser dominada por outros Dons, então a liberei. Confesso gostava dela, o importante que ela foi sincera comigo.
⸻ Por isso que não quero bottom do clube, muitas que não possuem Dom passaram pelas mãos de muitos de nós. Não quero uma mulher experiente, e sim, uma que eu possa moldar do meu jeito, se for possível, que não tenha sido dominada por ninguém.
⸻ Não é fácil como você pensa, conseguir uma submissa por aí. A maioria das mulheres são baunilhas, quando se deparam com homens como nós, fogem.
⸻ Sei que não é fácil, mas existem mulheres que tem a natureza submissa, tem necessidade de se submeter, não desenvolveram isso porque não encontraram o parceiro ideal. São poucos os homens que sabem dominar uma mulher, muitos julgam que dominação é proibir de sair, decidir qual roupa ela deve usar, a deixar presa em casa, e outras atitudes parecidas com essas. Nós dois sabemos que não é isso. Ser um dominador faz parte de nós, quem somos. O que acontece entre um Dom e uma sub, é consensual, prazeroso para ambos. Para o que domina e para o que se deixa dominar. Nossa conexão é profunda, onde se tem total confiança. Quem está de fora vê somente a questão sexual e a aparente agressão física, não fazem ideia que se trata de uma entrega total do corpo e da alma.
⸻ Boa sorte na busca pela sub dos seus sonhos, espero também encontrar a minha.
⸻ Não preciso procurar, vamos nos encontrar, se tiver uma mulher para ser minha, minha submissa, seremos atraídos um pelo, o outro. Pode não ser hoje, amanhã ou daqui a um ano, mas sei que vai acontecer.
Após ao almoço retorno para empresa, quando o elevador para no meu andar, vejo uma linda mulher ao lado da minha secretária, em seus braços dois ternos. Quando me vê ela abaixa a cabeça e permanece no lugar, seguro o elevador por uns segundos, como ela não se movimenta saio e passo por ela, seu doce e feminino cheiro invade minha narina. Não sei quem ela é, mas o fato dela ter me reconhecido como dominador que sou, mexeu comigo. Entro em minha sala, de pé atrás da minha mesa, observo a linda mulher. Seus cabelos castanhos escuros, ondulados cobrem a gola da sua camisa amarela, sua saia, lápis cinza envolve seu bumbum redondo.
A bela negra entra no elevador, mesmo de longe ela percebe que a observo. Antes do elevador se fechar, ela abaixa outra vez a cabeça. Porra!
⸻ Suzana quem era aquela mulher? Apesar da forma que ela estava vestida, ela não passa de uma menina, uma linda menina negra no tom mais claro da nossa cor, onde muitos chamariam de morena.
Suzana se espanta com a minha pergunta e me olha constrangida. Observo seu rosto, sei que ela está ponderando o que dizer. Cruzo meus braços e aguardo com curiosidade.
⸻ Por um erro da lavanderia, ela diz bem devagar, como estivesse explicando a uma criança, ⸻ e nosso, os ternos foram trocados, a atendente entregou o seu para Ana. Hum! Ana é o nome dela. ⸻ E o dela para mim. Como eu não podia sair a pedi que trouxesse.
⸻ Não consigo entender como você descobriu que meu terno estava com ela.
⸻ Em vez deles colocarem nomes das pessoas, eles colocam o nome da empresa.
⸻ Hum! Onde ela trabalha?
⸻ Store Market.
⸻ Bom saber, digo para mim.
⸻ O senhor disse alguma coisa?
⸻ Não. Pode ir. Obrigado.
A festa de aniversário do César Fortunato, dono do clube de BDSM ao qual também sou dono, está sendo realizada em sua mansão. César e eu temos quase a mesma idade, ele é apenas dois anos mais, velho do que eu. O conheci no clube, onde frequento desde meus dezoito anos. Ele herdou do seu pai o clube, que faleceu há cinco anos, desde então, me tornei seu sócio nos negócios e tenho o ajudado a manter a filosofia intacta. Por causa de um filme que não retratou nem dez por cento do que é o BDSM, muitos se denominaram Dominadores, surgiram várias mulheres querendo ser submissa pensando que se tornariam a protagonista do filme.
Essa festa em especial foi aberta a não sócios, muitas pessoas da alta sociedade e alguns políticos que não frequentam ao clube estão presentes. Fortunado está querendo ampliar os negócios e nada melhor do que pessoas como essas que zelam pelo anonimato em relação a sua vida íntima. Sua intenção é abrir um clube para aqueles que não são adeptos a filosofia do BDSM e conquistar mais sócios para nossa filosofia, é claro. Fortunato me pediu que eu fizesse uma demonstração, vai ser algo bem simples para não chocar as madames, palavras do César, e, porque não temos masmorras.
Comprimento algumas pessoas, uma grande porcentagem é de minha familiaridade, frequentam ao clube há anos. César me apresenta alguns deputados e celebridades. Caminho pelo espaço, algumas submissas se oferecem para a apresentação, mas nenhuma me interessa, escolherei na hora.
No meio do salão foi colocado uma barra de ferro, parecida com aquelas barras que encontramos em praças para fazer exercícios, a diferença é que em suas laterais possuem barras, como formasse uma escada. César anuncia a apresentação, seus convidados se amontoam ao meu redor. Tiro meu terno, afrouxo minha gravata. Olho ao redor para escolher a escrava ideal, meus olhos se deparam com os da Nanda, ela sorrir, mas não quero usá-la. Nanda sabe dos meus gostos, mas é uma submissa experiente, ela sempre está acima do limite e o intuito não é esse.
Uma mulher com um vestido preto justo me olha com excitação. Seu cabelo preto curto, expõe sua nuca, seus olhos negros não desviam nem um segundo dos meus. Seu corpo é magro e sua pele clara, já imagino as marcas vermelhas que deixarei nela. Me aproximo dela e sussurro em seu ouvido.
⸻ Aceita ser minha submissa essa noite?
⸻ Nunca fiz isso, ela diz timidamente.
⸻ Prometo que será bom para nós dois, mas se você não se sentir confortável com qualquer coisa que eu faça, é só dizer sua palavra de segurança que interrompo imediatamente. Escolha uma.
Ela me olha de cima a baixo, passa a língua nos lábios.
⸻ Pretinho.
Arqueio minha sobrancelha e ela sorri. Estendo minha mão, ela segura, a levo até a barra. Antes de prendê-la informo que é sua primeira vez, e sobre a palavra de segurança, menciono a que ela escolheu. Explicações feitas começo a apresentação.
Breinfing ⸻ descrição do trabalho a ser realizado / Top ⸻ dominador / Bottom ⸻ submissa / switch ⸻ que varia entre dominar e submeter.
HECTOREla me olha com desejo, muitas mulheres desejam um homem negro como eu, muitas querem comprovar o que dizem sobre nós em relação ao sexo e a respeito do nosso pênis. Isso também acontece com as mulheres negras e a fama de serem quentes na cama. Porém, as mulheres da alta sociedade nos usam para realizar seus desejos, uma pequena minoria nos quer como seus parceiros no dia a dia. A maioria não quer apresentar um homem de pele escura como seu companheiro, namorado, esposo. Não digo isso em relação a mim, e sim em relação a homens que tem um relacionamento, baunilha, apesar de já ter recebido algumas propostas como essa.⸻ Qual seu nome? Pergunto.⸻ Ana ClaraPorra, o que está acontecendo? Ana? A menção desse nome me deixa animado, porém, a Ana dos meus pensamentos, é linda, desde o nosso ‘encontro no’ elevador, a
ANAMeu final de semana foi praticamente dentro do quarto, não tive ânimo para fazer nada. Pela manhã acordava bem cedo, tomava café com minha mãe, às sete, meu pai já estava no mar. Depois caminhava pela praia. O mar e o vento gelado eram as testemunhas da tristeza em meu peito. Pensar no Bruno, em nosso relacionamento e em tudo que aconteceu, por mais que eu não quisesse, eram as únicas coisas que eu fazia. Ainda não consigo entender como que de repente tudo mudou. O que sei de relacionamento, vida a dois e de sexo, aprendi com ele. Antes do Bruno não havia namorado ninguém, minha única experiência foi um beijo inocente de uma adolescente.Com ele me tornei mulher, éramos perfeitos um para o outro, a não ser por um detalhe. Em mim há uma necessidade de ser domada, não que eu seja um animal feroz, longe disso. Preciso ser conduzida, não
ANASubo as escadas do prédio com o coração palpitando, a última vez que estive aqui foi sábado de manhã. Ando pelo corredor do terceiro andar ansiosa, sei que Bruno ainda não está em casa, costumamos chegar às seis, já que chegávamos juntos.Abro a porta e entro. Coloco minha bolsa sobre o sofá e me sento. Olho em volta pensativa, ainda não sei o que vou fazer, meus sentimentos em relação a essa situação, não está definida. O mais estranho é que nunca me imaginei sem o Bruno, mas estou cogitando essa possibilidade. Sempre falei brincando com as meninas sobre outros homens, em nosso grupo no WhatsApp dizemos muitas bobagens, mas tudo não passou de diversão, nunca cogitei me deitar com outro homem que não fosse o Bruno, se eu tinha alguma fantasia, era com ele que queria realizar.Como um passe de m&aac
ANAUma semana se passou, aos poucos Bruno e eu estamos voltando a nossa normalidade, ainda não fizemos amor, ele não demostrou interesse e eu não sinto a menor vontade, as imagens dele me segurando a força, me obrigando a transar com ele ainda permanece em minha cabeça. Meu pai foi duas vezes essa semana a Velha Boipeba para poder me ligar, ele estava preocupado, só se tranquilizou quando Bruno falou com ele e disse que estamos bem. Não tive coragem de contar o que aconteceu, se ele soubesse, protetor do jeito que é as coisas não ficariam nada bem.Rose me chamou para ir a um Pub amanhã, segundo ela, preciso descobrir que existe vida além do Bruno. Para ela não me dei oportunidade de conhecer a vida, mal cheguei na cidade grande entrei de cabeça em um relacionamento. Para ela tem muitas coisas para viver e aprender.⸻ Vou pensar, digo me despedindo, hoje irei embora soz
HECTORDepois de dez dias de obra, finalmente mudamos para o novo prédio. Não foi necessário fazer muitas modificações, alguns reparos e uma nova pintura, foram suficientes. Fiquei muito ansioso para que esse dia chegasse, o motivo da minha ansiedade não era só a empresa, não via a hora de poder estar trabalhando no mesmo prédio que a Ana, e assim talvez me aproximar dela. Estive todos os dias no prédio com a desculpa de verificar a obra, o que eu queria era a encontrar casualmente, mas não tive essa sorte.⸻ Bom dia! Digo assim que saio do elevador e passo pela recepcionista. Caminho até Suzana que está concentrada no seu computador em sua sala. Bato na porta aberta e ela sorri quando me vê.⸻ Como está se sentindo? Pergunto.⸻ Melhor impossível, essa tranquilidade, ela coloca as mãos nos ouvidos, é perfeita. Rio alto.⸻ T
ANAAcordo assustada com o pesadelo que tive, foi muito estranho, havia pessoas que não conheço, elas me cercavam e apontavam os dedos para mim. Diziam coisas que não conseguia ouvir, era como se elas tivessem me acusando, como se houvesse cometido algum crime. O cerco a minha volta foi se fechando, me sufocando, nesse momento as vozes se tronaram audíveis, gritavam, Burra. Burra, em comum acordo. Acordei assustada com o coração acelerado. Sento-me na cama, as imagens daquelas pessoas me acusando me fazem mal, mesmo sabendo que foi um sonho, sinto aperto em meu coração, como se algo ruim fosse acontecer.Pego meu celular na mesinha de cabeceira e vejo que são duas da manhã, olho para o lado, Bruno está dormindo, não sei dizer a hora que ele chegou. Levanto-me vou ao banheiro, uso sanitário, lavo as mãos, o rosto e volto para cama, forço-me a dormir sem pensar em n
ANA⸻ Espere um pouco. Tia Célia se exalta. ⸻ Você que paga o apartamento? Meneio a cabeça confirmando. Ela olha para Marisa e para o Bruno, fico sem entender.⸻ Isso é invenção dela para não dizer que mora de graça. Bruno não me defende, ouve sua mãe falar um absurdo desse e não diz nada. Célia balança a cabeça de um lado para o outro. Por dentro estou a ponto de explodir.⸻ Acho melhor mudarmos de assunto. Bruno diz, se levanta e leva a garrafa de refrigerante para a geladeira, explodo.⸻ Bruno, moro de graça? Adiei meu sonho para que você não precisasse parar de estudar e sua mãe diz isso e você não diz nada. Marisa, um pouco mais que a metade do meu salário vai nesse apartamento, é injusto você dizer isso. Digo expressando toda minha indignação.⸻ Ana, Marisa está err
ANAAcordo com meu celular vibrando debaixo de mim, por pouco quebrou, peguei no sono e não o coloquei sobre a mesinha de centro. Sento-me e o pego, com a vista embaçada, é a Rose.⸻ Boa noite! Digo sonolenta.⸻ Você foi para a casa dos seus pais e nem me avisou? Fico sem entender nada.⸻ Como assim na casa dos meus pais?⸻ Liguei para seu celular e você não atendeu, então entrei em contato com o Bruno que disse que você foi para Moreré. Só de ouvir o nome do Bruno me dá náusea, ainda não consigo acreditar que ele tem me enganado desde quando fizemos o financiamento do apartamento, o pior de tudo é que não tenho direito a nada, vou ter que recomeçar do zero. Sem casa para morar, sem móveis, sem dinheiro. Ainda tenho que pensar como e quando contar para meus pais.⸻ Ana, está me ouvindo?⸻ Estou na casa da