O taberneiro tinha reforçado a segurança da prisioneira com ordens categóricas. Ninguém deveria entrar naquela cela a não ser criadas que preparariam a jovem odalisca com roupas transparentes para os leilões orientais. Só o pensamento era capaz de deixar Garro excitado, só que a covardia era mais forte. Não tinha interesse algum em morrer por causa de uma mulher. Richard Morgan não era um oponente com o qual ele apreciaria cruzar espadas. A vingança era doce. Tão logo a mulher fosse comprada e conduzida para qualquer um daqueles haréns, Richard nunca mais a resgataria.
Richard Morgan poderia estar furioso. Ele nunca correria o risco com a vida daquela garota. Não depois de ter descoberto que a infernal garota que todos acreditavam estar morta estava viva. E isso era uma pequena precaução no caso dos planos não saírem bem.O navio de Pirata Sangrento revidou os disparos do ancoradouro principal da ilha como se fizesse qualquer diferença contra aquele fluty com seus cinquenta canhões, morteiros e lançadores de chamas.Garro estava apreensivo. Um encontro com Richard Morgan não lhe trazia boas expectativas mas a chance de vingar-se daquela garota era tentadora demais. Como senão bastasse o Coral Negro também estava em Chabone. A família Morgan costumava dificultar seu domínio ilegal de escravas brancas, causando-lhe perdas financeiras. Mesmo assim. Ah, aquela capitã o humilhara. O patíbulo estava pronto e aguardava o amanhecer para as execuções... Garro relembrava com amargor a ocasião.Richard furioso destruirá a taberna, as senzalas e todo o galpão com estoque de especiarias proeminentes do contrabando.Garro apenas olhava para a mulher consumido de luxúria. Sua intenção nunca tinha sido enforca-la. Pessoalmente ele acorrentara a garota as argolas de ferro na enseada. Assim que a maré subisse Cassie estaria morta.Ele também sabia que Cornor cobiçava o timão do Revenge e detestava a mulher. Só que acima de tudo Garro conhecia a fúria de seu inimigo. Apesar de todo o desejo não era tolo o suficiente para entregar-se ao prazer e ter Richard a sua procura pronto para mata-lo.Ah, de corsária uma reles pirata! Os ventos mudavam sem dúvida. Ele avaliava a reação de seu inimigo ao descobrir depois de tanto tempo que a mulher estava viva. E prisioneira da Ordem da Luz. As melhores notícias falavam sobre artefatos antigos. E quanto mais antigo, mais valioso.Tudo acontecia no momento adequado a seus interesses quando Valerius resolvera propor a barganha.O taberneiro refletia sobre aquilo. Não havia como invadirem a praça da ilha ou o centro do vilarejo. Seus homens de segurança faziam a guarda de forma discreta. E quanto a Philip Morgan... Garro sacudiu a cabeça. Tinha escutado também que a garota que acompanhava o capitão era vítima de uma maldição de sangue dos feiticeiros. Tudo era perfeito. Ele tinha conhecimentos. A suas ordens, os guardas tinham conseguido capturar um jovem feiticeiro integrante da Ordem. O sangue desse rapaz podia ser valioso numa barganha para salvar a vida da filha do comandante. Aquele sangue era muito melhor que salvo conduto garantido pela Armada.Só que o homem confiante não reparou no súbito silêncio ao entrar na taberna e nem no calor que o fogo trazia ao crepitar na lareira do salão da taberna.Havia ordenado que as chaminés fossem limpas pois o inverno se aproximava e a escrava negligente com certeza não se ocupara de seus deveres. Mandaria açoitar a mulher por desobedece-lo, pensou vagamente ao voltar para o conforto do salão.Deteve-se surpreso quando observou a mesa preparada e a garrafa de seu excelente vinho mais caro sobre a toalha de linho impecavelmente branca. Resmungou irritado. Não mandaria apenas açoita-la mas a deixaria amarrada ao tronco.-Acredito que aguardava minha chegada!A voz rouca e grave ecoou no silêncio do salão vazio. Garro praguejou ao estreitar o olhar na penumbra com desconforto crescente.Era uma maldição! Reconhecia o tom de voz baixo e visivelmente aborrecido. Ele tinha passado por seus guardas? Incomodado, a mão de Garro caiu sobre a pistola presa na cintura e parou de súbito. Sem poder se mexer. Totalmente paralisado e sem respirar. A lâmina fria de uma espada lhe comprimia dolorosamente a garganta.-Pensei... pensei...-Desculpe, o que foi que disse? – Richard aliviou a pressão-Pensei que tínhamos um acordo. Tinha ficado muito claro que não voltaria a Chabone! - o homenzinho reclamou e estava bastante nervoso ao conseguir respirar outra vez.Um rosnado irritado sobressaiu a queixa.-Deixe-me pensar...- o capitão do Gaia revirava os olhos. - Ah, aquele mesmo acordo que dizia que você ia ficar longe de minha mulher? – Richard continuou ao sibilar e sua voz era dura como aço.Garro suava. Sua coragem era pouca. Sabia que estava em apuros. Talvez tivesse sido um erro! O suor umedecia suas mãos. Engoliu em seco ao arregalar os olhos aflitos. De repente fazia um calor infernal!-Eu... Eu juro, Ricky. Não encostei nela. É sério. Não toquei mesmo em sua mulher!- Mesmo porque estava arriscado a ser esfaqueado. Sem dó.Aquele homem continuava intratável como sempre. Talvez menos tolerante. Só que a intenção de Garro não era negociar. As ordens de James eram para que os irmãos Morgans estivessem ocupados com o paradeiro de Faith. E ainda havia a questão do dinheiro. Aqueles olhos de ametista eram raros. Valeriam uma fortuna considerável entre os orientais. -Olhe, seja razoável. - o taberneiro defendia-se muito apressado. - Não toquei em sua mulher. Sou um homem de palavra. Richard rosnou, franzindo a testa ao enfrentar o homem assombrado por lembranças. Tinham revirado tudo: taberna, prisão e todo oporão sem nada encontrar. Meneou a cabeça irredutível. -Onde Garro? – rugiu implacável. - Onde está Cassie? Garro suava profusamente. - Ela... ela está viva. Juro a você! - ele falava aos tropeções. A declaraç&at
Meses antes...Richard Morgan O’HARA abaixou a luneta e observou a pequena escuna de longe.O Estrela do Amanhã atacava a embarcação. Podia sentir no ar pesado o cheiro de pólvora. Ele observava os combates armados na tentativa dos tripulantes, que transportavam o contrabando, salvarem a preciosa carga. Uma carga que ele poderia muito bem imaginar o destino: Chabone.No último instante sua mente foi invadida pela recordação de uma pele impecavelmente suave, cabelos ondulantes e rebeldes e lábios tentadores que pareciam como rosas.O cheiro de sangue, pólvora e mar dera lugar a outro: delicado, i
Ele podia sentir a expectativa da batalha aquecer seu sangue. Havia esperado tanto aquele momento. Como comandante passaria mais tempo em terra firme. Teria tempo suficiente para o que mais havia desejado naquele último ano.Iria encontrar aquela garota. Não sonhara com outra coisa naqueles meses. Agora que parecia perto de seu objetivo tudo era irreal.Aquela mulher seria dele. Não daria ouvidas as brincadeiras dos irmãos. A mão involuntariamente tocou o bolso do gibão. Com o lenço bordado. Cassie. Ele a encontraria, nem que fosse preciso fareja-la.Richard Morgan olhou ao redor. Os corsários estavam felizes e sorridentes com a expectativa d
- Não foi o que combinamos. Nosso trato jamais incluir entregar a mulher a um caçador de recompensas. - O homem quase gritava à beira da fúria.O nobre que o encarava ainda vestia as roupas de viagem e fez pouco caso.Thalagar odiava aquele homem. O próprio capitão não era tão diferente dele assim. Ah, maldito fosse Philip Morgan! Na busca pelo poder alguns sacrifícios eram exigidos e tolerados. Tinta trinta e dois anos e era o capitão do Estrela do Amanhã. A vida havia oferecido tudo o que um jovem ambicioso poderia almejar: uma carreira privilegiada e poder. Aliás, quase tudo. Ultimamente o velho Will, seu tio mirava o
Thalagar cerrou os punhos. Não respondeu. Teria que conquistar a confiança de Kassuim... Inferno! Aquilo ia ser difícil depois de tudo. E quanto aos lobos... Se ele fosse descoberto, não seria apenas exilado. Aquilo seria considerado traição. Iriam condena-lo a morte. Talvez...- Vamos. Tudo está sobre controle. Deixe os acontecimentos tomarem saiu rumo. Voltaremos a nos encontrar em Garrone.Thalagar pretendia protestar. Era arriscado para ele. Coçou a testa desanimado. Apenas assentiu.A primeira explosão que atingiu a escuna não chegou a atingir o porão de pólvora, mas avaliou seriame
O capitão revirou os olhos mais insatisfeitos ainda. Não conseguia ver o garoto com as chamas altas que ardiam no convés. Aquilo parecia um inferno. Ele pouco se lembrava daquele garoto durante as reuniões da Armada.Faith ainda passava parte do ano em terra firme no castelo de Escarlate, mas aquele garoto... Ah, ele havia praticamente crescido a bordo do navio. Havia os comentários, era claro. O menino tinha pavio curto, encrenqueiro e era um excelente espadachim. Nunca desistia de uma luta.Um novo estrondo ensurdecedor ecoou. O cheiro ácido de pólvora e enxofre enchia o ar. Outra vez a figura esmirrada amparava golpes da mesma forma que ataca e aquilo era com certeza uma rapineira. Rick estava pasmo. Ele próprio era conhecido por sua perícia com espadas, mas aquele garoto... Seus reflexos e agilidade... Poderia até mesmo ser um lobo, pois não pareciam humanos. Ele poderia se igualar com desen
-Não abandonei o moleque imprestável. Quando puser minhas ...As mãos de Rick Morgan agarraram Cornor pelo colarinho da camisa, mandando pelos ares o restante de sua prudência. O primeiro imediato respirava entre golfadas suspenso no ar vários centímetros, os pés balançando.- Costumo avisar apenas uma vez. - O capitão sibilava. Seus olhos não exibiam mais o profundo azul do céu. Ele era um lobo, estava furioso e seu olhar era dardejante e negro como a noite ao resplandecer ameaçador. – Não vai chegar perto desse garoto. Kassuim está sob minha proteção. O garoto é protegido dos lobos, eu fui bastante claro?O baque surdo do escaler chegou a seus ouvidos ao ser novamente lançado ao mar. E Rick poderia desferir um rosário de infinitas pragas. Ah, Zagorra era homem de confiança de Will. Estaria com certeza morta para expli
Altura baixa, corpo franzino e ombros terrivelmente pequenos. As roupas largas e molhadas apenas acentuavam a aparência frágil. O rosto sujo de fuligem exibia traços tensos apesar do olhar que reluzia com um ódio ferino.Kassuim nada enxergava. Nada via além de Cornor. Ele matara Zagorra. Ignorava toda a dor, mordendo os lábios com força. A dor era dilacerante cada vez que respirava. O curativo improvisado não estava ajudando muito, ainda assim apenas a ira a orientava. Cornor ia pagar. A pedra em seu pescoço começou a se esquentar. Era sempre um problema magia acidental. Coisas simplesmente aconteciam.Ah, iam descobrir que ela era uma mulher. E muito pior. Iam saber que ela era uma feiticeira. Não ia fazer diferença. Ia acabar sangrando até morrer.- Cornor... Eu... Eu vou...Richard Morgan interceptou lhe o caminho e franziu o nariz com o cheiro adocicado que cheg