Larissa ainda sentia o coração aos pulos quando entrou no carro. Suas mãos tremiam levemente no volante, mas o sorriso em seu rosto era impossível de conter. Uma alegria diferente vibrava em seu peito, um tipo de felicidade que fazia tempo que ela não sentia. O peso da vida, das perdas, das responsabilidades... por um momento, tudo parecia ter desaparecido. Era como se o universo tivesse, enfim, lhe devolvido algo.
A chave da antiga casa.
A promessa cumprida.
O carinho silencioso de William.
Tudo pulsava dentro dela com a mesma intensidade de um sonho que se torna real. Dirigia distraída pelas ruas movimentadas, os pensamentos voando para lembranças da infância: o jardim florido, as paredes com desenhos feitos por ela e seu pai, a cozinha onde sua mãe assava bolos nos finais de semana...
Estava tão imersa em suas lembranças que não viu o semáforo mudar.
O som do impacto foi seco e imediato.
O carro deu um tranco para frente, o cinto de segurança a segurou com força contra o banco. A batida não foi grave, apenas um leve toque, mas o suficiente para o estômago despencar e o sangue sumir do rosto de Larissa.
— Meu Deus... — murmurou, os olhos arregalados fitando o carro luxuoso à sua frente.
A lataria impecável agora exibia uma leve marca na traseira, quase imperceptível, mas real. O mundo ao redor pareceu congelar, o som dos carros e das buzinas desapareceu, como se uma bolha de tensão tivesse se formado ao redor dela.
— Isso vai me custar caro... — sussurrou para si, as mãos apertando o volante com força.
Foi quando a porta do outro carro se abriu.
A forma com que a porta se escancarou denunciava a irritação. Larissa sentiu um arrepio subir por sua nuca. Prendeu a respiração, o coração disparado, cada batida ecoando como um tambor dentro do peito.
— E agora...? — pensou, quase sem conseguir se mover.
O homem que saiu do carro caminhava com passos firmes, determinados. Era alto, os ombros largos preenchendo perfeitamente o terno escuro e elegante. A expressão em seu rosto era de pura indignação — maxilar travado, os olhos faiscando sob o sol da tarde. Ele deu a volta pelo carro, conferiu o arranhão com um olhar crítico e depois caminhou em direção ao carro de Larissa com uma presença tão intensa que o ar pareceu pesar.
— Mas que droga! — disparou ele, a voz grave e profunda como um trovão abafado. — Você por acaso não sabe olhar para o sinal antes de acelerar?!
Larissa sentiu o rosto arder, uma onda de nervosismo percorreu seu corpo como eletricidade. Mas o que realmente a atingiu não foi o tom de voz, nem a fúria nos olhos do homem.
Foi aquela voz.
Aquela voz que, de alguma forma, despertou algo adormecido nela. Um som que lhe era exatamente familiar e que ecoava em sua mente com uma força inexplicável.
Engoliu em seco. Respirou fundo. Abriu os olhos, enfrentando o momento com coragem.
E então o viu.
Jacob.
O mundo girou devagar ao redor dela. O homem parado ao lado do carro, agora a observando em silêncio, era mais do que uma figura zangada. Era intensidade pura, envolta em mistério. Os olhos dele encontraram os dela e, por um instante, houve silêncio absoluto.
Jacob também congelou. O olhar furioso deu lugar a uma expressão surpresa, ainda carregada de tensão, mas com algo mais... algo que nem ele soube explicar. Era como se aquela batida tivesse sido orquestrada pelo próprio destino — e nem um dos dois soubesse o que estava prestes a começar.
Jacob ainda estava parado ali. Imóvel. Como uma estátua esculpida em carne e osso, mas cujos olhos ardiam com um fogo estranho, difícil de decifrar. Era como se o tempo ao redor tivesse simplesmente... parado. O som dos carros, das buzinas, das pessoas — tudo parecia distante, como se estivesse acontecendo em outro mundo.
Seus olhos, intensos como uma tempestade prestes a desabar, analisavam cada traço do rosto de Larissa. Era uma observação silenciosa, profunda, que a fez sentir-se vulnerável de um jeito novo. Não havia julgamento naquele olhar, mas também não havia paz. Havia... intensidade. E algo mais. Algo inexplicável.
Então, de repente, a raiva em sua expressão vacilou. Como se algo dentro dele tivesse se rendido por um instante.
Ele não sorriu. Mas a raiva deu lugar a um tom mais contido, mais humano. E quando falou, sua voz veio mais baixa, mais profunda. Quase como se estivesse compartilhando um segredo com ela e com mais ninguém.
— Senhorita Larissa... você está bem?
A maneira como ele disse seu nome... suave, arrastado... como se o saboreasse. Aquilo mexeu com ela. Não era comum alguém dizer seu nome daquele jeito — como se já a conhecesse há muito tempo, como se houvesse história entre eles, mesmo que nunca tivessem tido nada antes.
Larissa piscou algumas vezes, tentando se recompor. Seus sentidos estavam confusos. Era como se algo além da razão se manifestasse ali, naquele encontro inesperado. Ela nunca fora do tipo que se perdia na presença de um homem, mas havia algo em Jacob que desarmava todas as suas defesas. Um magnetismo inexplicável. Um chamado silencioso que ela não conseguia ignorar.
Mesmo com as pernas levemente trêmulas, respirou fundo, destravou o cinto e saiu do carro com o máximo de dignidade que conseguiu reunir.
— Eu sinto muito, senhor Jacob. Eu... — começou a dizer, mas as palavras morreram em sua garganta no instante em que ele se aproximou e, de forma inesperada, pousou a mão sobre seu ombro.
O toque foi firme, mas gentil. E quente.
Larissa sentiu um calor imediato se espalhar pelo corpo. Um arrepio percorreu sua espinha, seguido por um tremor quase imperceptível. Era um gesto simples — um toque — no entanto, algo dentro dela despertou. Como se aquela mão já tivesse estado ali antes. Como se aquele contato já estivesse escrito em algum lugar que ela não sabia nomear.
Jacob, por sua vez, pareceu perceber a reação dela. Seu olhar não vacilou. Mas havia algo novo em seus olhos agora. Um brilho contido. Quase... curioso.
— Fique tranquila. — disse ele, com um leve tom de divertimento misturado à gentileza. — Foi só um arranhão.
Larissa não conseguiu responder de imediato. O ar parecia mais denso, o tempo ainda escorrendo devagar ao redor deles. As palavras dele ressoavam como um eco suave dentro de si.
— Um arranhão... — repetiu mentalmente, embora soubesse que não era só sobre o carro.
Ela se obrigou a desviar o olhar, buscando alguma âncora que a trouxesse de volta à realidade. Mas foi inútil. Havia algo naquele homem... algo no modo como ele a olhava... que a fazia esquecer do mundo.
Jacob deu um passo para trás, os olhos ainda fixos nos dela, e disse:
— Você dirige sempre assim... distraída? Ou é o destino que anda conspirando para que a gente se esbarre desse jeito?
Larissa levantou as sobrancelhas, surpresa com a súbita mudança de tom.
— Está me acusando de ter feito isso de propósito? — tentou brincar, sem muito sucesso. Ainda estava abalada.
— Não. — respondeu ele, com um meio sorriso. O primeiro desde que tudo começou. — Estou dizendo que talvez... só talvez... a gente estivesse mesmo destinado a se encontrar.
Ela sentiu o coração errar um compasso. Destino? Por que aquela palavra, dita por ele, soava tão real?
Larissa desviou o olhar novamente, tentando não se perder naquele enigma chamado Jacob Lauder. Mas, no fundo, uma certeza se formava dentro dela: aquele não era um encontro qualquer.
E aquela batida... não fora um acidente. Fora um ponto de partida.
Jacob inclinou levemente a cabeça, seus olhos deslizando lentamente pelo rosto de Larissa, como se estivesse memorizando cada traço com uma precisão quase poética. O olhar dele parou por um instante em sua boca, depois subiu de volta até os olhos dela, e então um pequeno sorriso se formou em seus lábios — não um sorriso comum, mas aquele tipo que surge quando alguém sabe exatamente o que está fazendo.— Mas seu carro vai precisar de um reparo, — ele disse, com a voz baixa, grave, carregada de uma calma que parecia proposital. — Se algum guarda te parar dirigindo com as luzes assim, quebradas… você pode acabar sendo multada.Ele falava com uma tranquilidade perigosa, como se cada palavra fosse uma isca lançada em direção a ela. E Larissa... não conseguiu se concentrar no que ele dizia. Suas palavras soavam distantes, abafadas pelo som abafado de seu próprio coração acelerado.Porque, na verdade, tudo o que ela sentia era a mão dele.Aquela mão quente ainda repousava sobre seu ombro — u
Larissa retornou ao trabalho com o coração aos pulos e uma sensação curiosa revirando dentro de si — borboletas no estômago, ansiosas, agitadas, como se cada batida do coração fosse um aviso: algo está mudando. Ela tentou focar no que restava do expediente, mas os pensamentos se negavam a cooperar. A imagem de Jacob — seu olhar, sua voz, o toque quente e seguro em seu ombro — voltava à sua mente como um eco doce e perturbador. Ela mal acreditava no que tinha acontecido. Um jantar? Hoje à noite? Como assim?A reunião das 16h, para a qual ela tanto havia se preparado, acabou não sendo sobre o novo chefe, como todos imaginavam. Em vez disso, foi algo ainda mais surpreendente: a Imperium Beauty estava firmando uma nova parceria com uma renomada agência de propaganda, especializada em campanhas de impacto com modelos selecionadas a dedo para representar grandes marcas. A ideia era ousada: trazer novos rostos para dar vida aos produtos da Imperium, tornando-os ainda mais desejados no merc
Antes de sair, Larissa se inclinou e depositou um beijo leve na testa da mãe. Foi um gesto suave, cotidiano, mas que carregava um carinho imenso. Ela sempre foi assim: inteira nas pequenas coisas. Um toque, um olhar, um sorriso.— Não volta tarde, meu bem — disse a mãe, ajeitando uma mecha do cabelo da filha como fazia quando ela era criança.— Prometo, mamãe — respondeu com um meio sorriso, mas seu olhar estava distante, já projetado em outro lugar... em outro alguém.Ao atravessar a porta, Larissa sentiu o ar da noite tocar sua pele, e foi como se o mundo lá fora a chamasse para algo novo, algo que ela ainda não entendia completamente. Caminhou com passos leves, quase dançantes, como se o corpo soubesse algo que a mente ainda não havia traduzido.Havia uma sensação vibrando dentro de si. Ela não sabia se era ansiedade, desejo ou apenas aquele impulso quase inconsciente de finalmente ser vista — não como a filha dedicada, nem como a irmã preocupada, tampouco como a mulher que segura
Ao entrarem no restaurante, Jacob transformou cada gesto em um ritual de elegância e atenção. Caminhava ao lado de Larissa com uma postura impecável, seus olhos atentos a cada movimento dela, como se quisesse guardar cada instante na memória. Assim que chegaram à mesa, ele puxou delicadamente a cadeira para que ela se sentasse e, com um sorriso discreto, lhe ofereceu o cardápio, seus dedos roçando levemente os dela no processo — um toque quase imperceptível, mas que fez o coração de Larissa bater um pouco mais rápido.Ela agradeceu com um sorriso tímido, e enquanto folheava o cardápio, tentando se concentrar entre entradas e pratos principais, sentia o olhar dele pousado sobre si. Jacob a observava com uma doçura contida, como quem admira algo raro, especial. Seus lábios desenhavam um leve sorriso no canto da boca — um sorriso que não era proposital, era instintivo, nascido da satisfação genuína de estar ali com ela.Logo o garçom se aproximou, os pedidos foram feitos, e quando ficara
Depois que Jacob pagou a conta, eles saíram do restaurante. A brisa noturna soprou suave contra o rosto de Larissa, fazendo seus cabelos cacheados dançarem no ar. Jacob, num gesto automático e protetor, abriu a porta do carro para ela e depois contornou o veículo para assumir o volante.No silêncio inicial do trajeto, tocava uma música suave, envolvente. Um jazz instrumental que preenchia o ar com uma atmosfera íntima. Larissa olhava pela janela, mas sentia o olhar dele se voltar para ela vez ou outra. Ela também o observava pelo canto dos olhos — as mãos firmes no volante, a mandíbula forte e relaxada, o cheiro discreto de um perfume amadeirado que misturava charme e mistério.Foi então que Jacob, sem tirar os olhos da estrada, perguntou:— Está tudo bem aí? Ficou quieta de repente...Larissa sorriu, virando-se lentamente para ele.— Estou bem... só estou tentando entender como tudo mudou tão rápido... E agora estou aqui, com você, me sentindo… viva.Jacob olhou para ela, dessa vez s
Enquanto Jacob conduzia o carro pelas ruas silenciosas da cidade, a imagem de Larissa ainda dançava em sua mente — o balanço gracioso do vestido, o sorriso tímido, o calor do toque... Ele sentia o volante sob as mãos e os pensamentos acelerados, como se cada curva o aproximasse não só de casa, mas de algo novo e eletrizante. Foi então que seu celular vibrou contra o painel. O brilho da tela mostrou o nome de sua mãe: Barbara Lauder. Seu coração deu um leve pulo: já passava da meia‑noite, e ela jamais ligava tão tarde. Um pressentimento frio o atingiu. No terceiro toque, ele atendeu, a voz guardando um traço de preocupação. — Oi, mãe! — disse, tentando soar casual. — Aconteceu alguma coisa? Do outro lado da linha, Barbara soava incomum: firme, quase impaciente. — Oi, querido. — Ela fez uma pausa antes de continuar, como quem ensaia cada palavra. — Precisamos conversar. Você poderia almoçar comigo amanhã? Há assuntos importantes… Jacob apertou os dedos contra o volante, preocupado
O céu já tingia-se de tons púrpura quando Jacob estacionou o carro em frente ao restaurante reservado para executivos. Aquele jantar não fazia parte de seus planos pessoais — tratava‑se de uma etapa crucial na consolidação da parceria com os Cokx e outros diretores da Imperium Beauty. Mesmo relutante, ele sabia que precisava estar ali. Ao entrar, foi recebido por olhares formais: Martins Cokx, seu pai; Isabela, a filha obstinada; David Moretti e Nolan Matos, diretores‑executivos da agência de propaganda. Jacob apertou a mão de cada um, oferecendo um sorriso contido, e se acomodou à mesa oval, da qual partiam taças de cristal e sousplats prateados. Logo, a conversa tomou o curso esperado: apresentações de números de vendas, debates sobre a seleção de modelos para a próxima campanha e especulações sobre o retorno de investimento. Martins ofereceu um gole de vinho tinto a Jacob, que agradeceu sem perder muito o foco. Internamente, porém, a mente de Jacob divagava em outra direção — par
O céu pintava-se de dourado quando Jacob estacionou o carro ao lado da trilha que levava ao mirante do Parque Florestal. Havia algo de mágico naquele entardecer: o ar fresco trazia cheiros de terra e folhas, e o canto distante dos pássaros criava uma trilha sonora suave. Larissa desceu do carro, ajeitando a calça jeans justa e a blusa de tricô que delineava suas curvas com simplicidade elegante. Os fios ruivos do cabelo refletiam os últimos raios de sol como candelas acesas.— Está linda — disse Jacob, com um sorriso contido, mas sincero.Ela ergueu o olhar, as bochechas rosadas.— Obrigada… o lugar é perfeito.Ele ofereceu o braço, e ela entrelaçou o dela, sentindo nos dedos a firmeza acolhedora. Começaram a caminhar pela trilha de terra batida, imóveis apenas para permitir que o momento se enraizasse.— Eu sempre gostei de parques — confessou Larissa, a voz suave enchendo o ar de nostalgia. — Mas há tanto tempo não vinha a um que quase esqueci como era respirar assim…Jacob parou p