Jardim.

O sol da manhã entrava timidamente pela fresta da cortina, lançando uma faixa de luz pálida sobre o lado vazio da cama. Hayley acordou com uma sensação de peso no peito, o eco da solidão da noite anterior ainda ressoando em sua mente. Ao seu lado, Marcos já não estava mais. Ela ouviu o barulho do chuveiro no banheiro e suspirou, a lembrança da rejeição da noite anterior ainda fresca e dolorosa.

Ela se levantou lentamente, vestindo o roupão com um nó apertado na cintura, como se tentasse se proteger de um frio interno. Na cozinha, Marcos já estava tomando café, o jornal aberto à sua frente. A interação entre eles foi mínima, um breve "bom dia" murmurado, os olhos evitando o contato. A atmosfera era carregada de uma tensão silenciosa, as palavras não ditas pairando no ar como uma névoa densa.

Depois que Marcos saiu para o trabalho, a casa pareceu ainda mais vazia. Hayley preparou o café da manhã das crianças em piloto automático, a mente distante. A energia contagiante de Lily e a agitação das gêmeas pareciam um tanto dissonantes com o seu próprio humor sombrio.

Mais tarde, depois de levar as crianças para a escola, Hayley decidiu cuidar do jardim da frente. O ar fresco da manhã e o trabalho manual geralmente tinham um efeito terapêutico sobre ela. Enquanto mexia na terra de um dos canteiros, ouviu uma voz suave chamando seu nome.

— Hayley? Bom dia novamente!

Ela se virou e viu Sara caminhando em sua direção, um sorriso caloroso iluminando seu rosto. Ela vestia jeans e uma jaqueta leve, e parecia estar carregando algumas ferramentas de jardinagem.

— Ah, oi, Sara! Bom dia — respondeu Hayley, tentando forçar um sorriso amigável.

— Aproveitando a manhã para cuidar do jardim? Que bom! Eu estava justamente pensando em fazer o mesmo no nosso. Essa grama precisa de um trato urgente — Sara riu levemente, gesticulando para o gramado ainda irregular da casa ao lado.

— Sim, é uma boa maneira de começar o dia — Hayley respondeu, voltando a mexer na terra, um pouco hesitante em iniciar uma conversa mais longa.

Sara se aproximou, apoiando-se na cerca que dividia as propriedades.

— E o David? Já conseguiu organizar muita coisa ontem? — perguntou Hayley, a curiosidade falando mais alto.

O sorriso de Sara pareceu vacilar por um instante, quase imperceptível.

— Ah, sim. Ele está... bem ocupado hoje. Teve algumas ligações de trabalho logo cedo e precisou resolver algumas coisas. Sabe como é mudança, sempre surge algum imprevisto.

Havia algo no tom de Sara, talvez um leve desvio de olhar, que chamou a atenção de Hayley. Nada de alarmante, mas uma pequena nota dissonante em sua voz amigável.

— Ah, sim, imagino — respondeu Hayley, voltando sua atenção para as flores, uma ponta de curiosidade começando a surgir. O que exatamente mantinha David tão ocupado no dia seguinte à mudança?

Sara pareceu notar a breve hesitação de Hayley e rapidamente retomou a conversa, mudando de assunto com uma desenvoltura quase ensaiada.

— Mas e você, Hayley? Algum plano para o resto do dia? As crianças estão na escola, certo? Aproveite para relaxar um pouco. Eu sei como é ter quatro pequenos correndo pela casa.

— Ah, sim, geralmente tento colocar a casa em ordem ou fazer algumas coisas que não consigo com eles por perto — Hayley respondeu, o tom um pouco automático. Ela ainda estava pensando na resposta evasiva de Sara sobre David.

— Se precisar de alguma ajuda com as crianças algum dia, nem hesite em me chamar — ofereceu Sara, o sorriso retornando ao seu rosto. — Ainda não temos nossos móveis todos organizados, mas com certeza terei tempo livre em breve.

— Obrigada, Sara, é muito gentil da sua parte — Hayley respondeu, sentindo um misto de gratidão e uma leve cautela. Havia algo genuíno na oferta de Sara, mas a pequena hesitação anterior ainda a incomodava.

A conversa fluiu por mais alguns minutos, sobre amenidades do bairro, a dificuldade de encontrar um bom supermercado na região e a previsão do tempo. Sara se mostrou uma vizinha agradável e prestativa, mas Hayley não conseguia afastar a sensação de que havia algo não dito, uma camada sutil sob a superfície daquela cordialidade.

Quando Sara mencionou que precisava voltar para dentro para ajudar David com algumas caixas "delicadas", Hayley sentiu a oportunidade de sondar um pouco mais.

— Caixas delicadas? Algo especial?

Sara riu levemente. — Ah, sabe como é mudança, né? Algumas coisas de valor sentimental, outras um pouco... peculiares. Nada demais.

A resposta vaga não satisfez a curiosidade de Hayley, mas ela não quis parecer intrometida. Elas se despediram com a promessa de se falarem mais tarde, e Hayley voltou a cuidar de suas plantas, a mente agora um pouco mais inquieta.

O resto da manhã passou em um ritmo lento e pensativo. Hayley tentou se concentrar nas tarefas domésticas, mas a imagem de David "ocupado" e a evasividade de Sara pairavam em sua mente. Ela se pegou olhando para a casa vizinha várias vezes, tentando vislumbrar algum movimento, alguma pista sobre o que poderia estar acontecendo lá dentro.

Na hora de buscar as crianças na escola, Hayley notou que o caminhão de mudança ainda estava estacionado, embora parecesse ainda mais vazio. Ela não viu Sara ou David.

À tarde, enquanto as crianças brincavam no jardim, Hayley observou discretamente a casa vizinha. As cortinas estavam fechadas, e não havia sinais de atividade. A sensação de mistério em torno de seus novos vizinhos começava a se intensificar.

À noite, quando Marcos chegou do trabalho, Hayley tentou agir normalmente, mas a distância entre eles ainda era palpável. Durante o jantar, ela mencionou brevemente a conversa com Sara pela manhã.

— Ela pareceu simpática — comentou Hayley, observando a reação de Marcos.

— Hmm, que bom — respondeu ele, concentrado na comida.

— Ela disse que David estava bem ocupado com o trabalho hoje. Logo depois da mudança... parece estranho, não acha?

Marcos finalmente levantou os olhos, um leve franzir de testa. — Talvez ele trabalhe remotamente? Ou tenha algum negócio que pode ser tocado de qualquer lugar. Não pense muito nisso, Hayley.

A resposta dismissiva de Marcos a frustrou. Ele parecia tão absorto em seu próprio mundo que não demonstrava interesse em nada que acontecesse ao seu redor, nem mesmo a chegada de novos vizinhos.

Mais tarde, antes de dormir, Hayley se pegou olhando novamente pela janela, para a casa escura ao lado. A curiosidade sobre David e o que ele tanto fazia a consumia. A evasividade de Sara, a falta de sinais de uma mudança normal... tudo isso somado criava uma sensação crescente de que havia algo mais acontecendo ali, algo que ela não conseguia decifrar.

Na cama, ao lado de Marcos, que já dormia profundamente, Hayley sentia-se mais uma vez sozinha em seus pensamentos. A imagem de David, a força silenciosa que ela havia brevemente vislumbrado, contrastava com a indiferença de seu próprio marido. Uma pergunta silenciosa ecoava em sua mente: quem eram realmente seus novos vizinhos e como sua chegada impactaria suas vidas? O mistério pairava no ar, denso e intrigante, prenunciando que a tranquilidade daquela rua suburbana poderia estar prestes a ser irremediavelmente quebrada.

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