Aiyra Tudo em mim grita para ir até seus braços, me enredar em seu calor e deixar que os anos longe um do outro cessem esse constante vazio que me cerca o peito, mas sei que existem questões bem mais sérias aqui.— Aiyra... — ele sussurra novamente, o peito subindo e descendo com força, começando a hiperventilar.Ethan fica me encarando, as lágrimas descendo livres por seu rosto, acentuando ainda mais a certeza que eu o quebrei de formas irreparáveis.Minhas sobrancelhas se franzem quando Ethan fica pálido, a respiração se tornando rasa e dificultosa.Ah, merda... ele está tendo uma crise de pânico.O mais rápido que consigo saio do carro, com uma pequena tesoura. Abro com tudo a porta do banco do passageiro, me sento ao seu lado e corto a braçadeira que o prende. Ethan não percebe muito o que fiz, pois, seus olhos conturbados se abrem e fecham, como se ele estivesse tentando se conectar com a realidade.Ethan teve muitas dessas crises de pânico quando adolescente, a pressão que ele
Aiyra“A neve caia obstinada ao nosso redor e os dedos magros e longos de Ethan batiam no painel do carro com irritação. Ele me avisou umas dez vezes que iria nevar, mas querendo provar meu ponto eu enrolei o máximo que consegui no banho. Eu não sei o que me fez agir como uma pirralha mesquinha, mas eu o fiz mesmo assim. Ethan tem uma reunião em uma das melhores faculdades do estado e isso pode definir todo o curso da carreira dele daqui por diante. Eu sei que o pai dele pode conseguir a vaga na faculdade onde ele quiser, mas sei também que Ethan quer conseguir por si mesmo, ele quer provar para o pai que consegue.Essa reunião deveria começar em quinze minutos. Com o engarrafamento só piorando por conta da neve nós nunca vamos chegar a tempo. — É isso, não vai dar tempo. — Ethan anunciou, o rosto cedendo a um desânimo desolador. Eu lembro que na época eu ainda estava em guerra com meus hormônios e talvez deve ter sido por isso que eu comecei a chorar, o fato de que eu em breve, me
AiyraSegurando uma xícara fumegante de café eu observo as crianças brincarem com Merlim, que mostra agora a barriga obediente a Ben. Yana está ao lado dele, balbuciando algo que deveria ser fofo, mas que no mínimo é engraçado.Eu vou ter que conversar com eles. Ontem depois que relaxei ao lado de Live, criei coragem e mandei ao Ethan o meu endereço. Marquei um horário razoável perto da hora do almoço. Uma agitação nervosa me obriga a respirar fundo. Se eu não os preparar direito, as chances de isso dar errado são enormes. Isobell desliza para a banqueta ao meu lado, seus olhos acompanhando a interação encantadora das crianças com uma expressão abobada que provavelmente espelha a minha. Uma percepção assustadora me atinge ao fitar os seus cabelos acobreados que caem em ondas selvagens pelo rosto delicado.Ela os ama como se fossem seus filhos. Desde que eles estavam em meu ventre ela cuidou deles e o tem feito sempre.Espero algum sentimento de posse ou ciúme me invadir, mas só sin
AiyraSe eu achava que tinha alguma possibilidade de algum deles não se habituar a Ethan eu estava completamente enganada. Em menos de uma hora eu já vi os olhos exigentes de Yana pedirem toda a atenção do pai e Ben começar a pedir colo, do mesmo jeito que ele faz comigo.Os pratos de filé de salmão com verduras que preparei já estão vazios sobre a mesa e eu fico observando a forma como o laço entre eles parece ficar mais forte a cada minuto. Não é como se não houvesse problemas no futuro ou alinhamentos que Ethan terá que fazer para tornar a convivência entre eles mais normal, mas para um primeiro encontro, eu diria que é um sucesso.Perco-me na conversa que se desenrola entre eles e começo a retirar os pratos. Distraída, eu deixo que os três tenham o seu momento a sós, levando o meu tempo para organizar a cozinha bagunçada pelo meu preparo do almoço.Retiro da geladeira a torta que comprei por delivery na cafeteria de Live e caminho para a bancada, me sentindo um pouco leve. Não é c
AiyraO percurso até onde Heiko vai estar começa a ficar longo e olho pela janela do carro, percebendo como estamos nos afastando do centro, afastando muito.Depois de mais de uma hora no carro eu olho para Kiler, a curiosidade me vencendo.— É muito mais longe que isso, Kiler?Ele desvia o olhar da estrada por só alguns segundos e depois volta a dirigir, uma mão no volante e a outra repousando em sua própria coxa.— O que vamos fazer lá requer um espaço tranquilo para trabalho e em Nova Iorque temos muitos ouvidos e olhos atentos para isso. — Kiler me responde, algo sombrio pesando em sua expressão.Um pensamento arredio perpassa em minha cabeça.— Quando você diz que Heiko vai interrogar, no que isso implica exatamente? — volto a perguntar, minha voz hesitante.Kiler aperta um pouco mais o volante e não me olha ao responder:— Acho que Heiko sempre te deixou a margem do que realmente fazemos, Aiyra. — Ele balança a cabeça — Imagine o seguinte: se nós perguntarmos ao cara uma coisa e
AiyraUm mês depoisEnquanto deixo as crianças no novo apartamento de Ethan percebo que algo mudou desde aquela noite entre nós. Não há declarações de amor ou rendições de lascívias escaldantes, mas agora, enquanto eu o sigo porta adentro do apartamento, eu notei pela primeira vez que ele não me olha como se eu fosse a pior decepção da sua vida.Uma melhora, ao menos.As crianças seguem a minha frente, Merlim já bem crescido para apenas um filhote, obedientemente, em uma guia que Ben segura.Tivemos alguns contratempos semanas atrás com a energia inesgotável do cão, mas seguindo as instruções do adestrador, nós conseguimos contornar a situação.Essa é a primeira vez que eu os deixo com Ethan, ao invés dele ir até o nosso apartamento e não tenho grandes preocupações se eles vão ficar bem, pois Ethan tem se mostrado um pai de fazer babar.Ele já sabe os gostos, as manias e até o exato jeito de parar as birras de Yana ou de fazer com que Ben reaja as suas perguntas.Estar na mesma sala q
EthanBen me entrega a última peça do quebra-cabeça com um olhar orgulhoso.Tão parecidos com os da mãe.Tento controlar o assombro em meu rosto, mas acredito que não me saio muito bem. Ele completou um quebra-cabeça daqueles de te deixar bravo de tão difíceis que são, em menos de uma hora.A questão da fala é um ponto a se atentar, mas não acredito que o vá prejudicar até que ele comece a socializar com outras crianças além de Yana.E esse é o outro problema. Já cheguei a conversar com Aiyra sobre os colocar na pré-escola, mas ela não confia em deixa-los em nenhuma instituição por aqui e eu entendo sua desconfiança, depois do que ela passou seria normal se não confiasse nem na própria sombra.Tenho sido um idiota com ela por não ter confiado em mim, mas eu entendo que deva ser difícil.Podemos talvez contratar algum educador particular, pois obviamente meus filhos tem um potencial gigantesco, mesmo que eu não seja o pai mais babão dessa terra.Tendo recebido a mensagem de Aiyra mai
AiyraEthan retira o braço de cima de mim e eu tento não parecer tão decepcionada com isso. Ele se senta na cama, os olhos avermelhados descendo para minha perna firmemente enfaixada e eu sigo o seu olhar, percebendo que eu fui trocada e limpa.Por Deus... que tenha sido Isobell. Não há nada que Ethan já não tenha visto, mas há uma certa insegurança no fato de ele me ver no meu pior.— A bala se alojou em um músculo e o médico disse que levaria um bom tempo até que sua cicatrização se complete, então decidimos que você ficaria comigo, enquanto isso. — Ethan me diz, seu olhar se cravando no meu, esperando minha reação.— Vocês decidiram, então? — Pergunto, não conseguindo conter o sarcasmo.— Você estava apagada e assim ficará melhor para que as crianças não fiquem preocupadas. — Ele me responde, a voz tranquila.— Eles me viram assim? — Indago, imaginando o desespero delas.— Não. Ainda não, mas teremos que deixá-los vê-la logo. Yana já começou a ficar mais birrenta que o normal e Ben