03

Desta vez, a viagem prosseguiu tranquila, e após alguns dias, Richard finalmente chegou ao condado de Burlington.

Logo, foram recebidos pelos empregados da propriedade e pelos parentes que aguardavam ansiosos. Loretta ficou aflita e nervosa, quando soube do que poderia ter acontecido com Richard durante a viagem, porém, passada toda a sua preocupação, ao constatar que agora estavam todos bem, ela também ficou radiante com as novas peças de arte para a sua galeria pessoal, mas, sua alegria foi realmente incomparável ao saber do acordo de casamento entre Richard e o duque de Rothesay. Sua filha, sua amada Hazel, seria nada menos que uma duquesa, e ela não merecia nada inferior a isso.

Hazel, por outro lado, não pareceu tão exultante com a menção daquele acordo. Sabia que mais cedo ou mais tarde algo do tipo iria acontecer, seu pai já estava há algum tempo analisando diversas propostas e a ela somente restava obedecer e aceitar o que o conde julgasse ser o melhor para o seu futuro.

O que a amedrontava, no entanto, era o fato de ninguém, em todo o condado, lhe dizer nada a respeito do seu noivo, nem mesmo suas irmãs mais novas, que eram as maiores fofoqueiras, sabiam que existia um tal duque de Rothesay. Mas, seu pai havia prometido que ao final da colheita ele deveria vir até Burlington para conhecê-la e corteja-la devidamente.

Foram quase três meses até o final deste período de colhimento, e durante todo este tempo, Loretta, acima de qualquer pessoa, parecia ansiosa para o grande encontro, como ela própria costumava chamar a chegada de Arthur, e providenciava novos vestidos, fitas e chapéus para Hazel, uma nova decoração para o principal quarto de hóspedes da propriedade, onde ele deveria ficar hospedado, programava os cardápios, os entretenimentos, e até cogitava oferecer um pequeno baile com os vizinhos influentes mais próximos, apenas para celebrar o momento.

No entanto, todos os seus planos foram por água abaixo, quando próximo a data marcada, o conde recebeu uma missiva com o selo do duque, informando que devido algumas complicações com relação as plantações que foram invadidas por pragas, e colocariam em risco a economia de vários vilarejos ligados a Rothesay, ele teria que adiar a sua visita. disse ainda, que faria todo o possível para estar em Londres durante a próxima temporada, mas que ainda não estava completamente certo sobre isso.

Para demonstrar que o seu interesse real pelo noivado acordado entre ele e o conde, ainda permanecia, Arthur também enviou, juntamente com a missiva, uma caixinha de veludo delicada, com uma pulseira de esmeraldas, delicadamente lapidadas, com pequenos diamantes cravejados ao redor de cada uma delas. Uma peça valiosa e de excelente bom gosto, mas, para família Stafford, jamais substituiria a presença dele ali.

Com o início da nova temporada Londrina, as esperanças da condessa se depositaram numa possível aparição do duque em Londres, e justamente por este motivo, partiram mais cedo para a capital, onde uma nova onda de preparações para um possível encontro com Arthur, começou a ser realizada. Loretta também aproveitou a oportunidade para falar para toda a sociedade sobre a mais nova notícia, e logo, todos comentavam incrédulos, sobre um possível casamento entre o recluso duque de Rothesay e a filha do conde de Burlington.

Assim como as irmãs de Hazel, a maioria das jovens mocinhas na capital, sequer sabiam que existia um duque de Rothesay, mas, conforme os boatos sobre o casamento foram aumentando, novas fofocas e informações sobre o homem misterioso voltaram a tona, e infelizmente a maioria delas deixavam o coração da jovem noiva ainda mais apreensivo.

- você está noiva do duque vampiro?

- ele nunca sai de casa, dizem que é alejado e tão feio quanto o mostro de Notre Dame.

- coitadinha de você, lady Stafford, será uma duquesa, mas, a troco de quê?

- minha mãe disse que ele tem idade para ser seu avô e sofre de gota, por isso ninguém o vê em Londres.

Era um boato atrás do outro, e por mais que o conde lhe assegurasse de que não passavam de fofocas infundadas, Hazel se perguntava se o fato de o seu noivo se tratar de um duque, não influenciava na defesa do seu pai ao mesmo, pois era exatamente por isso que a sua mãe o defendia com unhas e dentes. Para Loretta, tudo o que diziam de forma negativa sobre Arthur ou sobre o seu noivado, não passavam de falatórios por inveja incontida.

E estes falatórios aumentaram ainda mais, quando os meses foram se passando e ele não apareceu na cidade.

Tantos vestidos novos e fitas de seda comprados em vão, reclamava a condessa desconsolada. E quando faltavam poucos dias para a temporada oficialmente encerrar, o conde mais uma vez recebeu uma carta de desculpas com o selo do duque, acompanhada de uma gargantilha de diamantes. A novidade desta vez, foi uma pequena missiva destinada a própria Hazel, poucas palavras de desculpas e um desejo nada sincero de querer encontra-la em breve, ela sequer se deu o trabalho de respondê-lo.

Era bem verdade que a jovem não ansiava por aquele casamento, mas, esperava, no mínimo, ser cortejada de forma correta, e era um tanto aborrecido e humilhante o fato de que ele não se esforçava para conhecê-la, como se para ele não importasse quem ela realmente era.

Nos meses seguintes, novamente no condado de Burlington, Hazel passou a receber cartas regulares do noivo. Uma letra formal e bonita, com poucas palavras, mas que não expressavam sentimentos nenhum.

" Espero poder vê-la em breve, tenho andado um tanto ocupado."

" O ducado ainda exige a minha atenção, em breve poderemos nos conhecer."

" Espero que goste das ametistas, esta é uma antiga jóia de família e agora será sua."

Suas irmãs suspiravam com cada palavra, mas Hazel apenas se aborrecia, e as jóias em nada a recomfortavam, pelo contrário, sentia-se comprada por uma gargantilha ou uma pulseira. Como ele poderia julga-la por esse tipo de mulher, que se deslumbra com um presente caro? Ele não sabia nada sobre ela, e no que dependesse da sua vontade, continuaria assim. Nunca ousou lhe responder nenhuma carta, ou sequer agradecer pelos presentes. Apenas o conde o fazia, quando escrevia buscando apressar uma data para o encontro.

Enfim, mais uma temporada de bailes veio e se findou, mais falatórios surgiam sobre o futuro casamento, e entre os mais maldosos, havia quem comentasse que o duque nunca a propôs nada, e que a sua família alimentava uma mentira, buscando apenas chamar atenção, ao caminhar pelos salões de baile, Hazel podia ouvir os risinhos debochados as suas costas e também notava o olhar de dúvidas lançados a condessa, quando esta falava com qualquer outra lady a respeito do futuro e grandioso casamento da filha.

- papai, eu imploro, escreva para este duque recluso e ponha um final neste acordo. Eu aceitarei de bom grado qualquer noivo que o senhor aprovar, mas, ele sequer deseja me conhecer. Como poderá ser um bom marido?

- o duque é reservado, e passou por uma série de infelicidades que coincidiram com as datas em que viria corteja-la, mas eu o conheci e tenho falado com ele constantemente pelas cartas. Sei que é um bom homem.

- então suas cartas têm mais do que cinco palavras?

- eu não preciso de um grande texto, querida. Ele se preocupa com os empregados e com os moradores mais humildes do ducado, se envolve pessoalmente para resolver os problemas deles. Assim que puder, ele estará aqui.

- mas, papai...

- já chega, Hazel! É a minha palavra final.

Dentro de Hazel, a sua indignação crescia e ela até já tentara de diversas formas sair daquele enlace, mas, suas súplicas e choros não surtiram efeito algum na decisão de Richard. Para ele, uma vez que a sua palavra fora dada, não havia como voltar atrás, porém, mesmo o conde, já estava convencido a por um fim em todo aquele papelão e estipular um prazo final, para que o casal pudesse, enfim se conhecer, noivar e casar.

Decidido, Richard Stafford, escreveu uma carta ao duque, que mais parecia uma intimação para o baile que a condessa realizaria na mansão da família em Londres, e sem cerimônias, sugeriu que durante  este mesmo baile, o noivado fosse formalmente anunciado a sociedade, afinal, já faziam quase dois anos, desde que firmaram o acordo, e sua família tinha uma reputação a zelar.

Para o conde, se o duque não queria honrar com a sua palavra, seria melhor que falasse de uma vez, isto seria um baque enorme na vida de Hazel, e seria muito difícil conseguir um novo casamento vantajoso quando toda a sociedade parecia rir dela pelas costas, porém, até isso era melhor do que continuar naquela situação de dúvida.

Algum tempo depois, a resposta de Arthur finalmente chegou, dessa vez acompanhada de uma jóia de valor inestimável, uma tiara com pedras enormes e muitos diamantes cravejados. Quando viu uma jóia tão valiosa, ao invés de se alegrar, o conde se entristeceu, só poderia imaginar que o seu valor deveria ser para recompensar uma resposta negativa, ou um arrependimento sem explicações aparentes por parte de Arthur, mas, quando tomou coragem e finalmente abriu a resposta em suas mãos, ele sorriu aliviado. O acordo permanecia de pé e o duque já se preparava para estar presente em sua festa de noivado.

Resignada, Hazel apenas obedecia as ordens dos pais, assim como foi educada para fazer durante a vida inteira, mas por dentro,o seu coração se aflingia um pouco mais a cada dia e a sua mente criava pensamentos que nunca tinha cogitado antes. Pensamentos de liberdade, um desejo quase que incontrolável de fazer aquilo que desejasse, pelo menos uma vez na vida, sem ter que se Justificar ou se sujeitar às vontades de alguém, ou ao que diziam ser o melhor para si. Tinha que ser sempre obediente aos pais, e em breve, teria que ser obediente a um marido que nem mesmo conhecia. Este sentimento de impotência diante da própria vida a estava sufocando e a menção do seu noivado em poucos dias, deixavam todos os seus sentimentos ainda mais aflorados. Alguma parte de si estava disposta a se rebelar contra tudo aquilo e impor as próprias regras sobre a sua vida, por outro lado, seu consciente, treinado para apenas obedecer ordens, procurava algum propósito no qual se agarrar e se fortalecer, algo pelo que valesse a pena ignorar todas as regras e fugir de tudo aquilo para finalmente ser dona da própria realidade

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