Mundo de ficçãoIniciar sessão
Outro carro passou em velocidade, levantando a poeira, fazendo com que os cinco rapazes que caminhavam no acostamento fechassem os olhos. A Rodovia Miguel Melhado Campos parecia não ter fim e não fosse a sombra das árvores da margem direita da pista, todos eles já estariam sofrendo as consequências da insolação. Por várias vezes ficaram tentados a beber a água do Rio Capivari que corria a algumas centenas de metros da estrada. O horizonte não era nada animador, após horas de caminhada a paisagem continuava quase inalterada, de um lado o rio e vestígios da mata atlântica, do outro um descampado e eventuais indústrias.
Paulinho não conseguia acompanhar os outros, apesar de realizar os mesmos treinamentos exaustivos que seus companheiros, além de sua constituição ser mais franzina, sofria de rinite e a crise de espirros e tosse que o acometi
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Os três casais estavam sentados na grande mesa da sala de jantar. O cômodo estava bem iluminado pelo grande lustre central repleto de pequenas lâmpadas que imitavam o formato de velas. Não eram os únicos na casa. Da sala era possível ouvir o volume exageradamente alto do televisor. Uma toalha verde aveludada cobria toda a mesa e um deles distribuía cartas que escorregavam pela mesa com suavidade.- Oito, nove, dez, onze! Que é isso? Não precisa conferir!Aquela a seu lado esquerdo também empilhava dois pequenos montes com onze cartas cada. Soltou um silvo ao perceber que sobraram poucas em sua mão e todos na mesa riram.- Não foi dessa vez!
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Tentou girar a chave na porta pela primeira vez sem sucesso, empurrou a porta e repetiu o processo, a mesma resistência. Pela terceira vez, puxou o trinco em sua direção enquanto tentava girar a chave, uma, duas voltas. Estranho, a Simone deve ter deixado a chave na posição errada. Entrou em casa e pelo cheiro já sabia que sua mulher não estava, quinta-feira? Ela deve estar no centro espírita, estaria praticamente sozinho, posto que sua sogra, com uma idade surpreendentemente avançada, quase nunca saía do quarto.
Parte III - Ambição Perdida - 38
“Todas as pessoas sonham, mas não sonham da mesma forma. Há aqueles que sonham durante a noite, nos poeirentos recessos de suas mentes, para acordar de manhã e descobrir que era tudo vaidade. Mas os que sonham acordados são pessoas perigosas, pois eles sonham seus sonhos de olhos abertos e fazem com que eles se tornem realidade”.(T.E. Lawrence – Os sete pilares da sabedoria) Quem conheceu Angabaíba antes de 2013 e tivesse retornado para ela naquele mês de abril sentiria de imediato a estranheza: a certeza de que tudo estava errado. As ruas
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Algumas construções são atemporais. Após a revolução industrial do século XVIII o processo de urbanização se espalhou pelo mundo, corroendo as fundações do tradicionalismo. Os imponentes castelos entraram em decadência enquanto a burguesia construía suntuosos palacetes. Mas o desenvolvimento continuava acelerado e os palacetes cederam espaço para as mansões que logo foram derrubadas para a construção de grandes edifícios. Nas palavras de Marx: Tudo o que é sólido desmancha no ar. Mas mesmo assim, algumas construções escapam ao processo. Talvez por terem sido construídas sem o objetivo de serem bonitas, mas apenas com a ambição de serem funcionais, adquiriram a capacidade
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Aquele de óculos, com a expressão séria e resoluta no rosto, estava em pé, em frente a seu lugar, na cabeceira da mesa, enquanto as outras nove pessoas, acomodadas na grande mesa, aguardavam seu discurso. Atrás dele, era possível identificar uma pintura de Theodore de Bry, representando indígenas, homens e mulheres, nus, ao redor de uma fogueira, banqueteando-se com carne humana. Ao fundo da imagem, Hans Staden assiste a cena, chocado. Após pigarrear, aquele de óculos começou a falar: -
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Depois do desaparecimento de Márcio muitas coisas mudaram na vida de Gustavo. Da pior maneira possível, ele percebeu o quanto aquele homem a quem ele odiava era importante no seu dia a dia. Não de maneira afetiva, Gustavo não sentia nenhum pesar pelo desaparecimento do homem, mas de outro modo, Márcio estava presente em quase todas as esferas de relacionamento e convivência dos últimos dez anos. Gustavo não teve coragem para contar a sua mãe que acreditava que seu chefe e, agora ele sabia, futuro padrasto, provavelmente não estava desaparecido e sim morto. Em seu depoimento para a polícia, contou que foi chamado à locadora por outro funcionário e quando ch
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O grupo composto por Cibele, Paulo e mais onze pessoas conversava animadamente, enquanto se embrenhava em um bairro antigo, cheio de ruas sinuosas e onde os quarteirões jamais eram quadrados. Nenhum deles parecia ter certeza de estar no caminho certo. Para um observador externo, aquele era apenas um grupo comum de jovens animados caminhando para algum evento cultural, e poderia mesmo ser assim, mas os acontecimentos recentes de Angabaíba alteraram radicalmente o destino de cada um deles. Sem exceção, as histórias eram como a de Hernani e Janaína, irmãos, antigos colegas de escola de Paulo. Anos atrás assim como o Iann, o irmão mais velho, optaram por ficar
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A primeira quadra poliesportiva da cidade levava o nome de um já falecido atleta local, Humberto Grossi, o Betão, foi construída no início da década de setenta, durante o governo do presidente Médici e, apesar de a Ditadura Militar mal ter sido sentida pela então minúscula e interiorana cidade de Angabaíba, sua arquitetura refletia a austeridade do regime, muito concreto por todos os lados, todas as entradas de ar e luz eram amplas, mas ficavam fora do alcance. Um lugar muito bom para a diversão com a incrível capacidade de se transformar em um campo de concentração antes que as pessoas de dentro percebessem o que estava acontecendo. Era terça-feira, dia dezesseis de abril e nenhuma atividade esportiva estava programada, mas um grande número de pessoas fluía para o lado de dentro do Betão cruzando as duas amplas portas duplas