02. A PIOR TRAIÇÃO

VALERIA

Ele me morde com ferocidade na coxa e me arrasta para debaixo de seu corpo, controlando-me sem piedade.

Tento resistir, pedir ajuda, minhas mãos sobre meu ventre, tentando proteger meu filhote, mas suas garras, como armas mortais, perfuram minha pele, destroçando todo meu pequeno corpo vulnerável.

Preciso levantar os braços por instinto quando suas garras afiadas se dirigem ao meu rosto, e grito em agonia por causa de uma ferida profunda que atravessa minha bochecha desde a testa.

Ao deixar minha barriga exposta, ele investiu contra nosso filho.

— NÃO! O filhote, não! Por favor, Dorian, MEU FILHO NÃO!

As lágrimas caíam incessantemente dos meus olhos enquanto eu o suplicava, mas seus caninos devoravam minha carne, e suas garras procuravam, friamente, nas profundezas das minhas entranhas, arrancar a vida que eu carregava.

Não sei quanto tempo durou essa agonia; soluçava, implorando enquanto ainda conseguia falar.

A dor em todo meu corpo era insuportável, mas a da minha alma, que sangrava despedaçada, era ainda pior.

Estava jogada no chão como lixo, à beira do precipício, minha consciência quase me abandonando pela dor, mas então o vi se transformando em sua forma humana.

— Achou que ia me prender para sempre, idiota! — ele grita, enraivecido.

Seus olhos frios e repugnantes, como eu nunca os tinha visto antes.

— Você realmente achou que eu te amava, que eu queria um filho com você? Desperdício! — ele me chuta com raiva, mas eu não tenho nem forças para gemer de dor.

— TRÊS MALDITOS ANOS SEPARADO DA MINHA VERDADEIRA MATE POR SUA CULPA! — ele ruge com todo o ódio que guardou contra mim por todo esse tempo.

— Por… quê…? — consigo mal articular, sinto meu rosto inchado, minha língua pesada e minha garganta com uma ferida profunda de onde escorre sangue.

— Porque você chegou à matilha, a órfã infeliz, e a bruxa velha estúpida disse que você daria os melhores Alfas, poderosos, que elevariam minha linhagem.

— Pura besteira daquela velha louca, mas minha mãe acreditou e me obrigou a renunciar à minha mulher por você, porque você se encantou comigo! Três malditos anos ela me deu para engravidar você. Esse era nosso acordo, se você não conseguisse, eu poderia ser livre!

— Então, hoje, pronto para me libertar de um obstáculo como você, você aparece com um bastardo no ventre — ele ri como um psicopata.

— Não vou deixar que você estrague minha vida de novo, Valeria, é o fim!

Ele caminha em minha direção e vejo a morte de perto.

Quero dizer tantas coisas…

“Eu não sabia que você já amava outra pessoa. Eu era apenas uma jovem iludida e apaixonada, mas nunca te obriguei a corresponder. Como você pôde me enganar e fingir esse tempo todo? Nosso filho… como você pôde… como pôde fazer isso…?”

Sinto tanta impotência enquanto soluço, jogada no chão, ensanguentada e moribunda.

Gostaria de poder me conectar com seu lobo, desabafar, gritar por essa injustiça, mas nem isso posso fazer; não tenho uma loba interior, só posso transformar meu corpo em uma e fingir.

Alguns dizem que foi um trauma devido à morte violenta dos meus pais, onde apenas eu sobrevivi.

Outros disseram que é uma maldição, mas eu sei que não é verdade, nunca senti nenhum espírito de loba dentro de mim.

— Adeus, querida esposa, parece que você não era tão especial, afinal — ele diz cinicamente e com o pé, me chuta para o abismo.

A última coisa que sei é que estou caindo no vazio frio.

Olho para o céu escuro e as sombras de corvos voando sobre minha cabeça, como mensageiros da morte.

“Desculpe, bebê, eu não consegui te proteger.”

*****

«Por que as feridas dela não estão cicatrizando bem?»

«Não posso desperdiçar o sangue da matilha em uma desconhecida; já basta que Jake a resgatou da floresta sem dono. Ela tem que se curar sozinha.»

«A verdade é que não sei nem como essa mulher ainda está viva, coitadinha, a destruição em seu corpo é horrível, mas mais ainda em seu ventre e em… seu rosto.»

Eu ouvia vozes falando perto de mim, mãos que me examinavam, uma dor agonizante, pior que a morte, percorria todo o meu corpo, me levando da consciência à inconsciência.

Não sei quanto tempo se passou, nem onde estou, mas abro os olhos e vejo um teto branco.

Olho ao redor e é um quartinho pequeno, estou em uma cama individual.

— Você está acordada? — uma voz feminina fala de repente ao meu lado, e vejo um rosto desconhecido.

Tento falar, mas por alguma razão não consigo; é como se minhas cordas vocais não respondessem.

— Não se esforce, calma, você… acho que não poderá falar agora devido à ferida que tem no pescoço — ela me olha com um olhar complicado.

Então minha mente embaçada se lembra, lembra de tudo, e a primeira coisa que faço é levar a mão ao ventre, tentando me sentar, apesar da tontura e da dor lancinante.

— Não se mexa, calma, calma! — ela me detém e me faz deitar, mas eu quero saber, preciso desesperadamente saber se houve um milagre.

A olho com intensidade e depois olho para meu estômago cheio de ataduras.

— Sim, entendo o que você quer me perguntar, mas… sinto muito… seu ventre estava completamente destruído, seu útero perfurado e seu filhote… não… ele não resistiu, era impossível salvá-lo. Nem sabemos como você ainda está viva.

Sinto as lágrimas caírem incontrolavelmente dos meus olhos, e os fecho em agonia, com minha alma destruída.

Meus lábios tremem, assim como todo o meu corpo, e da minha garganta ferida saem soluços roucos.

Por que isso tinha que acontecer comigo?

Por que tudo ao meu redor tem que se tornar um pesadelo?

Meu bebê, meu filhote era inocente, por que tinha que acontecer algo tão horrível com ele?

— Calma, por favor, você não pode se descontrolar assim… Aston, preciso que venha! Traga o sedativo! Aston, é urgente!

— Aaahahhh! Aaaahhh! — ouço gritos roucos de uma voz deformada e um choro que congela o sangue e estremece o coração.

Uma pobre mulher chora inconsolável, desesperada, então percebo que sou eu… essa mulher infeliz que perdeu tudo… sou eu.

*****

Já se passaram alguns dias e sei que um homem me resgatou da floresta sob o precipício.

Estou em uma pequena matilha não muito longe de “Bosque de Outono.”

Com as mãos cheias de feridas, quero refrescar meu rosto, mas nem sei como tocar minha pele.

Levanto minha cabeça e, como sempre que me olho no espelho, preciso reunir toda minha coragem.

Meu rosto, que um dia foi bonito e invejado por muitas lobas, agora carrega uma horrenda cicatriz que atravessa minha testa e outra profunda na bochecha esquerda.

Dorian não apenas acabou com a vida do meu filho, com meu ventre, mas também deformou meu rosto.

Deveria cicatrizar, mas eu sei que não será possível, não possuo essa habilidade dos lobos para se curar rapidamente.

Sim, eu me curo, mas é mais lento e deixa cicatrizes.

Saio do quartinho e escuto a discussão baixa da loba que me atendeu junto ao médico da matilha.

Falam que já gastei muitos recursos, que logo terão que me pedir para sair, as matilhas não aceitam forasteiros assim, mas ela diz que estou muito debilitada.

Agradeço pelos cuidados e pela empatia dela, mas não será necessário que me expulsem; já decidi, esta noite irei embora sozinha.

*****

Caminho pela floresta escura como uma alma penada, as ataduras molhadas pelo sangue de algumas feridas que se abriram.

Não me importo, minhas pernas continuam se movendo em uma única direção.

Observo, escondida em um arbusto, a linha de patrulha; conheço muito bem o caminho para me infiltrar sem ser detectada, fui eu mesma que desenhei essa rotação de defesa para Dorian.

Como tantas coisas na matilha que eu fazia por ele.

Me esgueiro na noite, entre as sombras, o mais rápido que meu corpo destroçado permite.

Não tenho as habilidades dos lobos, mas consigo fazer coisas estranhas; por exemplo, quando não quero ser detectada, nem mesmo eles conseguem sentir meu cheiro ou saber da minha presença.

A noite e a escuridão são minhas melhores aliadas, é como se esses traços estranhos se intensificassem nas sombras.

Ouço vozes, risos e vejo luzes ao longe, no pátio atrás do que foi minha casa por três longos anos.

Camino como em câmera lenta, com umas velhas sapatilhas e um vestido gasto que a loba do hospital me deu.

— Senhoras e senhores, reuni vocês aqui hoje porque não podia mais esconder minha felicidade. Finalmente vou me casar com minha amada mate, a mulher da minha vida, minha pequena Sophia, sua futura Luna.

Sinto como se caísse em uma caverna de gelo ao vê-los, sorrindo e se beijando diante daqueles que ontem me chamavam de Luna.

Era minha “melhor amiga” Sophia e meu traidor Alfa Dorian, celebrando sua união enquanto meu cadáver deveria estar apodrecendo sob aquele penhasco, se os planos deles tivessem funcionado.

Traiçoeira hipócrita!

Aquela mulher estava até mesmo vestida com um dos meus vestidos de noite, maquiada com minhas coisas, roubando minha vida sem nenhum remorso.

Ela me enganou esse tempo todo, assim como eu estava cega com todos nessa matilha, principalmente com o homem que dormia ao meu lado todas as noites pensando em outra mulher.

Até mesmo a doutora que me contou sobre a gravidez estava ali!

Dorian deve ter prometido algo a ela para garantir que se calasse.

Cerrei os punhos até cravar as unhas na pele, meus dentes trincavam de raiva, e esperei, esperei como a psicopata desequilibrada que eu já era, observando toda a celebração até que as luzes se apagaram e cada um foi para sua casa.

*****

Subi as escadas até o segundo andar, caminhei pelo corredor na penumbra, mas podia ouvi-los muito bem, fazendo amor no quarto principal.

Os gemidos femininos escapavam pela fresta da porta entreaberta.

Vi a mim mesma empurrando a porta com suavidade, e a luz da lua entrava pela ampla janela de vidro, revelando aquela vadia cavalgando sobre Dorian, de costas para a entrada.

— Alfa, diz que eu sou melhor que ela... Mmmm... vamos, Dorian, diz que eu sou melhor que a frígida da Valeria...

— Você é a melhor, bebê... nem se compare com aquela sem graça... Monta bem gostoso na cama dela, vamos... não era isso que você sempre quis?

A conversa suja chega aos meus ouvidos, e é o último gatilho que preciso para que tudo saia de controle de um segundo para o outro.

Me lanço sobre eles na cama.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo