Após Ângela e sua equipe deixarem a residência, Sky subira para o quarto e se agarrara ao Sexy Notes. Passara a chamar aquele estranho caderno pelo nome de seu antigo blog, pois a única coisa que restara do que havia feito tinha sido o título com letras douradas na capa.
A ruiva mordia o lábio inferior de leve, nervosa, curiosa, pensativa. Fechara os olhos e ficara assim por mais de trinta minutos com o livro colado ao peito em um abraço. Se dizia todo o tempo que não estava louca. Era uma mulher jovem e saudável, plenamente no controle de suas faculdades mentais.
Não havia dúvidas, ela sabia que tinha escrito grande parte da cena junto de Ricardo naquele caderno. O encontro, a transa, tudo correra perfeitamente até a equipe do FBI surgir em sua casa. Agora, tudo que restava era a certeza de que havia transado com um assassino serial.
A confusão em sua mente se dava quanto ao poder daquele caderno. Tudo o que havia escrito tinha acontecido. Contudo, mais do que havia escrito também tinha acontecido. Se as palavras no caderno refletiam a realidade, quanto desse poder ela tinha sob controle? Não havia sonhado com nada daquilo, quando vira Ricardo pela primeira vez na imagem da câmera de segurança, sabia de quem se tratava. Ele era exatamente a pessoa em sua mente ao escrever aquela cena para Celeste. Tão charmoso e sedutor quanto imaginara.
Não apenas isso, cada pequeno detalhe daquela foda deliciosa que provara tinha sido escrita antes de acontecer. Suspirara recordando.
Ironicamente, tudo que escrevera desaparecera magicamente das páginas e o caderno em seu abraço agora tinha apenas folhas em branco. O porquê suas palavras haviam desaparecido permanecia um mistério, mais uma entre tantas outras perguntas sem respostas plausíveis.
Sky apertara o caderno contra o peito, ponderando os acontecimentos mais uma vez. Se havia algo pior que os pensamentos de uma pessoa normal, eram os pensamentos de escritores. Escritores eram uma mistura de psicólogo, louco e filósofo em um único ser. E essa não era uma boa receita.
Entre seus devaneios, a escritora ponderava até onde seus atos tinham sido relevantes nos acontecimentos. Se ela não tivesse escrito que receberia um lindo homem naquela madrugada, ele teria vindo? Ângela dissera que o homem viera até ali para se livrar do corpo de sua última vítima e que o encontro entre eles não passava de coincidência. Contudo, ela sabia que a presença de Ricardo não havia sido um acaso. Pior que isso, ela tinha o perfil das vítimas do assassino.
Teria atraído um assassino para si?
Não gostava dos rumos que essa linha de pensamentos tomava.
Cansada, decidira não pensar mais naquilo. Se não estava louca, a chance de ficar parecia promissora. Abrira a gaveta do criado mudo e guardara o Sexy Notes novamente. Retirara a blusa e a calça de moletom que usava e as lançara para o lado da cama, ficando apenas com a lingerie.
Felizmente, diferente do exterior, o interior da casa era bem aquecido e tudo agora estava novamente trancado e com os alarmes ligados. Não abriria a porta nem mesmo se o Papa aparecesse a chamando por seu nome de batismo. Uma exceção, talvez, se visse Jeffrey Dean Morgan, afinal, toda vez que via aquele homem atuando em algum filme ou série de TV, sua calcinha se encharcava.
Fechara os olhos e esboçara um sorriso enquanto começava a adormecer. Independentemente dos fatos, sua inspiração para a escrita estava voltando.
Exatamente ao contrário do que planejava, Sky dormira profundamente até além das vinte horas. Acordara na mesma posição em que dormira, com o corpo doendo e morrendo de fome. Levantara sem pensar no que havia acontecido e fora direto para o banheiro. Não conseguiria fazer nada sem um bom banho.
A noite fora simples e prática. Como não conseguiria resolver nada indo até a cidade àquela hora, Sky decidira se organizar e passar o dia seguinte em prol de si e da nova casa. Fizera uma longa lista de compras e enviara mensagem para Lecter, cabeleireiro e proprietário de um salão de beleza próximo ao porto, agendando um horário para o dia seguinte.
Finalmente se sentia mais calma. Algumas horas de sono tinham o poder de fazer milagres. Decidira deixar o Sexy Notes de lado temporariamente e se focar no que realmente importava, fixar seus laços à nova casa e à nova comunidade.
Ficara até tarde espionando redes sociais e botando a conversa em dia com amigos e amigas. Logan, um escritor de romances eróticos gays que conhecera na época do lançamento de seu livro ficara quase duas horas falando sobre sua nova obra e a convidara para uma noite de autógrafos. Melody, sua mãe, lançara tantas perguntas sobre a cidade e a nova casa que parecia um interrogatório.
Joana Sinclair era curiosa, até mesmo intrometida em tudo, sobre todos. Sky, por sua vez, acabava sempre sendo seu alvo principal. O fato era que a ruiva de olhos verdes nunca tivera segredos com sua mãe. Desde pequena, Sky vira na mãe a imagem de alguém em quem poderia confiar para se confessar e buscar por conselhos. Até hoje, aos vinte e sete anos, isso não havia mudado.
Até hoje.
A longa conversa com Melody incluíra detalhes acerca da linda cidade, das poucas pessoas que Sky conhecera até aquele momento e a belíssima casa que agora possuía. Por duas horas a ruiva falara com a mãe enquanto evitava pensar e falar sobre Ricardo e o FBI lhe fazendo companhia logo em sua primeira manhã no novo lar. Melody ouvira tudo e opinara sobre tudo também.
Por fim, concordara em visitar a filha dentro de duas semanas para a ajudar a organizar o que ainda pudesse estar fora do lugar na casa. Quando desligara a ligação, a escritora suspirara pensando em como se sentia mal. Era a primeira vez que omitira algo de Melody e não se sentia bem com isso.
E de alguma forma, sentia que Melody sabia que estava escondendo coisas.
Virando a face na direção do abajur próximo à cabeceira, pensara em como poderia falar sobre o Sexy Notes, fosse com a mãe ou qualquer outra pessoa. A verdade era que ninguém acreditaria nela. Ela mal acreditava.
A segunda noite na casa fora serena e tranquila. Sky falara com os amigos até que a maioria adormecesse e quando se vira sozinha, fizera suco e assara pizzas no micro-ondas, se sentando na cama para comer enquanto assistia aos últimos episódios da terceira temporada do seriado Westworld.
Torcera os lábios ao ver o final da temporada, claramente insatisfeita. Como autora de diversos livros e contos e leitora compulsiva na adolescência, Sky se julgava uma ótima crítica quando o assunto era continuidade de tramas. E séries de TV eram seus alvos preferidos. Enquanto assistia, devorara seis mini pizzas e bebera um litro de suco. Ao se dar conta do farto ataque à geladeira, decidira que era hora de dormir e se preparar para o dia seguinte.
Sky despertara com o som da banda Sugar Ray, Mean Machine, tocando no alarme do rádio relógio. A cacofonia musical invadira o ambiente em segundos, fazendo com que a garota saltasse da cama para baixar o volume.
Apenas quem já ouviu Mean Machine ou Tap Twist Snap, da mesma banda, de perto, sabe como essas músicas são boas para acordar pessoas pela manhã – costumava dizer a ruiva, viciada em rock dos anos 1980.
Embora o clima continuasse frio e chuvoso como no dia anterior, para a ruiva era como uma manhã ensolarada em um domingo de festa. Levantara da cama em um salto, abrira os braços e girara o corpo no lugar erguendo um dos joelhos como uma bailarina. Sorrira se encarando no espelho e se dando bom dia.Sem perder tempo, apanhara toalhas e xampus e correra para o banheiro. O dia não espera para começar – costumava dizer Melody e a jovem aprendera desde pequena a despertar com o raiar do sol, mesmo quando não havia sol.Pouco tempo depois, lá estava a ruiva saindo pela porta da cozinha. Checara os status do sistema de segurança pelo celular e conferira as horas, seis e vinte da manhã. Desativara o alarme do SUV e enfiara a mão direita no bolso da blusa, retirando dela uma touca de lã.Sky vestira uma cacharrel de cor rosa sob uma jaqueta de couro marrom. A calça jeans
Parecia loucura pensar aquilo, mas qual seria a extensão do poder do Sexy Notes? Aparentemente suas palavras tinham moldado a realidade, fazendo com que Ricardo viesse até ela, então a única coisa que conseguia presumir era que Ben também havia escrito no caderno. Mas… monstros?O que Ben estava querendo dizer com aquilo? Precisava ler seus livros.—Como ele morreu?A pergunta fora direta, mas assim como as palavras anteriores, não passara de outro sopro de voz. Havia diversas pessoas nas mesas próximas e Sky não queria que a ouvissem bisbilhotando sobre a vida de um homem morto.Elliott refletira por um instante e ajeitara novamente os óculos sobre o nariz.—Ben foi encontrado morto pelo filho, Johnny – explicara o sujeito – Parece que já estava lá tinha alguns dias, mas ninguém havia sentido sua falta. Em seus últimos
Sky rolara preguiçosamente na cama, os olhos ameaçavam entreabrir, mas o sono era mais forte. Quando o celular tocara pela quinta vez, a escritora abrira a boca em um bocejo matinal, como costumava chamar, cedo demais para seus padrões de autora baladeira com fama de acordar tarde.Finalmente, quando o smartphone tocara pela vigésima vez, a garota voltara a face na direção do criado mudo. Parte de seus cabelos lhe caíra sobre o rosto, cobrindo os olhos, o nariz e a boca. Ao respirar, a ruiva engolira uma das mechas acobreadas inteira, engasgando e dessa vez, despertando de mau humor.Ainda que ninguém a visse, Sky arqueara as sobrancelhas, torcera os lábios e estreitara o olhar, interpretando da melhor forma possível a expressão de vilã que sempre via em animações da Disney. Adoraria ter alguém por perto naquele momento para canalizar suas energias. Mas est
—Nova York sempre será uma parte importante da minha vida – dissera Sky – Mas não era meu destino ficar lá para sempre. Mesmo que Érika tivesse parado de me perseguir por toda parte, tudo sempre me lembrava Robert. Não é como se fosse me esquecer dele por aqui, mas sinto que agora tenho uma chance de recomeçar e ser feliz longe daquilo tudo.—Tenho certeza de que as coisas ficarão ótimas daqui em diante, querida – respondera a mãe – Sabe que eu nunca gostei daquela cidade, tanta poluição, carros e aglomeração de pessoas, tantos edifícios gigantescos ocupando toda a paisagem… mal espero para conhecer Camden e sua nova casa.Ainda nenhuma sugestão de cuidados ou medidas preventivas. Melody com certeza não estava dizendo tudo que pensava. Sky podia sentir a desconfiança da mãe e sabia que teria de d
De repente, como num passe de mágica, a semana de Sky se transformara no que ela passara a chamar de o sonho perfeito. A escritora abusara de todo o talento que tinha para narrar uma cena de sexo entre Celeste, a protagonista de seus romances e Jordan, seu mais novo desejo sexual.Quando começara a escrita no Sexy Notes, as ideias em sua mente surgiam como se estivesse dentro de um filme, apenas descrevendo minuciosamente as cenas que passavam diante de seus olhos. Lá estava ela, fodendo ardentemente com um homem sedutor, lindo e viril. Se fosse usar todas as ideias que tivera ao escrever aquela cena, escreveria um livro facilmente.O fato, percebera a ruiva, fora que após a noite em que descrevera sua futura foda com o gostosão no caderno, não apenas sua inspiração voltara a fluir, mas diversos outros aspectos de sua vida pareciam ter se organizado.Começara a escrever um novo roma
A garota ouvira o elogio desfrutando o prazer de cada palavra. Se havia uma coisa da qual nunca se cansava, era de ser bajulada por homens. Ouvir quando enalteciam suas qualidades era como música para seus ouvidos.Ainda assim, dessa vez a ruiva ponderara brevemente acerca do que ouvia. Quanto daquelas palavras eram realmente Jordan falando e quanto era o Sexy Notes agindo? Na cena escrita, Celeste era elogiada logo de imediato, mas não havia um diálogo pré-definido. Aquilo era o Sexy Notes improvisando ou Jordan assumindo o controle? Não importava realmente. Estava ótimo daquele jeito.—Obrigada. Você também está ótimo. Estava me esperando?—Estava organizando algumas coisas no convés e vi quando se aproximava na avenida. Como poderia apenas a admirar de longe? – respondera o sujeito.Sky sorrira e colocara as mãos na cintura, lançando seu olhar ma
Vou adorar movimentar sua cama – pensara a ruiva.Após o jantar, a ruiva descera para o porão da embarcação junto do anfitrião. O lugar era bem mais organizado do que esperava, havia uma cozinha adaptada e muito bem abastecida, um banheiro pequeno, mas limpo e perfumado e o que mais lhe interessava, uma cama quente e macia. Jordan mostrara ainda outras seções com equipamentos de pesca e acampamento, que segundo ele, servia para os passeios em longínquas ilhas remotas e solitárias. Não parecia verdade, mas o tom do rapaz era sério e não mudara com o sorriso desconfiado da moça.Não demorara para que o casal caísse na cama aos beijos novamente. Sky sabia o que queria e estava ainda mais excitada por estar testando suas teorias sobre o Sexy Notes. Era como estar atuando em uma novela erótica na qual ela era a roteirista, protagonista e atriz princ
Sky se agarrara à uma barra de metal próxima da porta da cabine do barco, procurando se equilibrar para não cair. Quando chegara naquele lugar, algumas horas mais cedo, o mar estava calmo e a embarcação parecia imóvel. As coisas agora tinham tomado outro rumo, a garota começava a se sentir enjoada e havia um forte chuvisqueiro anunciando uma tempestade a caminho.Mais estranho era ver Jordan encarando um homem exatamente igual a ele próprio, alegando ser o dono da embarcação. Duas pessoas exatamente iguais não era algo fora do comum. Gêmeos idênticos viviam fazendo brincadeiras com os amigos, se passando um pelo outro.Ao que parecia, não era o caso. Eram duas pessoas alegando ser a mesma pessoa. E a ruiva tinha certeza, em seu íntimo, que aquilo era outro dos efeitos colaterais de se escrever no Sexy Notes. Ela havia deixado passar alguma coisa e agora encarava as co