O coração de Kayla

Quando Kayla completou quinze anos, o pátio interno do St. Jude se encheu de luzes douradas e flores brancas, cuidadosamente organizadas pelas freiras e pelas colegas de classe. Era uma celebração simples, mas feita com amor. As irmãs haviam pedido doações e preparado tudo em segredo. Quando ela entrou no salão improvisado, de vestido azul claro e os cabelos presos num coque solto com pequenas pérolas, todos ficaram em silêncio por um instante.

Ela estava deslumbrante — não só por sua beleza única, mas pela força silenciosa que irradiava. Como uma rainha selvagem em seu momento de glória.

Houve música, risos, danças tímidas. E no fim da noite, enquanto Kayla observava a lua cheia no jardim do colégio, Ethan, um colega de turma e amigo próximo, se aproximou com as mãos trêmulas.

— Eu… preciso te dizer uma coisa — disse ele, desviando o olhar por um segundo. — Eu te amo, Kayla. Desde o primeiro dia em que você chegou. Você me inspira. Me desafia. Me faz querer ser alguém melhor, e quando você sorri, tudo parece mais fácil.

Kayla ficou em silêncio. O carinho por Ethan era sincero, mas algo dentro dela — um vazio que nunca soube nomear — a impedia de prometer qualquer coisa. Tocou sua mão com suavidade e sorriu, como quem agradece por algo verdadeiro, mas sabe que ainda está em busca de algo que não compreende.

Poucos dias após completar dezesseis anos, Kayla foi chamada à sala da Madre Superiora. Lá, uma mulher elegante, de terninho escuro e um tablet nas mãos, a aguardava. Era da agência de assistência social.

— Kayla — disse a mulher, olhando nos olhos azuis dela com um misto de cautela e reverência — Encontramos seus pais.

O mundo parou.

A garota sentiu o estômago afundar, como se todas as certezas que construiu naquele orfanato fossem arrancadas de uma vez. A mulher continuou, escolhendo bem as palavras:

— Eles não te abandonaram… não exatamente. Há detalhes, que você descobrirá em breve. Mas o importante é que você vai conhecê-los. Eles têm um lar. E um filho.

O nome dele era Kaiden.

Kayla não respondeu. Apenas assentiu com um leve movimento da cabeça, como uma guerreira que aceita um destino que ainda não entende.

Dois dias se passaram...

O dia da partida chegou com o céu coberto por nuvens baixas, como se até o tempo sentisse a tristeza da despedida. Kayla arrumou suas poucas coisas em duas malas — os livros preferidos, o ursinho antigo que ainda guardava e algumas cartas trocadas com as amigas mais próximas.

Crianças e adolescentes se reuniram no pátio do orfanato St. Joseph’s Haven for Children, onde ela crescera desde os três anos de idade. Lá, tinha aprendido a sorrir, a confiar, a ser forte.

Uma garotinha mais nova segurou sua mão com força:

— Você vai embora de verdade?

Kayla se ajoelhou e respondeu com um abraço apertado, tentando conter as lágrimas. Seus olhos, por mais serenos que parecessem, transbordavam emoção.

Irmã Margaret, que a conhecia como ninguém, lhe deu um último abraço comovido.

— Você foi um presente para todos nós, minha querida. E ainda será para muitos outros, onde quer que vá.

No carro que a levaria até seus pais, Kayla olhou uma última vez para os portões do orfanato. Uma parte dela queria descer e correr de volta. Ficar. Continuar sendo quem sempre foi ali dentro.

Mas outra parte — aquela que sempre quis entender de onde vinha — sabia que era hora.

Mesmo sem todas as respostas, mesmo com o coração apertado, ela partiu.

E ao deixar para trás o lugar que chamou de lar por tantos anos, uma certeza crescia dentro dela: sua história estava apenas começando.

A viagem foi longa e silenciosa. Kayla observava a paisagem desfilar pela janela do carro, como se pudesse entender alguma coisa do que viria a seguir. Cada árvore, cada sombra, cada curva no asfalto era um lembrete de que sua vida estava prestes a mudar.

Quando o carro parou em frente à casa branca de dois andares, elegante e cercada por jardins bem-cuidados, o coração de Kayla bateu mais forte. Era tudo bonito demais. Perfeito demais.

A porta se abriu.

A mulher que surgiu ali era como o reflexo de um futuro que Kayla nunca imaginou. Seus cabelos eram loiros com reflexos de cobre, caindo em ondas sobre os ombros, e seus olhos azuis brilhavam com emoção. A pele era clara, mas levemente rosada, como porcelana viva.

Kayla sentiu um impacto estranho ao encará-la. Era como se olhasse para si mesma… no futuro.

— Kayla — disse a mulher, com a voz embargada.

Ao lado dela, um homem alto e sério manteve a postura rígida. Seus cabelos negros estavam impecavelmente penteados, e seus olhos escuros a observavam com intensidade. A pele dele era pálida como papel. Uma presença firme, quase intimidadora.

— Bem-vinda, filha — disse ele, em um tom grave e contido.

A palavra "filha" a atingiu como um trovão silencioso. Era estranha. Carregada de peso. Kayla apenas assentiu, mantendo o rosto firme.

E então, surgindo no alto da escada, apareceu ele.

Kaiden.

O irmão que ela nunca soube que existia. O garoto que desceu os degraus em silêncio tinha os mesmos traços do pai: cabelos escuros, mas diferente do pai, eram longos, olhos profundos, expressão difícil de decifrar. Um contraste total com Kayla, que era a cópia da mãe.

— Oi. Eu sou o Kaiden — disse ele, com um leve aceno, sem emoção.

— Kayla — respondeu, com um sutil movimento de cabeça.

Foi um instante longo de silêncio entre os dois, como se ambos tivessem consciência de que aquilo mudaria tudo. Como se estivessem se estudando, testando os limites de algo que ainda não sabiam se existia.

A mãe se aproximou com um sorriso suave.

— Venha, querida. Entre. Sua nova casa está te esperando.

Kayla atravessou a porta devagar, carregando na mochila seus pertences… e no peito, o peso das perguntas que ninguém ainda havia respondido. Cada detalhe da casa era novo, estranho, limpo demais. Nas paredes, fotos de Kaiden em várias fases da infância: aniversários, festas escolares, viagens em família. E então, entre todas elas, uma única imagem diferente chamou sua atenção.

Ela mesma, aos quinze anos, no salão decorado do colégio interno. O vestido azul-claro, os cabelos presos em um coque delicado, um sorriso tímido nos lábios enquanto cantavam os parabéns.

Kayla parou diante dela.

— Essa foto… — murmurou, sem tirar os olhos do retrato.

A mãe se aproximou lentamente, com a voz embargada.

— Nós soubemos da sua existência e do orfanato porque uma das freiras nos enviou. E tivemos a certeza que era você.

O coração de Kayla apertou. Por um instante, a dor do abandono deu lugar a outra sensação: confusão.

Eles não sabiam. Realmente não sabiam.

E mesmo assim, agora, aquela foto estava ali, no centro da parede da família. Como se fosse um esforço para dizer: “Você pertence aqui.”

Naquela noite, deitada em uma cama macia, envolta por objetos escolhidos com carinho, Kayla lutou contra as lágrimas.

Porque apesar das dúvidas, da dor e do vazio, uma pequena chama de esperança começava a brilhar.

Talvez... só talvez, eu tenha um lar, afinal.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP

Capítulos relacionados

Último capítulo

Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP