Tony saiu pela janela e Sheryl ficou ali deitada. Tentou dormir novamente
mas não conseguiu. Ainda era cedo, mas ela estava apreensiva. Não sabia oque seria daqui pra frente, sem notícias do Tony. Sabia que os diasseguintes seriam um tormento. Seriam dias decisivos, dias que mudariam parasempre a sua vida. Em apenas um mês sua vida daria uma reviravolta em 360graus. Seria vida nova e isso incluía deixar tudo para trás, inclusive osseus pais. Ela se sentia triste, mas estava realmente decidida. Não iriadar pra trás agora. Desistir do Tony seria desistir do sentimento que elajulgava ser amor de verdade, seria desistir de si mesma, já que ele era oúnico que a entendia, que a protegia e que com ela possuía uma cumplicidadeúnica, um magnetismo diferente. Sheryl sentia calafrios só de pensar emTony. Respirava ofegante e seu olhar se perdia só de pensar no seu toque,nos seus beijos e no imenso amor que os unia. Isso estaria fora decogitação, desistir jamais, pensou!Os dias se passavam rapidamente e Sheryl ficou um pouco
tranquila, pois pensava no que Tony a dissera antes de partir, notíciasruins chegam rápido e se as mesmas não haviam chegado, era porque nadahavia acontecido. As coisas deviam ter corrido bem, mas por outro ladovinham os pensamentos negativos; -E se ele se afogou? E se fora assassinadopor alguém no navio? E se fora descoberto? Não! Isso é impossível... Se elefosse descoberto estaria preso e a notícia logo se espalharia, mas... E seele se perdeu em Novosibirsk? Não! O Tony é muito esperto. Então em umgesto brusco, assanhou os cabelos e disse para si mesa:-Chega!! Não vou pensar mais! Vou apenas me programar, pois
meu dia de partir está se aproximando. -Pensou alto.
Em um momento, pensou também em contar para a filha sobre a maravilhosa"viagem" que fariam, mas se a pequena empolgada contasse a alguém, atémesmo a uma coleguinha da escola, poderia colocar tudo a perder. Sheryltinha certeza mais que absoluta que, assim que ela partisse, mesmo deixandoa carta, seus pais não iriam acreditar e obviamente colocariam a polícia nomeio. Não seria de imediato, primeiro eles iriam esperar por um contato.Vendo que esse não ocorreria, eles iriam imediatamente à polícia e isso nãoseria bom. Porém como o Tony disse, tudo seria um risco e ela não poderiadeixar de aceitá-lo. Para viver com Tony Tramell mudaria tudo radicalmenteisso incluiria a sua "Fuga".
Faltavam apenas 15 dias para Sheryl partir. A tensão e a
ansiedade era parcialmente visível, misturada com a tristeza e a saudade.Sheryl não conseguia mais ficar longe de Tony e contava as horas para vê-
lo, para abraçá-lo e principalmente, para chegar ao seu destino final e verque tudo havia saído bem. Não seria fácil disfarçar, sua mãe já reparava
que estava acontecendo alguma coisa, mas não sabia o que era. Um dia,assistindo TV a noite lhe perguntou:-Sheryl, é impressão minha ou você anda triste, nervosa. Está
acontecendo alguma coisa no seu trabalho, filha?
Sheryl pensou bem no que iria responder. Mas se fizesse totalmentedesentendida iria parecer irreal, então ela ensaiou uma mentira:-Não sei, mãe! Está tudo tão parado, sabe? Sinto vontade de
mudar.
-Mudar de quê? De emprego?
-De vida, mãe. Não sei ao certo. Sair dessa cidade,recomeçar. Sim, tenho vontade de recomeçar.
-Mas filha, você de certa forma recomeçou.
-Mãe, como você acha que as pessoas daqui me olham sabendoque tive uma filha com um assassino? Metade me olha com desdém e a outrametade com pena. Sinto pela minha filha.-Isso não é verdade. Você foi vítima de um maníaco. As
pessoas sabem disso.
-Que saibam. Eu não estou feliz!
-Sim, isso é claramente visível. Mas, filha, diga-me sobre ooficial Jones. Ele me parece um bom rapaz. Esses dias você saiu com ele,não foi?-Sem chances, mãe. Sai apenas como amiga e ele me fez
interrogatórios a noite toda, sabe... As pessoas não veem em mim SherylMadison e sim a pupila do Tony Tramell. Isso é péssimo.-Entendo perfeitamente, filha. Mas já havia falado com seu
pai a possibilidade de mudar daqui, o que você acha?
-Eu acho ótimo. Mas não sei se terei paciência para esperar.
-O que você quer dizer com isso, Sheryl?-Apenas que não suporto mais conviver nessa cidade. Não seassuste se eu resolver partir.
-Mas e a Valentina?-Vai comigo. Ela é minha filha!-Eu sei, filha. Prometo que vou falar com o seu pai mais umavez sobre isso. O problema é que já temos as nossas vidas estruturadasaqui, sabe? As nossas raízes.-Mãe, raízes a gente planta por onde passamos. Olha, obrigada
por me ouvir, mas vou dormir. Toda essa conversa me deu sono. Boa noite!-Boa noite, querida!
Ellen Madison ficara preocupada com a possível decisão da filha. Se ela
fosse embora sozinha e levasse a pequena Valentina ela e o Steven iriamsofrer muito. Eles haviam se apegado à pequena de uma forma sublime. QuandoSheryl retornou a Springfield, Ellen e Steven estavam tensos, nervosos,apreensivos. Quando eles viram a filha reaparecer após quatro anos trazendoconsigo uma criança não sabiam de fato o que significava aquilo e comoiriam lidar com aquela situação, porém a criança era de uma amabilidade queconquistaria até mesmo o mais frio dos corações. Valentina era astuta comoo pai, porém possuía a doçura da mãe. Era uma criança linda por dentro epor fora. Branca de cabelos pretos e lisos, olhos verdes escuros como os doseu pai e o rosto razoavelmente parecido com o dele. Não pelo tamanho, orosto da pequena era normal, mas pelos traços. Assim como o pai ela possuíaalguns traços angelicais. O rosado das bochechas contracenando com assobrancelhas e cabelos lisos que por vezes lhe caia sobre os olhos verdes.O jeito de sorrir era idêntico ao do pai. Ellen ficava impressionada com asemelhança da neta com o mesmo ao ver as fotos dele estampadas nos jornaise dizia para si mesma:-Ainda bem que a minha neta é uma criança doce, não é como
esse monstro! -Suspirou.
Ellen não sabia de absolutamente nada, assim como a maioria das pessoas enem sequer suspeitava da tórrida história de amor que a sua filha possuía
com o seu suposto algoz. Muito menos suspeitava que ele estivesse vivo, aocontrário do oficial Jones que não só suspeitava disso como da possívelpaixão que Sheryl nutria por ele. Aquela noite fora difícil para Sheryl.Não sabia se havia falado demais e olhava a filha dormir ao seu lado,contando os dias para a sua fuga. Não dava mais para ficar ali. Viver sem oTony era algo que ela definitivamente não se acostumaria e apenas orava aDeus para que lhe desse forças no dia da sua fuga e no começo dessa novavida que a esperava.O dia amanhecera e ao retornar do trabalho, Sheryl recebeu um
telefonema, era o oficial Jones, quando ela atendeu, gelou! Pensou quefosse algo sobre o Tony, mas depois que o oficial começou a conversar elaviu que não houvera nada. -Graças a Deus!! -Suspirou dizendo a si mesma.O oficial apenas queria vê-la novamente e mesmo sem falar com o Tony elaachou que não seria uma boa ideia sair com ele novamente. Sabia que ooficial estava interessado nela e ela definitivamente sentia repulsa domesmo. Ele era o pior inimigo do seu amado em todos os sentidos assim sefalando. Desejava mais do que ninguém caça-lo, descobri-lo e prendê-lo paravê-lo morrer quando fosse a hora da sua condenação. Sheryl não tinhanenhuma simpatia pelo oficial Jones, ao contrário do mesmo que estavacompletamente apaixonado pela garota. No telefone ele continuavainsistindo:-Ora, Sheryl, vamos ao parque. Será divertido.
-Não oficial, Jones. Estou cansada. Meu dia foi cheio.-Então tudo bem. Hoje lhe deixarei descansar. Mas amanhã ésábado e não aceitarei um não como resposta, tudo bem?
-Vou pensar oficial.
-Me chame apenas de Jones. Sem formalidades.-Tudo bem... Jones! Vou pensar e amanhã nos falamos, ok?-Ok. Tchau! Boa noite!-Boa noite!Jones desligou o telefone, tirou a roupa e foi tomar um banho. Pensou em
Sheryl e no seu sorriso. -Como é linda! Mas também falava para si mesmo:-Será que ela e o Tony Tramell realmente se envolveram?Afinal de contas foram quatro anos. Em quatro anos muita coisa acontecee... Não! Não vou pensar nisso. -Terminou, vestiu-se e ficou em casa atomar cerveja e assistir televisão. Aquele dia ficaria em casa eaproveitaria para relaxar, mas os pensamentos em Sheryl não o deixavafazer. Jones não tirava aquela garota da cabeça por nenhum minuto epercebeu que sim, estava completamente apaixonado por ela. Precisariapensar em um plano para conquistá-la. Olhava para o enorme sofá da sua salae pensava o quanto seria bom se ela estivesse ali com ele assistindo TV,bebendo cerveja e dando risada. -Esboçou um breve sorriso. Jones, que nuncahavia se envolvido afetivamente com nenhuma mulher, sim, tivera seusromances, porém todos maçantes e efêmeros, encontrava-se ali, naqueleinstante, pensando o tempo inteiro em uma garota deveras problemática. Masisso fazia parte da paixão, desse sentimento que nos toma repentinamente eninguém consegue entender de onde vem e porque vem. Ele precisava elaborarum plano para chegar ao coração de Sheryl, mas como? pensava! Para ele,Sheryl era um enigma quase indesvendável. Era uma pessoa sofrida,traumatizada que das duas uma, ou se auto punia por não poder expressar umsentimento reprimido, ou estava definitivamente fechada para todo equalquer relação devido ao trauma que passou por todos esses anos,supostamente pelo sequestro e consequência do mesmo. Acabara dormindo comesses pensamentos. Era madrugada de sábado, o frio pairava sobreSpringfield. Sheryl deitada na cama, com a sua janela aberta, contemplava aimensa lua cheia que aparecia no céu estrelado. A pequena Valentina dormiaao seu lado. Ela olhava para a filha, sorria e depois olhava para a lua epensava no Tony. -Meu Deus, como ele está? Será que tudo correu bem? Ficavaséria mas depois esboçava um sorriso lembrando dos momentos perfeitos quevivera exatamente ali naquele quarto, naquela cama e apreciando a mesma luapela mesma janela. Era difícil não pensar nele. E quando isso acontecia,Sheryl suspirava e sentia calafrios, como de costume. Era como se ambostivessem uma conexão. Ela não havia mais falado com ele e tão pouco sabiado seu paradeiro, mas naquele exato momento tinha certeza que ele estava
bem e também estava pensando nela. Assim acabou adormecendo.O dia amanheceu e Sheryl acordou tarde. Já passava das onze
quando sua mãe a chamara. Valentina já havia acordado desde cedo parajuntar-se aos avós e a sua mãe preocupada resolveu chama-la:-Sheryl querida, o que houve? Passou a noite em claro?
-De certa forma sim, mãe. -Bocejou. -Não dormi muito bem.-Mas, por quê?-Não sei. Insônia talvez.-Tudo bem, vista-se e desça. Lave o rosto e tome um café.Ao descer Sheryl escutou o telefone tocar e de pronto atendeu, era ooficial Jones:-Bom dia, Sheryl!
-Bom dia Oficial Jones! -Disse revirando os olhos.-Jones, lembra?-Ok, Jones. O que você quer?-Gostaria de saber se podemos ir ao parque essa tarde.-Não sei, eu...-Ora, vamos! -Interrompeu. -A pequena Valentina vai amar.Sheryl não queria ir, mas pensou bastante. Se o Tony estivesse lá a teriaincentivado, mas também, depois do que ocorrera na noite às vésperas da suaviagem, ela nem mais sabia o que pensar. Pensou e resolveu ir. Sair com ooficial Jones era sondar o seu grau de sabedoria, era saber se ele tinhaalguma pista ou desconfiança do paradeiro do Tony, então ela resolveuseguir os seus instintos:-Tudo bem, Jones. Me pegue as quatro.
-As quatro então. Combinado!O oficial quase deu um pulo de felicidade. Desligou o telefone e vibrou.
Quem sabe, aos poucos, não domaria o coração daquela fera arisca, que maisparecia uma tigresa selvagem. Não em questão de temperamento. Sheryl eradoce e amável, porém arredia e desconfiada, o que dificultava a conquistatanto dele como a de qualquer outro homem. Mesmo antes de ocorrer osequestro, Sheryl não tinha namorado. O oficial Jones muitas vezes a teriaencontrado nas baladas, porém sempre sozinha, acompanhada apenas por amigase mesmo assim poucas amigas. Após o sequestro ela teria se tornado maisrecatada ainda, já que não ia mais à baladas e tampouco tinha amigas.Sheryl vivia isolada, apenas com a sua filha e os seus pais, era de certaforma estranha, assim ele pensava, mas isso o intrigava cada dia mais.Amava mulheres misteriosas, com segredos a serem desvendados e o magnetismoque ela exercia sobre ele era realmente perturbador. Jones não conseguiaparar de pensar em Sheryl, mal sabendo ele que a mesma só tinha olhos paraTony Tramell.As horas passaram rapidamente e Jones chegou à casa de Sheryl
às quatro como haviam combinado. Sheryl despediu-se dos pais e seguiu comValentina. Ellen vibrava, ao ver a filha saindo com o oficial, mal sabendoela que aquilo era puramente um disfarce, uma coleta de informações e nadamais que isso. O coração de Sheryl pertencia a outro homem e isso estavalonge de mudar, nem pelo Jones nem por ninguém. Quando Sheryl entrou comValentina no carro, Jones cumprimentou a mãe e ficou olhando para a criançacomo que hipnotizado. Fora a primeira vez que a olhara cara a cara, já queno dia do resgate ele nem tivera cabeça para reparar em tais detalhes. Amenina parecia muito com o pai. Ele ficou olhando fixamente, reparando osmínimos detalhes. Era impressionante a semelhança. O sorriso da garota, ojeito de olhar, a face corada... Sim. Ele não era o primeiro que achavaisso. Todo mundo que conhecia o Tony Tramell saberia que nem precisavafazer exame de D.N.A para comprovar a paternidade, até porque o TonyTramell não possuía traços comuns. Se existia uma coisa que ele passavalonge de ser era comum. Seu rosto era notado em qualquer lugar quepassasse. Não chegava a ser uma bizarrice, mas era sim, muito diferente.Valentina não tinha o rosto tão grande mas possuía característicasmarcantes e idênticas as do pai. Sheryl percebeu que ele olhava para amenina reparando tais detalhes e não se conteve em perguntar:-O que foi?
-Nada. -Riu-se
-Nem precisa dizer, eu já sei o que foi.-Se é o mesmo que estou pensando... Sim! Estou impressionadocom a semelhança. Essa criança é idêntica ao Tony Tramell.
-Sim, é. Ela não se parece comigo.
-Não. Desculpa lhe dizer, mas ela realmente é cópia fiel doseu pai.
-Todo mundo diz isso, inclusive os meus pais que nunca o
viram pessoalmente, apenas pelos jornais e noticiário.
-São coisas da vida. -Esboçou um sorriso.Ao chegar no parque, Valentina ficou extasiada. Brincou, correu, tomou
sorvete, ganhou balões e urso de pelúcia. Jones sabia que ali não era olugar e nem a hora de tentar avançar o sinal com a Sheryl, mas em suacabeça esses passeios abririam o caminho. Ele vira Sheryl rindo,divertindo-se com a filha e nem pensou em abrir a boca para falar doTramell. Isso certamente colocaria todos os seus planos a perder. Jones nãotinha certeza, mas no fundo sabia que Sheryl nutria um sentimento pelomesmo. Ele reparou que os olhos da garota brilhavam ao concordar que afilha se parecia com o pai. Podia ser até que estivesse enganado, mas tinhasim uma sombra de dúvidas que nem mesmo a morte do Tramell havia feitoSheryl o esquecer, se é que houve algum tipo de sentimento entre os dois.Ele ficava cada hora mais intrigado, mas sabia que através dela não saberianada e então resolveu calar-se a fim de não estragar o que ele demorarapara construir. O passeio estava bom mas já caia a noite e a pequenaValentina estava cansada e sonolenta, era chegada a hora de partir. Jones adeixou em casa, despediu-se e seguiu. Enquanto Jones seguia esperançoso,Sheryl entrou, deu banho na pequena, colocou-a na cama e após sair dobanho, foi para a cozinha. Preparou um café e ficou em pé, diante da grandejanela da mesma, usando um roupão e admirando a lua. Pensava no Tony.Faltava muito pouco para encontrá-lo. Sheryl não se comunicava com Tony aum mês e isso a perturbava. Ela pensava em milhões de coisas. Se por acasoele não estivesse lá o que seria? Na pior das hipóteses ela teria quevoltar e fingir que apenas pensou em fazer uma viagem, mas isso não erapossível. Tudo devia ter dado certo. O Tony não se comunicou porque nãohavia como. Ligar para ela seria um risco imenso. Quem garantia que apolícia poderia ter grampeado o telefone da mesma? Ninguém! Pela dúvida,preferiram não arriscar. Se ela tivesse alguém de confiança, poderia terpedido para que ele entrasse em contato com essa pessoa, mas quem? Ninguémem sã consciência ajudaria um assassino. Seria muito difícil. Mesmo quefosse para cooperar com uma grande história de amor e uma criançaenvolvida, não! Seria muito arriscado, principalmente por telefone.Aretha era colega de Sheryl, no trabalho. Era muito solidária ecomunicativa. Sabia do sequestro e nunca olhou para Sheryl com desdém, pelocontrário, era muito prestativa e solícita. Porém a verdadeira histórianinguém sabia. Exceto a advogada de Sheryl, doutora Kate. Sheryl sabia queo seu segredo estaria seguro com ela, até porque na época em que ela contoutudo isso, nem mesmo sabia que o Tramell estaria vivo. Fazer uma confissãoa um advogado era como fazer a mesma coisa para um padre. Pela ética, osegredo deveria morrer com os mesmos e com a doutora Kate, Sheryl não sepreocupava. Aretha às vezes perguntava a Sheryl se ela não tinha namorado,coisas do tipo, porém ela nunca se abriu. Quanto menos gente soubesse,melhor. Até porque se muita gente soubesse, na hora que houvesse qualquerrumor ficaria difícil descobrir quem havia falado. Sheryl se tornarabastante reservada, até porque ela sabia que se não fosse, diante dasituação que estava vivendo, colocaria em risco a liberdade e a vida do seuamado e que jamais poderiam cogitar a possibilidade de uma vida a dois, nemmesmo às escondidas. Ela estava ali com seus pensamentos e nem percebeuquando sua mãe chegou por trás e a tocou nas costas. Sheryl assustou-se equase derrubou o café. Por um momento pensou ser o Tony, então virourapidamente e viu a sua mãe sorrindo:-O que foi, filha, Está assustada?
-Oh, mãe! Estava tão distraída aqui que nem a vi chegar.-Sim, eu vi. Seria o oficial Jones tomando conta dessespensamentos?
-O Jones? -Riu-se. -De jeito nenhum! Eu e o Jones somos
apenas amigos, mãe. E por favor, não crie esperanças em relação a ele. Nãoaconteceu e nem vai acontecer nada.-Mas filha, o oficial Jones é um rapaz muito distinto e
lembre-se que...
-Mãe, por favor! -Interrompeu. -Eu não quero ouvir. Nós já
falamos sobre isso.
-Sheryl, você precisa superar esse trauma. Eu sei filha, deve
ter sido difícil para você viver todos esses anos em cárcere privado, comum maníaco, sendo estuprada e...-Mãe, pare! Por favor. Eu não quero falar sobre isso. Pelo
amor de Deus! -Colocou a xícara em cima da mesa, pediu licença e subiu.Ellen ficara intrigada. Nunca sabia o que se passava ao certo na cabeça dafilha. Por quê Sheryl se tornara tão arredia? Sim, ela ainda era amável,mas misteriosa e impenetrável. Não sabia que aquele sequestro havia lhecausado tantos traumas. Por outro lado ela pensava que havia algo de erradonessa história. Como a Sheryl conviveu tantos anos com um maníaco e chegaraem casa intacta? Geralmente as vítimas de sequestro quando são encontradasretornam sujas, descabeladas e com muitos hematomas pelo corpo, devido àslutas e algumas tentativas de fuga, porém nem todos os casos eram iguais eEllen começara a achar que a sua filha precisava de ajuda psicológica, pelomenos para tentar superar o trauma que havia passado.Os dias pareciam não passar para Sheryl. Mesmo estando tão
perto, cada dia era mais difícil que o outro. Tudo lembrava Tony. O sótão,a cama, a janela por onde ele entrava, a mesa da cozinha, onde elessentavam e faziam lanches como um casal normal, até mesmo a insistência dooficial Jones. Sheryl lembrava da primeira noite que saíra com ele apenaspara um jantar e o Tony ficou corado de ciúmes, com isso esboçava um imensosorriso e nem se deu conta de que sua mãe a observava:-Querida, está acontecendo alguma coisa?-Não, Por que perguntas, mãe?-De repente você sorrindo, tão feliz.-Sinceramente, não dá para entender. Se eu fico triste mecríticas, se eu fico alegre achas estranho. O que realmente você estáquerendo dizer, mãe?-Não filha, nada! Apenas fiquei feliz em lhe ver sorrir.
Pensei que poderia ser um novo amor.
-Mas será possível? -Riu-se. -Quer dizer agora que felicidade
só se caracteriza por amor a um homem?
-Não foi isso que eu quis dizer.
-Mas disse. Olha mãe, eu estou muito bem sozinha.-Sheryl, filha. Me diga. Eu sei que você odeia falar sobreesse assunto mas eu realmente preciso saber. O que aconteceu nesses quatroanos em que você conviveu com o Tony Tramell?Sheryl respirou fundo. Pensou bastante, franziu o cenho e
disse:
-Mãe, será que você não percebe que esse assunto me deixa
incomodada?
-Sim, querida, eu sei. Mas depois de tudo isso você voltou
completamente mudada.
-E não era para estar? Você sabe o que eu passei durante
esses quatro anos, mãe?
-Não. Gostaria muito saber.
-Eu não estou ouvindo isso. -Levantou-se do sofá e quando iacaminhando para o seu quarto sua mãe lhe disse:
-Querida! Você não acha melhor procurar ajuda psicológica?
-Ajuda psicológica? -Gargalhou. -Faz-me rir. Eu não estou comproblema algum. Sou uma pessoa absolutamente normal e não tenho desvio decomportamento. O que vais alegar a um psicólogo, que eu não quero falarsobre o que passei? Ele vai achar absolutamente normal.-Não. Apenas o fato de você não sair e de não querer se
relacionar com nenhum rapaz, após o ocorrido.
-Ótimo! Sabe o que o psicólogo dirá? Isso é absolutamente
normal. Nem todos os grandes traumas são superados momentaneamente, cada um
a seu tempo. Mãe, faça-me o favor! Eu estudei psicologia e era uma dasmelhores alunas da minha turma. Você vai querer agora ensinar um padre arezar uma missa?-Sheryl, não seja grossa.
-Não estou sendo grossa. Simplesmente me irrita quando mefalas assim. Olha mãe, quem sabe um dia eu lhe conte. Prometo que pensareia respeito, mas... hoje não! Agora se me dá licença, preciso dormir. Amanhãtrabalho cedo. Boa noite! Disse beijando-lhe a face.-Boa noite, Querida! -Respondeu tristemente.Ellen não estava satisfeita. Sabia que a sua filha não estava feliz mas
também sabia que havia um motivo. Porém vê-la sorrindo, de certa formapoderia ser um sinal de que teria encontrado alguém, ou que estariaconhecendo melhor o oficial Jones, mal sabendo ela que a sua filhasuspirava relembrando os tórridos momentos de amor que vivera com o TonyTramell.Era uma manhã de terça-feira e Sheryl encontrava-se no estado
máximo de ansiedade. Ela partiria dois dias depois, na madrugada de quinta-
feira. Estava tudo pronto. Bagagem arrumada e guardada no sótão, juntamentecom as passagens e toda a documentação necessária para a sua viagem.
Precisava fazer uma carta para despedir-se dos seus pais sem deixar pistas.Era doloroso. Talvez por esse motivo estivesse tão arredia, mais do que decostume, com os pais. Nervosismo misturado com ansiedade. Sheryl eraextremamente ansiosa. Costumava andar de um lado para o outro, ou subir edescer as escadas do seu quarto quando estava com algum problema ou quandotinha algo de importante para resolver. Porém fazer isso, só daria margemàs desconfianças contínuas de sua mãe. Ela precisava se controlar. Já haviapedido demissão do trabalho alegando estresse mental e o seu chefeconcordara de imediato, pois a cidade quase toda sabia do fato que lheocorrera. Ela teria motivos de sobra pra isso. Em casa ela fingiu queestava indisposta e que tirara uma licença para se recuperar, fato esse queseus pais acreditaram prontamente sem levantar nenhuma suspeita. Estavatudo esquematizado e sem sombras de desconfianças de parte alguma. Nem deseus pais, nem de seus colegas de trabalho e nem mesmo do oficial Jones.Esse sim lhe causaria problemas inúmeros se soubesse, mas pelas conversasque tinha com o mesmo isso nem lhe passara pela cabeça. Sheryl sabia que asua partida não tinha como dar errado, afinal ela não comentara com ninguéme sempre tratou de esconder tudo às sete chaves para não haver surpresasdesagradáveis. Sempre trancava a porta do seu quarto ao sair e colocava ocadeado no sótão. Aquele sótão, no seu quarto, não era usado há anos e elasabia que as chances de seus pais pedirem para abrir seriam mínimas, porisso tudo estava escondido lá, como um tesouro de valor inestimável dentrode um baú. Nessa hora não havia ninguém em casa. Valentina estava na escolae seus pais trabalhavam. Sheryl aproveitou para escrever a carta dedespedida para seus pais. Teria que ser uma carta inteligente e que nãolevantasse suspeitas, pelo menos por algum tempo. Tempo suficiente para queela vivesse em paz com o seu amor. Sheryl amava Tony, mas sabia que maiscedo ou mais tarde essa história daria errado de alguma forma. Não porfalta de amor, isso não. Se dependessem apenas do amor que nutriam um pelooutro, essa história certamente seria infinita, mas sim pela situação. Nãoexistia bem que durasse, ainda mais quando o bem tinha uma ponta de mal,como o exemplo do yin-Yang. Como seria bom se ela pudesse viver esse amorcomo todos vivem. Sem barreiras, sem fugas, sem subterfúgios... Mas seráque assim eles seriam realmente felizes? Sheryl não gostava doconvencionalismo e mesmo sabendo dos perigos que corria resolveu arriscar.Sabia que um dia seria descoberta, ou pior, "caçada" pela polícia como umanimal selvagem encurralado na mata, mas estava disposta a isso. Se fossedescoberta, poderia ser presa por cúmplice de um assassino. A sua históriaaté então ficara no anonimato ou na dúvida, mas se fosse configurada a suafuga para encontrar-se com o Tony seria a prova cabal de que Sheryl mentiratodo esse tempo. Inclusive ela poderia ser presa por falso testemunho. Elanão queria mais pensar. Sentou-se em frente a escrivaninha, olhou-se noespelho, pegou um caderno e começou a escrever. Olhando para a folha embranco deixou a sua imaginação fluir:
Pai, mãe... Sei que não deveria sair assim sem me despedir, mas
foi necessário. Já estava cansada dessa cidade, dessas pessoas e das mesmasperguntas de sempre. Me senti oprimida, acuada. Para onde quer que eu fosse eseja lá o que eu fizesse era sempre observada com desdém ou pena. Não queriaser vista em uma cidade toda como a única sobrevivente de um assassino, devítima, de coitada, não! Preciso ir para um lugar que as pessoas não mereconheçam e se reconhecer que não achem necessário me perguntar o querealmente houve naquele sequestro, como milhares de pessoas já me perguntaraminclusive vocês. O tempo inteiro. Quando coisas ruins acontecem em nossavida, o ideal não é ficar falando o tempo todo e sim, tentar esquecer pararecomeçar uma nova fase da mesma. Infelizmente, convivendo aqui emSpringfield eu jamais conseguiria fazer isso. Jamais conseguiria vencer o meutrauma e muito menos me relacionar com alguém. Todos os homens daqui sempreme terão como a pobre Sheryl, estuprada e massacrada por um maníaco e eu nãosuporto mais isso, por esse motivo resolvi partir. Preciso me encontrar,preciso retomar não só a minha vida, mas a minha liberdade. Preciso de umtempo sozinha, apenas com a minha filha que por ser muito pequena, necessitaimensamente da mãe. Sei que com isso farei vocês sofrerem. Não queria afastara Valentina de vocês, pois sei que vocês a amam imensamente. Um dia vocêsirão me compreender. Por enquanto não vou manter contato e nem direi aondeestou, mas prometo que, assim que eu me encontrar, que resolver meusproblemas internos, sem a ajuda da família, de amigos e muito menos depsicólogos eu retornarei. Não para ficar, mas para estar com vocês. Sei quepoderia ter contado antes, mas certamente vocês iriam tentar me convencer defazer o contrário e eu já estava totalmente decidida. Fico por aqui dizendoque estarei bem e feliz. Não se preocupem comigo e nem com a Valentina. Euamo vocês e a Valentina também. Obrigada por tudo que sempre fizeram por mim,mas agora é chegado o momento da minha partida. Assim que puder mandonotícias. Um abraço bem apertado e que Deus os proteja sempre. De vossa amadafilha, Sheryl Madison.Após escrever a carta Sheryl respirou fundo, guardou-ajuntamente com as outras coisas no sótão e ficara por ali pensando emalguns detalhes finais.Finalmente chegara o grande dia. O dia da sua partida e elajá estava tão ansiosa que nem comer direito naquele dia conseguiu. Estavatriste também, pois sabia que por tão cedo veria os seus pais, porémlembrava-se dos quatro anos que passara afastada dos mesmos e saberia queuma hora isso teria que acontecer. Era realmente ruim por esse lado, mas jáestava com tudo pronto. Seus pais chegaram normalmente como todos os dias ede nada desconfiaram. As coisas seguiram como de costume e após tomar cafécom seus pais Sheryl foi com Valentina para o seu quarto. A criança dormiucomo de costume e Sheryl andava de um lado para o outro, com a portatrancada. Era quase meia noite e ela teria que partir
Em Springfield, Steven e Ellen sofriam com a decisão deSheryl. Ellen estava apreensiva e achava que era hora de procurar apolícia, já que havia se passado alguns dias e eles não tiveram um contatosequer. Steven, pacientemente disse à esposa:-Calma, querida! A Sheryl vivia me dizendo que uma hora iriapartir. Ela precisava desse tempo, dessa mudança. Veja, vamos esperar pelomenos dois meses. Se ela não der notícias em dois meses, procuraremos apolícia, tudo bem?-Dois meses? Você enlouqueceu? Em dois meses a minha filha ea minha neta podem ter sido assassinadas, raptadas, ou... Sei lá o que.Melhor nem pensar no pior.-Ellen, escute. A Sheryl nos deixou uma carta. Você achamesmo que se ela fosse assassinada, raptada ou sei lá o quê teria escrito amesma?-Steven, quem lhe garante que ela não foi coa
Em Veliky Novgorod os dias estavam ensolarados porém frios. Apequena Valentina estava muito gripada e os pais ficaram muito preocupados.Já havia tomado medicamentos mas a tosse e febre alta não regredia. Sherylestava triste e apreensiva e Tony também. A pequena precisou ficarhospitalizada e ambos não conseguiam mais concentrar-se em nada. Tonytrabalhava, mas fechava o estabelecimento mais cedo para ficar no hospitalcom Sheryl e a filha. Todos os dias eram assim. Finalmente depois de umasemana, a pequena teve alta e saiu do hospital. Sheryl e Tony comemoraram erespiraram aliviados. O telefone tocou, era Dasha. Sheryl ficou muito felizao falar com a amiga e a convidou, juntamente com Sergei para passar unsdias lá e os mesmos concordaram. Arrumaram as malas e caíram na estrada. Aochegar foram muito bem recebidos pelos donos da casa. Dasha e Sergeiestavam muito feli
O dia em Springfield amanhecera frio e nublado. Ellen e Stevepareciam mais conformados embora não tivessem mais nenhuma notícia daSheryl. A doutora Kate segurava o celular, olhava para o visor e pensava emligar para o Jones. Digitou os números, olhou novamente para a tela edesligou. Foi até a cozinha, tomou um gole de café e depois retornou para oquarto decidida a ligar. Ligou e notou uma certa frieza do oficial para coma mesma. Ficou intrigada porém pensou que, por ser uma segunda-feira, elepoderia estar atribulado e mal humorado, então resolveu dar um tempo eligar novamente no final de semana. Havia gostado muito de sair com oJones, mesmo achando estranho as perguntas que ele lhe fizera todasrelacionadas a sua cliente, Sheryl Madison. Infelizmente naquela noite, elaestava um pouco alta pelo efeito da bebida, pois deveria ter-se aprofundadomais para saber o porqu
Quando Sheryl falou com a mãe ao telefone, eraaproximadamente dez da noite. Nesta mesma noite, em Springfield, o oficialJones não se encontrava em casa. Chegara aproximadamente meia noite,embriagado e fora dormir sem escutar a secretária eletrônica. Não imaginavao que acabara de gravar. No dia seguinte, ao ouvir toda a conversa, quaseteve um surto quando percebeu a voz de Sheryl ao telefone e voltou agravação inúmeras vezes. Sabia que não podia partilhar aquilo com ninguém.Lembrou-se do oficial Larry, que já fizera parceria com ele em algunscasos. lembrou-se que o mesmo lhe fora bastante solícito no passado e atépensou em comentar, mas sabia que se o fizesse o tenente Oliver poderiatomar conhecimento e sua carreira estaria arruinada. Definitivamente issonão poderia acontecer. Se a história da escuta e da investiga
Em uma madrugada de domingo, fazia bastante frio em VelikyNovgorod. Era lindo de se ver as luzes no céu semelhante à aurora boreal. -Meu Deus, que linda paisagem! -Dizia Sheryl. Olhava para a cama e via osmaiores amores de sua vida, Tony e a pequena Valentina, dormindo comoanjos. Ela perdera o sono, desceu para fazer um café. Era aproximadamentecinco da manhã. Ela foi até a cozinha, ligou a cafeteira e ficou ali apensar enquanto a água era aquecida. Franzia o cenho preocupada com aspalavras que ouvira da sua mãe. Estava tudo muito bem, mas ela sentia a suafelicidade ameaçada desde que ouvira tais coisas. Aquele oficial nunca atirara da cabeça e ela não poderia imaginar que a sua obsessão chegaria atal ponto. Parecia uma sina maldita. Ele a prendera da primeira vez e agorapoderia muito bem estar lhe "caçando". Não estava preparad
Jones estava em casa quando de repente recebeu um telefonema.Era o senhor William do aeroporto, dizendo que tinha encontrado algo e ooficial prontamente partiu para lá. Ao chegar viu a filmagem e ficouchocado com o que acabara de ver. Sheryl e Valentina, as três da madrugadaembarcando. Ficou perplexo com o que ouvira do senhor William:-Checamos a lista de passageiros desse dia. O senhor temcerteza que o nome dessa garota é Sheryl Madison?-Absoluta!-Aqui consta como Tânia Clarckson e a criança ChelseaClarckson, suposta filha da mesma.-Eu não acredito. -Respirou apreensivo.-Senhor. O senhor está bem?-Sim, estou. Apenas pensei alto.-Tem mais alguma coisa que eu possa fazer pelo senhor?-Sim, claro. Para onde elas embarcaram?-Para Novosibirsk, na Rússia.-Na Rússia? O senhor tem certeza? -Levantou-se assustado.-Absolut
No empório, Tony e Sheryl mantinham um diálogo sobre aviagem. Tony não conseguia acreditar que os pais da Sheryl sabiam de tudo eentão lhe perguntou:-Mas querida, você tem certeza que seus pais não lherecriminaram? Assim... Eles aceitaram isso numa boa?-Nem tanto! O meu pai é mais evoluído, sabe? Mais avançado.Sempre me identifiquei mais com ele. Sei lá, parece que ele sempre meentendia mais que a minha mãe. Ele sim, sempre procurando entender o meulado. A minha mãe relutou um pouco. No começo até fiquei preocupada porqueela me fazia tantas perguntas que mais parecia uma investigadora depolícia. Sabe... Temi que ela, pensando estar a fazer o meu bem, ligassepara a polícia.-Nossa, nem quero pensar nisso, querida! Se ela o fizesseseria o nosso fim.-O meu, não é? pois