Ariel acorda ao sentir a mão de Camelia a acariciar-lhe o rosto. Ao abrir os olhos, encontram os dela, que parecem vazios. Não diz nada, fica quieto, deixando que ela faça o que quiser. Parece-lhe que ela está ali e, ao mesmo tempo, ausente. Permanece imóvel, receoso de como ela possa reagir. —Dói-me... —balbucia Camelia—. Dói-me muito lá em baixo. Foi então que Ariel levanta a mão e toca na testa da sua esposa. Está a arder, a temperatura é demasiado elevada. Salta da cama e corre para ligar ao seu amigo Félix. Explica-lhe a situação, e este diz-lhe que enviará a ginecologista, pois ele não pode fazer nada. —Lamento, meu amigo, mas tenho de informar o nosso sogro para que envie o helicóptero. Mudaram de lugar ou estão no mesmo sítio? —pergunta, fazendo com que Ariel corra até à janela. —Estamos parados. Vou perguntar ao capitão e envio-te as coordenadas. Temos de ordenar o regresso —diz enquanto corre para abrir a porta, encontrando Israel e Ernesto a dar ordens—. Digam ao ca
A preocupação no rosto dos seus pais era evidente. A mãe, com os olhos brilhantes pelas lágrimas contidas, aproximou-se para abraçá-lo brevemente. O pai, mantendo a compostura característica dos Montero, deu-lhe um tapa firme no ombro. —Estarei bem —assegurou Ismael, tentando transmitir-lhes confiança—. Cuida da Sofia. O rugido das hélices do helicóptero intensificava-se enquanto atravessava o jardim em direção à pista de aterragem. A chuva começava a cair com mais força, e os relâmpagos iluminavam o céu escurecido. —Major Alfonso, devemos ir buscar a doutora ao hospital e depois ver se chegamos antes ao iate antes que isto piore —ordenou, trocando de lugar com o piloto. Ismael era o melhor que existia entre eles. —Vamos voar. O iate tinha mudado de rumo em direção ao
Em uma imponente mansão nos arredores da cidade, Eliza, a irmã do falecido Leandro, caminhava furiosa pelo seu escritório após receber uma ligação que a deixara descomposta. —Que diabos aconteceu? Como é possível que não conseguiram capturar Camelia? Ela estava sozinha no hospital, pelo amor de Deus! —vociferava, batendo com o punho na mesa. —Não era ela, senhora, era a irmã mais velha, Clavel —respondeu a voz do outro lado da linha—. Você sabia que ela é filha do senador Camilo Hidalgo? O lugar se encheu de seguranças em questão de minutos. Escapamos por milagre. Sinto muito, Elisa, mas nós estamos nos retirando —e tentaram encerrar a comunicação. —Espere, droga! —gritou ao telefone—. Que bobagens você está dizendo? Camelia é filha de Pedro Oduarte, e
O helicóptero, pilotado por Ismael, com Félix e a ginecologista a bordo, lutava contra as violentas rajadas de vento enquanto o major Alfonso, sentado ao seu lado, tentava localizar o iate na imensidão do oceano. —Eles estavam bastante afastados, ainda não há sinais deles —comentou Alfonso, sem desviar o olhar dos binóculos. —Estavam praticamente no meio do nada, em águas internacionais —respondeu Ismael, também examinando o horizonte. A intensa chuva reduzia consideravelmente a visibilidade, dificultando a busca. —Ali! —exclamou de repente o major Alfonso, apontando para um ponto no horizonte—. Às três horas! Vejo algo que pode ser o iate. Ismael manobrou o helicóptero com destreza, lutando contra as rajadas de vento que ameaçavam desestabilizá-los. Félix e a ginecologista se agarraram aos assentos enquanto a aeronave virava bruscamente. —A tempestade está piorando —advertiu Ismael—. Se quisermos fazer um reconhecimento, tem que ser agora. —Aproxime-se o máximo que puder
Ariel ficou observando por mais um tempo enquanto o helicóptero se afastava, até que se tornou um ponto diminuto contra o céu agora limpo. O rugido das hélices foi desaparecendo gradualmente, deixando apenas o som do mar e do vento. Caminhou lentamente de volta para a cabine, mas parou diante da porta. Através da madeira, podia ouvir o murmúrio de vozes e o tilintar de instrumentos médicos. Passou a mão pelo rosto, exausto, e encostou-se à parede do corredor. —Senhor —chamou um dos tripulantes—. O capitão quer falar com o senhor na ponte. Ariel hesitou por um momento, olhando para a porta da cabine. Depois, olhou para a porta do salão onde estavam cuidando de sua esposa. Será que algum dia ela voltaria a se deixar amar como antes? O marinheiro esperava pacientemente ao seu lado. —Diga a ele que irei em alguns minutos —respo
Camelia abriu os olhos e encontrou-se deitada na enorme cama de um quarto luxuoso ao qual não tinha prestado atenção antes. Virou a cabeça e, através da ampla janela com as cortinas corridas, observou o mar azul a estender-se até ao horizonte. O suave balançar lembrou-lhe que estavam num iate. Já não tinha febre, e a dor tinha diminuído consideravelmente. Com muito cuidado, levantou-se, notando que, embora ainda sentisse algum desconforto, este era menor. Quanto tempo teria dormido?Pareceu-lhe que muito. À sua mente veio a última recordação do que tinha tentado fazer e procurou imediatamente o seu marido. O olhar de terror de Ariel permanecia cravado na sua memória. Como pôde fazer-lhe algo assim? Nesse preciso momento, a porta abriu-se e, por ela, entrou ele com uma bandeja cheia de comida. Ao vê-la acordada, colocou-a rapidamente numa mesa próxima e avançou na sua direção com um sorriso no rosto.—Bom dia, amor. Como te sentes hoje? —parou mesmo à sua frente, enquanto ela o olhava,
Ariel baixou o olhar, sentindo como o rubor subia pelo seu pescoço até às bochechas. As suas mãos, que até há pouco se moviam com segurança, começaram a tremer ligeiramente. Um nó formou-se na sua garganta enquanto lutava contra as memórias que sempre tentara manter enterradas. Respirou profundamente, consciente do olhar incrédulo de Camelia sobre ele.A vulnerabilidade que sentia naquele momento era quase insuportável; nunca tinha falado disto com ninguém, mas agora tinha de desnudar a sua alma diante da mulher que amava. A vergonha pesava-lhe como um fardo esmagador sobre os ombros. Quando finalmente conseguiu levantar o olhar para se encontrar com o da sua esposa, o seu rosto refletia dor. As palavras que estava prestes a pronunciar queimavam-lhe na garganta, mas sabia que era o momento de partilhar a sua verdade, por mais dolorosa que fosse.—Sim, Cami... é verdade —conseguiu articular, enquanto continuava a passar a esponja sobre os seios marcados da sua esposa. A água caía sobre
Enquanto Ariel fala, ajuda-a a vestir o roupão. Saem da casa de banho devagar e avançam até à mesa onde o pequeno-almoço os espera. Camelia olha-o ainda com cepticismo. Ele serve-lhe a comida e senta-se à sua frente, enquanto ela morde, sem grande vontade, uma torrada com compota. —Cami, sei que não acreditas em mim, mas posso pedir ao Félix que te mostre todas as fotos que ele e o Oliver me tiraram. Guardaram-nas como prova, caso um dia eu decidisse denunciar a Mailen —explicou Ariel com seriedade ao notar a incredulidade da sua esposa—. Ela é uma mulher doente, muito doente. Excita-se com a dor dos outros. —Como é que alguém pode excitar-se com a dor alheia? —perguntou Camelia enquanto se ajeitava na cadeira. Ariel serviu-lhe umas torradas acabadas de barrar com queijo e compota, como ela gostava. Camelia não as rejeitou; sentia tant