EVELYNECapítulo 31Sei que você vai achar estranho eu dizer isso, mas, para mim, os dias da semana possuem cheiros específicos. Os sábados, por exemplo, sempre tiveram o cheiro característico do Porto de Salome, uma das poucas praias de Trempton City — onde eu costumava ir com a minha família a contragosto e quase sempre era obrigada a aturar tia Jodie e seus comentários inoportunos quando abria um livro para ler na sombra. Sextas-feiras tinham cheiro de canela e chocolate. Minha avó costumava fazer bolinhos de chuva toda sexta à tarde quando eu era criança, e a minha memória dos lanches da tarde em sua casa ainda é bastante vívida. Segundas-feiras, no entanto, sempre tiveram o cheiro do plástico de meu estojo e das capas de minhas partituras. Estes sempre foram os piores dias da semana, porque era quando eu voltava à minha rotina de estudante de música. Esta segunda-feira, em especial, tem um cheiro diferente. Cheira a sol, felicidade e simplesmente Aaron Ditt. Eu já havia me esquec
EVELYNECassidy me estende uma peça de roupa no piloto automático.— Cass, eu pedi as brancas primeiro — saliento, encarando o suéter vermelho em sua mão.Sua expressão descongela e ela pestaneja, como se estivesse saindo de um transe.— Desculpe.Depois de colocar todas as roupas na máquina de lavar, eu coloco uma moeda e espero a roupa começar a bater. Cass observa ao meu lado o trabalho do equipamento, ainda absorta.— Por que você está toda estranha hoje? — pergunto. — Primeiro, você decidiu acordar cedo em um sábado. Agora, está aqui, na lavanderia do meu dormitório, me observando lavar roupas?— O que? — Ela finalmente tira a atenção da máquina de lavar, os olhos arregalados.— Você está estranha — repito. — Por quê?Dá de ombros.— Não estou.— Está, sim — insisto. — Algo está acontecendo? Quer me falar sobre isso?Ela morde o lábio, tensa.— Eve...— Sim?— Você... você já sentiu atração por garotas?Estranho sua pergunta, mas respondo:— Não... por quê?Ela encolhe os ombros.
EVELYNE— Vocês viram o que estão cochichando por aí? — pergunta Trent na hora do almoço.— Não sabemos de nada — diz Aaron. — Sobre o que estão falando?— Estão dizendo que Eric Ramsay confessou ter feito a montagem com as fotos da Ginger.Eu me viro para Gin, que se encolhe em seu lugar. Ela tem melhorado bastante desde o ocorrido com Eric, mas ainda está relutante em falar sobre o assunto.— Você sabia disso? — pergunto.Ela dá de ombros.— Não faz diferença. Todo mundo sempre soube que foi ele quem espalhou, mas do que adianta se o idiota não vai ser punido de qualquer maneira?— Pra falar a verdade, ele foi punido, sim — Trent comenta com uma risadinha.— Do que você tá falando? — questiono.— Descobriram quem bateu em Eric — ele diz. — Não sabemos ainda o que aconteceu direito, mas o distribuidor de Eric, um cara de Summer Ally, não gostou da demora dele para entregar o dinheiro que estava devendo e acabou resolvendo o problema com as próprias mãos. Além disso, a merda dele bate
AARONQuerido diário,É estranho eu estar voltando a escrever depois de dois anos sem uma única palavra. É como se eu estivesse ignorando um velho amigo durante todo este tempo. Ignorando a mim mesma.Sei que sou dramática. Sou um pouco excêntrica, também. Paul Weller (ainda não o citei, mas vou chegar nessa parte) costuma dizer que sou apenas intensa, mas tenho certeza de que essa é somente a sua maneira de tentar apaziguar as coisas e evitar que eu derrame meus dramas em cima dele, porque se existe algo que define Aiko Saori certamente não é a intensidade.Neste exato momento, estou sentada em um dos meus lugares favoritos, admirando a chuva que bate na janela enquanto escrevo, sentindo o vapor de um café com leite fresquinho. Eu gosto do café daqui. Também gosto dos muffins de mirtilo, mas estou me perguntando agora: por que nunca pedi algo diferente? Por que não me arrisquei em comer batatas fritas no café da manhã, por exemplo. Isso é proibido? É estranho, certamente, mas não est
Eu fiz algo que nunca tinha feito antes: fui a um show de rock.Sim, é estranho eu estar relatando isso, quando tudo o que conheci foram recitais e peças de teatro, mas não posso dizer que foi uma experiência ruim.Há essa banda universitária chamada Lions. Eles são conhecidos de Paul e sempre ensaiam na garagem do baterista deles, um cara do qual não me lembro o nome agora. Paul está tentando se enturmar com os populares de sua universidade, então ele me levou com ele.O vocalista deles, James Ditt, não tirou os olhos de mim durante todo o momento. Nem mesmo quando cantou lindamente uma música dos Beatles, que eu particularmente não sou fã, mas na voz dele ficou incrível.Paul percebeu suas investidas, mas não demonstrou nenhuma emoção além de bajulação para cima dos rapazes. Me senti mal pelo fato de meu namorado sequer sentir ciúme de mim quando um rapaz bonito se interessa. Me pergunto agora se tudo isso é confiança ou desinteresse. Estou mesmo com o cara certo?
Quando penso em minha vida e em tudo o que passei até chegar aqui, não me sobra muito além de um passado vazio e triste. Ainda me sinto triste e vazia, presa em um personagem que atribui a mim mesma e ainda não consigo me desprender. Sempre gostei de acreditar que sentimentos são facilmente controláveis. Que você consegue ativar e desativar determinadas sensações de acordo com sua força de vontade. Não consigo desativar este sentimento agora. Essa inquietação, palpitação intensa. Parece que meu coração vai sair pela boca e eu não sei exatamente o porquê. Talvez eu saiba e esteja apenas mentindo para mim mesma, mas como não minto para você, diário, vou relatar brevemente o meu dia.Hoje pela manhã, houve um evento beneficente das Ravens. Gosto muito de Dionne e das outras meninas, portanto as ajudo sempre que posso, mesmo não fazendo parte da irmandade.Como era um evento de arrecadação, muitas pessoas vieram comprar doces e arranjos de flores que nós mesmos preparamos. Eu estava enc
Pela primeira vez depois de anos, minha mãe me ligou. Ainda tinha a tola esperança de que ela havia passado por cima de seu orgulho e princípios arcaicos para finalmente saber se estou bem, mas o que obtive foi uma dose de críticas e hostilidade quando informei que estava trabalhando em meio período como babá para me sustentar, já que era uma simples bolsista no Joe Bixby com materiais didáticos para pagar.Ela disse que ainda daria tempo de largar esta vida medíocre e voltar para casa se soubesse a maneira certa de pedir desculpas. Se me humilhasse o suficiente, talvez fosse aceita pelo meu pai, e até arranjar um bom marido. Eu ri na cara dela e desliguei a chamada.Depois disso, decidi ir em um show dos Lions com Hana. Na verdade, eu a arrastei até lá contra sua própria vontade, porque ela ficou o tempo todo me dizendo que o que estávamos fazendo era errado. Eu sei que era. Eu tenho um namorado... certo? Eu gosto dele, ou ao menos deveria gostar. Então por que estou tão afetada com
EVELYNEEu tenho uma lista.Sei que estou agindo como uma perseguidora, mas desde que coloquei na minha cabeça que desmascararia Kendall Vallen, não consigo pensar em outra coisa. Com a ajuda de Cassidy, selecionei uma lista de pessoas que foram constantemente humilhadas por Kendall desde seu primeiro dia aqui no Joe Bixby. A boa — e trágica — parte é que eu tenho muitas opções. A parte ruim é que eles não parecem tão dispostos assim a me ajudar. Eu conversei com cada uma dessas pessoas, à procura de testemunhos para ter algum conteúdo para dar à Sra. Ramsay, mas a maioria está com medo de dar o seu relato, o que complicou as coisas para mim.E para piorar a minha situação, descobri que talvez as pessoas tenham medo de mim. Ao que tudo indica, elas pensam que sou uma ex Raven que agora sai com o líder dos Hawks. Dois grupos com os quais eles, certamente, não gostariam de se meter. A cada dia que passa odeio mais os boatos e odeio mais o Joe Bixby.— Você ainda não desistiu, não é? — C