Aqueles que não foram mortos fugiram em debandada. Haku gargalhava deliciado.
-- Corram, covardes!
Mikoto, entretanto, não compartilhava de sua empolgação, conjurar o kami da morte a deixara trêmula, com a cabeça girando.
-- Você espantou todos? – a voz de Yamatohime soou mais impressionada às suas costas.
-- Ainda há outros na cidade e no Santuário. Vamos para lá, Haku.
Ele a acompanhou numa trôpega corrida de volta ao Santuário Branco.
***
Takako não sabia há quanto tempo estavam lutando contra aquele gashadokuro, pareciam horas, ou minutos agonizantemente longos.
Nesses momentos ela queria ser tão empolgada e boa em magia combativa quanto Sayuri, que conjurava fogo, raios, neve, terra e o que mais viesse à mente contra o esqueleto gigante, enquanto Kurono, Yukio e todos os seguranças e guardas do t
No momento em que Sayuri pôde ficar de pé, o que aconteceu apenas na manhã seguinte, ela fez um encantamento de cura para restaurar a perna quebrada de Takako, e deu certo, mas o esforço a exauriu e ela teve que voltar para a cama.Foram necessários dias para a cidade voltar a alguma normalidade. O dano causado pelos youkai não era tão extenso quanto o de um bombardeio, mas o verdadeiro estrago não estava nas paredes e ruas destruídas.As pessoas aparentemente tinham perdido a confiança nas sacerdotisas e no clã Kairiku. Agora não eram apensa boatos e rumores, tornou-se oficial e inegável que youkai existiam, e o fato de haver monstros perigosos à solta criou um pânico generalizado.E como nenhum membro veio em socorro dos cidadãos na noite do ataque, houve uma quebra na antiga confiança de que o clã protegia o mundo das ameaças da n
Takako apertou a página entre os dedos até se tornar uma bola de papel. Sayuri entrara no quarto de hóspedes para acordar Mikoto e encontrou o bilhete sobre o criado-mudo, junto à flor de shion, e imediatamente chamou a prima. Agora as duas tentavam tirar alguma conclusão daquilo que tinham.Ela deixara para trás tudo menos o presente de Takako, não levara o celular nem a naginata. Queria mesmo viajar com pouca bagagem e não ser rastreada.-- O que ela quis dizer com “não quero correr o risco de prejudicar mais gente”? – Sayuri pensou alto, andando de um lado para outro do quarto – Ela dá a entender que tem medo de nos machucar, mas isso não faz sentido nenhum. No que ela estava pensando para fazer uma loucura dessas?-- Haku – Takako olhou para o menino, encolhido na beirada da cama, imóvel desde que Sayuri encontrara o bilhete – Você sa
-- O que você acha que está fazendo?! – Yasha agarrou Mikoto pelos cabelos e a forçou a levantar – Eu te digo exatamente o que fazer, e você foge correndo para casa, como se pudesse pedir demissão? E ainda por cima me faz vir nesse fim de mundo para pôr isso na sua cabeça!Ela jogou Mikoto no chão de novo e começou a andar de um lado para outro, claramente tentando conter a raiva. A menina se erguia nos cotovelos quando a mulher se agachou ao seu lado, e não ousou se mover quando ela voltou a falar, quase soltando fumaça das narinas:-- Nós não vamos tolerar esse comportamento. Já que você está tão perdida, eu te digo de novo o que fazer: vá para a última ilha, eu estarei esperando por você. Pode levar seu guarda-costas, mas nem pense em trazer as outras sacerdotisas intrometidas – Yasha segurou o pulso de Mikoto e a p
Ao nascer do sol, Mikoto ainda não tinha se mexido, continuava sentada na areia, abraçada aos joelhos e encarando o horizonte com os olhos estáticos. Sequer dormira, com medo de ter um sonho profético que mostrasse algo que tinha medo de saber.Os restos da fogueira que Haku acendera fumegavam às suas costas, e o menino examinava o terreno ao redor, a naginata em mãos, embora não soubesse manejá-la.A jovem teve a impressão de que amanheceu rápido demais, ou talvez ela estivesse em choque e não percebera o tempo avançando. Esperava que a luz do sol revelasse uma visão dos botes salva-vidas, trazendo Takako, Sayuri, Yukio e todos os tripulantes sãos e salvos, mas só o que o dia trouxe foi um mar completamente vazio.Ela tateou o bolso atrás de seu último recurso. O celular milagrosamente não tinha pifado mesmo em contato com a água,
-- Como assim nos reencontramos? – Mikoto deu um passo para trás. Akumi voltou-se para a porta de onde viera.-- Há quinze anos, eu perdi minha criação mais importante. Ela tinha a missão de devolver o mundo para nós.A menina precisou suprimir e silenciar o turbilhão de emoções de dor e desgosto por confirmar seu maior receio para continuar a seguir a mulher. As duas passaram para outra sala, muito maior, ocupada por um estranho maquinário, tecnológico, mas ainda assim antigo, como máquinas a vapor. Aquilo era claramente uma instalação de pesquisa.-- O que significa essa missão? Por que você quer destruir o mundo humano? – Mikoto não conteve a pergunta. Akumi virou-se para ela.-- Destruir? Não desejo destruir nada, não faria sentido, afinal era minha casa, e é para onde pretendo voltar. Foi para isso que
-- Levem-na para o laboratório. Começarei o processo de reformulação de memória ainda hoje – Akumi assumiu sua forma original, uma raposa de pelos alaranjados do tamanho de um porco e com oito caudas, ondulando atrás dela como as penas de um pavão.Depois que a nogitsune desapareceu escada abaixo, um tengu subiu e se dirigiu para Mikoto, mas seu peito foi transpassado por uma lâmina a meio caminho, e ele caiu morto diante de Yasha.-- Um youkai de nível tão baixo não deve tocar na minha irmã – ela disse com desprezo.Depois de limpar a tanto na roupa do tengu, Yasha a guardou no quimono e falou para a menina, apesar de saber que ela não podia ouvir.-- Aquilo foi muito interessante de se escutar. Não esperava aquela reação de você, mas até que gostei, maninha – com todo o cuidado ela segurou Mikoto no colo.
Mikoto parecia não estar em lugar nenhum, Haku começava a se desesperar. Seu irmão também estava preocupado, mas repetia o tempo inteiro como um mantra para se acalmar:-- Ela estava com Akumi-sama, então deve estar bem.A intuição de Haku dizia o contrário. Tudo naquele lugar exalava perigo, como fora idiota em ignorar seus instintos para satisfazer a própria curiosidade, e agora Mikoto desaparecera, e não podia culpar ninguém além de si mesmo.Haku afastou esses pensamentos, haveria tempo para se culpar depois, o mais importante agora era encontrar Mikoto para saírem dali. Ele olhou para seu gêmeo.-- Você conhece esse lugar melhor do que eu. Já olhamos várias salas, onde mais ela poderia estar?-- Ainda tem a ala leste, mas sou proibido de ir lá. Ikari-sama não admite que ninguém entre no laboratório de
-- Mikoto? – Takako e Sayuri também se paralisaram com a visão dela ameaçando Haku. Yukio sussurrou apavorado:-- O que ela está fazendo?-- Ei, Mikoto, calma – Haku ergueu as mãos, mas ela não abaixou a naginata.Havia algo errado com ela. Seu rosto estava congelado numa expressão neutra, e seu corpo mantinha uma postura tão rígida que se não fosse pelos cabelos que caíam sobre seus ombros, seria fácil pensar que Mikoto era uma estátua. O mais estranho eram seus olhos, vazios como se a mente dela não estivesse ali.E apesar disso, sua pérola ainda brilhava fracamente.-- Haku, se afaste, ela não está normal – Takako apertou o suzu com mais força. Sentia alguma energia sobre a amiga, algo maligno.Haku recuou para longe do alcance da naginata, e Mikoto assumiu uma posição defensiva. Say