Chego em casa e vou direto para o banho, sinto que há um cheiro estranho grudado em mim, me esfrego todo, até ficar vermelho, acredito que o problema mesmo está na minha cabeça, a imagem de Davi no caixão ainda está na minha mente. Como alguém pode simplesmente acabar com uma vida?
Saio do banho e o vapor se espalha pelo corredor, visto a minha roupa de ficar em casa, me deito e permaneço ali até ouvir uma leve batida na porta, com certeza é minha mãe, ela me olha de cima a baixo, nos somos pouco parecidos, a nossa maior semelhança é o formato do rosto e a boca.— Como foi lá?— Foi... A mãe, foi um enterro, só foi.— Se precisar me contar qualquer coisa, estou aqui, quiser conversar algo...— Sabe, quando estávamos lá o Pedro surtou... Acusou o Emanuel e a Janina de terem o matado, depois estendeu a acusação para mim e a Ísis... Eu me senti extremamente mal. Nenhum de nós faria isso.— Eu sei meu amor. E se não temos nada a temer, não tem mFecho meu notebook, que sexta-feira péssima. Não sei muito bem o que está acontecendo, meus pais queriam que eu fosse para a casa de minha avó, mas insisti em ficar sozinho, lá não tem nada para fazer e, além disso, o que pode acontecer? Não tem aula hoje, claro, quem tem clima para aula depois de um enterro? Foi horrível, não que um enterro deveria ser bom ou animado, mas os ânimos estavam a todos os momentos alterados, Pedro queria uma confusão a todo custo, sobrou até para a coitada da Janaína. Fiquei junto de Fani e Alexandre, Miguel estava desolado de mais e estou com um pé atrás com ele. Não que eu seja um amigo ruim, ou coisa do tipo, apenas não acho que seja um bom momento para estar do lado de alguém acusado de assassinato por um post, alguém que ganhou todos os olhares, desde familiares do Davi até a galera de fora da escola, que estava com ele quando Davi sumiu, para o meu bem, é melhor está longe. Esperei que meus pais saíssem e contin
A escola sem alunos, não parece uma escola. Por mais que a Escola Metódica se gabe em ser uma escola silenciosa e controlada, o que não é no dia a dia, sem os alunos correndo no corredor, sentados no chão, saindo e entrando das salas, passa a ser apenas um buraco vazio. Estou sentado no chão perto da porta da diretoria, minha mãe está com a diretora debatendo sobre o caso Davi. É estranho olhar para esse corredor e pensar que ele só sumiu para aparecer morto no dia seguinte, tento pensar em alguma coisa que me dê uma resposta, mas nada faz sentido. Deixo essa parte para minha mãe.Minha mãe é advogada e se prontificou para defender a escola, ela acha a escola perfeita, pois, eu sempre estou amparado, posso procurar ajuda com minhas notas baixas ou fazer atividades diversas, não tem com o que se preocupar, meu pai, que também é advogado, está em Salvador ministrando um curso, só volta mês que vem, por isso minha mãe não quer que eu fique em casa sozinho, nem que eu vá as minha
Estou completamente surtada.Alexandre tira a faca da minha mão com calma e me encara.— Pode me explicar o que está acontecendo?Solto os papéis sobre a mesa, com todo o respeito, maldito Jorge Amado. Um dos nossos livros de leitura obrigatória é Capitães da Areia, como na biblioteca não tem exemplares suficientes para todos os terceiros anos, e eu e mais duas pessoas na minha sala tem o livro, resolvemos fazer cópias cobrando quatro reais, achei que as folhas que tinham iriam dar, porém, as folhas de ofício acabaram no meio da impressão, fui correndo comprar um maço novo, quando voltei para casa e fechei a porta, escutei um barulho de algo se quebrando vindo de um dos quartos. Eu estava sozinha em casa, foi o suficiente para pegar a primeira faca que vi, e ir correndo para o corredor, a porta do meu quarto estava aberta assim como a janela, mas eu as tinha deixado assim antes, sem soltar a faca e as folhas, procurei pelo quarto o invasor, mas não havia nenhum
Mal superamos um trauma e já temos outro, esse sábado tem tudo para ser sem graça.Estou voltando do encontro de jovens da minha igreja e claro, um dos assuntos mais comentados foram sobre o meu colégio. Me cercaram de perguntas e recomendações, pois, o mal sempre se esconde nas sombras, seguro minha bíblia com mais força, aparentemente ninguém se importou com a ameaça colada nas portas, mas ainda me deixa preocupada... Talvez eu esteja levando a sério de mais.Atravesso a rua, tentando focar em qualquer outra coisa.— Janaína!Me viro lentamente e encaro Pedro vindo até mim.— Oi?— É que... Eu vi você... Você andando por aqui... — Pedro esfrega as mãos, é a primeira vez que o vejo gaguejar— Eu sempre passo por aqui... — Tento entender que rumo essa conversa vai levar— Queria... — Ele respira — Eu queria me desculpar. Me desculpar sobre o dia do enterro do Davi. Por ter te chamado de assassina.Ok, Pedro pedindo descu
Ísis está ao meu lado mesmo depois do sinal tocar, ela aperta as mãos, nervosa, mas seu rosto não expressa um porque exato.— Eu não vou assumir esse problema por ele de novo. — Quebro o silêncio— De novo?— Eu posso ter até sido um péssimo estudante, ter sido incontrolável, mas o Alexandre sempre esteve um pouquinho a cima de mim. Eu assumi roubo da prova de história no primeiro ano, ele é meu amigo, não podia deixar ele se ferrar sozinho.— Você deveria deixar. — Ela não parece chocada — Ele está completamente errado, mas ainda sim, ele roubou as provas e alguém as roubou.— O Marco e depois o Alexandre? Qual é a lógica?— Eles dois podiam facilmente ter irritado alguém. Sabe, depois que a morte do Davi foi anunciada, o Alexandre foi para casa transar com a Fani. — Ísis fala calmamente — Uma morte não o abala, mas provas roubadas sim? E o caderno de matéria dele? Isso é tão absurdo.— E se não foram as provas... E se foi algo que e
Meu plano de ficar até tarde no laboratório de robótica foi por água a baixo depois que perdi meu posto de líder. Eu sei que as regras da escola são seguidas severamente, mas a diretora poderia ter me dado a cópia da chave, eu só queria terminar o meu projeto de robô e estudar um pouco, parece estranho, me concentraria muito melhor aqui do que indo para casa, o silêncio seria o mesmo, mas há algo nessa escola que move a minha dedicação. Eu adoro a Escola Metódica, me sinto bem e acolhida, é como uma segunda casa, as meninas riem de mim por pensar isso, pois, não conseguem entender o meu gosto, mesmo depois de um horário integral de permanecer na escola, e mesmo depois de tudo que aconteceu com o Davi aqui dentro, ainda não consigo apagar a imagem de lugar amável. Vejo algumas pessoas do segundo ano passarem pelo corredor e pergunto sobre o menino que fica com as chaves, todos dizem que já foi embora, uma menina até ri dizendo que ele já perdeu a chave e antes disso mal ficava na sal
Surto, é isso que se resume o começo da manhã. Choro, desespero, Márcia está morta e ninguém entende o porquê. Nos deixaram presos na sala, enquanto os professores se retiraram para conversar sobre como proceder, a maioria da turma chora, a wi-fi da escola foi desligada, poucos tem internet para ter uma notícia nova, os meninos tentam especular algo, mas quando Ísis joga a cadeira do meu lado e me encara, todos se assustam e se afastam, inicialmente eu e ela não falamos nada inicialmente, apenas nós encaramos de um jeito triste e tosco, mas quando Janaína também se junta limpando as lágrimas, Ísis abre a boca.— Não faz sentido, vão ter que parar as aulas até que esse assassino seja pego. A Márcia sempre foi tão normal...— Posso estar sendo insensível, mas até agora não tivemos nenhum sinal do assassino. Quem foi que contou para todo mundo mesmo? — Digo mordendo a ponta da tampa da caneta incansavelmente— A Gabi recebeu uma mensagem e começou a chorar. — Janaí
Estou sentada na quadra com Natan, ele tem uma bolsa de gelo sobre o olho esquerdo e uma careta, ainda não falamos nada, me lembro de termos sido amigos, mas acabou no mesmo momento que ele e Pedro se tornaram melhores amigos, era muito mais pelo futebol, pelas brincadeiras do que por serem compatíveis, era muito mais pelo amparo das más criações que eles se uniram, e como Pedro não perdeu a oportunidade fez minha caveira, mas com Natan consigo conviver melhor.— Você quer a fofoca completa?— É.— Acho que o Pedro está afim da Valéria... Mas aí eu disse para ele abrir o olho, principalmente sobre o Bruno.— Você sabe que eles são amigos, né?— Mas o problema é justamente esse, Bruno é puta cuzão, ele tem aquela cara de sonso, mas fala umas coisas... O Pedro é só burro mesmo.— Olha, sim. — Deixo escapar uma risada— Eu falei isso para ele e o Pedro já ficou todo irritado, mas estávamos de boa, só que ele tava no celular com a cara fe