Catarina pov A mansão de Tristan tinha uma beleza silenciosa. O tipo de beleza que às vezes incomoda, não por ser opressiva, mas por nos lembrar do que a gente nunca teve. Havia uma imponência antiga nas paredes, nos móveis, nos vitrais que deixavam o sol escorrer com cuidado pelos corredores. A casa tinha alma — uma daquelas que observa, escuta, guarda segredos.A noite estava morna, mesmo aqui no alto, na floresta. O som das cigarras lá fora misturava-se ao sussurro leve do vento que passava pelas janelas mal fechadas. E eu andava com cuidado pelo corredor do segundo andar, carregando comigo a quietude de quem sente demais.Foi então que o vi. Tristan.Ele estava parado à porta do quarto de hóspedes — o quarto onde nosso filho agora dormia. Era um espaço que claramente nunca fora pensado para uma criança. As paredes nuas, os móveis antigos e rústicos demais, nenhum traço de cor ou brinquedo. Ainda assim, de alguma forma, o menino já havia dominado o lugar. Tinha deixado seus l
— Você… foi salvo por ele. — A pressão quente queimou atrás dos meus olhos, mas contive a frágil represa de lágrimas. eu nunca conheci Alexandre, mas ele já tinha toda minha gratidão. Se não fosse por ele, Tristan estaria realmente morto. — Sim, — ele respira fundo. —. Alexandre achou que me manter longe era o único jeito de me manter vivo. A essa altura, já tinha saído em todos os jornais que eu estava morto. Mas o corpo que encontraram… não era o meu. Era o do Óscar.Fiquei gelada. — Meu Deus, Tristan…— E tem mais uma coisa, — Ele murmurou, como quem sabe que vai deixar uma bomba no ar. — A Mary… estava grávida. Descobri só quando meu pai tentou me matar. Ele sabia. Por isso fez o que fez.Eu não conseguia reagir. As revelações caíam uma por uma, pesadas como pedras. E eu estava ali, tentando processar tudo, enquanto escondia uma parte importante da história — a verdadeira razão de eu ter invadido aquela casa: o documento. Aquele maldito documento que ainda me assombrava.
A carta começava simples:“ Tristan, se você está lendo isso, é porque estou morto.” talvez porque finalmente você tenha tido coragem de abrir esse cômodo. Sorrio só de imaginar o quanto você enrolou para fazer isso. A verdade, meu querido, é que eu guardei este documento aqui porque sabia que você só entraria nesse quarto quando estivesse pronto. E se você está aqui agora… então, bem-vindo. Está na hora de você saber de tudo.Durante muitos anos, eu mantive um silêncio que me custou noites de sono e paz de espírito. Eu sabia que, ao trazer você para a Rússia, não estava apenas protegendo um garoto ferido — eu estava te arrancando das garras de algo muito maior. Algo que nem eu compreendia por completo naquele momento. Mas fui entendendo aos poucos.Daniel Adamo Correia — seu pai — estava diretamente ligado a um esquema internacional de corrupção, lavagem de dinheiro, desvio de verbas e desaparecimentos suspeitos. Mas ele não era o cabeça. Ele era o braço sujo. O homem por trás d
Eu não sabia o que responder. Como poderia explicar a ela que eu estava ainda tentando entender tudo o que estava acontecendo? O peso das descobertas era enorme. Eu só queria encontrar uma forma de processar tudo isso antes de compartilhar mais.— Cat, — falei, com um suspiro cansado. — Só estou… cansado. A Carta…a carta. mexeu comigo. — Eu nem sabia mais o que estava sentindo direito.Ela sorriu com suavidade, como se soubesse exatamente o que eu queria dizer, e estendeu a mão até meu rosto, acariciando minha bochecha de leve.— Vai descansar, nerd— ela disse com ternura, um olhar doce que me fez sentir um pouco mais tranquilo. — Isso tudo pode esperar.Inclinei-me para frente e, sem pensar muito, beijei sua testa, seus olhos fechados, e depois dei um beijo suave em seus lados, sentindo a suavidade de sua pele.— Eu já vou deitar — murmurei. — Preciso de um pouco de descanso.Ela se afastou gentilmente, sorrindo, como se entendesse que eu precisava de um tempo para process
Eu quis fazer uma surpresa.Tristan vinha buscando nosso filho na escola todos os dias naquela semana. Estava tão empolgado com a paternidade que fazia questão de participar de cada pequena rotina. Era lindo de ver. Difícil de esconder o quanto aquilo me desmontava por dentro. Mas hoje… hoje eu quis ir. Não só para ver meu filho sair pelos portões, como fazia nos velhos tempos, mas porque algo dentro de mim não estava em paz.Fui a pé, como sempre, após não aceitar que o motorista particular me levasse. O fim de tarde trazia um vento fresco, e as folhas secas estalavam sob meus passos. As casas familiares, os vizinhos conhecidos. A falsa sensação de segurança que me mantinha funcional.Até que vi.Um carro escuro, reluzente, estacionado ao lado da escola, num ponto que dava visão direta para o portão da onde sairiam as crianças. Uma Ferrari. Preto fosco. Janelas escuras. Quase discreta, se não fosse o contraste gritante com o bairro.Meu corpo reagiu antes da mente.O sangue gel
Bati a porta do apartamento com força o suficiente para que qualquer coisa frágil ali dentro tremesse. Stevan apareceu no corredor logo em seguida, camisa parcialmente aberta, cabelo bagunçado, e pela primeira vez… parecia acabado. Pálido, olhos fundos. Não era o homem seguro, sarcástico e no controle que eu conhecia.— Que porra é essa?! — minha voz saiu rasgada. — Você mandou o seu pai atrás de mim? Ele me encarou como se eu tivesse cuspido fogo.— Vai com calma, Catarina.— Vai se foder com essa calma! — eu gritei, andando em direção a ele. — Eu quase tive um ataque do coração! Você tem noção do que ele fez? Ele foi até a escola! Ele ameaçou o meu filho!Os olhos dele brilharam por um segundo. Talvez surpresa. Talvez medo. Talvez vergonha. Mas, como sempre, ele se recompôs rápido demais.— Você tá pisando em gelo fino — ele respondeu, frio. — Eu não gosto desse tipo de acusação.— Acusação? — ri, nervosa. — Você sabe o que ele me disse? Que eu tenho dois dias pra entregar
A porta imensa da mansão do Tristan rangeu quando entrei. A casa estava silenciosa, envolta naquela penumbra de fim de tarde que sempre parece anunciar segredos. Ivana estava sentada no sofá, o olhar fixo na tela do celular, mas ergueu os olhos quando me viu. O silêncio entre nós foi imediato, denso.— Catarina… — ela disse, com a voz baixa. — Tá tudo bem com você?Hesitei. Minha garganta secou por um segundo. Ela era minha amiga. E parte de mim queria chorar no colo dela. Mas a outra parte… aquela que só pensa no Tristanzinho, não podia se dar ao luxo de fraquejar.— Só cansada — respondi, tentando esboçar um sorriso. — Aquelas correrias do dia.Ela franziu a testa, claramente não convencida. Mas não insistiu. Em vez disso, ajeitou a postura e disse, sem emoção:— Vou voltar pra Rússia por uns meses. A galeria tá me chamando, e eu não posso mais adiar.— Ah… — foi tudo que consegui dizer. Ela não tinha família. Não era como se estivesse voltando para casa. Mas eu também não
E mais: era o mesmo homem que Sheila dizia ter sido seu “marido”, ou o que muitos achavam que era. O tal que a acolheu quando estava grávida. O homem que por muito tempo ela achava ser seu único porto seguro.E esse mesmo homem, agora, ameaçava o nosso filho.Não havia mais espaço para dúvidas. A invasão da minha casa meses atrás não foi por acaso. Ela não estava ali por alguma necessidade, ou por curiosidade. Ela foi obrigada. Ela estava tentando proteger nosso filho. E eu… eu não vi.Eu devia ter percebido antes.Devia ter ligado os pontos, perguntado mais, insistido. Mas eu estava tão cego pelas minhas próprias dores, pela raiva do passado, que não enxerguei o que estava bem na minha frente: ela estava lutando sozinha esse tempo todo.Continuei lendo.Havia mais mensagens de Stevan. Muitas mais.“Você sabe que não tem saída. Ele vai vir atrás de você. Se não entregar o documento, não adianta correr.”“Se fizer merda, vai pagar. Você, e o moleque.”E então, como se meu pei