A carta começava simples:“ Tristan, se você está lendo isso, é porque estou morto.” talvez porque finalmente você tenha tido coragem de abrir esse cômodo. Sorrio só de imaginar o quanto você enrolou para fazer isso. A verdade, meu querido, é que eu guardei este documento aqui porque sabia que você só entraria nesse quarto quando estivesse pronto. E se você está aqui agora… então, bem-vindo. Está na hora de você saber de tudo.Durante muitos anos, eu mantive um silêncio que me custou noites de sono e paz de espírito. Eu sabia que, ao trazer você para a Rússia, não estava apenas protegendo um garoto ferido — eu estava te arrancando das garras de algo muito maior. Algo que nem eu compreendia por completo naquele momento. Mas fui entendendo aos poucos.Daniel Adamo Correia — seu pai — estava diretamente ligado a um esquema internacional de corrupção, lavagem de dinheiro, desvio de verbas e desaparecimentos suspeitos. Mas ele não era o cabeça. Ele era o braço sujo. O homem por trás d
Eu não sabia o que responder. Como poderia explicar a ela que eu estava ainda tentando entender tudo o que estava acontecendo? O peso das descobertas era enorme. Eu só queria encontrar uma forma de processar tudo isso antes de compartilhar mais.— Cat, — falei, com um suspiro cansado. — Só estou… cansado. A Carta…a carta. mexeu comigo. — Eu nem sabia mais o que estava sentindo direito.Ela sorriu com suavidade, como se soubesse exatamente o que eu queria dizer, e estendeu a mão até meu rosto, acariciando minha bochecha de leve.— Vai descansar, nerd— ela disse com ternura, um olhar doce que me fez sentir um pouco mais tranquilo. — Isso tudo pode esperar.Inclinei-me para frente e, sem pensar muito, beijei sua testa, seus olhos fechados, e depois dei um beijo suave em seus lados, sentindo a suavidade de sua pele.— Eu já vou deitar — murmurei. — Preciso de um pouco de descanso.Ela se afastou gentilmente, sorrindo, como se entendesse que eu precisava de um tempo para process
Eu quis fazer uma surpresa.Tristan vinha buscando nosso filho na escola todos os dias naquela semana. Estava tão empolgado com a paternidade que fazia questão de participar de cada pequena rotina. Era lindo de ver. Difícil de esconder o quanto aquilo me desmontava por dentro. Mas hoje… hoje eu quis ir. Não só para ver meu filho sair pelos portões, como fazia nos velhos tempos, mas porque algo dentro de mim não estava em paz.Fui a pé, como sempre, após não aceitar que o motorista particular me levasse. O fim de tarde trazia um vento fresco, e as folhas secas estalavam sob meus passos. As casas familiares, os vizinhos conhecidos. A falsa sensação de segurança que me mantinha funcional.Até que vi.Um carro escuro, reluzente, estacionado ao lado da escola, num ponto que dava visão direta para o portão da onde sairiam as crianças. Uma Ferrari. Preto fosco. Janelas escuras. Quase discreta, se não fosse o contraste gritante com o bairro.Meu corpo reagiu antes da mente.O sangue gel
Bati a porta do apartamento com força o suficiente para que qualquer coisa frágil ali dentro tremesse. Stevan apareceu no corredor logo em seguida, camisa parcialmente aberta, cabelo bagunçado, e pela primeira vez… parecia acabado. Pálido, olhos fundos. Não era o homem seguro, sarcástico e no controle que eu conhecia.— Que porra é essa?! — minha voz saiu rasgada. — Você mandou o seu pai atrás de mim? Ele me encarou como se eu tivesse cuspido fogo.— Vai com calma, Catarina.— Vai se foder com essa calma! — eu gritei, andando em direção a ele. — Eu quase tive um ataque do coração! Você tem noção do que ele fez? Ele foi até a escola! Ele ameaçou o meu filho!Os olhos dele brilharam por um segundo. Talvez surpresa. Talvez medo. Talvez vergonha. Mas, como sempre, ele se recompôs rápido demais.— Você tá pisando em gelo fino — ele respondeu, frio. — Eu não gosto desse tipo de acusação.— Acusação? — ri, nervosa. — Você sabe o que ele me disse? Que eu tenho dois dias pra entregar
A porta imensa da mansão do Tristan rangeu quando entrei. A casa estava silenciosa, envolta naquela penumbra de fim de tarde que sempre parece anunciar segredos. Ivana estava sentada no sofá, o olhar fixo na tela do celular, mas ergueu os olhos quando me viu. O silêncio entre nós foi imediato, denso.— Catarina… — ela disse, com a voz baixa. — Tá tudo bem com você?Hesitei. Minha garganta secou por um segundo. Ela era minha amiga. E parte de mim queria chorar no colo dela. Mas a outra parte… aquela que só pensa no Tristanzinho, não podia se dar ao luxo de fraquejar.— Só cansada — respondi, tentando esboçar um sorriso. — Aquelas correrias do dia.Ela franziu a testa, claramente não convencida. Mas não insistiu. Em vez disso, ajeitou a postura e disse, sem emoção:— Vou voltar pra Rússia por uns meses. A galeria tá me chamando, e eu não posso mais adiar.— Ah… — foi tudo que consegui dizer. Ela não tinha família. Não era como se estivesse voltando para casa. Mas eu também não
E mais: era o mesmo homem que Sheila dizia ter sido seu “marido”, ou o que muitos achavam que era. O tal que a acolheu quando estava grávida. O homem que por muito tempo ela achava ser seu único porto seguro.E esse mesmo homem, agora, ameaçava o nosso filho.Não havia mais espaço para dúvidas. A invasão da minha casa meses atrás não foi por acaso. Ela não estava ali por alguma necessidade, ou por curiosidade. Ela foi obrigada. Ela estava tentando proteger nosso filho. E eu… eu não vi.Eu devia ter percebido antes.Devia ter ligado os pontos, perguntado mais, insistido. Mas eu estava tão cego pelas minhas próprias dores, pela raiva do passado, que não enxerguei o que estava bem na minha frente: ela estava lutando sozinha esse tempo todo.Continuei lendo.Havia mais mensagens de Stevan. Muitas mais.“Você sabe que não tem saída. Ele vai vir atrás de você. Se não entregar o documento, não adianta correr.”“Se fizer merda, vai pagar. Você, e o moleque.”E então, como se meu pei
— Tristan? — A voz de Ivana surgiu alta, levemente tremida.— Tô ouvindo — respondi, acionando o viva-voz.— Desculpa ligar tão cedo, mas… eu achei que você precisava saber. Catarina… ela tá estranha. Muito. — A voz dela carregava uma urgência que me fez apertar o volante. — Ela me procurou agora há pouco e quando não te encontrou, perguntou se eu sabia onde você estava. Ela parecia… desesperada. Como se estivesse prestes a fazer alguma besteira.— O que ela disse?— Me fez prometer que eu cuidaria de você… e do pequeno. Me agradeceu por tudo. Me pediu desculpas. Disse que te amava. Que sempre te amaria. Disse que você foi a melhor coisa que aconteceu na vida dela.Fechei os olhos por um segundo, lutando contra a vontade de dar meia-volta.— Ivana… escuta. Eu preciso que você chame a polícia. Agora. — minha voz saiu firme, sem espaço para questionamentos. — Leva meu filho pra um lugar seguro e fica com ele. Não deixa ele sair. Tranca as portas, qualquer coisa. E chama a políc
— Porque você é um! — ela rebateu, a voz finalmente ganhando força. — Eu vi o que fez com ele! Com seu próprio filho! Se ele está vivo, não é graças a você.— Cala a boca! — ele berrou, e eu instintivamente me coloquei entre os dois.— Nem ouse levantar a voz pra ela. — falei com os dentes cerrados, a mão próxima ao coldre improvisado onde eu guardava a arma. — Se você encostar um dedo nela, eu juro que acabo com você aqui mesmo.Igor, até então observando a cena com uma expressão entediada, deu um passo à frente.— Chega. Todos vocês estão agindo como crianças. — ele olhou para mim. — Tristan. O documento.— Eu já disse que só entrego com garantias.— Você acha que está no controle? — Igor respondeu, começando a perder a paciência.Foi então que Daniel percebeu a arma sob meu casaco. Ele sorriu com escárnio.— Ah… então você veio preparado. — ele cuspiu no chão e avançou um passo. — Vai me matar agora, é isso? Vai terminar o trabalho que eu comecei?— Se você me der motiv