Laura
— Vocês precisam me ajudar! — Emily quase implorou, após aparecer de súbito no quarto, jogando-se em cima da minha cama, ao meu lado, da forma mais despojada que conseguiu.Franzi minha testa, sem conseguir entender direito, muito menos processar sua chegada e palavras, que mais me confundiam do que qualquer outra coisa.— Vamos por partes — Isabel falou, tentando acalmá-la. Fiquei surpresa ao ver que ela havia conseguido agir tão rápido diante dessa situação minimamente curiosa. Provavelmente não era a primeira vez que isso acontecia, o que só aumentava minha curiosidade sobre o significado por trás daquilo tudo. — O que aconteceu?— É uma história muito longa e eu não sei se tenho tempo para gastar contando para vocês — respondeu, parecendo alarmada.Foi inevitável para mim não perceber como seus olhos estavam cansados e levemente vermelhos, parecendo até que ela havia chorado há poucas horas atrás, sem nenhum consolo sequer. MesmValentimTalvez eu estivesse me sentindo meio louco ou, quem sabe, tivesse perdido o entendesse nas belas mulheres que rebolavam para mim ao som de um funk potente. Era isso ou alguém havia feito uma macumba das mais perigosas comigo, me deixando incapaz de sentir tesão até mesmo quando tive a oportunidade de ter uma novinha rebolando bem em cima do meu pau.Mas que porra! Por que nada estava me animando como eu gostaria? Nem as bebidas, nem as drogas. Nada era capaz de me fazer sentir aquela excitação que procurava quando vim até ali, e o mais engraçado era que o mesmo parecia servir para Marcelo. Nós dois estávamos mais que enfeitiçados, agora só restando saber se era pela mesma maldita bruxa.— Isso aqui está uma merda — falei, soltando um suspiro. Ele apenas assentiu, virando o líquido esverdeado presente em seu copo de uma vez só em sua boca.— Talvez, depois de tudo que aconteceu hoje, não estejamos no clima certo para curtir, vai saber.
ValentimFelizmente para mim, eles pareceram não se importar — ou até mesmo notar — minha saída dali. Por isso, dei a volta na pista de dança, desviando de mulheres e homens que dançavam sensualmente ao som de um pancadão bem envolvente, só para ficar em uma posição que era impossível não ser notado pelos olhos avelãs sempre aventureiros de Laura.Quando ela me viu, seu rosto pareceu empalidecer. Essa era uma reação esperada por mim, o que me fez fazer o mesmo da forma mais convincente que consegui. Arregalei meus olhos e fiz menção de caminhar até ela, a vendo se despedir apressadamente de seus amigos e vindo me interceptar assim que eles sumiram no meio da multidão.Ao parar diante dela, não fiz cerimônia. Fiz um sinal para que me seguisse e rumei em direção a uma área mais reservada, onde o som não seria um empecilho para a conversa intensa que nós dois iríamos ter. Ao chegar lá, apenas um casal de homens aproveitavam um momento a sós, me fazendo até f
LauraTrês palavras resumiam tudo que eu sentia naquele momento: ansiedade, expectativa e aflição. Não era por algo simples, longe disso, era pela prática de um plano de última hora que eu tinha sido obrigada a bolar para ajudar uma amiga em apuros — embora ainda não tivesse aceitado que Emily havia se tornado mais que uma simples "babá" posta apenas para me viajar.Após sairmos da casa de Valentim, eu e Isabel nos vimos em um dilema complicado: abandonar nossa amiga em um lugar cheio de homens com claras más intenções ou ficar, mesmo sabendo que isso não seria permitido facilmente. Por mais que eu gostasse de bancar a durona e arrogante, não pude ir contra eles. Fui expulsa dali a pontapés — quase que literalmente —, só tendo a chance de ver quem era o infeliz por trás da dívida que Emily havia feito em tão pouco tempo.Vicente, o maldito desgraçado.Grunhi baixinho só de lembrar, começando a subir as escadas. Depois dele não me reconhecer, um mi
LauraSe tinha uma coisa que eu não esperava ver era Isabel junto de Marcelo. Não, até que fazia sentido os dois estarem juntos — uma vez que tudo indicava que ele havia vindo com Valentim e alguém precisava distraí-lo para que Emily pudesse ter uma chance de escapar de uma grande bronca, por menor que fosse essa possibilidade. E quem melhor para fazer algo nesse nível do que a minha irritante ex-colega?Querendo ou não, ela sabia como conseguir enrolar alguém, e isso vinha desde a época em que nós duas fazíamos um curso de teatro juntas. Enquanto eu era boa em fingir e enganar, ela era boa em distrair e entreter o público. Muitas vezes nós duas juntas formavamos uma dupla perfeita, ao qual tornava as poucas apresentações que fazíamos juntas em grandes espetáculos sempre bem sucedidos.Era ótimo, tanto a emoção quanto os aplausos que nos eram oferecidos após cada apresentação. E, como Isabel, eu quase idolatrava a adrenalina que sentia ao final de cada sho
ValentimNão eram nem oito horas direito e eu já me encontrava no galpão, conversando com Marcelo sobre os próximos passos que teríamos que dar para crescer minha influência no morro. Não era um assunto fácil, uma vez que parecia haver mais pessoas interessadas em roubar essa posição de mim do que ser meu aliado, algo que me frustrava até certo ponto, eu era obrigado a admitir.Balancei minha cabeça, negando a ideia que o meu amigo havia acabado de sugerir. Ele sugeria que eu adiantasse a minha ida até a boate mais famosa da Rocinha gerida por Fábio antes de sexta-feira, que era a data que eu havia combinado com ele pela primeira vez. Isso não me agradava muito, principalmente depois do incidente onde eu acabei vendo que minha irmã e Emily haviam levado Laura até aquela boate sem minha permissão.Querendo ou não, isso tinha violado meus planos. E se alguém importante a tivesse visto ali? O que eu diria uma vez que o boato sobre sua estadia na minha casa já
Valentim— Ainda bem que sabe disso — Marcelo falou depois de um tempo, em um tom que não consegui decifrar e só serviu para me tirar dos meus pensamentos incessantes.Após isso, ficamos em silêncio por alguns minutos, imersos em pensamentos conflitantes. Admito que gostaria de falar alguma coisa naquele momento que me livrasse do gosto amargo que nossa conversa deixou na minha boca, mas não parecia haver nada que fosse capaz de fazê-lo. E o pior disso tudo era saber que, mesmo eu tendo noção que o final que esperava qualquer envolvimento que tivesse com Laura, isso não seria suficiente para me fazer abandonar a ideia de tê-la para mim.Eu a queria — até já a considerava minha — e a teria de qualquer forma, por mais estranho que isso soasse.Quando decidi finalmente dizer isso para meu amigo, a porta da sala onde nós dois nos encontrávamos abriu de repente, causando em mim um sobressalto. Olhei com raiva para o indivíduo que havia entrado ali, e m
LauraO dia estava quente, tão quente que eu me mantinha nadando na piscina como se nada ali me incomodasse; o que, de certa forma, não era verdade. Tudo estava me incomodando naqueles dias, de um jeito que eu não era capaz de pôr em palavras. Talvez isso tenha sido por causa do encontro e da decisão que eu havia tomado ontem? Era bem provável, uma vez que isso poderia muito bem influenciar as atitudes que eu tomaria nos próximos dias, muito mais do que eu gostaria de admitir.Soltei um suspiro, nadando para a borda da piscina. O sol quente batia em meu rosto, me fazendo cogitar a ideia de me trancar no meu quarto pelos próximos dois dias. Não era uma má ideia — e não seria a primeira vez que eu faria isso —, mas, mesmo assim, parecia um pouco errado. Demoraria um pouquinho ainda para eu decidir se iria ou não por esse caminho, eu sabia, e essa demora só seria mais um motivo para me enlouquecer.Bufei, saindo da água e nada feliz com minha última constataç
LauraAs ruas da favela da Rocinha estavam quietas, me fazendo crer que havia um motivo especial para não haver ninguém transitando pelo bairro; um que ainda era desconhecido por mim. Por um segundo, senti vontade de perguntar sobre isso para Emily, mas, ao vê-la nervosa, percebi que aquele não era o melhor momento.Talvez houvesse um segredo envolvendo aquela parte da favela que ela não quisesse me dizer ou até fosse proibido ser dito por aí. A chance era grande, o que me fazia crer que, quem sabe, uma boa parte das pessoas que moravam ali não fossem empregados e capangas de Valentim? Isso responderia tudo, e até me deixava em um misto de preocupação e receio.Se essa teoria estivesse certa, onde todo mundo estava naquele momento para as ruas estarem desertas? Talvez Valentim estivesse em alguma luta por território, e isso o levara a pegar todas as pessoas que conseguiu para ganhar, fosse como fosse.Por algum motivo que eu não era capaz de saber