Maju
A governanta e as outras funcionárias já haviam me avisado que o Senhor Henrique Smith era um pouco estressado, mas eu não fazia ideia que era tanto... Agora entendo o porque da Senhora Smith estar tão afobada atrás de uma babá, as outras devem ter fugido desse homem sem nem olhar para trás.
Eu não tive coragem de dizer mais nada, apenas acenei com a cabeça me sentindo totalmente nervosa... Eu nunca passei por nada assim antes, esse é o meu primeiro trabalho como babá, achei que as coisas seriam mais fáceis.
O Senhor Henrique não falou mais uma palavra se quer, ele apenas passou por mim rapidamente e saiu sem ao menos dar um "boa noite".
É, pelo visto as coisas não serão como eu imaginei, mas não vou desistir... Eu não vou e não posso desistir.
Até mais ou menos um mês atrás eu morava no interior de Minas Gerais, eu
tive que deixar minha cidade e estado do coração as pressas para tentar uma vida melhor aqui em São Paulo... O meu pai, meu paizinho que sempre cuidou tão bem de mim e da nossa família está com uma doença, ele tem Alzheimer e infelizmente nós não temos condições de cuidar bem dele lá da roça. Minha mãe faz o que pode trabalhando na lavoura, mas ela já é uma senhora, não pode fazer muito, foi por isso que eu decidi largar tudo para trás e vim tentar a vida aqui em São Paulo... Graças a Deus eu encontrei esse trabalho que já irá ajudar muito a pagar os medicamentos do meu pai e com algumas despesas de casa. É por isso que eu não posso e nem penso em desistir desse trabalho.- O seu pai deve ter tido um dia difícil no trabalho, mas está tudo bem, amanhã ele já deve está melhor.- Falei ao me virar para o Miguel sorrindo.
- O meu pai é um chato, igual você! Sua boba!- O Miguel gritou alto e em seguida acertou a minha canela em cheio com um chute forte e bem certeiro.
Eu fui na lua e voltei com a dor forte do pontapé que aquela criança abençoada me deu... Eu não fazia idea que uma criança tão pequena poderia chutar tão forte.
- Aí Miguel, não faça isso... É muito feio e o papai do céu não gosta.- Tentei corrig-lo enquanto massageava a área que ele havia chutado.
- Feio igual você! Chata!- Ele me xingou mais uma vez e em seguida saiu correndo.
Não tive outra opção, saí correndo meio que mancando atrás do Miguel enquanto ele pintava o sete... Se ele continuar o pai dele vai me colocar no olho da rua hoje mesmo. Aí eu tô literalmente lascada!
- Miguel, você tem que tomar seu banho para jantar... Vamos subir, por favor?- Pedi com toda calma e paciência do mundo.
- Eu não vou!- Ele gritou enquanto pulava sem parar pela sala de estar.
Ele pulava feito um coelhinho em meio aqueles itens de decoração caríssimos... Se esse menino quebrar algo, tenho certeza que o pai dele vai me fazer pagar e cada item desse deve valer mais que a minha casa lá do interior.
- Vamos Miguel, por favor... A Maju vai te dar um banho bem gostoso e depois você vai comer um papa muito gostoso.- Tentei convence-lo.
Ele nem se deu ao trabalho de me responder dessa vez, apenas subiu em cima do sofá e começou a pular no móvel branco com sem se importar com absolutamente nada.
- Miguel, desça daí, por favor, se não seu pai vai ficar bravo comigo e com você.
- Problema seu! Eu não tô nem aí!- Ele respondeu enquanto mostrava língua e balançava os ombros.
Enquanto Miguel pulava, pude ouvir barulhos de passos descendo a escadas e uma voz imponente soou fazendo com que o Miguel descesse do sofá imediatamente.
- Miguel, desça já desse sofá... Eu não vou falar duas vezes!- O Senhor Henrique pediu uma vez só e ele prontamente obedeceu.
Ahhh, então pelo visto ele obedece a alguém... Mas não sei se isso é bom, ele parece temer ao pai e pelo visto, eles não tem uma ligação de pai e filho. Esse homem mal falou com o menino, mesmo ele tendo estado mais de dois meses fora, está visível o motivo da revolta desse pequeno.
- Você não estava vendo ele praticamente destruindo o sofá? Não seja incompetente, garota!- Henrique falou com soberba ao passar por mim.
- Me desculpe, eu pedi para ele descer, mas ele estava irredutível.- Tentei explicar.
- É Marta, você definitivamente não vai durar muito tempo aqui.- Henrique falou.
- Desculpe, mas meu nome é Maria Júlia.- Fiz questão de corrigi-lo.
Henrique que andava em direção a sala
de estar, parou bruscamente, ele virou em minha direção e veio até mim enquanto sorria de forma debochada e irônica.- Garota, eu nem vou fazer o esforço de tentar lembrar o seu nome... Pelo que estou vendo aqui, você não passa desse mês.- Ele me respondeu com ironia e em seguida me deu as costas novamente sem me dar uma chance de resposta.
Esse Henrique definitivamente não me conhece, ele não faz ideia do quão decidida eu sou, irei passar sim desse mês e digo mais, farei com que esse menino me ame, ou eu não me chamo Maria Júlia.
- Sim senhor!- Respondi enquanto acomodava o Miguel em uma das cadeiras.
- A primeira regra de todas, eu odeio ser incomodado durante o meu trabalho, então nunca, em hipótese alguma permita que o Miguel me interrompa enquanto eu estiver focado no meu trabalho, caso contrário, isso lhe custará o seu trabalho.- Ele falou em alto e bom tom.
Apenas acenei com a cabeça em forma de resposta, pois percebi que ele passaria um bom tempo falando.
- Eu não quero que o Miguel se apegue a você, funcionários são descartáveis, e não quero vê-lo sofrendo caso você tenha que ir embora, então nem precisa dizer seu nome pra ele... Pra ele você será apenas a babá, é assim que ele vai te chamar, não ouse falar seu nome ou apelidinhos pra ele.- Ele falou e naquele momento percebi que aquele homem era desumano.
Pessoas não são descartáveis, sendo funcionários ou, eu acredito que cada um tem o seu valor, mas pelo visto para ele nada disso importa... É triste ver alguém assim, tenho certeza que ele é uma pessoa muito triste.
- Sim Senhor!- Falei ao engolir seco.
- E por último, mas não menos importante...Cuide do Miguel como se ele fosse a sua vida, eu não vou permitir que esse menino chegue em casa com um arranhado se quer. Você não pode deixa-lo sozinho por um segundo se quer r jamais, jamais fale ou resposta perguntas sobre a mãe dele... Essa mulher esta morta e se você menciona-la, você também estará!- Ele falou por fim.
Ouvi tudo calada e no fim desse apenas uma frase, "sim senhor", as exigências do Henrique são pesadas e algumas até mesmo absurdas, mas vou levando com a barriga até onde der... Esse com certeza não é o trabalho dos meus sonhos, mas eu com toda a certeza do mundo rnfrentatia o inferno só pra ver o meu pai um pouquinho melhor.
- Eu vou me retirar! Se precisar de algo, chame a Tânia, ela irá te auxiliar... O Miguel tem que estar na cama as nove, amanhã ele tem aula cedo e a tarde tem as atividades extra curriculares... Você já conheceu o seu quarto?- Ele me questionou sem ao menos me olhar.
- Sim senhor! É tudo muito lindo e confortável, muito obrigada.- Falei sorrindo.
O meu quarto é realmente muito lindo e aconchegante... Eu morava em uma casinha tão simples lá em Minas, estar dentro desse palacete e ter um quartinho só pra mim é um sonho.
- É, tem gente que se contenta com pouco.- Henrique falou com desdém e em seguida saiu sem ao menos se despedir.
É, agora vejo de onde o Miguel tirou sua ótima educação... O pai dele é um exemplo e tanto.
- A comida está boa?- Questionei ao Miguel.
Aquele menino me olhou com uma carinha de bravo, mostrou a sua língua toda suja de comida e deu os ombros... Aquilo me fez rir.
Miguel é um bom menino, eu sei que ele é. Ele está apenas perdido por não ter carinho e isso é perfeitamente normal... Eu sei que com o tempo e com muito jeitinho eu vou conseguir conquistar o coraçãozinho desse anjinho.
É, parando pra pensar... Talvez eu tenha uma missão nessa casa, além de ajudar os meus pais, eu também tenha que ajudar essa criança de alguma forma. Eu acredito muito que Deus direciona os passos de cada ser humano e creio que foi Ele quem me guiou para essa casa e para essa família. Talvez seja esse o meu propósito, cuidar e dar amor para uma criança com o coração ferido.
HenriqueNa medida que corria sob aquela esteira, sentia meus batimentos acelerarem, o suor descer pelo meu rosto e a cada segundo a minha respiração ficava mais cansada.Me exercitar é um dos poucos momentos livres que eu tenho e é uma das coisas que mais me trás paz... Eu me sinto bem quando estou aqui, sinto-me como se liberasse todo um peso das minhas costas, e é exatamente por isso que isso é a primeira coisa que faço todo santo dia, religiosamente.Desci daquela esteira ao completar dez quilômetros... A minha camiseta já estava toda molhada, meu corpo estava exausto e eu estava sedento por um copo de água.Saí da minha academia e me encaminhei direto para a cozinha... Tudo que preciso é uma garrafa de água, um banho gelado e em seguida um café da manhã reforçado.- Bom dia, Senhor Henrique!- Uma voz calorosa e animada soou atrás de mim me assustando.Virei-me para trás e me deparei com a babá... Qual é mesmo o nome dela? Marta, Manuela? Não me lembro, e também não faço questão d
MajuSinto o meu rosto queimar como se estivesse pegando fogo de tanta vergonha.O que é que deu em mim? Eu simplesmente não sei!Os meus pais me deram uma ótima educação, eu nunca havia entrado em um cômodo na casa dos outros é até mesmo na minha casa sem a permissão dessa pessoa, mas pelo visto de uma hora para outra eu me esqueci totalmente de um gesto tão básico de educação.- Que vergonha... Que vergonha!- Repeti pela milésima vez enquanto bebia um copo de água fria na tentativa de me acalmar.Eu preciso confessar algo, eu nunca havia visto um homem nu em toda a minha vida, então ver aquele homem totalmente pelado me causou uma grande síncope... Eu não soube o que fazer, o que falar e nem para onde ir. Apenas fiquei parada alí com uma cara de boba!- Sua tonta!- Falei para mim mesmo sem conseguir esquecer toda aquela situação totalmente vexatória.O Senhor Smith já não gostava de mim, agora ele vai ter uma ótima desculpa para me colocar bem no olho da rua... Esse com toda certeza
HenriqueA sala de reuniões está abarrotada nesse momento. Pela primeira vez no semestre reunimos todo o time de lideres para que possamos discutir sobre os lucros do último semestre e também discutir estratégias para o semestre que está por vir... Eu sei que eu deveria ser a pessoa mais focada nesse momento, mas a minha cabeça está bem distante daqui.A minha mente está uma verdadeira confusão nesse momento e mil assuntos rodam dentro dela sem parar... Eu penso no Miguel, nos meus pais, nós negócios e até mesmo na destrambelhada da babá do Miguel. Aquela garota definitivamente não nasceu para ser babá, acho até que ela está durando tempo demais lá em casa, mas sinto que dessa semana ela não passa... Pelo que fiquei sabendo, Miguel aprontou uma boa com ela esse fim de semana, sinto que até o fim de semana ela pede as contas.Estava com meu pensamento distante, mas ao ouvir o Mattew falar de forma tão sínica, minha mente despertou automaticamente.- Os gráficos estão apresentando uma m
MajuNesse exato momento são quatro e meia da da manhã, hoje é domingo e não preguei os olhos por um segundo se quer durante toda a madrugada.O Miguel não está nada bem desde as quatro da tarde de ontem. Ele vomitou algumas vezes, não conseguiu comer nada e está quentinho de febre... Eu chamei o médico dele durante a madrugada e ele já foi medicado, mas eu não vou conseguir dormir até ver que ele está totalmente bem.- Ele vai ficar bem, okay? Continue administrando as medicações e quando ele acordar vê se consegue fazer com que ele coma algo... Ah, e se a febre aumentar me liga, talvez a gente tenha que leva-lo para o hospital.- O doutor me avisou enquanto eu o acompanhava até a saída.- Tudo bem! Eu vou ficar de olho nele. Muito obrigada por ter vindo esse horário, doutor. Eu estava muito preocupada.- Fiz questão de agradece-lo.O Miguel estava queimando de febre quando eu liguei para o médico. Eu estava desesperada e não sabia o que fazer, estou realmente grata por ele ter vindo a
Henrique Os dias estão passando vagarosamente ultimamente, mas as palavras da Maria Júlia não saem da minha cabeça... Eu não fazia ideia que o Miguel se sentia assim, e mesmo sendo totalmente frio com ele, eu não quero que ele se sinta preterido por mim, porque eu sei exatamente como é se sentir assim e como isso é prejudicial.Quando eu era menino, tudo que eu mais queria era um gesto de carinho do meu pai ou da minha mãe, ao menos um abraço ou um afago nos cabelos, mas eu nunca recebi e sinto que até hoje isso me afeta... Os meus pais me deram de tudo. Eu sempre tive as melhores roupas, os melhores brinquedos, estudei nas melhores escolas e viajei para lugares incríveis, mas na minha infância isso não fazia tanta diferença pra mim, eu só queria estar junto deles e isso eu nunca tive, e infelizmente esse tipo de coisa não dá pra comprar nem com todo o dinheiro do mundo.As vezes eu sinto que deveria fazer uma terapia para superar tudo isso, mas sei que isso é perca de tempo, já não
Maju Eu ainda estava totalmente surpresa e desacreditada com o gesto do Henrique. Quando ele me disse que iria ajudar meu pai, eu achei que ele estava brincando, mas ele realmente cumpriu com o que disse.Fazem menos de uma semana que ele me disse que buscaria por ajuda para meu pai, e nesse meio meu pai já foi transferido pra uma ótima clínica médica, os remédios que ele estava precisando foram comprados e ele ainda custeou os gastos com transporte para a minha mãe... Eu não poderia estar mais grata por tudo que ele fez por mim e pela minha família e munda vou esquecer desse seu gesto de bondade.- Ele pagou todas as despesas médicas do seu pai?- Tania me questionou pela décima vez me fazendo rir.Nenhum funcionário acredita quando descobrem que o Henrique ajudou minha família... Todos tem exatamente a mesma reação, ficam de boca aberta e totalmente incrédulos.- É verdade! Confesso que até algumas semanas atrás achava que ele era apenas mais um riquinho, metido a besta e egoísta,
Henrique Dias haviam se passado desde o incidente ridículo que houve entre a Maria Júlia e eu e ainda estava sem acreditar que aquela garota tinha dito NÃO para mim.Acho que ela realmente não tem noção de nada da vida, caso contrário ela com toda certeza teria se sentindo privilegiada de um cara como eu ter se interessado por ela. Não que a Maju seja uma mulher feia, ela não é, muito pelo contrário, mas eu sou Henrique Smith, um dos homens ricos do país... Quem diria não para mim? Ninguém!Mas quer saber? Foi realmente ótimo que ela tenha dito não... Ele com certeza iria se apaixonar por mim, isso não daria certo e eu teria que demiti-la, ela ter dito não foi ótimo para nós dois.- Senhor Smith?- Uma voz soou lá no fundo do meu subconsciente me fazendo acordar.Levantei a cabeça afastando aqueles pensamentos e me deparei com Cíntia parada de frente pra mim... O que essa mulher quer? Já estou com a cabeça cheia demais.- Fala, Cíntia.- A respondi sem paciência.- Nossa, Henrique! O S
Maju Hoje completam três meses exatos que venho trabalhando na mansão do Henrique Smith. Confesso que ao chegar naquela casa pensei que tudo seria mais fácil, pensei que eles gostariam de mim logo de cara e que teria a afeição do meu patrão e do seu filho, mas hoje vejo o quanto eu estava enganada com tudo isso... O carinho do Miguel eu até consegui conquistar e estou imediatamente feliz por isso, mas aquele troglodita idiota do Henrique realmente deve ter coração de pedra, e quer saber de uma coisa? Hoje em dia já não faço questão que ele se simpatize mais comigo, tudo que quero desse babaca é o meu pagamento no fim do mês, mais nada.Quando o Henrique me ajudou nas questões do meu pai, eu mudei toda a minha concepções sobre ele e pensei que ele realmente poderia ser um ser humano bom e empático, mas as palavras que ele me disse aquele dia no corredor mostraram que ele é apenas um ser desprezível, pobre de espírito e sem consciência... Foi naquele dia que eu decidi que não iria mais