Capítulo 05

entrei em meu quarto. Chorei deitada em minha cama, com os fones de ouvido berrando: No time To Die, da Billie Eilish, até pegar no sono. Não era sempre que isso acontecia, afinal, depois de anos, eu já havia me acostumado com os insultos tanto de meu pai como de minha mãe. Mas dessa vez tinha sido diferente, não por suas palavras, mas porque eu sentia algo em mim diferente. Havia uma esperança de as coisas serem diferentes, e ver que meu pai só pensa em mim para usar em seu próprio benefício, me doeu. Muito!  

Quando acordei, já passava das três horas da tarde. Foi um despertar doloroso e vazio. Não havia propósito para eu me manter acordada e desejei ser a Bela Adormecida sem pretensão alguma de acordar. Betina entrou em meu quarto como um furacão, me sentei na cama assustada com sua invasão repentina.  

— Safira, olha pela janela, rápido! — Ela trancou a porta, e eu ainda não conseguia entender o que estava acontecendo. 

Me levantei, olhei meus cabelos desalinhados e minha cara amassada no espelho… é… eu consegui ficar pior.

— Eu disse: rápido! — Tina me puxou pelos braços e me empurrou até a janela. — Olha quem está lá.  

— Meus Deus — falei alto. — Eu disse para ele não aparecer aqui. — Meu coração estava disparado e minhas mãos começaram a suar, esfreguei-as na calça jeans que eu usava, na tentativa de me acalmar. Daniel estava escondido entre duas árvores que ficam de frente para minha janela, mas distante o suficiente para ninguém desconfiar que ele estaria a me observar de lá. — Se alguém vê-lo ali, nem sei o que pode acontecer.  

— Como ele sabe que seu quarto é aqui? 

— Ele fazia isso quando éramos crianças. Ele me chamava para brincar por aqui.  

— Ele teve sorte de você não ter mudado de quarto. — Tina se afastou e falou ao mesmo tempo. Meus olhos não desviavam do homem parado com as mãos no bolso da bermuda, observando tudo ao seu redor. Finalmente ele olhou em minha direção e então sorriu, pegou o celular, olhou para tela e voltou a me encarar com o telefone no ouvido. — Seu telefone está tocando, Safir. 

— Me dê aqui. É o Dani. — Um sorriso se desenhou em minha boca quando vi o nome dele estampado na tela do meu telefone. 

— Atende logo, mulher! — Betina me encorajou e me empurrou de volta para a janela. Voltamos a nos observar e atendi sua ligação. 

“— Oi! — eu disse. 

Oi! Você está bem? — Sua voz era quase um sussurro. 

— Sim! — respondi, sorrindo e sacudindo a cabeça. — E você?  

Incrivelmente com saudades da minha amiga que reencontrei há um dia.  

— Aposto que sua amiga também está com saudades.  

Eu espero que sim. Pois estou a um passo de escalar a parede que me impede de abraçá-la.  

— O que você veio fazer aqui? 

Já disse, estava com saudades e você não respondeu nenhuma das minhas mensagens. Fiquei preocupado.

— Não precisa se preocupar. Estou sempre aqui nessa casa e nesse quarto. Vou até aí amanhã para te explicar todo nosso cronograma.  

Por que não vem hoje?  

— Tenho um compromisso com a família. Não queria, mas tenho. Amanhã à tarde vou dar um pulo aí.  

Te aguardo ansiosamente, Sari.

Ele desligou e ficamos ali parados por um tempo, nos encarando. Ele olhou para todos os lados e quando sentiu segurança, saiu de fininho e às pressas.  

— Ele gosta de você! — Tina falou. 

— Somos amigos. Éramos amigos na infância e agora... 

— E agora ele está totalmente atraído por você!  

— Para de falar besteira. Ele é meu amigo, nada além disso. Ele vai me ajudar e eu vou ajudá-lo e acabou. Depois é cada um com sua vida.  

— Para alguém que ama uma comédia romântica, você é péssima em leitura comportamental. 

— Exatamente por assistir tanto, que sei que ele não sente nada disso, e eu não serei tola de ficar me iludindo. Agora, vamos, a gente precisa se arrumar, pois hoje tem o ensaio para o Baile e a gente vai espiar tudo! 

— Ah, então era esse o compromisso? 

— Sim! Não posso perder o foco. Tenho que me preparar para o confronto que será esse evento.  

— Vai dar certo, minha amiga. Você terá sua liberdade muito em breve. 

— Deus te ouça!  

O restante do dia passou rapidamente. Betina e eu nos escondemos atrás de uma das mesas no canto do salão. A reunião começou e minha mãe falou sobre o horário de início da festa, o que os profissionais precisam usar e fazer, coordenadas do jardim e o lugar que cada um ficaria, e os convidados mais ilustres daquele ano. O governador do estado e sua esposa, viriam prestigiar o evento de maior fama da região e se tudo corresse como eles previam, eu seria pedida em casamento no dia do Baile,

Espera... O quê? Eu vou ser o quê?  

Eu e minha amiga nos entreolhamos, boquiabertas com o que estava para acontecer e o coração a mil por hora com aquela novidade. Eu precisava sair dali o mais rápido possível. Mas a nossa posição não nos favorecia e qualquer movimento que eu fizesse estaríamos encrencadas por estar espionando.  

Aparentemente eu tenho um pretendente. Mas não sei como vou conhecê-lo se não poderei ir ao baile. O que eu faço agora? 

Minhas pernas começaram a tremer tamanho foi meu nervosismo ali, e sem que eu percebesse, meu corpo tombou para o lado e cai sentada. Meus pés embolados na toalha branca de cetim da mesa onde eu me apoiava. 

— Merda! — xinguei. — Fica quieta aí, para você não levar bronca — cochichei para Tina e me levantei lentamente ao ouvir passos vindos em nossa direção. 

— O que faz aqui, Safira? — minha mãe perguntou. 

— Nada. Estava curiosa para saber mais da festa. E sem querer acabei descobrindo que tenho um possível casamento arranjado. — Encarei minha mãe e marchei até onde ela estava. — Vocês não têm esse direito sobre mim! Além do mais, eu já tenho um par para me acompanhar ao Baile. — Saí batendo os pés. Escutei minha mãe dar a reunião por encerrada e logo seus passos apressados vindo até mim. 

— Filha, vamos conversar. Por favor! — Minha mãe alcançou meu braço e parei de andar. O corredor estava vazio, mas eu podia sentir os olhares pairando sobre nós. — Vem, vamos até o escritório de seu pai.  

— Não vou a lugar nenhum. — Puxei meu braço, interrompendo nosso contato. — Não tenho nada para falar!  

— Não dificulte as coisas, Safira. Seu pai já vai ficar nervoso com a sua intromissão na reunião pré-baile.  

— Eu não ligo! Não vou deixar mais vocês me controlarem como querem. Eu cansei de só ouvir as merdas que vocês pensam de mim e sofrer calada. Minha vida, minhas escolhas!  

Minha mãe não foi capaz de me refutar e se calou. Consegui ver o tremor de seus lábios e a tristeza em seu olhar. Ela estava abalada, mas passei anos assim e ela nunca se importou, então eu também tenho esse direito. Me tranquei no quarto, tomei um banho, me desfazendo em lágrimas debaixo da água quente da banheira até ouvir o som do meu telefone avisando que havia uma mensagem.  

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