Capítulo três

Gina Morreu.

Essas palavras pareciam o remédio perfeito para enlouquecer Giovanna de vez. Ela colocou as duas mãos na cabeça e sentiu como se aquilo não fosse real. Uma moça jovem, que tinha sonhos, se foi. E a culpa de tudo aquilo era apenas dela, e da sua incapacidade de enfrentar o próprio marido. Se tivesse sido só mais um pouco corajosa uma única vez, Gina ainda estaria viva. As lembranças de dois dias atrás, quando deu adeus ao Nicolau, invadiram a sua mente. A dor imensurável, a perda de um homem que havia lhe salvado, ainda destruía seu coração. Agora se misturavam com a dor de perder a irmã.

— O que você tinha de tão importante para fazer, que não pode salvar a Gina? – Irma, agora com a maquiagem borrada, segurava pela blusa de Giovanna com força, mas o terror estava em seus olhos, – Por que você foge quando as pessoas mais precisam de você?

Como se a dor a calasse, ela não conseguiu dizer mais nada. Irma ainda berrava, mas ela não era a única a se sentir assim.

— Desde quando você nasceu só trouxe desgraças para minha vida – berrou mais uma vez. Irma atropelava as palavras demonstrando que já não raciocinava direito.

Giovanna a olhou pela última vez e virou as costas saindo do hospital. Nessa hora, já respirando o ar puro e observando o movimento da avenida logo a sua frente, pensou que seria bom se aquele carro a tivesse atropelado naquela manhã. Seria menos doloroso do que todos os acontecimentos que vieram em seguida. Ela não se lembrava como havia chegado ao carro tão depressa. Ela manobrou o veículo na direção da estrada. Seu mundo estava borrado pelas lágrimas. Quando, enfim, chegou na mansão, olhou pelo retrovisor e conteve um soluço à medida que a imagem de Gina, tão cheia de vida, aumentava em suas memórias. Desceu do carro com dificuldade, como se carregasse o mundo nas costas. A mansão estava silenciosa, apenas os empregados faziam os serviços diários. Subiu as escadas e assim que entrou no quarto, a dor ganhou dimensões imensuráveis, fazendo Giovana gritar tanto, que o seu desespero ecoou por toda a mansão. Meia hora depois, foi para o banheiro. O jato d’água-forte acoitou sua pele como um castigo. Quando finalmente saiu do banho, vestiu uma roupa qualquer e começou a guardar todas as outras na mala. Lembrou-se que não havia mais motivos para permanecer ali. Nicolau se foi, e como o próprio Antony havia dito, aquele casamento também. Sobre isso, ela ainda não conseguia pensar direito, como se a realidade não tivesse batido a sua porta.

A dor pela morte de Gina ocupava todo o espaço e a culpa não a deixava raciocinar. Porém, mesmo quando sua mente começou a desacelerar, Giovana se deu conta que ainda não estava pronta para ir embora. Em vez disso, sentou-se na cama, pela última vez e observou o sol enfraquecer, se escondendo atrás da montanha, deixando a escuridão se espalhar delicadamente pelo quarto. Se perguntou, se um dia se perdoaria por aquela falha que custou a vida da própria irmã. Quando, enfim, desceu as escadas, com as malas nas mãos, ouviu a voz de Antony vindo do escritório. Caminhou até lá, percebendo conhecer a segunda voz que vinha do ambiente. Era Ricardo, o amigo de Antony.

— Você se divorciou dela? – Ricardo falava em voz baixa. Giovana deu uma espiada e viu Antony encostado na mesa do escritório com uma taça de vinho nas mãos, como se comemorasse aquele momento.

— Minha irmã acabou de falecer, e ele está comemorando?

Sentiu-se enojada ao vê-lo em tal posição.

— Você sabe que ela é uma boa esposa. Tudo o que ela fez foi amar você. Continuou Ricardo. Antony riu, encarando o homem com ironia.

— Eu nunca desejei o amor dela – ele franziu a testa e bebeu mais um longo gole de vinho, — Só me submeti a esse papel de marido para ter minha parte na herança.

Giovana imediatamente se viu obrigada a parar de escutar. Era brutal ouvi-lo dizer aquilo em voz alta. Agora conseguia entender que o divórcio havia sido uma solução para metade dos seus problemas. Enquanto caminhava para fora da mansão, se questionou do porquê permitiu ser tão humilhada por Antony. Durante aqueles três longos anos havia sido tratada como algo sem valor. Antony a desprezava e tudo o que ela fez foi obedecê-lo e amá-lo.

— Para onde está indo, senhora? – Tania interrompeu sua jornada, obrigando Giovana a parar ainda na porta.

— Não sou mais a sua senhora – respondeu ela, olhando bem nos olhos da governanta, – estou divorciada do Antony.

— Está me dizendo que vai embora? – Havia lágrimas nos olhos da mulher.

— Não se lamente, Tania – deu dois passos para frente, abraçando Tania, – avise ao seu patrão que eu já desocupei a mansão, e que o enterro da Gina será amanhã.

Após jogar a mala no banco do carona, Giovana deu partida no carro, prometendo não olhar para trás. De qualquer forma, aquela parte da sua vida estava resolvida. Era o momento de fazer novos planos. De recomeçar. Vinte minutos depois, Tania entrou no escritório, fazendo o que Giovana havia pedido.

— Gina morreu? – Perguntou com urgência, os olhos arregalados e o espanto da notícia espalhado no semblante. Antony pegou o celular e ligou para Irma. Ele precisava entender qual havia sido a parte da história em que ele se perdeu.

— Gina precisava de uma transfusão de sangue e como o banco de sangue do hospital estava vazio, apenas Giovana poderia doar o sangue para a irmã. Mas por algum motivo, Giovana foi embora, e quando voltou ao hospital já era tarde demais.

Quando a ligação foi encerrada, ela se sentou com cuidado, a cabeça latejando, o estômago embrulhado. Juntou as peças e chegou a uma conclusão dolorosa: ele a obrigou a assinar os papéis do divórcio enquanto a Gina morria no hospital. Por isso Giovana dizia que Gina precisava dela.

— Preciso encontrar Giovana – disse com desespero.

— Giovana não está mais na mansão – comunicou Tania, – ela foi embora.

Seus pensamentos se voltaram para Giovana e ele foi invadido por uma enorme solidão.

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