Capitulo dois

Há dois dias o Nicolau, pai do Antony, foi enterrado com honrarias de um homem bom. Nicolau foi o homem que salvou Giovana das maldades de Irma, quando ela ainda era uma adolescente. Essa era uma história que Giovana não conseguiria explicar direito, por achar ironia demais do destino ou sorte, mas sabia que antes do seu pai morrer, fez o Nicolau prometer que cuidaria dela e que daria a própria vida para salvá-la das maldades da própria mãe. E foi o que ele fez em memória e respeito ao melhor amigo. Apadrinhou Giovana, colocou ela para estudar em uma das melhores faculdades e a deu paz e dignidade. Mas a grande surpresa viria depois. Nicolau fez um pedido inusitado a Giovana, que por gratidão, não teve como recusar: 

— Case-se com o meu filho Antony – dizia ele. 

Na época, Giovana mal conhecia Antony, apenas por fotos ou histórias que o próprio Nicolau contava sobre ele. Antony residia nos Estados Unidos há mais de cinco anos. Estudava engenharia em uma da melhor faculdade daquele país, mas se tinha algo que Giovana sabia bem sobre o rapaz é que era de uma frieza incalculável e uma soberba sem fim. 

Nicolau havia salvado Giovana, para que no final Giovana salvasse o filho dele. O propósito desse casamento arranjado era somente esse, e Giovana não recusou o pedido. Casou-se com um homem que também não queria se casar com ela. 

Aquilo tinha tudo para dar errado. Antony sabia que para ser o único herdeiro da fortuna de Nicolau, precisaria aceitar o acordo. E ali estavam eles, dois anos depois, prontos para acabar com tudo isso. 

— Antony pedirá o divórcio assim que o testamento for lido – Tania, a governanta da casa, que era a mais próxima de Giovana na mansão, a alertou assim que ela pisou na casa, – Esteja preparada, minha querida. Antony não medirá esforços para se livrar de você. 

Mas Giovana vinha se preparando para esse momento há muito tempo. Desde quando Nicolau havia ficado doente, ela já sabia que o dia do divórcio se aproximava. Essa não era a primeira vez que ele falaria do disso com ela. Pelo menos as poucas vezes em que conversavam, ele deixava claro o quanto a desprezava. Não havia mais motivos para eles ficarem juntos, a única razão que os uniu estava morta: Nicolau. 

— Não se preocupe comigo – disse ela a empregada, – talvez seja até melhor assim. 

— A senhora poderá perder tudo e sair desse casamento sem absolutamente nada. 

— Não me casei com o Antony por dinheiro – desviou o olhar para o corredor que dava acesso ao escritório, – sendo assim, nada disso me fará falta. 

Caminhou apressada pelo corredor, parando bem em frente à porta do escritório de Antony. Desde quando se casou com ele, havia entrado ali apenas duas vezes. Antony não gostava de vê-la andando pela mansão, sempre a recriminava por isso. Sempre fez ela se sentir como se não fizesse parte da sua vida e como se nada daquilo a pertencesse. Seu corpo tremia, apesar do calor que fazia naquele dia. Giovana respirou fundo, tomou coragem e entrou na sala. 

Giovana avistou a expressão de Antony se fechar assim que ela cruzou a porta. 

— Vamos acabar logo com isso – Antony disse isso sem olhar nos olhos dela. 

Giovana queria que aquilo fosse o mais rápido possível. Enquanto o advogado lia o testamento, os pensamentos dela vagavam até o hospital, onde Gina estava, e orava para a irmã resistir até ela voltar. 

— Concordamos, senhorita Lens? – A voz aguda do advogado a trouxe de volta, mas Giovana não havia escutado absolutamente nada do que aquele homem havia dito. 

— A senhorita Lens não tem que concordar com nada – tomou os papéis das mãos do advogado e os entregou até Giovana, – Apenas assine o divórcio. 

Giovana deu um salto da cadeira, ficando tão próxima do marido como há muito tempo não ficava. 

— Você me chamou até aqui para a leitura do testamento – indagou ela. 

— O que acabou de ser feito – Antony ajeitou o terno, – Nicolau se foi e levou com ele esse casamento. Será que eu já não deixei claro o suficiente que eu não quero mais estar ao seu lado? 

— Eu sabia que esse dia chegaria – seus olhos caíram sobre os dele, agitados. 

— Você não quer permanecer casada com um homem que você odeia – as palavras de Antony soaram indiferentes e não mostravam nenhum sinal de preocupação, – Vamos acabar logo com isso, Giovana. 

Mas ela não odiava, mesmo que muitas vezes tenha dito isso. Sem ter ideia do que se passava na mente dele, Giovana considerou concordar, e mesmo que ela costumasse ser obediente a todas as ordens de Antony, embora discordasse do fundo do coração, aquela ordem ela se recusava a obedecer. 

— Preciso voltar para o hospital – Antony mirou nos olhos dela, extremamente frios, e Giovana pôde sentir que algo muito ruim estava prestes a acontecer, – podemos deixar o divórcio para depois? 

Ela virou as costas, coisa rara, e já estava pronta para ir embora, quando ele a segurou pelo braço com força e a puxou, fazendo Giovana se encolher de dor e medo. 

— O que você quer ouvir? – Ele vociferou, zombado da fraqueza de Giovana, – Acha que eu não me divorciaria de você, por consideração ao Nicolau? 

Essas palavras a atingiram com força. Giovana sabia que contrariá-lo o deixaria furioso, e ela conseguia ver isso no seu rosto sombrio e fechado. 

— Eu não acho nada, Antony, eu… – ela se encolheu ainda mais, quando Antony enfim a soltou, – Gina não está bem, e ela precisa de mim agora. 

— Giovana, não arrume mais desculpas – franziu a testa e estendeu novamente o papel do divórcio a ela. 

O seu tom deixava claro que nenhuma negociação era permitida. 

Antony realmente não tinha ideia de que a Gina estava em estado grave no hospital, esperando apenas uma transfusão de sangue de Giovana para ser salva. Ele não sabia e não tinha interesse em saber. Giovana tinha consciência que ficar ali gesticulando com ele, só a faria perder mais tempo, e a vida de Gina corria riscos. 

Como um ato de desespero, Giovana, enfim, pegou os papéis e assinou o divórcio. 

Ela só desejava voltar ao hospital e salvar a sua irmã. 

Antony observou a assinatura dela, enquanto Giovana observava a reação dele. Seus olhos negros se estreitaram como se estivesse zombando do que havia acabado de fazer. 

— Não foi tão difícil assim – essas duras palavras quase a deixaram sem rumo, – Agora saia daqui. 

Giovana ficou atordoada. Antes que pudesse reagir, viu Antony sair do escritório. Só então ela pegou sua bolsa e saiu logo em seguida. Não tinha tempo para se lamentar nem para se arrepender do que acabara de fazer. 

Caminhou apressada de volta para o prédio, onde a irmã estava internada. Olhou no relógio percebendo que três horas já haviam se passado desde que ela foi se encontrar com Antony. Será que era tarde demais? 

Os pensamentos de que Gina não resistiria invadiram a sua mente. Enquanto caminhava de volta em direção ao quarto onde Gina estava, percebeu que Irma já não estava mais lá. O quarto estava vazio. Perguntou para a enfermeira que arrumava a cama para onde a paciente havia sido levada. 

— Gina foi levada para a UTI – informou. 

O coração dela explodiu mais uma vez. Giovana não queria vê-la morta. Correu pelos corredores do hospital, como se procurasse uma saída. Quando avistou Irma em desespero. Tinha as mãos repousadas no rosto e gritava desesperadamente. 

— Onde está a Gina? – Sacudiu a mulher em uma reação de desespero, mas Irma não respondia, apenas berrava. 

— Eu sinto muito – disse o médico que estava ao seu lado, mas que por algum motivo ela não havia percebido, – A Gina acabou de falecer. 

O silêncio ensurdecedor foi o que a atormentou logo em seguida. Um pesadelo silencioso. 

Gina morreu. 

A culpa era toda de Giovana 

 

 

  

  

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