Três

— Desculpas não vão pagar o conserto do meu carro!

— Eu pago, me dá seu telefone e a gente vê um mecânico aqui perto. — ele disse, sendo educado até demais.

— Não, não precisa, quer saber? Só preciso que você me leve para onde eu estava indo, não estou em condições de dirigir.

— Ok, vou estacionar meu carro e te levo com o seu.

Menos de cinco minutos depois ele já estava de volta e andava em direção ao banco do motorista do meu carro.

— Para onde, senhorita? — ele disse assim que bati a porta ao meu lado.

— Segue direto, vou te dando as instruções.

Paramos em frente ao prédio de Roger e acenei para o porteiro, que liberou nossa entrada com o carro. Então eu desci e esperei que ele descesse também para me entregar a chave e fosse embora para que eu pudesse ir em direção ao elevador. Mas ele não só entregou, como foi me acompanhando até a porta.

— O que é? Sei apertar dois botões e chegar onde eu quero.

— Quero me certificar de que não vai arrumar confusão por aí de novo.

Não disse mais nada, estava irritada demais até para discutir com um desconhecido.

O elevador finalmente parou no sexto andar e estava na esperança dele prender a mão na porta quando tentasse sair, mas isso não aconteceu e só percebi sua presença ao meu lado quando Roger abriu a porta e fez cara de espanto.

— Noooooossa, como você descobriu que eu adoro homem de cabelo grande? Ele é meu presente de Natal adiantado? Sabe que eu te amo, né Hope? Muito obrigado! — Roger praticamente gritou essas palavras e o homem, que eu ainda não sabia o nome, o olhava confuso, se afastando.

— Roger, pelo amor de Deus, chega disso! Vem, vamos entrar, preciso de você. — disse, o arrastando para dentro. — E ah, obrigada por me trazer até aqui, tchau! — disse ao cara do lado de fora e fechei a porta atrás de mim.

— Mulher! Onde você encontrou esse deus grego? — Roger gritou assim que eu surgi em seu quarto.

— Ele bateu no meu carro e fez a gentileza de me trazer até aqui.

— E qual o nome dele? Pegou telefone? Quantos anos ele tem?

— Calma aí, não me enche de perguntas. Eu estou bem, obrigada por perguntar. E não, não sei nem o nome daquele cara e também não me interessa saber, provavelmente nunca mais o verei na vida. Mas enfim, vim até aqui por um motivo e estou afim de cumprir. Estou precisando conversar, acabei de terminar com o Mateo.

— O QUE? POR QUÊ? — Roger berrou, totalmente aterrorizado pelo que eu acabei de dizer.

Até Roger dizia que tínhamos sido feitos um para o outro. Mas como meu melhor amigo, ele sempre me apoia em todas as minhas decisões. Eu sabia que quando explicasse como estava me sentindo, ele iria concordar e me apoiar como sempre faz.

A noite foi longa. Passamos a madrugada inteira conversando e depois de quinze chamadas ignoradas de Mateo, eu decidi desligar meu celular e Roger também, já que ele já tinha tentado ligar.

Muita conversa em meio a chocolates e sorvete, bem típico de filmes adolescentes, onde a menina de coração partido se isola e toma todo o estoque de sorvete do estado e mesmo assim continua magra e esbelta. O que infelizmente não era o meu caso. Como não podia exagerar, depois do segundo pote, deixei essa história de lado e fui dormir.

Me deitei ao lado de Roger e onde ele afagou meu cabelo com as mãos até eu pegar no sono, sabendo que não haveria perigo algum.

No dia seguinte, eu acordei exausta e queria muito poder continuar na cama, mas me esforcei para levantar e tomei uma xícara de café forte para aguentar o dia. Por sorte tinha roupas na casa de Roger, então escolhi um vestido soltinho e estampado com uma sapatilha de cor neutra para ir trabalhar. Seria um dia longo e estava determinada a ir em casa e ter uma conversa definitiva com Mateo. Não poderia ficar nesse namoro ioiô para o resto da vida. Nós somos adultos e maduros o suficiente para conversarmos e decidirmos nossa vida juntos.

Depois do trabalho fui para casa e fiquei à espera de Mateo. Quando as meia hora que faltavam para ele chegar, passaram, eu senti o ar sumir dos meus pulmões.

— Oi — murmurou cabisbaixo, assim que entrou pela porta e me viu sentada no sofá.

— Oi. Podemos conversar?

Ele não disse nada, apenas se aproximou e tentou me beijar, mas eu virei o rosto em negação e ele me olhou torto.

— Desculpa, mas eu realmente estou aqui apenas para conversar. Nós somos adultos e não tem como ficar nessa situação. Eu simplesmente saí correndo igual a uma menininha com medo de algum inseto e te deixei plantado lá, e ainda por cima a pé. — disse e ele apenas concorda com a cabeça, sem tentar dizer nada. — Então, olha... sinceramente, eu não sei como te dizer isso de outra maneira, mas eu quero terminar. Definitivamente. — ele me olha com expressão de surpresa e sinto uma ponta de suas lágrimas surgindo em seus olhos castanhos.

— Você tem outro? É isso? — ele questionou, em tom baixo.

Esse era mais um motivo pelo qual eu não aguentava mais. Ele nunca quebrava as regras, ele é sempre assim, do mesmo jeito. Tem medo de demonstrar sua opinião e se fecha com seus pensamentos. E ainda quando consegue pôr pra fora, fala de uma maneira branda e ainda com o tom de medo exalando em sua voz.

— Não, não tem outro. — falei, irritada e ele me olha triste. — É só que... — hesito por um instante — nosso namoro se desgastou, caiu na rotina e é sempre a mesma coisa, todos os dias. E isso vem me cansando, sabe. Você é sempre o mesmo, e eu acabo sendo sempre a mesma também. Não quero ser aquele tipo de mulher que constrói um casamento baseado em suas histórias de adolescência, quando ainda tinham que se esconder para darem um mísero selinho. Nossas aventuras sempre foram divertidas, mas com o tempo, tudo se tornou igual e monótono e eu anseio por coisas novas, ares novos.

— Que tipos de coisas?

— Eu não sei, sinceramente, mas quero e pretendo descobrir. Sei que você é um ótimo homem e vai encontrar alguém que te queira tanto quanto você me quer nesse momento. Não quero te magoar e é por isso que eu estou terminando tudo agora. — disse por fim.

Ele assentiu e não disse mais nada, apenas se levantou e foi para o quarto enquanto eu juntava alguns dos meus pertences que estavam espalhados pela sala.

Saí pela porta e entrei em meu carro, ligando o rádio antes mesmo de ligar o carro. E então começou a tocar uma de nossas músicas e deixei algumas lágrimas rolarem por meu rosto e se encaminharem até meus lábios para que eu pudesse sentir o gosto salgado que é a perda de algo ou alguém.

[...]

Ainda era cedo, Roger não estava em casa ainda, mas chegaria logo. E como eu tenho a chave, entrei e me apoderei do seu sofá de couro escuro e macio. Procurei algo na TV mas não encontrei nada que prestasse. Então conectei meu celular ao rádio e aumentei bem o volume. Ao som de Problem eu cantarolava.

'I got one less problem without ya'

Imaginava o quanto essa música me caía bem nesse momento e consegui deixar a tristeza de lado e me jogar na minha vida nova a partir de agora.

Estava no meio da batida do rap da Iggy, quando Roger entra exaltado em casa, batendo as portas e já abaixando o volume da música.

— Que foi? — o repreendi, consciente de que a casa é dele.

— Que foi nada! Estou com dor de cabeça. Vamos sair? Preciso espairecer.

— Aaah não, pensei em ficar em casa e curtir um filminho na Netflix agarrada com meu amor. — digo e o abraço, carente.

— Ih, sai garota, gosto de pau! — ele grita e se solta do meu abraço, indo direto para o quarto.

Aumento novamente o som e dessa vez está tocando 23, da Miley Cyrus com uns rappers e essa música sempre me deixou com vontade de transar loucamente. Mas como no momento isso não é possível, me contento em dançar no ritmo da música e me deixar levar pela batida contagiante cantando loucamente, quando Roger surge do nada gritando.

— Já que está tão animadinha, vamos para uma balada! Está decidido. Vem, vamos escolher uma roupa.

Roger saiu me arrastando e como não tinha nada que prestasse meu, na casa dele e eu não estava afim de ir em casa buscar, demos uma volta no shopping para escolher o look perfeito.

Rodamos igual barata tonta, passei por todos os tipos de lojas de departamento, olhei desde calças de tecidos e jeans até os vestidos mais sociais e caros. Não conseguia encontrar nada para mim, então arrastei Roger até uma loja de roupas masculinas com umas peças incríveis que deixa qualquer homem totalmente lindo e arrumado.

Optamos por uma calça jeans escura acompanhada por uma blusa de botões florida, bem gay, no estilo que ele gostava e que ficou maravilhosa nele. Um tênis de cano médio e preto com detalhes dos lados completavam o look e deixou tudo casado e lindo. E quando não teve mais jeito, o foco voltou a mim e procurando em todas as lojas que víamos pela frente, entramos em tudo que é tipo, mas por fim encontramos um vestido incrível, inteiro preto, de tecido leve e mangas compridas, mas com um decote em V nas costas, levemente rodado da cintura pra baixo. Simples e elegante. Discreto e sexy.

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