Os dias que se seguiram foram um borrão de dor e silêncio. Eu não comia, não falava... apenas sobrevivia. As risadas e o barulho da alcateia ao redor pareciam de outro mundo, um mundo que eu não conseguia mais alcançar. Não havia mais nada em mim. Apenas o vazio.
Nesses dois últimos anos, desde os meus dezesseis, havia sido a piada para a grande maioria de minha matilha. No começo, eu me incomodava com os comentários e me sentia envergonhada. Depois, quando eles perceberam que eu não ligava mais, começaram a fazer maldades, e quando percebi, era humilhada constantemente.
Me perguntava o que aconteceria agora, após enterrar as únicas pessoas que realmente se preocupavam comigo. No entanto, não tinha resposta para isso.
Imaginei que, após toda a tragédia que aconteceu com minha família, a caçada e a festa em celebração ao novo alfa, que estava programada para o dia de meu aniversário, pelo menos iria ser adiada. Ninguém sabia ao certo o que matou meus pais e meu irmão.
Se comentava que talvez tenha sido um lycan, devido à brutalidade dos ferimentos, mas nada foi confirmado ainda. Quanto à caçada e à festa... a vida da alcateia não podia parar “simplesmente” porque minha família morreu. Tudo precisava seguir seu curso.
Isso foi o que escutei na primeira semana após enterrar meus entes queridos. Mas quer saber? Não dou a mínima para essa festa idiota, porque nem tenho certeza se quero permanecer aqui. Eu não iria declarar minha lealdade a uma pessoa que nunca fez nada para mudar minha situação.
Um alfa de verdade precisava proteger seus lobos. Martín sempre esteve presente em cada humilhação que passei. Ele fazia parte daquele grupo, e mesmo não participando diretamente dessas humilhações, nunca fez nada para impedi-las. Seus amigos praticavam várias atrocidades e ele nunca os impediu de nada.
No dia de sua coroação, três semanas após a tragédia que matou minha família, eu fiquei em casa, remoendo todos os comentários que surgiram sobre a morte deles. Aproveitei para fazer uma faxina em meu quarto.
Eu me perguntava o que um lycan estaria fazendo em nossas terras, e se por acaso seria um deles a matar toda minha família. Os lycan eram seres muito mais evoluídos do que nós, lobos. Eles eram mais rápidos, mais fortes, mais cruéis e muito mais frios. No entanto, eram poucos e ocupavam uma região bem distante de onde nossa alcateia estava localizada.
O mais surpreendente dessa história toda era que a grande maioria desses lycan pertenciam a um nível bem mais alto que o nosso, pessoas bem acima de qualquer alfa ou sua alcateia.
Se os líderes de minha alcateia desconfiavam que poderia ser um deles, teriam que comunicar ao rei e tinha quase certeza que Martín não se daria a esse trabalho. Quem iria atrás de uma pessoa de uma categoria tão acima da nossa?
No entanto, eu desejava saber, eu queria que o culpado fosse responsabilizado pela minha dor. E se realmente isso foi provocado por um deles, esse precisava ser detido, pois surtos como esse poderiam voltar a acontecer. Dizia surto, porque era assim que se comentavam entre as fofocas, mas não passou de uma extrema brutalidade.
Olhei para o relógio e já se passavam da meia-noite, o que significava que Martín já havia sido declarado o mais novo alfa e a caçada já tinha começado. Eu, uma simples loba defeituosa, não prestei lealdade a ele e não estava nem um pouco preocupada com o que isso poderia me causar.
Olhei ao redor daquela sala e me perguntei se não havia chegado o momento de partir e deixar tudo para trás. Refazer minha vida em outro local. Sei que nenhuma alcateia me aceitaria, já que não possuía uma loba, mas eu poderia viver como uma humana.
Maitê entrou em contato comigo quando soube da morte dos meus familiares em um “trágico acidente de carro”. Foi assim que os líderes daqui justificaram minha ausência na faculdade.
Ela insistiu em saber meu endereço para poder me visitar, mas expliquei que morava de favor em uma propriedade de pessoas abastadas que não permitiam visitas, nem mesmo em momentos como esse. Apesar de sua revolta, ela aceitou minhas desculpas e passou horas ao telefone tentando me consolar.
Minha amiga era dois anos mais velha do que eu, tinha seu próprio apartamento custeado pelos pais, que passavam mais tempo viajando do que cuidando da filha. Ela admitia sentir inveja pelo cuidado que minha família tinha por mim, e até ríamos disso.
Diante de toda a minha dor, ela me convidou para passar um tempo com ela em seu apartamento, e naquele momento eu estava seriamente considerando aceitar esse convite. Quem sabe eu poderia arrumar um emprego de meio período para me sustentar.
Estava ponderando todas essas novas possibilidades, mas antes de chegar à minha decisão final, ouvi batidas na porta. Um arrepio percorreu minha espinha e os pelos do meu corpo se eriçaram.
Quem poderia ser? As batidas se fortaleceram na segunda vez, e ouvi meu nome ser pronunciado, por uma voz que conhecia bem, o que me levou a decidir abrir aquela porta.
— Por que você não foi fazer seu juramento de lealdade a mim? — Perguntou Martín, o novo alfa, assim que abri a porta.
Olhei ao redor na rua e percebi que não havia mais ninguém ali. Seria mais uma pegadinha daquele grupo cruel?
— Por que você veio até aqui? — Perguntei, minha voz cheia de incredulidade e dor.
— Porque você não estava lá. Não fez seu juramento. — Ele respondeu, a voz tensa.
— Você veio até aqui, a essa hora, apenas por isso? — Indaguei, incrédula.
Ele me segurou com força, o calor de sua mão no meu braço se transformando em faíscas elétricas que percorreram meu corpo. Aquilo não era possível.
— Por que não foi? Você sabia, não sabia? — Ele gritou agora, e sua voz soava diferente, ferida de uma forma que eu não conseguia entender.
— Sabia o quê? — Respondi quase sem voz. E então, como se algo explodisse dentro de mim, as faíscas aumentaram. Ele era meu companheiro.
— Você é meu companheiro?! — Não sabia se estava perguntando ou afirmando, mas olhei para ele assustada e constatei que, de fato, ele era meu companheiro. Ele estava na caçada e isso o trouxe até mim.
— Eu nunca… — Ele hesitou, mas endureceu a expressão. — Eu, Martín King, rejeito você, Aisha Davis, como minha companheira e Luna.
Quando as palavras saíram da boca dele, foi como se o mundo tivesse desmoronado. O aperto no peito se intensificou, e o vazio dentro de mim parecia devorar tudo ao redor. Meu corpo inteiro tremeu, como se uma parte de mim estivesse sendo arrancada, deixando apenas um buraco.
Selene, a deusa da lua, entrelaçou os fios de nossas vidas, e agora ele partiu sem nem me dar a chance de argumentar. Caí de joelho no chão e olhei para ele, percebendo a dor em seu olhar. No entanto, ele nada fez ou expressou. Simplesmente virou as costas e se foi.
A rejeição dele, tão crua e fria, cortou mais fundo do que qualquer ferida física. Era como se todo o esforço que eu havia feito para sobreviver após a morte da minha família fosse em vão. Agora, eu estava realmente sozinha. Sem família, sem futuro, sem loba. Apenas o vazio.
Mais um mês se passou sem que eu sequer cruzasse com Martín. Se já não bastasse perder minha família, agora também perdi o companheiro que Selene me enviou. A dor só não era mais profunda pelo fato de não possuir uma loba, mas a raiva que sentia pela insensibilidade dele era maior que a dor.Martín nunca fez nada diretamente contra mim, mas sempre estava ao lado dos amigos nas vezes que me maltrataram, me amedrontaram e me fizeram correr desesperada pela floresta. Ele não proferia uma única palavra diante do bullying que seu grupo fazia comigo.E por ele ser conivente com os amigos, eu acreditava que ele era tão culpado quanto os outros. Tantos lobos na face da Terra e a Deusa tinha que entrelaçar meu destino justo com esse? Eu não podia acreditar nisso. Durante esse tempo, nenhuma explicação me foi dada sobre o que havia matado minha família. Parecia que, para todos, nada tinha acontecido. Após o enterro, era como se minha família não tivesse existido, e a única pessoa que ainda sen
Assim que cheguei lá, Maitê já me esperava ansiosa em frente à boate. Peguei um band-aid em minha bolsa e coloquei naqueles dois ferimentos em meu braço. Quando minha amiga me viu descer do carro, correu para me abraçar e, mesmo eu tentando disfarçar, ela percebeu que eu havia chorado.— Não fica assim, amiga. Tenho certeza de que o maior desejo da sua família era que você fosse feliz. Eles não gostariam de te ver triste. — Ela disse, consolando-me, acreditando que eu estava assim devido à minha família.— Sei disso, Maitê.Não podia contar a verdade a ela sem ter que explicar o que significava o laço de companheiros, sem mencionar o que eu era, mesmo sendo uma loba defeituosa. Então, apenas a deixei acreditar no que ela pensava ser o motivo. Adentrei a boate com determinação, disfarçando a tristeza que ainda pesava no peito.A música alta e pulsante, as luzes coloridas dançando ao ritmo da batida, tudo isso me surpreendeu pelo fato de nunca ter estado em uma boate antes e acabou me e
Enquanto conversávamos na mesa de Kiron, a atmosfera ao redor parecia mais leve e vibrante. Os olhares curiosos dos amigos dele logo se transformaram em sorrisos acolhedores quando começamos a interagir.Maitê, sempre extrovertida, logo se juntou à conversa, fazendo todos rirem com suas histórias engraçadas sobre algumas de nossas aventuras juntas.Eu me sentia estranhamente à vontade ao lado de Kiron, como se o conhecesse há muito mais tempo do que apenas algumas músicas de boate. Seu jeito confiante e atencioso era cativante, e eu me pegava cada vez mais interessada em conhecê-lo melhor.Conversamos sobre tudo e sobre nada ao mesmo tempo. Ele se aproximou mais e, por um momento, nossas conversas eram trocadas ao pé do ouvido, aproveitando a companhia um do outro e o clima descontraído da noite.Kiron mostrou-se genuinamente interessado em minha vida, fazendo perguntas que iam além da superficialidade das conversas de boate. No entanto, eu evitava as perguntas mais pessoais que não p
Ele afastou meus cabelos e beijou a lateral do meu pescoço, repetindo o gesto do lado oposto. Fechei meus olhos e suspirei com aquele contato, era muito bom. Ele tirou a taça da minha mão e a colocou no centro ali próximo, fazendo-me virar para ele. Voltamos a nos encarar e, em seguida, seus lábios envolveram os meus.Achei que ele tinha entendido meu recado quando me mantive em silêncio, eu não desejava falar sobre o futuro, eu queria viver apenas o momento.Seus beijos, que começaram lentos, agora estavam mais profundos, até mesmo necessitados. Ele colou seu corpo ao meu e logo estava pressionada contra aquela parede de vidro.Seu beijo desceu novamente pelo meu pescoço, enquanto sua mão subia até meus seios, fazendo-me gemer involuntariamente. Sua outra mão segurou minha bunda, puxando-me mais para ele, enquanto eu me entregava totalmente ao momento.— Você é irresistível para mim. Tenho que confessar que não aceitaria perder você para ninguém. — Kiron disse, suas mãos percorrendo
A sensação de vulnerabilidade misturada ao desejo me fez ofegar. Por um segundo, o quarto pareceu ficar em silêncio absoluto, como se o mundo ao nosso redor tivesse parado, e o único som fosse o de minha respiração entrecortada.Kiron não se mexeu de imediato. Ele simplesmente permaneceu ali, seus olhos intensos me observando com atenção. Sentindo a leve tensão que surgira, ele afastou a mão, deslizando-a gentilmente pela minha perna até alcançar meu joelho. Seu toque era tão suave que parecia acalmar o nervosismo que havia começado a crescer dentro de mim.— Está tudo bem. — Ele murmurou, sua voz rouca e carregada de cuidado. — Não precisamos continuar. Quero que você se sinta segura, Aisha.Mesmo enquanto o desejo me consumia, uma parte de mim ainda estava incerta. Mas, ao olhar para Kiron, seus olhos repletos de cuidado e devoção, soube que queria confiar nele. Meu corpo ansiava por ele, mesmo que meu coração ainda estivesse se ajustando à intensidade da experiência.Não era medo q
Cada movimento me levava para mais longe de tudo que eu conhecia. Era uma experiência completamente nova, que me fazia questionar não apenas meu corpo, mas também minhas emoções.Kiron investia em mim de forma quase animalesca, fazendo-me gemer e me levando ao limite novamente. Quanto mais ele percebia que eu me aproximava desse momento, mais rápido seus movimentos se tornavam. Seu corpo colou-se ao meu, mas seus movimentos não cessaram.— Consegue sentir isso, doce Aisha? Consegue sentir o quanto estou rendido a você? Você é totalmente minha. Apenas minha.Kiron dizia com a voz afetada pelos movimentos enquanto arremetia contra mim. Sua boca lambia o lóbulo da minha orelha e logo em seguida meu pescoço. Quando chegou na curva para alcançar meu ombro, ele mordeu levemente e fui novamente jogada no limbo.Ele arremeteu mais uma vez, grunhindo como um animal, os movimentos totalmente descontrolados, mostrando que também foi demais para ele, que também alcançou o seu prazer.— Argh — ros
KIRONQuando meus olhos encontraram aquela marcada pela Deusa da Lua exclusivamente para mim, uma corrente elétrica percorreu meu corpo. Cada passo que ela dava ao ritmo pulsante da música me desestabilizava, enquanto a fera dentro de mim rugia, impaciente. Era como se o mundo ao nosso redor desaparecesse, e apenas nós dois existíssemos naquela boate lotada.Havia perdido as esperanças de algum dia encontrar aquela destinada a mim pela Deusa. No entanto, quando me aproximei, algo nela não fazia sentido. Seu cheiro, doce e cativante, permanecia inalterado.Era como se estivesse presa no tempo, sem jamais ter atravessado o ritual da transformação. O que isso significava? Por que a deusa me levaria até ela, se seu destino como lycan parecia incompleto? Ela de fato era uma lycan ou apenas uma humana?Isso, na verdade, não importava para mim. Ela era minha e eu precisava tê-la, precisava conhecê-la e me apresentar, não apenas minha versão humana, eu precisava apresentar meu animal a ela, e
AISHAAo deixar o hotel, uma parte de mim hesitou. Queria voltar, ficar ao lado dele, mas sabia que as complicações do meu mundo não permitiriam isso. Precisava preservar meus segredos antes que fosse tarde demais.Tive que passar na boate para pegar meu carro e, em seguida, seguir para o apartamento de Maitê. Minha amiga já havia deixado na portaria a informação de que receberia uma convidada e a placa do meu carro. Dessa forma, o porteiro apenas confirmou os dados e permitiu minha entrada.Assim que o elevador chegou ao seu andar, Maitê me aguardava na porta. Ela me analisou dos pés à cabeça, como se quisesse comprovar que eu estivesse inteira.— Você me deu um baita susto. Eu mal consegui pregar os olhos depois que cheguei em casa. — Ela voltou a me analisar. — Em compensação, você parece muito mais do que bem. — Ela me encarou.— Sim, Maitê, eu estou muito bem, obrigada! — Disse, sorrindo para ela, com minha mala na mão.— Você é louca, Aisha… como você aceitou sair com aquele hom