CAPÍTULO 05

Mais um mês se passou sem que eu sequer cruzasse com Martín. Se já não bastasse perder minha família, agora também perdi o companheiro que Selene me enviou. A dor só não era mais profunda pelo fato de não possuir uma loba, mas a raiva que sentia pela insensibilidade dele era maior que a dor.

Martín nunca fez nada diretamente contra mim, mas sempre estava ao lado dos amigos nas vezes que me maltrataram, me amedrontaram e me fizeram correr desesperada pela floresta. Ele não proferia uma única palavra diante do bullying que seu grupo fazia comigo.

E por ele ser conivente com os amigos, eu acreditava que ele era tão culpado quanto os outros. Tantos lobos na face da Terra e a Deusa tinha que entrelaçar meu destino justo com esse? Eu não podia acreditar nisso. 

Durante esse tempo, nenhuma explicação me foi dada sobre o que havia matado minha família. Parecia que, para todos, nada tinha acontecido. Após o enterro, era como se minha família não tivesse existido, e a única pessoa que ainda sentia falta deles era eu.

No entanto, estava cansada de tudo isso. Cansada da minha vida, cansada de me esconder, cansada dessa alcateia. Estava determinada a esquecer todas as dores que havia enfrentado durante esses meses infernais.

A rejeição de Martín King, o alfa da minha alcateia, ainda ecoava na minha mente, mas recusava-me a deixar que isso me definisse. Com meus dezoito anos recém-completados, eu precisava superar o luto e decidi celebrar como qualquer jovem humana faria, já que eu não possuía uma loba. Iria aceitar o convite de minha amiga para ir à boate.

Tinha certeza de que minha família desejaria que eu fosse feliz, que comemorasse essa data, e se eles estivessem vivos, aceitariam que meu irmão me levasse a um lugar assim para festejar. Decidi exatamente fazer tudo aquilo que faria se eles estivessem aqui. Já que não possuía a loba, faria a lagarta virar borboleta.

Peguei o carro que era do meu pai, o cartão com todo o dinheiro de minha família e seguir para a cidade. No caminho, liguei para a Maitê, que ficou animadíssima com minha decisão. Passamos em um salão de beleza, manicure, compramos produtos de beleza e finalmente entramos em uma loja de roupas, nossa última parada.

Minha amiga fez questão de pagar pelo vestido, dizendo ser seu presente de aniversário para mim. Insistiu para que eu fosse para seu apartamento para sairmos de lá para a boate, mas eu disse precisar desse momento comigo mesma, e ela respeitou minha decisão, apenas me fazendo prometer que não desistiria dos nossos planos.

Quando entrei em casa com todas aquelas sacolas, esperei escutar a voz da minha mãe como sempre acontecia, mas o silêncio me recebeu. Percebi minha realidade e isso me fez decidir aceitar o convite de Maitê para passar um tempo com ela.

Fui até meu quarto e arrumei uma mala com coisas de que possivelmente precisaria. Como Martín não me fez fazer o juramento de lealdade, não precisava dar satisfações a ele. Tinha certeza de que ele não sentiria minha falta, e por um momento fiquei feliz com isso. Poderia ter a vida que sempre imaginei quando não conseguir minha loba.

Quando estava definitivamente pronta, olhei-me no espelho. Não pude acreditar que aquela pessoa que me olhando de volta era realmente eu. Eu não parecia mais a vítima que todos pisoteavam. Talvez, só talvez, estivesse pronta para ser outra coisa. Para encontrar uma nova vida, uma nova versão de mim mesma. Eu era uma sobrevivente, e isso precisava ser suficiente.

O vestido preto justo que estava usando realçava minhas curvas e destacava meus leves cachos ruivos de uma maneira que nunca imaginaria.

Meus olhos estavam marcados, como a Maitê havia me ensinado, e isso me conferiu um ar de sensualidade incrível. Eu realmente parecia outra mulher, e estava feliz com essa nova aparência. 

Aquela noite prometia ser diferente de todas as outras que já tinha vivido. Saí de casa com uma mistura de excitação e nervosismo borbulhando dentro de mim. No entanto, antes de poder chegar até meu carro, cruzei com aquele grupo que sempre conseguia deixar um gosto amargo em minha boca.

Percebi os olhares surpresas de todos eles. A raiva, principalmente, borbulhando em Kathy. Se aquela loba pudesse, arrancaria cada pedaço de meu corpo com seus próprios dentes. Mas o que me surpreendeu foi ver Martín abraçado a ela.

— Veja quem encontramos… — James disse, analisando-me dos pés à cabeça como se olhasse uma vitrine.

— Tenho que confessar que a morte da sua família te fez bem. Você parece mais gostosa agora, mesmo sendo uma loba defeituosa. — Black disse, inescrupulosamente, circulando-me e observando-me como se fosse um pedaço de carne.

Meu olhar fixou na cintura de Kathy, onde Martín segurava, e voltou até os olhos dele, a mágoa provavelmente estampada em meu rosto. Observei o olhar dele me analisar dos pés à cabeça, como James havia feito. 

O silêncio parecia pesar sobre mim enquanto os olhos de Martín percorriam meu corpo. Por que ele ainda olhava para mim daquele jeito? O toque dele em Kathy, provavelmente sua nova companheira, machucava mais do que qualquer palavra.

— Deixem-na ir. — Foi a ordem que ele deu, e pela primeira vez observei aquele grupo olhar surpreso para ele.

— Mas, Martín… — Kathy tentou argumentar.

— Deixem-na ir. Não sou mais aquele garoto que apenas observava vocês fazerem as coisas erradas e ficava em silêncio. Agora sou o líder dessa martilha e com essa responsabilidade vêm as obrigações.

— Pelo que fiquei sabendo, ela não jurou lealdade a você. — Black desafiou.

— É verdade. Mas a família dela fazia parte dessa alcateia, assim como ela continua fazendo. Depois de tudo que ela passou, acredito que tenha motivos para ainda não ter feito isso ainda. — Ele disse, encarando-me.

— Não prestar um juramento de lealdade ao alfa é considerado uma traição, Martín. Qualquer lobo poderia fazer o mesmo. — Kathy provocou com essa descoberta.

Nesse momento, Black segurou meu braço como se tivesse descoberto aquela informação apenas naquele instante. No entanto, ele usou força e suas garras surgiram, perfurando um pouco meu braço, o que me fez gemer de dor e Martín rosnar. 

— Dei a ordem para deixá-la ir! — Martín disse, soltando Kathy e avançando na direção de Black, que imediatamente me soltou.

Ele havia me rejeitado. Disse que nunca me aceitaria. Mas agora estava me protegendo? Por que ele fazia isso? A confusão era quase tão dolorosa quanto as palavras que ele proferira semanas atrás.

A raiva estava clara nos olhos dele. Mas não era apenas contra Black. Por um segundo, eu vi algo mais — arrependimento? Hesitação? Era como se Martín estivesse dividido entre o dever de líder e algo mais profundo que ele não queria admitir.

O sangue escorreu um pouco pelo meu braço. Martín olhou para aquilo e até pude sentir sua raiva. Todos parecíamos surpresos com a reação dele naquele momento, mas apenas nós dois sabíamos o motivo daquilo.

Levei minha outra mão ao ferimento e saí dali às pressas, sem nem mesmo olhar para trás. Ele me rejeitou, e nada mudaria aquilo. Mesmo agora que ele estava lidando com seu lobo. Antes, por um tempo, eu o admirava, mas após tudo o que seus amigos fizeram comigo sem qualquer intervenção dele, só conseguia sentir decepção. 

Entrei no carro com meu corpo tremendo e as lágrimas turvando minha visão, mas não ficaria ali nem por mais um minuto. Já havia colocado minha mala no carro antes e isso me fez respirar aliviada. Tinha o percurso até a boate para me recuperar.

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