Susan e Mara agora estavam diante de um desafio mais perigoso do que imaginavam. A criatura, feita de pura escuridão, era um guardião, protetor de segredos antigos, e atacá-la de frente seria fatal. Susan sabia que precisavam provar que eram dignas de descobrir o que a floresta escondia, e a solução não estava em força, mas em sabedoria.
Lembrando-se de um antigo feitiço de comunicação, Susan começou a recitar palavras em uma língua há muito esquecida. A entidade hesitou por um momento, sua forma oscilando como sombras ao vento. O tom gutural de sua voz retornou: — Por que deveriam vocês, seres de carne e osso, ter acesso aos segredos que protejo? Apenas os corajosos de espírito podem avançar. Mara, aflita, perguntou em um sussurro: — O que fazemos agora? Susan manteve a calma. A floresta reagia a magia antiga, e elas precisavam se conectar a esse poder. Sabendo disso, Susan recitou um verso sobre coragem e verdade. A escuridão ao redor pareceu absorver suas palavras, enquanto a criatura começou a diminuir de tamanho. A voz gutural soou novamente, desta vez com uma leve reverência: — Sigam em frente, mas saibam que os segredos que buscam podem não ser os que desejam encontrar. A sombra desapareceu, e as duas ficaram sozinhas novamente, agora com o caminho livre. Olhando ao redor, elas perceberam que o altar estava imerso em uma luz fraca, como se o véu de mistério da floresta tivesse sido parcialmente levantado. — Conseguimos — disse Mara, ainda com o coração acelerado. Susan, no entanto, não relaxou. Algo ainda pairava no ar, algo que nem mesmo o guardião revelou completamente. E era isso que ela temia: o desconhecido que estava por vir. Assim que avançaram mais na floresta, a sensação de estarem sendo observadas nunca as abandonou. Sabiam que haviam passado pelo guardião, mas o verdadeiro perigo ainda estava por vir. Susan e Mara seguiram adiante, a floresta tornando-se cada vez mais densa e sombria. As árvores retorcidas pareciam observá-las, e a atmosfera opressiva pesava sobre seus ombros. O chão sob seus pés parecia pulsar com uma energia antiga, quase como se a floresta estivesse viva e respirando ao ritmo de seus passos. O caminho à frente não era mais apenas físico; sentiam que estavam entrando em um espaço que transcendia o tempo e a realidade. — Susan... não gosto disso — disse Mara, sua voz baixa, mas carregada de inquietação. — Nem eu — respondeu Susan, os olhos atentos, — mas não podemos parar agora. Conforme avançavam, começaram a perceber que o terreno mudava. O chão, antes coberto de raízes e folhas secas, agora estava encharcado de uma substância negra, como se a própria floresta estivesse sangrando. O cheiro de podridão era intenso, e um vento gélido soprava entre as árvores, trazendo consigo murmúrios de vozes distantes. De repente, Mara parou e segurou o braço de Susan. — Ouviu isso? — sussurrou ela, os olhos arregalados. Susan fez um sinal para que ela ficasse quieta e concentrou-se. No começo, tudo o que ouviu foi o vento, mas então, aos poucos, percebeu algo diferente: uma batida rítmica, quase como um coração gigantesco batendo debaixo da terra. — Está vindo debaixo de nós — disse Susan, com o cenho franzido. Antes que pudessem reagir, o chão tremeu violentamente, como se algo imenso estivesse se movendo nas profundezas. As árvores ao redor balançaram, e o som gutural do guardião voltou, desta vez mais distante, mas ainda perceptível. — Estão perto, mas lembrem-se: a verdade traz mais dor do que a ignorância. — O que isso quer dizer? — perguntou Mara, agora visivelmente perturbada. — Não sei, mas precisamos continuar. O caminho para a verdade sempre é perigoso — respondeu Susan, embora uma parte dela começasse a se questionar se estavam realmente preparadas para o que encontrariam. --- Após horas de caminhada pela floresta opressiva, Susan e Mara finalmente chegaram a uma clareira. No centro, uma árvore colossal, muito maior do que qualquer outra que já haviam visto, erguia-se como uma sentinela. Suas raízes se espalhavam pelo solo, cobrindo o espaço como uma teia de aranha, e sua casca estava coberta de símbolos arcaicos, brilhando fracamente sob a luz da lua. — Esta deve ser a árvore... — murmurou Mara, impressionada. Susan assentiu. Sabia que aquela não era uma árvore comum. Era o coração da floresta proibida, o lugar onde o antigo poder da maldição tinha origem. Sentia a presença da magia pulsando no ar, quase sufocante. — A maldição deve estar conectada a isso — disse Susan, aproximando-se lentamente. Assim que deram o primeiro passo na direção da árvore, uma voz ecoou por toda a clareira. Não era gutural como a do guardião, mas feminina, serena e, ao mesmo tempo, assustadora. — Vocês vieram até mim em busca de respostas, mas estão preparadas para as consequências? As duas olharam ao redor, tentando identificar a fonte da voz, mas não havia ninguém ali além delas. — Quem está falando? — perguntou Mara, erguendo sua espada instintivamente. — Eu sou o espírito da floresta, a guardiã dos segredos antigos. Vocês ousam invadir este santuário, mas não compreendem o que procuram. A verdade não é um prêmio a ser conquistado. Ela é uma maldição. Susan respirou fundo, seus olhos fixos na árvore. — Precisamos entender a maldição que aflige o filho do rei — disse ela, sua voz firme. — Não viemos em busca de poder ou glória, apenas de respostas. — Respostas, sim... mas as respostas que buscam não trarão paz. A criança foi marcada, não por capricho, mas por um juramento antigo, uma promessa quebrada pelo próprio sangue de sua linhagem. Mara franziu o cenho, confusa. — O que isso significa? A voz da floresta pareceu suspirar, como se estivesse lamentando um destino já traçado. — O rei, em sua juventude, fez um pacto com as forças deste lugar. Prometeu uma vida em troca de poder e prosperidade para o reino. O tempo passou, e ele quebrou seu juramento, acreditando que a floresta havia esquecido. Mas a floresta nunca esquece. Susan sentiu um arrepio percorrer sua espinha. — A maldição sobre o bebê é a consequência desse pacto quebrado? — Sim. A criança carrega o peso do pecado de seu pai. Apenas o sacrifício de uma vida inocente pode quebrar o ciclo. E vocês, que vieram até aqui, devem decidir: continuarão na ignorância ou aceitarão o destino trágico que os aguarda? Mara olhou para Susan, seu rosto pálido. — Não pode ser verdade... — sussurrou ela. — O rei condenou seu próprio filho? Susan fechou os olhos por um momento, processando a verdade cruel que acabara de ouvir. A escolha que estava diante delas era insuportável. Salvar o bebê significava condenar outra vida. Mas quem? Como poderiam decidir algo assim? — Há uma outra maneira? — perguntou Susan, desesperada por uma alternativa. — Há sempre uma escolha, mas cada escolha traz uma consequência. Vocês podem tentar quebrar a maldição de outra forma, mas o preço será ainda mais alto. Estão dispostas a pagar? Mara recuou, suas mãos trêmulas. — Não podemos... Susan, isso é... isso é loucura! Susan, no entanto, ficou imóvel. Sabia que não havia uma solução fácil. O destino da criança, do reino, e até mesmo da própria floresta estava em jogo. — Diga-nos o que precisa ser feito — disse Susan finalmente, sua voz cheia de determinação. O espírito da floresta ficou em silêncio por um momento antes de responder. — Para quebrar o pacto sem sacrifício, vocês precisarão encontrar o coração da maldição. Ele não está aqui, mas no lugar onde o juramento foi feito, onde o sangue foi derramado pela primeira vez. Apenas lá poderão desfazer o que foi feito. Susan olhou para Mara, que ainda parecia em choque, mas sabia que não havia outra escolha. — Vamos terminar isso — disse Susan, com o olhar fixo na escuridão além da clareira. As duas, agora cientes da terrível verdade que carregavam, começaram a se preparar para a última etapa de sua jornada. Estavam prestes a enfrentar o legado sombrio de um rei, as consequências de um pacto antigo, e a batalha final entre vida e morte. Enquanto desapareciam na escuridão da floresta, a voz da guardiã ecoou uma última vez: — Que o destino lhes seja misericordioso, pois a verdade raramente é.Susan e Mara seguiram em silêncio, a escuridão da floresta densa envolvendo-as como um manto. As palavras do espírito da floresta ainda ecoavam em suas mentes, pesando sobre cada passo que davam. A atmosfera ao redor tornava-se cada vez mais opressiva, como se a própria floresta soubesse que o fim estava próximo. Elas não apenas carregavam o fardo de salvar uma vida, mas também o peso de desfazer um pacto antigo, manchado por traição.— Temos que achar o local do juramento — disse Susan, quebrando o silêncio. — Foi ali que tudo começou e é ali que podemos acabar com isso.Mara hesitou. O medo e a incerteza visíveis em seu olhar a deixavam vulnerável, mas Susan percebeu que, apesar disso, sua amiga continuaria. Elas não tinham outra escolha.Enquanto avançavam, o terreno tornou-se acidentado, como se a floresta estivesse tentando impedi-las de chegar ao seu destino. O ar ficou denso, cheio de uma névoa estranha que dançava em torno delas, quase viva. De repente, o vento trouxe sussurro
Mara ainda estava ajoelhada na clareira, seus soluços ecoando na vastidão da floresta que agora parecia adormecer ao redor dela. A sensação de perda era avassaladora, e o vazio deixado pela partida de Susan pesava em seu peito como um ferimento aberto. Por um momento, ela ficou ali, sem saber o que fazer. A clareira antes sombria agora estava iluminada por um brilho pálido e suave, como se a floresta finalmente estivesse em paz, mas o preço era alto demais. Ela sentiu uma brisa leve passar por seus cabelos, trazendo consigo um sussurro familiar. Era a voz de Susan, suave e distante, como se viesse de um lugar entre os mundos. — Você precisa continuar, Mara. O reino ainda precisa de você. Levantando-se com dificuldade, Mara enxugou as lágrimas e olhou para a clareira, onde agora apenas uma marca cintilante na pedra negra lembrava do sacrifício de sua amiga. Ela sabia que a missão ainda não havia acabado. O pacto estava desfeito, mas a maldição não desapareceria tão facilmente. O esp
Mara, agora aclamada como a heroína do vilarejo, passou os dias seguintes coordenando a reconstrução das casas e cuidando dos feridos. Apesar da dor pela perda de Susan, ela se manteve firme, utilizando a memória de sua amiga como combustível para seguir adiante. A presença dela parecia estar em cada ato de bondade, em cada sorriso que ela via nos rostos daqueles que ela ajudava. Uma noite, enquanto descansava em sua pequena tenda nos limites do vilarejo, Mara sentiu uma inquietação no ar. O vento carregava consigo um sussurro familiar, como se as folhas das árvores estivessem cantando. Ela se levantou, seguindo o som até a borda da floresta, onde a luz da lua iluminava o caminho. Era como se a floresta a estivesse chamando. Ao se aproximar das primeiras árvores, a névoa reapareceu, mas, desta vez, era mais sutil, menos ameaçadora. Ela fechou os olhos e escutou o que parecia ser a voz de Susan, distante, mas clara. — Não tenha medo, Mara. O caminho ainda não terminou. A voz er
Depois de descansarem no templo purificado, o grupo se preparou para seguir em frente. As sombras pareciam mais leves e a floresta, menos opressiva. Mas todos sabiam que, com cada fragmento destruído, os desafios se tornariam mais complexos. A própria essência da maldição tentaria impedi-los de alcançar o sucesso final. Elara, estudando o mapa antigo que trouxera, mapeou o próximo destino: as Ruínas de Norr, uma cidade antiga e esquecida, agora um ponto de concentração da energia sombria. Era ali que, segundo os textos, o próximo fragmento estava escondido. As ruínas estavam localizadas ao norte, além de um desfiladeiro que cortava a terra como uma cicatriz. — As Ruínas de Norr são um lugar de memória e perda — explicou Elara, enquanto o grupo se preparava. — Dizem que antes da maldição, era uma cidade próspera, mas as traições que ocorreram ali a tornaram um túmulo para almas inquietas. Precisamos estar prontos para enfrentar essas memórias. O grupo partiu, caminhando por trilh
A manhã trouxe com ela uma neblina espessa e um frio cortante que se espalhava pelo vilarejo. Mara se preparava para partir em sua nova jornada, acompanhada por um grupo de quatro pessoas que haviam se voluntariado para ajudá-la. Havia Rael, o caçador, cuja habilidade com o arco era conhecida por todos; Lena, uma curandeira jovem e promissora; Dorin, um ferreiro de coração nobre; e Elara, uma estudiosa das antigas magias, cujos conhecimentos seriam cruciais para decifrar as pistas que encontrariam. O grupo se reuniu na clareira central, com as expressões carregadas de determinação e incerteza. Mara olhou para eles com gratidão e força. Sabia que não poderia enfrentar essa jornada sozinha, e ver que tantos estavam dispostos a lutar ao seu lado renovava sua coragem. — Obrigada por estarem aqui — disse Mara. — Esta jornada será perigosa, e as sombras que enfrentaremos não são apenas criaturas da floresta. As marcas da maldição ainda estão enraizadas no coração do reino, e só unidos s
Enquanto avançavam pela floresta, o grupo se tornava mais unido, cada um desempenhando seu papel com precisão e coragem. As sombras ao redor pareciam mais intensas, e a sensação de serem observados aumentava a cada passo. Mara sabia que os fragmentos restantes se tornariam mais difíceis de encontrar, e que os guardiões que os protegiam seriam ainda mais perigosos. Em uma clareira aberta, o grupo decidiu fazer uma pausa. Lena preparava ervas para curar as feridas que Dorin havia sofrido na última batalha, e Rael observava atentamente os arredores, sempre em alerta. Elara estava sentada no chão, de olhos fechados, tentando sentir a energia mágica que emanava da floresta. Mara se aproximou dela. — Elara, está tudo bem? — perguntou, percebendo a expressão de preocupação no rosto da amiga. — Sinto algo estranho — respondeu Elara, sua voz baixa. — Os espíritos estão mais agitados, e há um fragmento próximo, mas é diferente dos outros. Parece mais poderoso, mais antigo. Mara franziu
A minha última lembrança antes de morrer foi o som da chuva, do carro derrapando na pista, da batida no caminhão de gasolina e a explosão. Depois de fechar os olhos, só lembro de abrir novamente e estar viva em outro lugar. Era um campo de grama, flores e a árvore em que eu estava apoiada, vestindo um vestido de época e com um livro de romance no colo, enquanto o vento soprava meu cabelo trançado que ia até a cintura. Ao longe, uma moça se aproximava com um lindo sorriso e uma cesta de flores, o vestido verde musgo combinando com o corpete preto que ela usava. ─ Ah, finalmente achei as flores certas para a coroa de flores do casamento da minha irmã ─ disse ela, suspirando com o rosto iluminado por uma beleza incrível. Inclinei a cabeça para a cesta, vendo as flores que ela colhera, e meu sorriso surgiu meio inclinado. ─ São lindas, bela escolha ─ mencionei, com os olhos brilhando de felicidade. Em seguida, por um breve momento, fechei os olhos e suspirei com a leve brisa que
Susan passou a noite em claro, com os olhos brilhando pelas lágrimas que marcavam o rosto angelical, enquanto as olheiras evidenciaram a falta de sono. Ela se levantou da cama já com tudo preparado para a viagem à capital real, mesmo estando sonolenta e com a mente lenta demais para acompanhar os próprios pensamentos e sentimentos. Ao sair do quarto, deparou-se com o pai, que estava cabisbaixo e silencioso. Ao vê-la, seu semblante de surpresa e choque ao notar o rosto e o cabelo bagunçados a fez engolir em seco. ─ Filha... - ele murmurou, engasgando de preocupação. Ela lhe ofereceu um sorriso doce e tranquilo, acenando um leve adeus enquanto se movia até a porta. Ao chegar na igreja, sua presença chamou a atenção dos cavaleiros, da amiga e do padre. Alguns ficaram em choque ao verem seu rosto e suspiraram surpresos ao notarem o sorriso doce e despreocupado, apesar da evidente exaustão. ─ Você deveria descansar, Susan - aconselhou o padre, preocupado. Ela soltou um