Demétrio
Abri os olhos num susto, como se meu corpo estivesse me acordando automaticamente por causa da rotina criada por mim há anos. Busquei meu aparelho celular e verifiquei que horas eram.
— Porra, estou atrasado. — exclamei, levantando-me da cama, com raiva —Essa porcaria de despertador não está funcionando! — levei a mão ao pequeno aparelho e o joguei na parede.
Passei as mãos pelo rosto, exasperado, sentindo minha cabeça latejar. Ainda meio zonzo da quantidade de álcool que bebi na noite anterior, fui para o banheiro. Tomei um banho rápido, escovei os dentes e me vesti. Peguei meu chapéu e fui em direção ao quarto do meu irmão.
— Frederic! — gritei, dando batidas fortes na porta.
— Não enche, Demétrio... — balbuciou com a voz sonolenta.
— Está atrasado para a aula! Levante-se, não quero ser obrigado a falar duas vezes. — ordenei.
Quando não ouvi nenhum barulho me sinalizando que ele se levantou, voltei a bater na porta, um pouco mais forte.
— Que merda irmão, pensei que você nem viria para casa ontem, você não saiu para beber? Por que não encontrou uma mulher por lá e dormiu com ela?
— Cale a boca e se arrume para ir.
— Você precisa de uma nova namorada para parar de me encher! Você ficou insuportável depois daquilo. Esquece aquela mulher, cara. Parte para outra.
— Seus pais também morreram naquele maldito acidente, seu imbecil. — grunhi — E eu já a esqueci e não tenho mais tempo pra esse negócio de namorar, tenho muita coisa para me preocupar e uma dessas é você, então é melhor se levantar porque já sabe o que acontece quando perco a paciência. — avisei me referindo ao balde de água que joguei em cima dele semana passada.
— Pelo visto acordou com o pé esquerdo hoje. Você parece mais mal humorado que o normal. — Fredéric disse e finalmente abriu a porta do quarto.
— Ótimo. Se quiser carona é melhor correr porque já estou saindo, estou atrasado e tenho que ir até a cidade comprar algumas coisas para o Sr.Heitor.
— Foda. Já vou, relaxa um pouco.
Coloquei ração e troquei a água do Bobby, meu cachorro e dei uma olhada em volta mas não o encontrei para dar um carinho antes de sair, deve ter saído para brincar no quintal.
Sai de casa e fui em direção a caminhonete, liguei o rádio e nenhuma música que passava, me agradava, soquei o volante e desliguei o maldito aparelho de som.
Eu sempre fui muito explosivo, mas de um tempo para cá, eu estava um pouco pior, tinha que admitir. Simplesmente não conseguia controlar minha raiva, ela corria em minhas veias a todo instante e eu fazia o que podia para não m****r todos irem para o inferno.
— Vamos Frederic! — gritei, apertando a buzina repetidas vezes.
— Já estou indo! Que saco porra, chato pra caralho.
— Você viu o Bobby por ai? — perguntei quando ele se sentou no banco do carona.
— Não, não vi seu cachorrinho. — falou, em tom irônico e então dei partida na caminhonete — Fiquei sabendo que a filha do Sr. Heitor está vindo morar com ele. — Frederic comentou, sorrindo.
— E daí? — dei de ombros — Com certeza é uma patricinha mimada, como todas de cidade grande.
— E daí? Ela pode ser uma gata.
— Você deveria prestar mais atenção nos seus estudos. Você vai fazer dezenove anos e ainda está no terceiro ano do ensino médio. — o adverti.
— Ah, me deixa Demétrio. — bufou.
Alguns minutos depois, chegamos a cidadezinha próxima, parei perto da escola e Frederic desceu do carro, parecendo irritado. Eu não ligava que estivesse, eu era seu irmão mais velho e tinha a obrigação de cuidar dele e me certificar de que tivesse um futuro bom.
— Tchau pra você também! — impliquei.
Depois que resolvi tudo na cidade, comprei o que precisava, coloquei tudo atrás da caminhonete e voltei para fazenda. Já era pouco mais de uma hora, fazer esse tipo de trabalho demandava tempo, pois eu sempre tinha que verificar mercadoria por mercadoria.
E, quando estava descendo do carro para ir em direção a casa do Sr. Heitor, avisar que estava tudo certo e entregar o restante do dinheiro, vi uma garota segurando meu cachorro.
— O que esta fazendo? Quem é você? — questionei e caminhei até ela rapidamente.
Quando me aproximei, a visão me tirou um pouco o fôlego, era uma linda moça, o rosto bem desenhado e delicado prendeu meu olhar, inclusive nos lábios rosados, porém o que mais me chamou atenção foram os olhos incrivelmente azuis. Eu nunca havia visto nada tão bonito antes. Parecia um maldito anjo. Percebi suas bochechas ficarem um pouco vermelhas. Ela não me respondeu nada, apenas ficou me encarando.
Algo diferente e estranho se agitou dentro de mim, o que me fez sentir raiva.
— Estou falando com você. — exclamei.
— Eu me chamo Lívia, sou a filha do Heitor, irei morar aqui a partir de hoje. — abri mais os olhos, surpreso — Eu estava dando uma volta quando vi esse cachorrinho machucado. Eu estava indo levá-lo para dentro, para cuidar dele.
— É meu, eu estava procurando por ele, me dê. — pedi e ela sem hesitar entregou o bichinho, dando uma última acariciada em sua cabeça.
— Espero que ele melhore. — deu um sorriso simpático.
Apenas virei as costas e fui para casa, tratar do meu cachorro.
— De nada tá? — a ouvi gritar, segurei uma risada e ignorei.
Lívia— Lívia! — ouvi meu pai me chamar.Percebi que havia ficado muito tempo encarando para onde o homem grosseiro foi. Balancei a cabeça e corri em direção a casa.Papai segurou minha mão e entrou comigo, me senti animada e ansiosa para conhecer meu novo lar. Enquanto andávamos, ele pegou uma mecha do meu cabelo fazendo cachinhos e me apresentou a todos os empregados da casa.— Maria e Luísa, essa é a minha filha Lívia, a que eu sempre falava para vocês, finalmente ela está comigo agora. — meu pai me olhou e sorriu dando um beijo na minha testa — Filha, a Luísa cuida da limpeza da cada e a
LíviaPerdida em meus pensamentos sobre aquele homem mas acima de tudo, feliz por estar com meu pai, acabei dormindo. No dia seguinte acordei, escovei os dentes, tomei banho e desci para encontrar meu pai, ele já estava lá embaixo sentado a mesa.— Bom dia. — abriu um largo sorriso ao me ver — Vem filha, junte-se a mim.Fui até ele, o cumprimentei e me sentei para tomarmos café da manhã juntos.— Pai, eu estou tão feliz de estar aqui... — declarei suspirando.— Que bom minha querida. Eu também estou muito feliz por ter você comigo, minha princesa. — ele re
LíviaUma semana se passou desde o dia em que fui morar na fazenda. Estava deitada na minha cama, tarde da noite, vestida com a camisa de um homem arrogante que nunca mais olhou na minha cara, pensando nele, graças a um livro de romance que eu havia lido. Eu não estava apaixonada nem nada, só tinha curiosidade de saber a sensação de estar vestida com a camisa do namorado e era totalmente sem sentido, eu sei.Eu não poderia deixar de me sentir idiota por isso. Eu mal conhecia o cara e já estava assim, e além de tudo, ele era um grosso.Ouvi um barulho lá em cima e rapidamente me sentei, um pouco receosa de que pudesse ser outra pessoa a estar lá, o Demétrio não parecia se
LíviaMe despedi do meu pai com muito custo. Dei-lhe um longo abraço e muitos beijos, eu sabia que ele voltaria logo, mas o amava tanto que tinha certeza de que apenas um dia sem ele se pareceria com um ano.— Oh, acabei de me lembrar de algo. Você pode fazer um favor para mim, filha?— Claro, qualquer coisa pai. — respondi prontamente, feliz em ser útil de alguma forma.— Eu não vi o Demétrio durante todo o dia e acabei me esquecendo de entregar a ele a lista de compras de ração para os animais. Você pode fazer isso para mim?— Claro, pode deixar. — aceitei de i
DemétrioEu estava quieto no meu canto preferido quando aquela garota intrometida chegou e meus olhos por um acaso se encontraram com os dela pela primeira vez desde que chegou a fazenda. Percebi que havia ficado um pouco perdido naquele olhar azul tão intenso e perfeito, eu não havia notado-a ainda desse jeito. Ela era linda.O que mais me chamou atenção foram o quão fortemente azuis eram seus olhos, depois, aquela boquinha rosinha e bem desenhada dela. Me fez começar a imaginar como seriam certas partes sensíveis de seu corpo. Quando dei por mim, estava duro pensando nela.Mas que porra estava havendo comigo? Eu sempre senti uma raiva incomum dentro de mim, mas naquele momento,
LíviaDois dias se passaram...Acordei com mãos macias acariciando meus cabelos, abri os olhos e vi o rosto do meu pai.— Pai. — dei um sorriso preguiçoso, me levantei feliz em vê-lo e o abracei, contemplando o sorriso enorme em seu rosto.—Que saudade, filha — me abraçou de volta.— Parece que faz um ano. — sorri.— Foram só dois dias. — sorriu — Como foi aqui sem mim?— Foi chato, senti sua falta o tempo todo.
LíviaEle estava demorando... Será que não viria mais? Eu estava com os braços nos joelhos sentada quando senti alguém se aproximando, olhei para frente e meus olhos encontraram a pessoa que fazia meu coração acelerar e meu corpo estremecer.— Frederic não vai poder sair com você. Ele tem aula. Não sei para que prometeu que te levaria em algum lugar em horário de aula. — Demétrio informou-me com olhos cheio de raiva.Ele estava montado em um cavalo, a visão de sua camisa de botões entreaberta e seus cabelos caindo nos ombros de forma selvagem, fez meu corpo esquentar.No mesmo instante, vi meu pai se a
DemétrioContinuei olhando para a porta fechada mesmo após ela ter passado por ela e batido-a com força. Suas palavras se repassando em minha mente. Remorso se aponderou de mim como uma mão agarrando meu peito e espremendo-o.Eu sempre deixava que minha raiva falasse por mim e tratava as pessoas de maneira rude, mesmo quando no caso de Lívia, não mereciam.Eu merecia que ela me odiasse por ser um bruto. Mas acontecia que meu coração era de pedra e eu não conseguiria corresponder a ela com a mesma educação e doçura que ela tinha.Talvez eu tenha exagerado, a culpa e o arrependimento me consumia cada vez mais, principalmente no