− Como? Estou aqui há horas e você não estava aqui!
Seu coração batia tão descompassado que ele o ouvia dentro dos ouvidos, e imaginou que o avô também pudesse ouvir.
O velho retirou com cuidado o livro do chão, passando a mão como que para desamassar qualquer deformidade que porventura pudesse ter sofrido.
− O quê? Mas como? O quê ... - Balbuciava o rapaz perplexo. Notou que a cor havia fugido das faces do avô, e que esse se sentara do outro lado da cama, cabeça baixa, olhava fixamente para seu livro-diário-apontamentos.
−Só me dê um tempo, por favor, Já não sou mais um garotinho, e você me assustou sentado em minha cama com minhas anotações e isso ...
− Calma lá! - Interrompeu o rapaz -Tínhamos combinado há horas de jogarmos, lembra-se? Tive que inventar uma mentira para minha mãe ou teríamos até helicópteros sobrevoando aqui agora e em toda a cidade. Você simplesmente sai de dentro do banheiro que eu inspecionei e não tinha como você estar lá? Do nada? Como é possível? Agora vejo algumas coisas escritas aí. Pelo jeito de séculos, e você acha isso normal?
Seu avô passou a mão pelos parcos cabelos que ainda lhe restavam, outra mão segurava o livro e era como se carregasse o peso do mundo em seus ombros. Como se houvesse sido surpreendido em um banco a roubar, com câmeras a lhe filmar ao vivo de todos os ângulos.
Siro, ali conseguiu enxergar todos os 75 anos que o avô tinha realmente. Não se via ali a destreza de quando ele se preparava para alguma viagem ou pescaria. Seu avô era ágil, e o homem que se encontrava agora em sua frente, era um velhote lento e derrotado.
Por um momento, se arrependeu de tê-lo crivado de perguntas.
−Sente-se garoto! - Ordenou a avô, passando a mão pelo rosto e se recompondo em parte um pouco da sua fraqueza momentânea.
− Começarei falando de mim, de minha infância e de como vim parar no que você presenciou hoje aqui, ok? - A um sacudir de cabeça confirmando, ele prosseguiu:
− Antes, vamos descer para a cozinha e vamos preparar algo para comermos, e não, eu não estou tentando te distrair da conversa que teremos; sei que é isso que está pensando. Só não toque no assunto ainda, por favor.
Ao descer as escadas devagar atrás do avô, o rapaz sentiu um cheiro que emanava do avô. Parecia algo como clorofila, algo que lembrava mato. Não parecia também que o avô tivesse tomado banho há apenas algumas horas, como era o que lhe parecera quando chegara que seu avô tivesse acabado de usar o banheiro para uma chuveirada.
Tantas perguntas ele tinha na cabeça, que queria saber logo! Primeiro: Como ele saíra do banheiro de repente se não estivera ali antes? E aquele livro-diário-apontamentos? Parecia que o avô lhe dissera que eram anotações, mas o que significava outro lado? e ainda , como o avô o esperara por anos?
Enquanto pensava naquilo, nem percebeu que já estava sentado á mesa, enquanto o avô lhes preparava uma refeição. Só agora percebia os barulhos de talheres e o cheiro de carne.
−Sei e imagino o que passa pela sua cabeça, filho. Você quer que eu ligue para sua mãe e peça para você dormir aqui? - Questionou-o o velho.
− Não, eu já liguei para ela há horas atrás e disse que dormiria aqui hoje - Respondeu o rapaz, sem olhar o avô no rosto. De repente era como se nunca o tivesse conhecido.
− Ótimo! - Disse o velho − Boa ideia, pois precisarei de um tempo para eu te explicar tudo.
Ele agora olhava ao redor, para a cozinha tão conhecida como a de sua própria casa. Há vinte anos ele circulava por ali como se fosse sua casa. Nada havia mudado desde a morte de sua avó, com exceção de que ela não deixava pratos na mesa, sempre os lavava e sempre ia lavando as louças que usava conforme as ia usando. Seu avô não era tão meticuloso como sua avó, mas também não parecia que era a casa de um homem ali.
Lembrou-se da mesa que estava sentado agora e de quando os avós a foram comprar. Sua avó queria uma mesa que tivesse um tampo no meio que rodasse, para colocar temperos para salada. Ícaro insistira que poderia ele mesmo fazê-la, mas a avó não permitiu. Queria a que havia visto e lá foram comprar. Levaram uma semana para entregar, e cada dia que demorava e sua avó ligava para reclamar, seu avô dizia que se ele mesmo tivesse feito, já estaria pronta e em uso.
Siro sorriu ao se lembrar de briguinhas corriqueiras que os avôs tinham, e muitas vezes sua avó piscava para ele e dizia com os lábios se movendo, mas sem som:
- Velho rabugento!
Eram muitas as lembranças. A escada que seu avô insistira em fazer para pegarem coisas no armário em cima da pia continuava encostada entre a pia e o fogão. Ele se arrependera de tê-la fabricado, pois Áurea vivia empoleirada, como dizia Maggie para o pai: − O senhor não devia ter feito essa arma para a mamãe! Ela vivia bem sem ela e agora se empoleira a toda hora! E se cair? A culpa será sua!
Ali estava, aquele ambiente gostoso, a casa de seu avô e amigo. Se fosse á garagem, veria as varas e tralhas de pescas que os dois sempre usavam. Mas a ansiedade em saber o que seu avô tinha para lhe dizer, lhe tirou o apetite e ao colocar um prato de salada de folhas e um bife grosso que parecia suculento sobre a mesa, o velho percebeu que o neto não iria comer.
− Você precisa estar alimentado para o que vou lhe dizer - Avisou-o − E levará tempo; Por isso, por favor, me acompanhe, pois sempre volto faminto de minha passagem e ess...
− Que passagem, vô?! Eu não entendo - Interrompeu-o o rapaz.
− É exatamente sobre isso que vou lhe falar, Sí - Esse era o apelido carinhoso que o avô sempre o chamava quando queria acalmá-lo − Não lhe esconderei um detalhe. Na verdade, há tempos tenho que falar isso com você, então vamos comer!
Por alguns minutos os dois sentados á mesa, partilharam bifes, sucos e salada. Começou beliscando, mas em seguida se viu devorando aquela refeição deliciosa e nada sobrou no prato.
Levantou-se assim que o avô também terminara de comer e pegou seu copo, talheres e prato para lavar.
− Isso pode esperar – disse o avô − Desde que Áurea descansou, não preciso mais me preocupar em deixar a pia seca e limpa para o dia seguinte. Acredite, faço isso sem remorsos; para quê deixar tudo limpo se nem sei se estaremos vivos amanhã? - Deu uma sonora gargalhada - Era o que eu sempre dizia á ela.
“Agora vamos subir novamente ao meu quarto e teremos uma conversa de homem para homem, ok?”
Siro anuiu, mas de repente sentiu certa apreensão sobre o que descobriria. Subiram as escadas.
O rapaz se sentou apreensivo em uma cadeira próxima á cama de seu avô que sentara também, porém em uma poltrona que fora de sua avó. Confortável, e que também fora fabricada pelo avô. Segurava o caderno de anotações nas mãos e acariciava a capa, sem abri-lo. Às 18 horas, ela esperava na antessala o chamado de sua mãe. Sentada ereta, com o queixo para cima em sinal de provocação, ela ouvia não a voz de dois homens, que seria seu pai e seu futuro marido, mas lhe pareceu à voz de mais de dois homens. “Usava o cabelo penteado e domado por brilhantina, mas o sorriso era o mesmo. Travesso e rebelde. O sorriso que a acompanhou e torturou-a por meses. Não fizera a barba e parecia ainda mais alto e bonito assim de perto.” “Somos em 136 pessoas e seis mulheres grávidas, damos valor a cada vida que chega. Nossa preocupação principal são pessoas para ajudar na busca por água e aumentar nosso número de pessoas; Para isso, creio que fomos designados, entende? Fui sucedido pelo meu pai, como já lhe disse, quando tinha 19 anos e agora é a sua vez. Pode perguntar algo agora - Exortou-o pai − Sei que é muita coisa para assimilar de uma vez, e mais uma vez lhe digo, essa é a única traição quCAPÍTULO SEIS
CAPÍTULO SETE
CAPÍTULO OITO
Siro foi até o guarda-roupas e retirou uma coberta, cobriu o avô e se dirigia para o quarto que o avô costumava ocupar, quando esse disse baixinho:− Eu amei a sua av&
Quinta-feira chegou e um dia antes, Siro já foi dormir na casa do avô com a desculpa de que ficava mais fácil, visto que eles sairiam na madrugada para pescar e a cidade era longe. Sua vontade era abraçar e beijar muit
Um Dragão!Ele sentiu um medo tão grande que achou que não estaria nunca preparado para aquele mundo; Talvez ele não fosse a pessoa certa para estar ali.
− O que está fazendo aqui fora, rapaz? Quer ser o bobo da corte, ou o quê? - Ela era diminuta, mas fez ele se sentir um inseto, sua voz era rascante e autoritária.Cada vez mais ele se sentia um peixe fora d’água