Capítulo 3

Jack Voyaller 

Acordo com um solavanco no meio da noite completamente perdido, automaticamente apalpo minha cintura em busca da minha Glock 9mm, mas não a encontro acoplada no cós da minha calça. Em alerta sento-me analisando todo o local e ao ver que estava tudo bem passo as mãos pelos cabelos soltando um pesado suspiro.

As luzes estavam acesas e demorou mais do que o necessário para me situar e compreender o que estava acontecendo.

Observo minhas roupas e respiro profundamente ao lembrar da noite anterior. Volto minha atenção para o relógio sobre a cômoda e vejo que são mais de cinco da manhã.

Estava cansado, a dias não vinha dormindo com a preocupação desse casamento, sem contar que a garota demorou mais do que eu previa no banheiro.

Cogitei até a possibilidade de ir ver se ela estava bem, mas havia dado minha palavra que não subiria, então decidi que a melhor opção era esperar e acabei pegando no sono. 

Um sono bem pesado por sinal.

Meio atordoado e sonolento caminho para o andar superior, sabia que a menina loira de olhos castanhos estaria dormindo, mas precisava tomar um banho.

Procuro não olhar para a cama, mas a curiosidade é mais forte do que eu e quando vejo já estou parado ao seu lado.

Jessye dorme serenamente agarrada aos travesseiros com seus cabelos loiros levemente molhados e esparramados por sua volta. Os fios de ouro escorrem por sua pele e rosto, por um momento cogito a possibilidade de arrumá-los, mas contenho meus estranhos impulsos.

Não precisava ter empatia por ela, eu não queria nada daquilo e tenho certeza que nem ela, então vamos continuar mantendo as coisas assim, mesmo que seu corpo delicado me chame atenção, que sua inocência e olhos assustados instiguem minha curiosidade e a vontade de encurrala-la, não posso dar-me o luxo de cair em tamanha tentação.

O pior de tudo é que achei que a garota seria bem mais pirralha e na verdade é o completo oposto. Ela é linda e dona de um corpo escultural se comparado a pouca idade que tem, um pouco tímida, mas acaba falando demais quando se sente nervosa e ouvi-la tentar se explicar sobre sua virgindade foi realmente cômico.

Confesso que contive arduamente a vontade de rir, porém bem lá no fundo senti -me assustado com o rumo da conversa, afinal posso ser tudo o que meu pai me criou para ser, mas um estuprador jamais seria, muito pelo contrário, sempre abominei tais atos. Meu pai já não tenho tanta certeza, mas eu e meus irmãos sim.

Jamais obrigaria ela a se deitar comigo por mais interessado que eu tivesse -o que não é o caso- eu não forçaria uma mulher a tal ato.

Desço meus olhos por seu corpo e observo a camisola preta de renda envolver seus seios arredondados. Como ela estava deitada de lado não permitia minha total visão e agradeço aos céus por isso, porque porra, como essa menina pode ser tão linda?

E porque diabos ela vestia uma camisola tão sensual sendo que nem nos conhecemos?

Impossível que ela crescesse tanto em poucos meses ou Dante estava zoando com minha cara ao mostrar a foto de uma fedelha sorridente e irritante ou estava tão desinteressado que nem prestei atenção.

Pensando por esse lado acredito que a segunda opção seja bem mais viável.

Como se sentisse minha presença ela se remexe incomodada e sei muito bem como é ter essa sensação. Apesar de ser mulher e não ser obrigada a herdar a cadeira do pai, Jessye foi treinada para manusear uma arma com perfeição e aprendeu a se defender tenho total certeza disso, pois é assim que as coisas funcionam em nosso mundo independente do sexo.

O movimento de seu corpo faz seus cabelos loiros escorrerem mais para baixo revelando a tatuagem em suas costas. Fixo meus olhos naquele ponto e não me surpreendo por vê-la levar o símbolo da família em seu corpo. Apesar da tatuagem ser menor do que o esperado, costumava pegar todo dorso do integrante. Ainda mostrava quem ela era e a quem pertencia.

Suavemente afasto seus cabelos focando em sua tatuagem mais do que devia e corro meu dedo por sua pele em um toque suave. Jessye se remexe incomodada, mas não acorda. Recolho minha mão soltando um pesado suspiro balançando minha cabeça em negação observando o falcão exposto em suas costas.

-Garota você é mais interessante do que eu gostaria. -Afirmo para mim mesmo com irritação.

Agradeço por seu corpo estar coberto da cintura para baixo e disperso aqueles pensamentos errôneos e irritantes.

Mal nos conhecemos e meu amigo já quer subir com os peitos e a bunda empinadinha da jovem a minha frente. Não que nossa diferença de idade fosse tão grande, realmente não é, seis anos apenas, apesar de que irei fazer vinte e cinco em breve, mas isso não vem ao caso agora.

Que merda de pensamentos são esses?

Minha mente está um caos, até a poucas horas queria meter uma bala na cabeça de Edgar e agora fico aqui analisando a garota como se fosse um pedaço de carne a ser estudado?

Eu só posso estar de brincadeira comigo mesmo.

Balanço a cabeça e caminho em direção ao banheiro jogando minha camisa no pequeno cesto que ficava no canto próximo ao armário do banheiro. Tranco a porta e termino de me despir entrando embaixo do jato de água morna.

Irei ignorar todos os pensamentos idiotas dessa noite por ainda estar cansado demais.

Além desse casamento trazer uma p**a dor de cabeça, a morte de Donatel fez a mídia cair em cima da nossa família e mesmo com a insistente tentativa de Dante em preservar nossa imagem, tudo foi por água abaixo quando as revistas resolveram fazer uma votação de beleza entre as famílias mais ricas e nossos nomes estamparam os outdoors da Itália em primeiro lugar.

Confesso que me sinto honrado por ser considerado um símbolo de beleza, mas nós não queríamos tanta visualização como estamos tendo. Isso é uma verdadeira merda e só compliga ainda mais nossas vidas. Gostamos das sombras e da discrição e no momento discrição é a última coisa que estamos tendo. 

Estendo meu banho o máximo que posso e quando saio coloco um terno escuro, pois precisava ir para mansão resolver os assuntos pendentes do casamento que envolvia a nossa viagem à Alemanha em algum momento do interesse de Edgar.

***

Estaciono a Ducatti 1199 - Superleggera vermelha em frente às escadas da mansão e deixo meu capacete sobre a mesma. Entro em busca de alguma alma viva dentro daquela casa, além dos seguranças e encontro minha amada Teresa em seus afazeres na cozinha.

Silencioso, caminho na ponta dos pés envolvendo meus braços em sua cintura a abraçando por trás enquanto tasco um beijão em sua bochecha e recebo trilhões de xingamentos por tê-la assustado.

-Menino abusado. -B**e em mim com o pano de prato e encolho os ombros rindo.

-Estava com saudade de você Teresa. –Tento me defender das panadas e ela só se satisfaz depois de descontar toda a sua raiva em tapas e xingamentos. -Que mulher brava Deus. -Encolho-me fingindo chateação.

-Nem adianta fazer essa carinha de cachorro sem dono que comigo não cola. -Aponta a colher de pau em minha direção e acabo rindo.

-Te amo Teresa. -Confesso na maior naturalidade e vejo sua raiva ir embora.

-Acho bom mesmo. -Volta a mexer em suas panelas. -Falando em amar, não era pra você estar em lua de mel? Cadê sua esposa? Porque não trouxe ela aqui para que eu pudesse dar uma boa olhada nela? Nem tive tempo de vê-la adequadamente naquela festa pomposa e cheia de gente esquisita.

-Respire Teresa, você fez trinta perguntas em menos de cinco segundos. -Acabo torcendo o nariz.

-E acho bom você responder todas, se me ignorar igual seu irmão faz lhe dou uma bela surra de cinta. -Ameaça e faço uma careta sabendo que ela realmente seria capaz daquilo, já que foi ela quem me criou desde bebê e sei bem do que é capaz.

-Tem que ser mais específica quanto ao irmão, tenho três sabe. -Sabia que ela falava de Dante, já que é o mais desgarrado dos quatro.

-Estou falando do mais velho. -Ela b**e na panela com certa raiva.

-O que Dante fez para te irritar tanto? -Pergunto sabendo que algo estava errado.

-Nada. -Ela afirma. -O assunto aqui não é seu irmão e sim você. -Aponta a colher para mim novamente. -Com aquele mal agradecido me resolvo depois.

Solto o ar com força fazendo uma careta, jamais conseguiria sair daquela cozinha antes de sanar todas as dúvidas dela e sendo sincero, até mesmo agradeço por não estar na pele de Dante.

-Deixei Jessye no meu apartamento em Pádua. -Limito-me em dizer.

-Porque ela não mora conosco? Você deveria trazê-la para cá. -Afirma pensativa.

-Não acho uma boa ideia Teresa, nem conheço a garota, nós vimos pela primeira vez ontem e bom, como você sabe, acredito que ela deve me odiar da mesma maneira que não gosto muito dela. -Falo pensativo.

-Hum... Não gosto muito dela? Evoluímos grandes passos correto? A um dia atrás você queria jogá-la para os lobos, agora não gosta MUITO dela? -Da ênfase na palavra me fazendo suspirar.

-Complicado, acho que julguei errado. -Dou de ombros. -Talvez ela seja uma boa pessoa, mas ainda não tenho certeza, só o tempo dirá, isso não muda o ódio que sinto pela família dela e da mesma maneira que aquela família é boa em encenação a filha também pode ser, não vou cair nesse jogo com tanta facilidade Teresa.

-Pare de arrumar empecilhos onde não existe e traga a pobre moça para nos conhecer.

-Deixe-a descansar e depois vemos como as coisas fluirão. -Afirmo pensativo e ela desliza a xícara de café em minha direção.

-Tenho certeza que não comeu nada correto? -Pergunta com a mão na cintura e eu apenas afirmo com um menear de cabeça. -Conheço bem meus filhos. -Nega abrindo a geladeira e retirando de lá um pequeno embrulho laminado.

Abro e vejo o lanche natural do qual como bebericando o café preto que ela entrega em uma pequena xícara.

-Eu já disse que te amo Teresa? -Pisco para ela e recebo um lindo sorriso.

-Puro interesse. -Ri enquanto volta a mexer nas panelas e finge de desentendido.

-Teresa. -Chamo ela novamente que volta sua atenção para mim. -Dante ainda está aqui ou já foi para o porto?

-Se não me engano está paparicando Eva e Allef no andar de cima. -Ela aponta com a colher de madeira para os quartos.

-Preciso conversar com ele sobre Edgar. -Termino o café pronto para levantar.

-Você deveria estar na sua casa tentando se entender com a pobre garota que deixou sozinha. Os assuntos podem esperar. -Afirma brava.

Dou um beijo rápido em sua bochecha e corro em direção aos quartos a fim de me encontrar com Dante, mas vejo Max saindo de seu quarto e ele franze as sobrancelhas ao me encarar.

-Você deveria estar aqui? -Pergunta confuso.

-Todos irão fazer essa mesma pergunta? -Falo frustrado.

Max balança os ombros.

-Sei que não foi um casamento desejado, mas você poderia pelo menos conversar com a jovem. Dar uma chance e uma oportunidade de se conhecerem.

-Não temos tempo para isso e você bem sabe, Edgar está planejando a apresentação dos Voyaller, na Alemanha e preciso conversar com Dante sobre isso. O que faremos se ele tiver brigas pendentes com nossos aliados? O casamento traz mais poder às nossas mãos, mas junto dele vem as responsabilidades e brigas de Edgar.

Max faz uma careta e passa as mãos na barba mal aparada.

-Só mais uma porrada de papéis e ligações para fazermos durante o final de semana. -Suspira sabendo que seria incluído nos assuntos mesmo contra sua vontade.

-Em memória do nosso pai. -Finjo um brinde e vejo meu irmão torcer o nariz.

-Desgraçado, mesmo depois de morto continua nos ferrando.

Agradeça por não ter que se casar a força, ele fez isso com Dante e comigo, apesar de serem casos distintos os próximos da lista seria você e Royal.

-Não tenho vocação para o amor.

-Estou falando com Max mesmo? -Finjo me confundir. -Por que não disse logo que era você Royal.

-Para de ser idiota, ainda assim somos gêmeos irmãozinho, mais parecidos do que pode imaginar. -Max ri e sinto vontade de soca-lo.

-Vocês e esses negócios estranhos de gêmeos. -Reviro os olhos e o vejo rir ainda mais.

-O que posso fazer? -Dá de ombro caminhando. -Vá para casa Jack ou melhor traga sua esposa para casa, não adianta tranca-la no alto da torre e escondê-la do mundo.

-Não estou trancando ninguém. -Falo em minha defesa. -Apenas acho que ela precisa de um tempo até conhecer toda a nossa família louca. -Afirmo. -Além disso nosso vínculo é zero, não confio nela o suficiente para trazê-la para essa casa quando Aleff acabou de nascer, não sei do que ela é capaz.

-Você mora mais aqui do que lá, deixará a garota sozinha quando Eva pode estar com ela, pare de ser um irmão chato e ranzinza já temos Dante para esse papel.

-Deixa ele ouvir que você terá trabalho pelo mês inteiro sem direito a descanso e reclamações. -Afirmo rindo.

-Vamos fingir que eu não disse nada, foi apenas força de expressão. -Encolhe os ombros e desce as escadas correndo.

-Que barulheira é essa na porta do meu quarto quando posso dormir até mais tarde? -Royal aparece só de calça social e cara amassada.

-Ainda com as roupas de ontem?

-Cala boca, bebi demais e você nem deveria estar aqui. -Fecha a porta na minha cara e eu reviro os olhos para o seu mal humor.

-Até você Royal. -Suspiro seguindo para o escritório, pois sabia que Dante não demoraria a ir para lá.

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