Não era doloroso perceber que estava morrendo, sentir ar queimando os pulmões ou notar o quão difícil era dar o próximo passo. Estranho mesmo era a leveza que Orion aceitava aquilo. Não havia por que lutar, só restava ceder aos braços da morte que envolvia seu corpo da mesma maneira que não estava preso... a nada. Era um toque suave e caloroso, como o de uma mãe segurando seu filho. Era assim que se sentia mesmo não sabendo o que era isso. Ele podia notar que o desespero não batia a sua porta, não havia medo apenas uma questão: “O tinha do outro lado?”
Não seria um devaneio bobo que o manteria acorrentado ao mundo, um desejo fosco e sem vida de ajudar alguém, ou de ser útil, e nem sua dívida o prenderia. Não tinha um porquê, um pra que na verdade de ainda estar ali. Só queria continuar, ir ao limite do máximo, dobrar o infinito era tão impossível quanto se manter vivo. Por isso se concentraria no próximo passo. Não era algo grandioso, inalcançável ou utópico, mas
Ela não reconheceria o desespero mesmo se ele estivesse bordado diante dos seus olhos, uma peça linda, escrita com suas letras negras, com as lágrimas que caiam da palavra que se desdobrava do profundo medo. Ela não reconheceria o desespero, por isso não sabia o que estava vendo, o que ainda iria sofrer e no que se apoiava.Foi aos poucos que a coisa ou melhor a... se revelou, no começo parecia mais alguém, uma silhueta estática a esperando, um dos monstros retirado dos seus pesadelos que a névoa trazia á vida e dava forma para assombrá-la em carne e osso e não só quando estava dormindo. Os passos estavam carregados de hesitação enquanto o ar, massivo e gelado, a fazia ofegar. Havia a sensação de estar sendo observada e o lugar, a névoa e o gelo sólido sobe seus pés a obrigavam a se questionar. “Para aonde estou indo? Em qual enrascada isso vai me levar?” Essas eram perguntas que só o tempo traria repostas, mas no momento permaneceriam como charadas esquecidas.<
O vento deslizava sobre a pele feito uma agulha esfolando o tecido e sem vontade nem uma de costurar ou ver sangue. Só queria ferir, provocar dor, sem o esforço de atravessar a pele e pra isso carregava o frio á onde fosse. Porém a verdadeira tortura era o alarido mudo, os grunhidos do silêncio, que se desdobravam na loucura de ouvir a mais familiar das vozes fossem elas rudes, gritos ou broncas por ter feito ou esquecido de algo. Orion conseguia ver atreves dos ouvidos e se imaginava lá.“O homem estava de pé, com as pernas levemente separadas, o elmo descansando entre os dedos enquanto fitava o menino. Já Orion das poucas vezes que ousava desviar os olhos do que estava fazendo o fitava com a expressão rígida, a barba rala crescendo, como ervas daninhas no gramado, em desordem. Porém todas as vezes que olhava-o o resultado era o mesmo, o corpo desabava cansado, exausto, do que estava fazendo.– Você só vai descansar depois de levar todas as toras p
Antes que tudo ficasse escuro demais, foi antes que as pálpebras se fechassem por uma eternidade, tudo aconteceu rápido e estranhamente com alguma ordem. Assim que a coluna rompeu jogando estilhaços, pedaços de gelo pra todos os lados, e a cobrindo de água, o ar entrou, o susto a fez respirar, a fez perceber que estava prendendo a respiração por tempo demais. Mas foi veloz demais pra entender.O instinto a fez olhar para baixo, cobrir os olhos e por fim fitar a coluna em destroços. O ar entrou corrosivo, como o mais doces dos vinhos, era sim dez vezes mais viciantes que qualquer bebida que houvesse provados antes e como qualquer viciada Endrelina queria mais e mais. Na verdade precisava disso pra continuar existindo. O coração ainda palpitava no peito tentando romper as grades das costelas, feito um cavalo selvagem sentindo a imposição das rédeas, e os lábios entre abertos estavam indecisos, surpresos com o que está diante dos olhos enquanto o oxigênio entrava com t
Ela não estava vendo, os olhos estavam pregados no escuro enquanto o coração ofegava tentando achar um ritmo pra tudo. Era confortável sentir a ausência do peso, o silêncio sendo quebrado pela brisa gelada e o cansaço dominando os músculos, enquanto o corpo se entrega ao sono.Se esperasse mais um pouco Endy estaria dormindo no campo do inimigo, fazendo da grande armadilha uma cama pra qualquer um dos seus sonhos. Mas ela não ligava pra isso, só queria comer e a garota deitada era uma refeição servida em uma bandeja de prata. Foi a fome, o cheiro suave de sangue fresco, que a trouxe do mundo dos mortos mais uma vez.Se estivesse de olhos abertos Endy correria, não estaria deitada e se entregando as suas vontades. Era esse o seu fraco, a ausência da disciplina de ignorar alguns dos seus desejos. A vida seria menos divertida mais com certeza teria menos problemas. E isso pra Endy era o problema, não poderia ser ela se não se entregasse de verdade, se
Ele estava chamando ajuda, acordando o resto do bando. Por isso do sorriso, dos gritos e das pancadas contra as pilastras. Tudo fazia sentido. Ele tinha mais de um plano.- Maldito, Maldito... – Vociferou Endy cerrando os punhos enquanto o ruído aumentava. – Seu MALDITO! – Gritou percebendo que o monstro estava pensando muito além do que podia ver.Bastou ouvir a primeira pilastra ruir pra tentar tirar a foice do gelo, ela poderia precisar de uma arma e aquela era única que tinha na plataforma, inteira. A lâmina havia atravessado o gelo, estava bem cravada, e o ombro quase deslocado de Endy não ajudava em nada. Enquanto tentava desvencilhar a foice conseguia ouvir as criaturas se libertando, a todo instante colunas se quebravam trazendo à tona os monstros. Ela ergue os olhos, eram tantos e ao menos tempo que não daria tempo, que não sobreviveria se ficasse. Precisava sair correndo. Precisaria ter alguma vantagem.Mas os observ
Os crânios se viraram pra trás. Eles estavam parados e uma parte de Endy torcia pra que tivessem desistindo de caçá-la, enquanto a outra sabia que havia algo de errado, que não devia ficar esperando que viesse ao seu encontro, mas a curiosidade não permitia que avançasse sem saber do que estava fugindo ou o que estava acontecendo. O silêncio os envolvia pela primeira vez, não havia os barulhos da corrida desenfreada, das colunas quebrando e nem um deles repetindo a mesma frase em uníssono. Isso por si só era estranho e a tensão crescia a cada segundo que nem um barulho era produzido.A curiosidade impelia Endy à chegar mais perto, mas o receio a impedia, afinal tudo tinha um limite e não seria idiota de cometer tal erro, ela esperaria a onde estava, nada mais que isso. Endy sentiu a plataforma tremer, parecia que algo estava pulsando, como se o gelo estivesse vivo. Como se algo estivesse vindo à tona. O silêncio crescia enchendo a cabeça da garota de pensamentos enq
O sabor da morte se alastra do fundo da boca ao resto do corpo, era um gosto amargo que eriçava todo os pelos do corpo, sua mortalidade estava sendo posta a prova e estava reprovando, miseravelmente. Era um humano, um nobre no fim das contas, e ele odiava o fato com todas as forças que estava no meio do inferno gelado carregando mais coisas do que seria possível, estava lutando contra a natureza pra provar que não era como eles, que não precisaria do título pra conseguir realizar seus desejos. Faria o impossível se apoiando na frágil ideia que conseguiria, uma hora ou outra, contanto que nunca desistisse. Orion sabia que estava morrendo, que se não fosse o veneno a armadilha de gelo o mataria primeiro. Seria seu fim se caísse na água gelada, estava carregando peso demais, não sabia como estava aguentando correr, mas não conseguiria nadar.Estava ficando pra trás, sem ideias e de maneira nem uma deixaria suas coisas abandonadas no fundo do lago, não podia
Endy correu pra direita, depois pra esquerda, mudou de rumo algumas vezes e foi em direção ao lago. Estava confusa, desorientada e não parava de cair água e pedaços de coisas que a grande armadilha tinha tragado a tempo demais. Deveriam estar no fundo do lago não despencando do céu. Ele devia estar ao alcance dos seus braços, dos socos que despejaria sobre o caçador e não fora do seu campo de vista. Queria gritar, mas tudo que atravessa a garganta era o som mudo que envolvia tudo. A garota não sabia o que machucava mais se eram as gotas quentes tocando a pele exposta, a dor de cabeça que se alastrava pelo corpo, feito uma serpente sufocando sua presa, ou a mudança bruscas de sentimentos, não havia a transição entre o prazer e a felicidade de vê-lo seguindo em sua direção e o desespero, apenas o soluço atando um nó no fundo da boca junto com o desprezo por si mesma.- CAÇADOOOOR! – Gritou Endy sentindo o eco do silêncio enquanto lágrimas e água fervente banhavam seu