O despertador tocou cedo demais e, ao tentar me mexer, percebi que Matheus estava com um braço pesado sobre mim.— Você vai me deixar levantar ou pretende me prender aqui o dia todo? — perguntei, empurrando de leve seu braço.— Cinco minutos a mais — ele murmurou, com os olhos ainda fechados.— Matheus... — insisti, mas ele me puxou para mais perto.— Tá bom, tá bom. Vou levantar. Mas só se você me der um beijo de bom dia.Revirei os olhos, mas atendi ao pedido. Ele finalmente se mexeu, me soltando.Enquanto eu seguia para o quarto de Carlinha para acordá-la para a escola, Matheus ficou na cozinha começando a preparar o café. Quando voltei com ela pronta, ele estava terminando de servir panquecas. O cheiro delicioso já tomava conta do ambiente.— Uau, papai, isso tá com uma cara boa! — Carlinha exclamou animada enquanto subia na cadeira.— É porque fiz com amor — ele respondeu, piscando para mim.Carlinha comeu rapidamente, conversando sobre a escola, as amigas e o que planejava fazer
Matheus (MT)Acordar com a Halu do meu lado era uma das poucas certezas boas que eu tinha na vida. Halu sempre teve a cabeça mais no lugar do que Luizinho e eu. Levantei e fui direto pra cozinha. O café da manhã era minha forma de compensar por tudo que eu fiz a ela. Fiz panquecas porque sabia que Carlinha adorava, e o sorriso dela quando chegou à mesa valeu a correria.Mas o melhor momento não foi ela me chamar de "papai". Foi ver Halu rindo enquanto cortava a panqueca pra Carlinha.Depois de deixar as duas na escola, eu sabia que o dia ia ser pesado. O "dia do arrego" era sempre assim. Um risco aqui, outro ali. Mas, quando eu vi a Halu preocupada, prometi que ligaria se algo desse errado. Claro que era mentira. Não porque eu não queria falar com ela, mas porque eu sabia que, se ela soubesse de qualquer problema, ia largar tudo pra resolver por conta própria. O dia começou tranquilo até a ligação do Pé de Pano. Fuba tinha sido pego pelos canas. — Qual foi do B.O, por que agarraram
Hannah Luiza (Halú)O trabalho penal que tínhamos que fazer era denso e cheio de detalhes que podiam definir o futuro do réu na nossa análise fictícia. — Olha, eu ainda acho que a pena poderia ser reduzida se considerarmos o histórico dele — argumentou Rafaela, sublinhando uma passagem do texto com a caneta. Luigi balançou a cabeça, discordando: — Reduzir a pena pode até ser justo, mas o cara precisa pagar pelo que fez. Se a gente considerar só os atenuantes, parece que estamos ignorando o impacto das ações dele. Suspirei, colocando o papel de lado: — Mas, Luigi, a justiça não é só sobre punir. É sobre reabilitar também. Se apresentarmos um bom argumento, podemos mostrar que ele merece uma chance de se reintegrar. Não dá para tratar todo mundo como um caso perdido. Estávamos nesse vai e vem há quase uma hora, quando senti uma mãozinha tocar meu braço. Virei para ver Carlinha ao meu lado, segurando seu ursinho de pelúcia. — Mamãe, me dá colo? — ela pediu, com aquele olhar
Estava com Carlinha no sofá quando Matheus começou a me fazer uma massagem gostosa. — Aí, amor. Continua assim. — Pedi a ele que continuou com as suas mãos firmes. — Ixi! Daqui a pouco Halú vai gozar no sofá. — Macla estava rindo. — Mamãe, o que é gozar? — Carlinha perguntou e encarei minha amiga e cara feia. — É coisa de adulto meu amor. — Minha pequena apenas assentiu. Dona Jacira nos chamou para comer e agradecemos a ela, Rafaela estava ao meu lado quando meu irmão chegou, ele estava com os olhos vermelhos e o encarei. — Carlos Luiz não me diz que você estava se drogando de novo? — Perguntei a ele que abaixou a cabeça. — Depois tu come meu rabo no esporro, agora tô na ‘mó’ larica. Meu irmão não muda mesmo,já conversei com ele sobre se drogar assim, mas as vezes ele sucumbe a tentação, essa é a merda de quem se enfia nessas merdas. Matheus me encarou sabendo como me sinto quando meu irmão se mete nessas merdas. Carlinha terminou de comer e foi pra sala. — Tamo de olho no f
Por Hannah Luiza — Mamãe, o que está acontecendo? — pergunto ao ouvir barulhos de tiros.— Meu amor, está havendo uma invasão. Vou levar você para o cofre.— Não, mamãe, eu quero ficar com você, por favor! Por favor! — choramingo.— Filha, vou te colocar no cofre e ajudar o seu pai e seu tio. Saiba que eu te amo muito! Não abra para ninguém, entendeu?Ela me coloca no cofre, e eu começo a chorar. Por que o Matheus e o Carlinhos tinham que estar na escola? Por que eu tinha que ficar naquele lugar sozinha?— Tá bom, mamãe.Fico ali dentro sozinha, enquanto os tiros não cessam. Subo no banquinho que tem ali e abro o cofre para dar uma espiadinha lá fora. Assim que saio, vejo meu pai caído, ensanguentado, e minha mãe, com lágrimas nos olhos, apontando uma arma para um homem que a ameaça com uma arma também. Um desespero profundo toma conta de mim, e eu grito seu nome. Ela me vê, se estremece e diz um "eu te amo". O resto acontece rápido demais: dois disparos, e minha mãe e o outro home
Por Hannah Luiza Acordo cedo, faço minha higiene e me preparo para mais um dia de trabalho. Preparo um café e arrumo minha mochila. Logo, minha amiga me envia uma mensagem.“Halú, cuidado, amiga. Os meninos estão no alvoroço.”“Valeu, Macla, vou ficar na ativa.”Assim que travo o celular, os tiros começam. Nem sempre o morro é desse jeito, mas de uns tempos pra cá tem acontecido com frequência, e tudo culpa da facção rival, que quer tomar o controle daqui.Moro no Rio de Janeiro, especificamente na rua Gregory Copper, vulgo Morro do Chipre. Nome chique para uma favela.— Halú, se protege e não sobe pra escola, não! — meu irmão grita da minha janela.— Valeu! Vou esperar normalizar e subir. Cuidado aí.— Pode deixar, mana. — Ele solta uma lufada de ar, como sempre, e vai embora.Dia de tiroteio não me traz boas recordações. Meu irmão é o subchefe do morro. Na verdade, eu também sou uma subchefe. Já explico pra você entender melhor.Meu irmão, Carlos Luiz, é conhecido como Luizinho; no
Por Hannah Luiza Não demora muito, e Carlinhos chega com Matheus. Eles me procuram, e, assim que me veem, caminham na minha direção.— Vocês podem, por favor, abaixar as armas? — digo a eles, que me encaram. — Estão assustando as meninas.— Pedindo com esse jeitinho, eu faço qualquer coisa — Matheus responde com uma de suas gracinhas de sempre.— Sendo assim, então se mate, por favor — retruco, tentando manter um tom fofo, e ele sorri de lado.— Se eu fizer isso, você vai sentir falta do pai aqui — ele provoca, e eu reviro os olhos.— Vamos parar com esse papinho de casal, porra! Halu, o que aconteceu? Algum vizinho viu que porra aconteceu aqui? — Carlinhos interrompe.— Primeiro, maneira no palavrão, estamos numa escola. Segundo, não sei. Vou chamar a Rita; foi ela quem chegou primeiro e talvez tenha visto algo.Chamo Rita para falar com os meninos, e ela se aproxima, mais pálida do que já é. Vendo o desconforto dela, faço um sinal para Carlinhos, que entende e coloca o fuzil atrás
Por Hannah Luiza Pulei da moto ainda em movimento e vi o menino com um buraco de bala nas mãos. Ainda bem que ele está vivo. — Carlinho, o que está fazendo? — pergunto, me aproximando do menino. — Ladrãozinho não se cria aqui — Matheus responde com um baseado na mão. — Ele é só uma criança e estava com fome. Não precisava disso tudo! Era só ter dado uma advertência. — Halu, tu não pode proteger a favela inteira. — Meu irmão me olha friamente. — Solta ele agora! — olho para meu irmão. — Qual foi? Acha que manda em alguma porra aqui? — CARLOS LUIZ CHAVES, SOLTA ESSE MENINO AGORA!! Olho para meu irmão e vejo que ele está drogado. Toda vez que mistura entorpecentes, perde um pouco a razão, dificultando o diálogo. — Sai daqui, Halu! — ele diz, apontando a arma para o menino. Em um ato de valentia vindo de onde não faço ideia, entro na frente. — Se vai atirar nele, terá que atirar em mim primeiro. — Mas que caralho, Halu, sai da frente agora! — Não! — olho dentro do