Por TonhãoTava ali, deitado na minha cama, com a Bruna me montando como se fosse o último dia da vida dela. Essa mulher tem fogo, não nego, mas às vezes é muita encheção de saco pro meu gosto. No meio da nossa transa, ela joga a pergunta no ar:— E aí, Tonhão, quando cê vai dar um jeito na Halu?Parei na hora. Meu sangue subiu, mas segurei o tranco. Olhei pra ela com aquele olhar que diz mais do que qualquer palavra.— Já te falei pra não vim me dar ordem, Bruna! Não sou cuzão que nem o MT, tá ligada? — Dei um tapa na cara dela, não pra machucar, mas pra ela entender o recado. — Eu não aceito ordem de vagabunda nenhuma!Ela ficou ali, com os olhos arregalados, segurando a bochecha, mas sem coragem de retrucar.— Sai daqui, vai! Some da minha frente antes que eu perca a paciência. — Apontei pra porta do quarto.Bruna bufou, vestiu a roupa de qualquer jeito e saiu batendo o salto pela casa como se fosse dona do pedaço. Só que aqui, quem manda sou eu. Sempre fui e sempre vou ser.Quand
Hannah Luiza (Halu)Estava descendo da escola com a Carlinha, quando ela começou a insistir pra comer um sonho na padaria. Resolvi levar, e assim que chegamos, demos de cara com a Macla cheia de chamego com o Gigante, em vez de estar atendendo.— Não tem ninguém pra atender nessa merda, não? — perguntei, já com a cara fechada.Minha amiga me olhou com aquele olhar de quem ia me dar sermão.— E aí, chefinha! Tá tudo de boa? — Gigante perguntou, mais despreocupado do que deveria.— Tá tudo de boa lá em cima. E você, Gigante? Não tem nada pra fazer, não? Um carregamento pra conferir? Uma biqueira pra averiguar? Nada?— Halu, larga de ser chatona. Ele só veio aqui conversar comigo um pouquinho. Às vezes, tu é pior que o MT e o Luizinho juntos — Macla revirou os olhos. — O que você vai querer?— Ô, tia, eu quero um sonhozinho! — Carlinha pediu, interrompendo qualquer resposta atravessada minha.Macla sorriu, pegou o sonho e entregou pra ela.— Prontinho, princesa da titia. — Depois, se vir
Por Hannah Luiza — Mamãe, o que está acontecendo? — pergunto ao ouvir barulhos de tiros.— Meu amor, está havendo uma invasão. Vou levar você para o cofre.— Não, mamãe, eu quero ficar com você, por favor! Por favor! — choramingo.— Filha, vou te colocar no cofre e ajudar o seu pai e seu tio. Saiba que eu te amo muito! Não abra para ninguém, entendeu?Ela me coloca no cofre, e eu começo a chorar. Por que o Matheus e o Carlinhos tinham que estar na escola? Por que eu tinha que ficar naquele lugar sozinha?— Tá bom, mamãe.Fico ali dentro sozinha, enquanto os tiros não cessam. Subo no banquinho que tem ali e abro o cofre para dar uma espiadinha lá fora. Assim que saio, vejo meu pai caído, ensanguentado, e minha mãe, com lágrimas nos olhos, apontando uma arma para um homem que a ameaça com uma arma também. Um desespero profundo toma conta de mim, e eu grito seu nome. Ela me vê, se estremece e diz um "eu te amo". O resto acontece rápido demais: dois disparos, e minha mãe e o outro home
Por Hannah Luiza Acordo cedo, faço minha higiene e me preparo para mais um dia de trabalho. Preparo um café e arrumo minha mochila. Logo, minha amiga me envia uma mensagem.“Halú, cuidado, amiga. Os meninos estão no alvoroço.”“Valeu, Macla, vou ficar na ativa.”Assim que travo o celular, os tiros começam. Nem sempre o morro é desse jeito, mas de uns tempos pra cá tem acontecido com frequência, e tudo culpa da facção rival, que quer tomar o controle daqui.Moro no Rio de Janeiro, especificamente na rua Gregory Copper, vulgo Morro do Chipre. Nome chique para uma favela.— Halú, se protege e não sobe pra escola, não! — meu irmão grita da minha janela.— Valeu! Vou esperar normalizar e subir. Cuidado aí.— Pode deixar, mana. — Ele solta uma lufada de ar, como sempre, e vai embora.Dia de tiroteio não me traz boas recordações. Meu irmão é o subchefe do morro. Na verdade, eu também sou uma subchefe. Já explico pra você entender melhor.Meu irmão, Carlos Luiz, é conhecido como Luizinho; no
Por Hannah Luiza Não demora muito, e Carlinhos chega com Matheus. Eles me procuram, e, assim que me veem, caminham na minha direção.— Vocês podem, por favor, abaixar as armas? — digo a eles, que me encaram. — Estão assustando as meninas.— Pedindo com esse jeitinho, eu faço qualquer coisa — Matheus responde com uma de suas gracinhas de sempre.— Sendo assim, então se mate, por favor — retruco, tentando manter um tom fofo, e ele sorri de lado.— Se eu fizer isso, você vai sentir falta do pai aqui — ele provoca, e eu reviro os olhos.— Vamos parar com esse papinho de casal, porra! Halu, o que aconteceu? Algum vizinho viu que porra aconteceu aqui? — Carlinhos interrompe.— Primeiro, maneira no palavrão, estamos numa escola. Segundo, não sei. Vou chamar a Rita; foi ela quem chegou primeiro e talvez tenha visto algo.Chamo Rita para falar com os meninos, e ela se aproxima, mais pálida do que já é. Vendo o desconforto dela, faço um sinal para Carlinhos, que entende e coloca o fuzil atrás
Por Hannah Luiza Pulei da moto ainda em movimento e vi o menino com um buraco de bala nas mãos. Ainda bem que ele está vivo. — Carlinho, o que está fazendo? — pergunto, me aproximando do menino. — Ladrãozinho não se cria aqui — Matheus responde com um baseado na mão. — Ele é só uma criança e estava com fome. Não precisava disso tudo! Era só ter dado uma advertência. — Halu, tu não pode proteger a favela inteira. — Meu irmão me olha friamente. — Solta ele agora! — olho para meu irmão. — Qual foi? Acha que manda em alguma porra aqui? — CARLOS LUIZ CHAVES, SOLTA ESSE MENINO AGORA!! Olho para meu irmão e vejo que ele está drogado. Toda vez que mistura entorpecentes, perde um pouco a razão, dificultando o diálogo. — Sai daqui, Halu! — ele diz, apontando a arma para o menino. Em um ato de valentia vindo de onde não faço ideia, entro na frente. — Se vai atirar nele, terá que atirar em mim primeiro. — Mas que caralho, Halu, sai da frente agora! — Não! — olho dentro do
Por Hannah Luiza Macla, Carlinha e eu descemos o morro até a pracinha. Deixo Carlinha brincando no escorregador e me sento ao lado de Macla, que ainda está irritada com Bruna. Digo a ela que aquele projeto de “puta” nem vale o esforço do ranço. Conversamos mais um pouco, e minha amiga insiste para que eu vá ao baile hoje à noite. Mesmo dizendo que não estou com vontade, ela continua insistindo tanto que acabo cedendo, especialmente depois que ela reclama que faz tempo que não apareço.Estávamos ainda conversando quando ouço o choro de Carlinha. Levanto-me rapidamente para socorrê-la. — Mamãe, eu e minha coleguinha caímos — ela diz, mostrando o joelhinho ralado. Compro uma garrafinha de água para limpar o machucado e coloco um curativo no local. — Você é uma boa mãe — comenta a mãe da outra menina, sorrindo. — Tento fazer o meu melhor — respondo, sorrindo de volta.Carlinha pede para tomar um sorvete, e vamos até a sorveteria. Depois de saborear o doce, digo que é hora de irmos p
Por Matheus (MT)Mais um dia de confronto na favela, esses cuzões estão achando que vão conseguir tomar o morro, mas tão tudo fudido. — Coé, Pé de Pano, passa a visão! — falo para um dos vigias. — Aê, patrão! Os filhos da puta tão tudo recuando.— Fica na atividade aí, senão já sabe que sobra pra tu.Finalmente conseguimos fazer os caras recuar e, dessa vez, sem perder ninguém do nosso lado. Porra! O pai lá do céu nos protegeu, porque os caras tavam armados até os dentes, mas nós somos mais preparados, tá ligado?Tava fazendo a ronda quando vejo a Halú subindo. Sei que ela tá indo pra escola, então tento puxar um papo, mas a mina me trata frio. Ela nem liga pras minhas cantadas e segue o caminho dela.A gente tinha um lance maneiro, coisa firme mesmo, tá ligado? Mas o idiota aqui fez merda. Um dia, no baile, ela não foi, e eu acabei enchendo a cara, usando tudo quanto era droga que via pela frente. Vacilei feio e acabei transando com uma das amigas dela. Foi um caos. A mina ficou gr